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O objetivo deste artigo é analisar as teorias acerca da arte e da estética do russo L. S. Vigotski
(1896-1934) e do alemão Walter Benjamin (1892-1940), e, permitir que possamos debater a
contribuição de tais teorias para compreendermos o significado histórico do cinema enquanto
arte, de acordo com materialismo dialético. Desta forma, questionamos duas teorias que, a
partir do marxismo, buscaram compreender o século XX, acerca dos rumos do capitalismo e
de seus aspectos ideológicos, na alienação da humanidade, e até mesmo na estética e na arte e
sua relação com a sociedade e sua influência na humanização ou na desumanização das
massas, trabalhadoras ou marginalizadas. A sociedade contemporânea, ocidental, urbana e
capitalista o adotou como uma de suas formas de arte mais massificadas, através da ideologia
do progresso científico e tecnológico, o que nos permite observar que a obra cinematográfica
é um eficiente retrato da nossa época, onde o homem é instigado a todo tempo a se colocar em
movimento, a fim de alienar-se cada vez mais de si mesmo, mas que, contraditoriamente, é
apenas através do movimento que o mesmo homem tem a possibilidade de se libertar e se
universalizar, tendo a arte papel fundamental neste processo. Através de recorte teórico,
analisaremos a Psicologia da arte de Vigotski. A teoria de Benjamin considerava o cinema
como potencialmente revolucionário, por possibilitar às massas um instrumento de renovação.
Considerando que a arte, como a ciência, constitui-se como uma forma mais desenvolvida de
conhecimento produzida pelo homem, ela pode nos ensinar a ver e a ouvir, e também a
refletir, fazendo avançar a nossa humanidade.
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para os rumos do atual debate acerca do papel da arte em nossa sociedade. As teorias de
Benjamin e Vigotski buscaram compreender o século XX, acerca dos rumos do capitalismo e
de seus aspectos ideológicos, na alienação da humanidade, e até mesmo na estética e na arte e
sua relação com a sociedade e sua influência na humanização ou na desumanização das
massas, trabalhadoras ou marginalizadas. No entanto, o contexto social e cultural que cada um
vivenciara e até mesmo os objetivos que cada um se propunha com o marxismo implicou em
ideias próprias em relação à arte e à estética e sociedade.
Isso faz dos filmes um ótimo material para análise da cultura e também para
a compreensão da história da ciência. Seja através da reconstrução do
passado ou do futuro do pretérito, os filmes nos possibilitam re-visitar os
eventos ocorridos ou imaginados. (OLIVEIRA, 2006, 135).
Temos nos filmes, assim, uma fonte bastante e rica para a compreensão da
constituição do sujeito contemporâneo e de sua subjetividade. Na transição do século XX para
o século XXI, temos vivenciado uma série de problemas advindos do modo como a sociedade
encontra-se estruturada em classes antagônicas e sua repercussão na constituição dos
indivíduos, já apontado por Sennet (2001) e Mészáros (2003). Vivemos, portanto, numa época
marcada por transformações profundas e contraditórias. Pessoas são excluídas do mercado de
trabalho e ficam à deriva, à margem da economia, sem acesso às condições humanas
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essenciais. Temos também um crescente acesso ao mundo televisivo, inclusive pelas camadas
mais baixas da população, mas este “mundo” é controlado por interesses de grandes redes de
telecomunicações que determinam o que e de que maneira é passada a programação.
O russo Lev. S. Vigotski tem como pano de fundo de sua obra a Revolução
Russa de 1917 e a implantação do regime socialista, como uma pretensa superação do
capitalismo. Muito se discutiu acerca do estado da Rússia czarista na época, pois era, na
verdade, um estado com características muito mais feudais que modernas ou até mesmo
capitalistas. No entanto, com a formação de um regime socialista, a partir das teses de Karl
Marx (1818-1883), Vigotski liderou um grupo de pesquisa que tinha por escopo:
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A partir da reflexão de Tonet (2006), que afirma que o processo de o indivíduo tornar-
se membro do gênero humano passa pela necessária apropriação do patrimônio – material e
espiritual – acumulado pela humanidade em cada momento histórico, consideramos que é
através dessa apropriação que o indivíduo vai se constituindo como membro do gênero
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humano. Por isso mesmo, todo obstáculo a essa apropriação é um impedimento para o pleno
desenvolvimento do indivíduo como ser integralmente humano. Desta forma, quando se
pretende promover o desenvolvimento das funções psicológicas para níveis mais complexos,
não basta apenas assistir filmes como forma de entretenimento, mas é necessário que a eles
sejam relacionados conhecimentos que se articulem ao entendimento do Cinema como forma
de Arte. No entanto, na sociedade de classes, como nos mostra Leontiev, um dos principais
colaboradores de Vigotski: “a encarnação no desenvolvimento dos indivíduos dos resultados
adquiridos pela humanidade na seqüência do desenvolvimento da sua atividade global, de
todas as aptidões humanas, permanecem sempre unilaterais e parciais” (LEONTIEV, 1978, p.
185). Este patrimônio material e espiritual a que este autor se refere está relacionado ao que
há de mais elaborado pela cultura humana, no caso a Ciência, a Arte e a Filosofia. Vejamos
esta citação de Lukács:
Não pensamos aqui tão-sòmente em tôda a técnica dos instrumentos surgidos
com o desenvolvimento da produção econômica, da técnica e das ciências
naturais, mas também no superior desenvolvimento dos órgãos receptivos
naturais causado pelas exigências cada vez mais diversificadas do trabalho,
etc., e pelas fecundas relações recíprocas entre os estimulantes resultados
oferecidos pela ciência e pela arte, pelo trabalho e pela prática cotidiana. A
diferenciação produzida pelo desenvolvimento histórico-social, portanto, não
isola entre si as atitudes singulares. Pelo contrário: quanto maior fôr a
especialização, tanto maiores podem ser – se a estrutura social não intervém
como fator de distúrbio, como é o caso na divisão capitalista do trabalho –
suas fecundas relações recíprocas, os estímulos que elas exercem umas sôbre
as outras. (LUKÁCS, 1968, p. 160).
De acordo com Engels, segundo o qual: “Primeiro o trabalho, e depois dele e com ele
a palavra articulada, foram os dois estímulos principais sob cuja influência o cérebro do
macaco foi-se transformando gradualmente em cérebro humano” (ENGELS, [s.d.], p. 273), e
para LEONTIEV (1978), foi por meio do desenvolvimento de instrumentos e ferramentas
cada vez mais complexas em virtude do trabalho, que o homem desenvolveu as funções
motrizes da mão e a fonética das línguas, aperfeiçoando a articulação e o ouvido verbal, o
progresso das obras de arte demonstra também a expressão do desenvolvimento das aptidões
estéticas, no homem. O processo de apropriação se objetiva no decurso do desenvolvimento
de relações reais do sujeito com o mundo, e estas relações “não dependem nem do sujeito
nem da sua consciência, mas são determinadas pelas condições históricas concretas, sociais,
nas quais ele vive, e pela maneira como a sua vida se forma nestas condições” (LEONTIEV,
1978, p. 275). Seguindo este raciocínio, para se desenvolver as aptidões artísticas e
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científicas, as novas gerações devem não só ter acesso a estas formas de conhecimento, mas
se apropriar do modo como elas são produzidas:
As aquisições do desenvolvimento histórico das aptidões humanas não são
simplesmente dadas aos homens nos fenômenos objetivos da cultura
material e espiritual que os encarnam, mas são aí apenas postas. Para se
apropriar destes resultados, para fazer deles as suas aptidões, “os órgãos da
sua individualidade”, a criança, o ser humano, deve entrar em relação com os
fenômenos do mundo circundante através de outros homens, isto é, num
processo de comunicação entre eles. Assim, a criança aprende a atividade
adequada. Pela sua função este processo é, portanto, um processo de
educação. (LEONTIEV, 1978, p. 290)
Sendo assim, por que não pensarmos o cinema enquanto um ganho histórico
que pode ser um importante meio para a educação?
Benjamin parte da tese de Marx que pode ser citada em nesta passagem: “A
força é o parteiro de toda sociedade velha que traz uma nova em suas entranhas. Ela mesma é
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uma potência econômica.” (MARX, 1998, p. 864). Assim, a tônica de sua teoria é que as
produções do capitalismo serão a força que o derrubarão, por conterem um potencial
revolucionário. Ele acreditava que o cinema era essa força.
Pois a aura depende de seu hic et nunc. Ela não sofre nenhuma reprodução.
No teatro, a aura de Macbeth é inseparável da aura do ator que desempenha
esse papel tal como a sente o público vivo. A tomada no estúdio tem a
capacidade peculiar de substituir o público pelo aparelho. A aura dos
intérpretes desaparece necessariamente e, com ela, a das personagens que
eles representam. (BENJAMIN, 1980, p. 16).
Desta forma, o cinema possui uma praxis que o torna totalmente peculiar em
relação ao outros modos de arte. Tanto no teatro, como no na pintura, a aura do ator ou do
pintor são a expressão da individualidade, o que no cinema, de produção altamente coletiva,
especializada na divisão do trabalho, o que implica na reprodução do capitalismo no fazer do
cinema.
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É interessante notarmos que ele já visualizava, nos anos 30, o acirramento das
tensões do fascismo e do nazismo que culminariam em mais um conflito mundial.
Interpretando esses regimes totalitários como uma das formas da atuação do capitalismo na
política, Benjamin previa que a estética da guerra se anunciaria. O fim do capitalismo então,
se fazia necessário como forma de preservação da humanidade:
Fiat ars, pereat mundus, esta é a palavra de ordem do fascismo, que, como
reconhecia Marinetti, espera da guerra a satisfação artística de uma
percepção sensível modificada pela técnica. Aí está, evidentemente, a
realização perfeita da arte pela arte. Na época de Homero, a humanidade
oferecia-se em espetáculo, aos deuses do Olimpo: agora, ela fez de si
mesma, a fim de conseguir viver a sua própria destruição, como um gozo
estético de primeira ordem. Essa é a estetização da política, tal como a
pratica o fascismo. A resposta do comunismo é politizar a arte.
(BENJAMIN, 1980, p. 28).
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Referências.
BENJAMIN, W. A obra de arte na época de suas técnicas de reprodução. São Paulo: Abril
Cultural, 1980. Col. Os Pensadores.
ENGELS, F. & MARX, K. A ideologia Alemã. São Paulo: Martins Fontes, 2002.
MÈSZÀROS, I.. Século XXI: Socialismo ou Barbárie. Rio de Janeiro: Boitempo, 2003.
VAZQUEZ, A. As idéias estéticas de Marx. 2.ed. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1978.
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