Você está na página 1de 23

Escola Tomista – Apenas para uso dos alunos Página | 1

Escola Tomista
Professor Carlos Nougué
Aula 84

Bem-vindos à nossa aula de número (23)84 que, espero, vou fazer de


tudo para isso, seja a última de nossa introdução à Física, para que possamos
cumprir a ementa no número de aulas previsto.

Pois bem. Terminamos a aula passada dizendo, depois de falar do


complexo caso da Teoria da Relatividade, e que, em grande, parte deixamos em
suspenso, terminamos a aula passada falando que o darwinismo, o evolucionista
darwinista, não só não está comprovado, senão que é hipótese; mas não só é
hipótese, senão que é hipótese anticientífica, e mais, não só que é hipótese
anticientífica, mas é um dogma. Um dogma. E é o que tentaremos provar no
curto espaço que nos cabe aqui.

Pois bem. Resumamos muito brevemente – já daremos mais detalhes –


mas resumamos, ao modo de objeção à nossa tese, o que diz o evolucionismo
de Darwin. Diz ele: uma série de fatores ambientais existentes na primitiva terra
ocasionaram o surgimento da vida. Esta vida, depois, por si mesma, reagindo a
estímulos externos ou por motu próprio, ou seja, de dentro de si mesma, desde
si mesma, foi mudando e evoluindo: mudando de vegetais para animais e, dentro
dos animais, de umas ordens a outras, peixes a répteis, por exemplo, répteis a
aves, répteis a mamíferos, e dentro de cada uma das ordens, por si mesmas. As
espécies também evoluíram. E o que prova isto, segundo o darwinismo? A
semelhança evolutiva como se se tratasse de uma árvore evolutiva. Assim como
a árvore genealógica, seria uma espécie de árvore genealógica da evolução dos
animais, das espécies.

Vejam as semelhanças entre o macaco e o homem: é claro que o homem


é um macaco desenvolvido! E assim para o conjunto das espécies não só
vegetais, mas animais; elas evoluem reagindo a estímulos externos ou por
necessidades intrínsecas que a fizessem evoluir por si mesmas. Digo essa dupla
possiblidade porque conquanto Darwin haja falado da adaptação ao meio, de
seleção natural, o neodarwinismo, tentando salvar as incongruências desta tese,
já não insiste tanto no fator ambiental. Porque, com efeito, e com uma frase aqui
nos bastará dizer o que temos para dizer quanto a isto nesta aula, no espaço
que nós temos, a “lei do mais forte”, ou seja, a lei da sobrevivência diante dos
obstáculos da natureza, em vez de favorecer a mudança das espécies,
favoreceria antes o quê? A permanência nela. Porque aqueles indivíduos mais
Escola Tomista – Apenas para uso dos alunos Página | 2

aptos de cada espécie, em vez de transformar-se, porque são os mais fortes,


conservam-se e, ao conservar-se, conservam a mesma espécie. Algo disso
pressentiram os neodarwinianos, e tentam adaptar a teoria de seu mestre ao
possível.

Pois bem. Tudo isto não passa de uma espécie de conto, de uma espécie
de fábula, de uma espécie de mito como outrora, antes de Aristóteles, faziam os
filósofos, até mesmo Platão. Dizia Platão que, se certa realidade vai além do que
nos é possível conhecer, criem-se mitos que os expliquem de alguma forma,
porque, como dizia Aristóteles, de certa forma, o mitólogo é um filósofo – mas de
certa forma, dizia Aristóteles.

Pois bem. Poderíamos abordar a falácia que é o evolucionismo por


diversos ângulos. Poderíamos abordá-lo do ângulo religioso. É o documento de
Pio XII, Humani generis, que diz que só está proibido pela fé crer que a alma
humana tivesse evoluído do macaco ou de qualquer animal anterior. Disse isso
Pio XII dando assim os limites, as delimitações do campo da fé embora,
recordando, que não se deve ser precipitado ao abraçar a primeira novidade
científica.

Pois bem. Não é do ângulo da fé que vamos tratar aqui. Mesmo o caso da
impossibilidade, segundo a fé, de a alma humana, que é imaterial e espiritual,
ter brotado, por evolução, de um animal anterior, também pode provar-se
filosoficamente, cientificamente. De que maneira? Já o dizia Aristóteles – vejam
que já Platão e Sócrates falavam da alma humana! Sócrates tinha dúvidas
quanto à imortalidade da alma. Já não tinha tal dúvida Platão, mas ainda de
maneira semi científica, às vezes mitológica. Ao passo que Aristóteles já vai
dizer, com todas as letras, que o que é matéria, isto que nos rodeia no mundo
sensível, isto que é o sujeito da Física, o ente móvel, não tem potência, não tem
capacidade para desdobrar-se, evoluir, mudar para algo espiritual, para criar
algo espiritual, que está além do sensível. Grande afirmação, grande
descoberta, já, de nosso Aristóteles, embora ele se perguntasse: se assim é, de
onde vem a alma? Deve ter uma origem externa. Queria ele dizer com isto, uma
origem divina. Realista que era, não tinha dados para ir além e preferia, como
sempre, permanecer antes da fronteira do mitológico – ali se deteve. Igualmente,
se perguntava: o que faria a alma humana após a morte do corpo? Tampouco
sabia. Eram limites não tanto religiosos, como limites filosóficos de verdade. Será
Santo Tomás quem nos explicará filosoficamente, ainda que, naturalmente,
ajudado, auxiliado pelas luzes que lhe dava a fé.

Pois bem, quanto à questão da alma humana e a impossibilidade de ela


brotar, ela surgir, ela evoluir de qualquer coisa material, de qualquer coisa
sensível, trataremos no apêndice sobre a alma humana e sua imortalidade.
Conquanto, a partir do que se diga hoje, já se terão suficientes indícios para
concluir aquilo que ali concluiremos. Muito bem.
Escola Tomista – Apenas para uso dos alunos Página | 3

Vamos tratar o assunto do evolucionismo - tampouco vamos tratá-lo no


âmbito da Metafísica, ou Teologia ou Filosofia Primeira. Vamos tratá-lo no âmbito
da Física. Naturalmente, da Física Geral e da Ciência Biológica. É neste âmbito
que o trataremos.

Hoje, ainda, exporei, na medida do possível, segundo o tempo que me


couber, o que são os princípios da natureza segundo a exposição de Santo
Tomás em traduzindo a Aristóteles. Traduzindo, não do grego ao latim, mas
numa maneira propriamente tomista. Já o veremos. Mas temos de, aqui,
antecipar alguma coisa. Vejam: tudo o que é, tudo o que existe, está, disse, em
ato. Tudo o que é, tudo o que existe, está em ato. Mas, no mundo que nos rodeia,
aquilo que está em ato só está em ato porque tinha potência para estar em ato.
Por exemplo: o sêmen e o óvulo humanos. Ao se mesclarem, eles já têm
potência para, ao mesclar-se, ao juntar-se, ao conformar-se, eles têm potência
para gerar o ente humano. E isso pode dizer-se do tigre, por exemplo: o esperma
do tigre e o óvulo da tigresa têm potência para, conjuntamente, gerar um
tigrezinho, que estará em ato porque terá a sua forma de tigre, a sua alma. No
caso do tigre e da tigresa, e não dos humanos, como veremos no referido
apêndice, a alma ou forma é a enteléquia. Vejam: aquela matéria que tem
potência para gerar o tigre é de onde se parte, em latim, ex qua. E a forma, que
é a enteléquia, o fim da geração, é aquilo a que tende, a que tende a geração. A
forma, a alma, é aquilo a que tende. Parte-se da matéria que tem potência para
gerar uma forma, para alcançar, melhor dizendo, uma forma. Gera-se, assim, os
tigrezinhos de uma ninhada. Mas vejam: nem tudo está em potência para tudo.
Por exemplo, a água não está em potência, não tem potência para gerar um
tigre. Não tem potência para alcançar a forma de tigre. A água tem potência para
algumas coisas, por exemplo, para, mesclando-se com outras, fazer refrescos,
sucos, um chimarrão, por exemplo, um tereré em português. Ela tem potência
para isto, mas não tem potência para gerar um tigre. Dela, não pode surgir um
ente em ato chamado tigre. Do fogo, tampouco. Do fogo não é possível sair um
macaco. O fogo não tem potência para ser macaco.

Podemos, então, ver a falácia do evolucionismo em dois campos. Em três:

Primeiro: um não vivente – já vimos a divisão da substância entre viventes


e não viventes – não tem potência para ser vivente. Nem tudo tem potência para
tudo. Logo, o não vivente não tem potência para o vivente, para a vida.

Dentro do campo da vida, o vegetal não tem potência para o animal. E,


em plano superior, o animal não tem potência para a alma humana. Este é o
segundo. Mas, mais que isso. Ao menos nos animais, as espécies não têm
potência para tornar-se outras espécies. No mundo vegetal, isto é um pouquinho
mais complicado, mas... aliás, há um grauzinho de complicação, mesmo no reino
animal, dada a existência de híbridos; a mula, o ligre – mistura de leão e tigre –
e tantas outras que andam fazendo por aí. Mas já o veremos com detalhe. E
Escola Tomista – Apenas para uso dos alunos Página | 4

mais, há outro problema ainda maior: descobriram a lesma-do-mar. A lesma, por


ser lesma, não pode não ser, senão um animal. Sucede, porém, que a lesma-
do-mar, linda, verdinha, realiza a fotossíntese e produz clorofila, logo lançam-
nos em rosto os evolucionistas: “está descoberto o elo entre o vegetal e o
animal”.

Mas lembram-se qual a distinção entre os viventes e os não-viventes? Os


não-viventes não têm o menor, nenhum, em sentido algum, senhorio de seus
atos. Eles são absolutamente passivos. Jamais têm domínio, senhorio sobre
seus mesmos atos. Ao passo que os viventes, sim, têm, conquanto que nos
vegetais seja inferior, e nos animais muitíssimo superior, têm eles, de alguma
maneira, movimento e domínio, em graus variadíssimos, sobre seus mesmos
atos.

Ora, o mineral não tem potência para este domínio. Como poderia,
portanto, evoluir ele, por si mesmo, para algo que tem tal domínio? Ah, explique-
se, então, por agentes externos! Concedo. Concedo, mas nos seguintes termos:
algo só passa da potência ao ato mediante, por meio de algo, que já esteja em
ato. A madeira só se torna cinza mediante o fogo que já está em ato de ser fogo.

Não há agente natural que seja capaz de dar, de transformar, de mudar o


não-vivente em vivente, pela simples razão de que o não-vivente não tem
potência para ser vivente. Logo, só um ente poderia, seria capaz de fazer com
que algo que não tenha potência para outra coisa, transforme-se nesta coisa
para a qual não tem potência. E este seria um ente, um único ente. Este ente
teria de ser ato puro, porque um ente que tivesse mescla de potência não teria
potência ativa para fazer com que aquilo que não tem potência para vivente se
tornasse vivente. E isto o estudaremos ao final da nossa introdução à Metafísica
com o Tratado de Deus Uno em seu capítulo, A Criação.

Não nos venham com argumentos assim: “o senhor está baseado no


Gênesis da Bíblia”. Não, não estou baseado no Gênesis da Bíblia, embora o
Gênesis da Bíblia em nada contraria, senão que concorda com tudo o que vou
dizer. Vejam, temos de fazer esses parênteses com relação à fé. Como dizia São
João Crisóstomo, e como repetia Santo Tomás e o Papa Leão XIII, a narração
da Criação – não estou falando do homem, exclua-se daqui o homem – a
narração da Criação foi feita com toda a verdade, sem nenhum resquício de
falsidade. Mas foi escrita com termos sensíveis para um povo rude, que era
preciso formar.

Neste sentido, não nos valemos do Gênesis. Digo apenas ao modo de


antecipação (aprofundarei isto no Capítulo da Criação), como já dito, em suas
teses gerais, há plena concordância com a Metafísica e com a Filosofia em geral,
ou seja, o universo foi criado de nada, e as coisas se constituem em suas
espécies. E mais: foi feito tudo com ordem. Os sete dias traduzem isto, uma
ordem. Uma ordem natural porque, com efeito, um ente sumo, a Ele convém
Escola Tomista – Apenas para uso dos alunos Página | 5

fazer as coisas segundo uma ordem. Já não dissemos que o próprio do sábio é
ordenar? Ora, imagine se esse ente sumo, que cria tudo de nada, se não fosse
capaz, ele mesmo, de criar sua criação de maneira ordenada, não de maneira
desordenada. E outros aspectos que não cabem entrar aqui. Mas vejam. Vocês
hão de dizer, “mas isto é filosofia, e a ciência contraria a filosofia – a ciência
desde Darwin – contraria com dados empíricos e científicos, factuais, o que se
diz filosoficamente”. Repita-se o que se diz filosoficamente: o não-vivente não
tem potência para tornar-se vivente; e um ente em ato que o fizesse não o
poderia ser senão um, aquele que fosse ato puro, porque quem tem mescla de
potência não é capaz, não só de tirar tudo de nada, senão que não é capaz de
dar algo que não tem potência para outra coisa esta potência. Tampouco tem
potência o vegetal para tornar-se animal, nem muito menos tem o animal
potência para tornar-se espiritual, como o somos e como o provaremos.

Mas lançam-nos em rosto palavras. Palavras vãs, decorrentes, saídas de


uma filosofia caduca, de quando não se tinha conhecimento científico e
descobertas científicas como a de Darwin. Pois bem, antes de tudo, ciência entre
aspas. Hipótese não-científica e dogma. Mais que não-científica: anticientífica e
antirreligiosa. Mas como não estamos tratando disto aqui, anticientífica e
dogmática. Como o provamos? Antes de tudo repita-se que Darwin não
descobriu o evolucionismo. Já nossos filósofos antigos, com seus mitos, já o
tinham descoberto. Anaximandro, por exemplo, dizia que pela ação do sol, pelo
elemento primeiro, que é a água, surgiu a vida. Surgiu a vida ali. Os animais
surgiram pela ação do sol sobre a água. Vocês já verão como se parece com o
evolucionismo, isso. E esses animais, de início, tinham uma espécie de capa, de
carapaça espinhosa. Eles, no entanto, acabaram por, anfibiamente, vir para a
terra e, pouco a pouco, foram perdendo a carapaça espinhosa, a casca
espinhosa, e se foram mutando, se foram transformando uma espécie em outra,
e outra e outra... Isso é Anaximandro. É também, de alguma maneira, uma
continuidade, o evolucionismo darwinista, da tese absurda de Empédocles, a de
que primeiro se teriam se constituído as partes dos animais – a pata, a cabeça,
a cauda, a coluna vertebral, o coração, e depois se teriam juntado no todo: no
tigre, no réptil, no macaco, no homem. E veremos que isso tampouco está tão
distante do evolucionismo darwinista, embora não seja exatamente o que ele diz.
Mas o que é que está implicado nessa bizarrice empedoclidiana? Ele não tem a
noção de todo substancial. Não tem a noção de todo substancial. E que,
portanto, num todo substancial, as partes não são senão partes deste todo. E
em todo ente com unidade substancial, em todo todo substancial – substância,
lembram-se, que é dado pela forma substancial, e forma substancial é aquilo que
dá o ato à coisa, dá à coisa o ser desta coisa – neste todo substancial, a ação
da parte não pode ser, senão a ação do todo. Nunca a parte agirá por si mesmo.
Demos só um exemplo, a modo de antecipação. Talvez não possamos, agora,
voltar a falar disto. O que é um exército, uma cidade, uma família? Uma família,
uma cidade, no sentido de sociedade, o que é um exército? Já vimos diversas
Escola Tomista – Apenas para uso dos alunos Página | 6

partes de todo, lembram-se? Todo potencial, todo universal, etc. Pois bem, agora
é outro ângulo que tem relação com aquela divisão. Mas não poderemos insistir
nessa relação. Quanto ao que nos interessa: este todo, que é um exercito, uma
família, uma sociedade, é o chamado todo de ordem. Neste todo, conquanto às
vezes todas as partes funcionem juntas, por exemplo, quando um exército ataca
em massa um inimigo, em colunas cerradas, em formação, quando ele ataca o
inimigo (estou pensando nas guerras antigas, naturalmente), as partes atuam
junto com o todo. Mas não é verdade que, numa guerra, um soldado pode sair
deste todo de ordem para matar um inimigo que está ao longe? Pode. Isto é
típico do todo de ordem, aquele em que suas partes podem atuar isoladamente.
Peguemos, agora, uma casa. Ele é todo não só de ordem, mas de composição,
porque, com efeito, a casa tem solidez maior que um exército. Ela é mais unida,
ela tem unidade, ela tem composição: as paredes, os alicerces, o teto, se
compõem para constituir um todo e ficam ali. Mas, pense-se num tigre. Agora,
não. Nenhuma das partes do tigre pode agir se não for em razão, em função e
decorrentemente do conjunto, do todo. Na verdade, o tigre é sempre o todo que
age. Uma criança diz assim, “não fui eu que fiz isso, não fui eu que peguei o
doce, foi minha mão”, mas ela mesma sabe que está tentando enganar os pais,
sobretudo se já chegou à idade da razão. Ela sabe que o que foi pegar o doce
foi o conjunto dela, não foi a mão por si mesma. Um coração só funciona
funcionando em função do todo, é na verdade o todo do tigre, seu coração, suas
vísceras, suas patas, sua língua, seus olhos que funcionam, é o todo, é a
operação de conjunto do composto que constitui o tigre. E isto é que se chama
todo substancial, com unidade substancial, em que as partes não agem senão
em função e em decorrência do todo.

Pois bem, vê-se por aí o absurdo da tese do grego e, como se verá, o


desconhecimento desta tese fundamental é um dos pilares do evolucionismo
darwinista.

Eu vou dar, para começar, e ao modo tomista, vou dar voz longa ao
próprio evolucionismo. Porque, até hoje, o que se propala é que o russo
Aleksandr Oparin, um biólogo químico russo, que começou sua atividade sob o
regime cruel que de Stalin, não sei de Lenin, e viveu até 1980. Ele, porém,
conquanto tenha avançado na hipótese do surgimento da vida e de sua
progressão, ele não teria podido dar provas laboratoriais de então. Então, três
americanos o teriam feito. Pois bem, vou dar voz ao Oparin e a estes três
americanos: Miller, Urey e Fox. Os dois primeiros em conjunto, e Fox
complementando as provas da teoria de Oparin que, por sua vez, seria a prova
do surgimento da vida segundo Darwin. É a chamada Hipótese Heterotrófica de
Oparin. Eu vou fazer um documento, que estará à disposição de vocês no nosso
site. Vou permitir-me ler porque fiz essa pesquisa há poucos dias para poder ser
didático aqui. Então eu lerei a sequência da Teoria de Oparin e de suas provas
Escola Tomista – Apenas para uso dos alunos Página | 7

laboratoriais pelos três. E pouco a pouco vou fazendo comentários. Vamos à


Hipótese Heterotrófica de Aleksandr Oparin:

1. Os gases da atmosfera primitiva – hidrogênio, vapor


d’água, amônio e metano – não o questionemos – foram submetidos
a descargas elétricas das tempestades constantes que se davam
sobre a terra e a uma intensa radiação ultravioleta vinda do sol.
Bom. Tal como olhamos, é uma mera hipótese. Em si não é anticientífica,
é uma mera hipótese. É sobre isso, aliás, com respeito a tais descargas elétricas,
que se darão as provas dos nossos três americanos. Repita-se a primeira, para
que vocês fixem bem.

1. Os gases da atmosfera primitiva – hidrogênio, vapor


d’água, amônio e metano – foram submetidos a descargas elétricas
das tempestades constantes que se abatiam sobre a terra e a uma
intensa radiação ultravioleta proveniente do sol.

2. Nos oceanos primitivos formaram-se compostos. Que


compostos são esses? Aminoácidos, açúcares, ácidos nucleicos e
ácidos graxos.
A hipótese está começando a ficar hipotética demais, mas ainda estamos
no campo da hipótese. Não se pode dizer perfeitamente que é uma hipótese
anticientífica, não se pode dizer isso. Continuemos.

3. Estes compostos formaram os primeiros agregados de


moléculas, os chamados coacervados.
É importantíssimo, na hipótese de Oparin, os coacervados. Já estamos
nos aproximando da beira do precipício anticientífico. Mas continuemos.
Lembrem-se que se formaram, neste item três, neste passo três da evolução, os
coacervados, ou seja, os primeiros agregados de moléculas, moléculas que se
agregaram. Há que perguntar-se, aliás, desde já, como se formaram esses
coacervados. Nada se diz, mas pode ser uma hipótese. Vamos.

4. Interagindo entre si (outra suposição, outra hipótese) e


com o ambiente (hipótese ainda), os coacervados evoluíram para
formas mais complexas: os agregados com membranas, que seriam
os primeiros entes vivos.
Vejam: aqui já se começa a cair no precipício anticientífico. Os
coacervados não poderiam ter potência para o vivo. Por mais que se
aglomerassem, e por mais que criassem membrana, ele não tem potência para
o vivo. Por quê? Porque de algo que não tem potência para ser dono de seus
próprios e atos, e ter, em algum sentido, movimento próprio, não tem potência
para aquilo que é, de alguma maneira, em algum grau, senhor de seus atos e
que, de alguma maneira, tem alguma espécie de movimento próprio, ainda que
não seja um movimento local, como a maioria dos animais. Há animaizinhos lá,
Escola Tomista – Apenas para uso dos alunos Página | 8

inferiores, que não têm movimento local. Então, já estamos mergulhando no


precipício. Pois bem.

5. Tais agregados evoluíram até constituir as células


primitivas.
Vejam que os primeiros seres vivos estavam constituídos antes das
células primitivas.

Como, porém, na atmosfera primitiva, ainda não havia gás


carbônico (vejam!), os primeiros entes vivos não eram capazes de produzir
alimento através da fotossíntese (claro), por isso, tais seres vivos eram
heterótrofos (por isso a hipótese heterotrófica, ou seja, não produziam seus
próprios alimentos).

6. Tampouco havia oxigênio, razão porque tais seres vivos


eram anaeróbicos (ou seja, não respiravam oxigênio).
Vejam que estamos, cada vez mais, indo para o fundo do abismo!

Os heterótrofos anaeróbicos, por serem fermentadores,


liberaram gás carbônico na atmosfera de então.

Tudo isso sem prova alguma! Muito bem, mas continuemos.

7. Formado o gás carbônico, deram-se as condições para


o surgimento de seres autótrofos (ou seja, que criam seus próprios
alimentos) fotossintetizantes ou fotossintetizadores.
Mas vejam que salto! Isto é o que se chama pirueta. É uma cambalhota
lógica. Vai parar lá no fundo do abismo. Deram-se as condições para o
surgimento dos seres autótrofos fotossintetizantes ou fotossintetizadores,
deram-se as condições, mas como eles se criaram? Como eles se criaram?
Vejam. Para que nasça um tigre, há de haver pré-condições. O ar, o sol,
certamente o conjunto dos planetas, embora não saibamos como, há de haver
essas pré-condições. É o que Platão chamava concausas. Há de haver essas
pré-condições. Mas só essas pré-condições são capazes de gerar o tigre? Ou é
preciso o esperma e o óvulo do tigre e da tigresa? Nada disto é considerado
aqui!

8. Em razão da reação de fotossíntese, os primeiros


autótrofos liberavam gás na atmosfera.

9. O oxigênio permitiu o surgimento dos primeiros


heterótrofos aeróbicos, ou seja, que respiram oxigênio.
Mais uma vez: o oxigênio era pré-condição. Mas a pré-condição ou
concausa, como diria Platão, são capazes de fazer surgir algo como tais entes
heterótrofos aeróbicos? Obviamente que, por si, não. Então, o que os fez surgir?
Escola Tomista – Apenas para uso dos alunos Página | 9

Nada diz Oparin. Nada, zero. Ele diz apenas que tais heterótrofos ainda eram
unicelulares. Grande descoberta!

10. Os unicelulares tornaram-se cada vez mais complexos.


Como? Por quê? Eles tinham potência para tornar-se cada vez mais
complexos?

Até transformar-se em pluricelulares, que acabaram por


conquistar, depois de muitos milhões de anos, a terra.

Vejam, esses muitos milhões e milhões de anos são uma das “armas”, um
dos argumentos do evolucionismo darwinista. É como se se esticasse o tempo,
o impossível se tornasse possível pelo esticamento do tempo. Ora, com
esticamento do tempo e tudo, nem estatisticamente – já não falamos nem
teologicamente, nem filosoficamente, nem cientificamente – pelo simples esticar
do tempo, ainda assim é impossível que tais transformações se dessem. Por
quê? Porque são estatisticamente impossíveis. São desprezáveis as estatísticas
que o permitiriam. Recomendo que se leia As Descontinuidades da Criação,
de Gustavo Corção. Não concordo com tudo o que está no livro. Corção era
caudatário ainda de um tomismo cheio de defeitos. Mas como Corção era um
cientista, e um cientista agudíssimo, sobretudo em algumas partes entre as quais
esta, em que prova impossibilidade estatística da evolução, de que desse
unicelular, ou melhor, desde aquelas descargas elétricas, se chegasse até o
homem, ele prova a impossibilidade estatística. Já que se trata de esticar o
tempo, trata-se de estatística. E estatisticamente é impossível.

Bom, mas não é sobre isto que nos vamos deter. Continuemos, agora,
dando as provas fornecidas pelos três americanos. Permitam-me seguir nelas.

Em Chicago, em 1953 (se não me engano), Stanley Miller e Harold Urey


fizeram a seguinte experiência: puseram dentro de um balão de vidro, metano,
amônia, hidrogênio e vapor d’água, se lembram? Aqueles elementos que haveria
na atmosfera da terra primitiva. E submeteram esta mistura a aquecimento
prolongado. Uma centelha elétrica, como se fosse um raio das tempestades que
caiam sobre a terra, centelha elétrica de alta tensão, cortava continuamente o
ambiente onde estavam contidos aqueles quatro gases – metano, amônia,
hidrogênio e vapor d’água. Ao fim de certo tempo, comprovou-se o aparecimento
de moléculas de aminoácidos no balão. Muito bem, comprova-se uma hipótese.
Algo superior (os raios das centelhas elétricas) pode fazer que algo que tenha
potência para ser molécula de aminoácido, se façam moléculas de aminoácidos.
Eles pararam por aí. Depois, uns dois anos depois, Sidney Fox – não sei se na
Universidade de Chicago, mas em alguma universidade americana – submeteu
uma mistura, uma mescla de aminoácidos secos a prolongado aquecimento, e
viu que reagiram entre si, formando cadeias peptídicas semelhantes às
encontradas nas proteínas. O que é que isso quer dizer? Que o aquecimento é
Escola Tomista – Apenas para uso dos alunos Página | 10

capaz de fazer com que aminoácidos secos se transformem em cadeias


peptídicas reagindo entre si. O que quer dizer que esses aminoácidos tinham
potência para constituir cadeias peptídicas. É até aí que vão as provas da teoria
de Oparin. Não tenhamos ilusão. Não só estes três cientistas americanos, como
uma infinidade de cientistas por todo o mundo, da antiga URSS até os EUA,
tentaram ir muito além. Tentaram, a partir daí, chegar àqueles coacervados, os
primeiros entes vivos. Conseguiram? Não. É porque nada tem potência, nada
que não seja vivente, tem potência para vivente. Esta é uma prova cabal dos
limites da evolução. Ou seja, não conseguiram provar, de modo algum, nem
filosoficamente, nem teologicamente, nem cientificamente, nem
laboratorialmente que a vida pode criar-se segundo a hipótese de Oparin. E
vejam – vocês terão aí o documento em mãos – os diversos passos da teoria de
Oparin. Com quê se completam?

1. Qual é o elo de ligação entre os diversos passos


explicitamente ou implicitamente. Explícitos ou implícitos – quais os elos
de ligação?

2. Duas palavras mágicas: evoluir e evolução. O que implica


dizer que prova-se a Teoria da Evolução pelos mantras evoluir e evolução.
Nada mais que isso. Não mais que isso.
Pois bem. Mas estamos aqui, ainda, numa prova filosófica. Vamos partir
para provas científicas? Com efeito, quando Darwin, quando apareceu com sua
hipótese anticientífica, e com Oparin, e até mesmo com estes nossos três
americanos aqui, Urey, Miller e Fox, a biologia molecular estava incipiente. É ela
quem vai dar-nos as provas científicas da falácia do darwinismo. Já demos as
provas filosóficas, na medida em que o podemos fazer aqui. Vamos agora a
algumas provas filosóficas. Antes de mais nada, repito a importância de Michael
Behe e de seu livro A Caixa Preta de Darwin. Ele não consegue sustentar até o
fim a sua tese porque carece, ainda, de certo fundamento filosófico, metafísico,
aristotélico e tomista. Mas é importantíssimo o que ele vai descobrir.
Importantíssimos, também, são as obras do argentino Raúl Leguizamón,
importantíssimas obras. Mas há mais. Há um sujeito, Michael Benton, é outro
importantíssimo biólogo que contraria o evolucionismo, que nega o
evolucionismo. Além disso, cresce enormemente no mundo o número de
cientistas que se opõem ao darwinismo. São todos católicos? Não, não o são.
Mas que são cientistas e que veem que, cientificamente, não se sustenta o
evolucionismo. E isto cresce. Cada dia tenho notícia de uma adesão a isto. O
que sucede é que o evolucionismo é, “está no poder”. É muito difícil galgar na
carreira científica sem aderir à tese que está no poder. Não se terá dinheiro, não
se terá subvenção, não se terá apoio, não se terá divulgação. E, se não se adere
ao dogma, ter-se-á uma carreira muito obstaculizada. Mas deixemos isto de lado.
Escola Tomista – Apenas para uso dos alunos Página | 11

Antes de falar de Michael Behe, que eu considero o mais importante de


todos, demos algumas provas científicas que consegui coligir. Vejam, se se
tratasse de evolução – e agora, encaremos particularmente a evolução do
macaco para o homem – haveria realmente uma arvorezinha gradual, com seus
ramos, aliás, como desenham largamente os evolucionistas, volta e meia se
veem árvores evolutivas, parecem árvores genealógicas, árvores mesmo... se
veem árvores.

Pois bem, vamos ver se é possível, em particular, enfocando o caso do


macaco para o homem, mas também, em decorrência, abrangendo o conjunto
dos animais. Ainda não falaremos da questão da vida, da questão do surgimento,
não falaremos aqui nem da passagem do não vivente para o vegetal e nem do
vegetal para o animal. Apenas vou referir algo ao final.

Provas científicas da Biologia Molecular. Vou lê-las:

- A hemoglobina, que é a proteína dos glóbulos vermelhos de nosso


sangue, está só em nós? Não, está em todos os macacos. Raùl Leguizamón
brinca: exultam os evolucionistas – descobriram que nos macacos está a
hemoglobina, esta proteína dos glóbulos vermelhos de nosso sangue. Vejam,
está nos macacos. Mas seu contentamento vai decaindo pouco a pouco porque
logo depois se descobre que está em todos os vertebrados. E depois, se
descobre que está em alguns moluscos. Depois, em alguns insetos. Depois em
minhocas, algumas minhocas. E depois, em algumas bactérias. Vejam que
curioso! A hemoglobina, esta proteína, enquanto proteína. A proteína dos
glóbulos vermelhos, chamada hemoglobina, está em algumas bactérias. De
repente, com um salto imenso, de algo não em todas as bactérias, mas em
algumas (é o que Corção chama As Descontinuidades da Criação, vejam a
descontinuidade), vai dar um salto para quê? Para as minhocas. Ou melhor, para
os moluscos. Vai dar um salto das bactérias para alguns moluscos, algumas
minhocas, alguns insetos, depois para todos os vertebrados, depois, claro, para
os macacos e, como somos vertebrados, para os homens.

Vejam. Onde está a continuidade evolutiva? Como pode a hemoglobina


estar numa bactéria e desaparecer, surgir mais adiante na minhoca, para depois
surgir em alguns insetos, e não em todos... onde está a árvore evolutiva?

Outra prova: a Lisozima

É a proteína presente nas lágrimas humanas para proteger os olhos de


infecções. Lisozima. O que era de se esperar, segundo a hipótese evolutiva?
Que a lisozima, ou uma quase lisozima estivesse presente nos olhos dos
macacos. Mas sabe onde está presente, exatamente igual a como está nos
humanos? Na galinha! Veja o salto: da galinha vamos para o ser humano, no
respeitante à lisozima, que é o que impede a infecção dos olhos. E estas
Escola Tomista – Apenas para uso dos alunos Página | 12

descontinuidades impressionantes se dão com respeito à insulina, à mioglobina,


à relaxina e a uma infinidade de outras proteínas.

Vamos a outra prova? Quanto, agora, à sequência de aminoácidos das


diferentes proteínas. Elas se dão iguais na lampreia que, segundo os
evolucionistas é um peixe primitivíssimo, é uma sobrevivência da época dos
dinossauros. Se dá na carpa que, segundo os evolucionistas é um peixe
muitíssimo evoluído, já a um passo de se tornar anfíbio. A lampreia, a carpa.
Depois, a um anfíbio, mesmo, que é a rã; a galinha, que é uma ave; o canguru,
que é um marsupial; e o ser humano. Vejam as descontinuidades! Segundo a
sequência de aminoácidos das diferentes proteínas, são estes animais que se
parecem. E os que estão no meio da escala evolutiva? Descontinuidades...

Querem mais um? Quanto à composição química do leite. A quem se


parece mais a composição do leite humano? Com a do burro. Seríamos tentados
a fazer certa jocosidade, mas deixemo-la de lado.

Quanto aos níveis de colesterol. A quem se assemelham mais os níveis


de colesterol humano? À cobra chamada Gardener Snake. Vejam que
descontinuidade abissal, da cobra ao ser humano!

E com base no antígeno A do sangue? A quê se parece o humano? Com


uma espécie de feijão, chama-se Butterbean.

Vejam. Trata-se de uma composição mosaica ou modular, e não de uma


árvore ou de uma sequência evolutiva. Façamos uma analogia: o pintor, ao fazer
um grande quadro, ele não precisa usar todas as cores. Ele pode usar um
conjunto pequeno de cores que, dependendo dos tamanhos, das dimensões das
figuras, se combinam variadamente, em toda a sua gama. Porque, realmente, a
relação entre cor e dimensão é efetiva. Então variando as figuras e as
dimensões, basta usar pequeno número de cores; não é preciso usar todas. E
assim, em todo quadro. Nenhum pintor usa todas as cores em nenhum dos seus
quadros. Pois assim também é o mundo do sensível. Ele segue um padrão
mosaico ou modular, e não um padrão evolutivo. Sequencial, reto, lógico, neste
sentido darwiniano.

Pois bem. Eu não posso falar aqui das fraudes que implicam os fósseis
que provam ter-se encontrado, hominídeos. Se eu pudesse, eu falaria que esses
fósseis ou eram verdadeiros macacos ou eram verdadeiros homens, por
exemplo, com certas deformações ósseas. Mas tudo isso se terá de deixar para
outro lado, porque é preciso concluir.

Vou concluir filosoficamente, uma mescla de ciência moderna a biologia


molecular que, se bem feita, pode não só ser uma boa base de indução para a
Física Geral, mas incorporar-se, ela mesma, como ciência específica, à Física
Geral. Quê descobre Michael Behe? Descobre a complexidade irredutível. O
Escola Tomista – Apenas para uso dos alunos Página | 13

sangue, por exemplo, é de uma complexidade irredutível: não pode ser nem
mais, nem menos sangue. O olho e qualquer coisa que se veja molecularmente,
lançam em rosto de Behe que isto de ser mais ou menos olho...mas veja, isto é
uma forma de ele vulgarizar sua teoria. Mergulhem em suas provas
biomoleculares, e verão o grau de complexidade de tudo, de cada parte de um
corpo e do corpo inteiro. Complexidade tal que, se se tira dela uma parte, ela já
não funcionará. Em certo sentido, é como as máquinas e o computador: tire-se
uma parte e ela já não funcionará – em certo sentido, estou usando
analogicamente, apenas. Tire-se uma parte do olho, uma ínfima parte que
compõe o olho e já não se terá um olho. É neste sentido que diz Michael Behe.
Ora, a complexidade irredutível de cada parte dos corpos e de cada substância
corpórea revela, portanto, assim como revela uma máquina, um desenho
inteligente. Uma máquina tem um desenho inteligente. Ora, os corpos têm
desenhos inteligentes. E falar de desenho inteligente pressupõe um planejador
inteligente. Vejam que toca ele os umbrais da Metafísica, já que, como vimos, a
Metafísica, que estuda o ente enquanto ente, tem de estudar ao Ente máximo
enquanto causa do ente, a Deus. Isso que chamamos Deus. É perfeita a sua
conclusão. Eu recomendo efusivamente que se leia o livro dele, embora,
sobretudo no capítulo final, ele não me convença. Mas o passo que ele deu foi
gigantesco. O que é que ele está descobrindo? A noção de todo substancial. O
que o darwinismo não sabe é que, num todo substancial, como é o ser vivo,
como é o ente vivente, a parte não funciona sem o todo, e em ordem ao todo e
segundo certa potência porque, com efeito, algo não se torna outro algo em ato
se não tiver potência para este ato. É impossível, como veremos nos Princípios
da Natureza. Foi isso que ele descobriu. Ele chegou a isso sem ser um filósofo.
Embora goste de Aristóteles, e tal, mas não tem perfeito domínio do que diz
Aristóteles. Chega a isso cientificamente. Chegou aos umbrais da Física Geral e
da Metafísica. É ali que ele chegou.

Mas há mais. Podemos ainda provar, ainda no campo da experiência


científica. É a questão mesma dos híbridos. Vejam, os evolucionistas
descobriram um dia que havia híbridos, como o mulo e a mula, que já haviam há
muito tempo, por cruzamento natural, que gerava híbridos. Híbridos estéreis.
Mas, ainda assim, lançaram-se eles, e continuam a lançar-se, com grande afã,
a gerar rebentos, filhotes de espécies distintas. Muito bem. Já fizeram o ligre, ou
o inverso, ou seja, tigre com leão ou leão com tigre, tigresa com leão. Já fizeram
cão com lobo. Saiu lá um bichinho! Camelo ou dromedário, não me lembro, com
lhama. Inúmeros passarinhos, fizeram híbridos. E outros. Assim, cavalo e burro
com zebra, saíram lá híbridos. Mas vejam, estamos no âmbito da discussão do
que são espécies. Lembram-se que, em alguma aula daquilo que eu chamei
núcleo duro do curso, falei eu da dificuldade de estabelecer An sit esta ou aquela
espécie, se existe esta ou aquela espécie, ou se se trata de espécie ou de meras
raças, ou se se trata de gêneros... lembram-se dessa dificuldade? Essa
dificuldade permanece, e não podemos resolvê-la aqui. Nem aqui, nem
Escola Tomista – Apenas para uso dos alunos Página | 14

facilmente. Isso é para biólogos altamente capacitados e formados pelo


tomismo. Mas algumas coisas se podem dizer e que negam frontalmente estas
mesmas experiências de que eles se gabam, os evolucionistas negam mais uma
vez o seu próprio evolucionismo.

Primeiro: este é um defeito da biologia e da zoologia como um todo. Falar


em subespécies é um paralogismo. Não existem subespécies. As espécies,
lembram? É o limite! A partir dali, só há diferenças acidentais. Raciais,
individuais, são diferenças acidentais. Assim como entre os humanos há os
negros, os brancos, os amarelos, os peles vermelhas: são diferenças acidentais.

Ou bem não existem essas subespécies, são raças. Ou bem isso que eles
chamam subespécie é a espécie, e o que está acima dele é um gênero próximo.
É só relembrar tudo o que dissemos no núcleo duro de nosso curso.

Mas há mais. Estes híbridos só são conseguidos entre – tomemos,


provisoriamente como espécies por espécies muito próximas. Ainda há que
discutir um pouco a noção mesma de espécie neste âmbito. A noção filosófica
de espécie está dada: é o limite a partir do qual só há diferenças acidentais. Mas
essas duas espécies que cruzam, são sempre espécies muito próximas. Cavalo
e zebra, burro e zebra, leão e tigre, jaguar e leão, camelo e lhama, camelo e
dromedário, passarinho canário com pardal, não tenho certeza, isso além das
plantas, eles também fazem híbridos de plantas. Eu reconheço que não sei tudo
sobre as plantas, mas as plantas, como estão num grau inferior, podem ter uma
volatilidade maior nesse sentido, até porque é muito difícil, no âmbito vegetal,
estabelecer as espécies. Muitíssimo difícil. Provavelmente o que se chama de
espécies e subespécies não passam de raças e diferenças acidentais. Mas
contentemo-nos com estes animais. Peixes. Peixes muito próximos.
Consequência disso é que eles dizem provar a evolução e que, inversamente, a
negam.

Primeiro: criam-se, em geral, monstros. Alguns peixes, por exemplo, não


têm boca para comer direito, a ponto de que cientistas da USP (ou seja, nada
suspeitos, nada suspeitos), provavelmente evolucionistas eles mesmos, tenham
dado o brado, o grito de alerta, contra o que deixaram escapar ao mar e aos rios,
estes monstros que gerarão o que eles chamam de um déficit biológico. Em que
sentido? Primeiro, porque não têm muitas condições, eles mesmos, de
sobrevivência. Dois, porque, se se trata de um macho híbrido e estéril, a fêmea
de um peixe liberará os ovos que não serão fertilizados, então haverá uma perda
biológica daqueles ovos. Mas, mais que isso. Em geral, os animais são – ou
tendem a ser anões ou tendem a um gigantismo desmesurado, a ponto de que,
os defensores dos direitos e das constituições dos animais proibissem, em vários
zoológicos da Europa, a procriação de ligres (leões com tigres), porque geravam
seres débeis com pouco tempo de vida, com alguma deformação. Mas, mais que
tudo isso, ainda. Nunca se passa da segunda geração de híbridos. Em que
Escola Tomista – Apenas para uso dos alunos Página | 15

sentido? Dois híbridos, no máximo, mas no máximo, em pouquíssimos casos,


geram até a segunda geração. Depois, anulam-se. E mesmo no cruzamento
vertical, de híbridos com não híbridos, tem um limite. Se não me engano,
segunda ou terceira geração. Depois para, limita-se, acaba. Será que não se vê
que esta é a prova de que nem no cruzamento entre espécies muito próximas
pode haver, na natureza, o evolucionismo? Isso para não falar que é impossível
tirar um híbrido de jacaré com galinha. Mas para não radicalizar, de ornitorrinco
com gato. Ou de um gato, uma pantera com uma lhama. É impossível. Não
pensem que não o tentaram! O tentaram, e abundantemente, freneticamente,
afanosamente, obcecadamente. Por quê? Porque têm que provar o seu dogma.
E esse dogma, que é antirreligioso, quanto ao que nos interessa neste curso, ele
é antifilosófico e é anticientífico. Espero ter podido dar aqui, minimamente, a
refutação dessa teoria que enferma o nosso ambiente científico e universitário.
É um dogma, e da pior espécie. É preciso abrir um parentesezinho para dizer:
se você crê em Deus, você aceita os dogmas oriundos dele porque o considera
a Autoridade supra-humana, supramundana, a Autoridade das autoridades. A fé
é um assentimento do intelecto movido por uma vontade informada pela graça a
aceitar o que decorre da Autoridade de autoridades. Se você não tem fé,
obviamente isto não vale, é o que eu acabo de dizer: é preciso ter fé e a moção
da fé e da graça para tal. Mas o que quero ressaltar é um curvar a cerviz a uma
Autoridade supramundana. Não só supra-humana como supramundana. E o que
se passa com o evolucionismo? O que se passa com respeito ao dogma
evolucionista? É curvar a cerviz para um homem. É mera fé humana e da pior,
porque fé humana nós temos, ao atravessarmos uma rua, com sinal verde para
nós, temos fé em que o carro não ultrapassará o sinal, não nos matará. Temos
fé. Quando fazemos algum acordo verbal com alguém, depositamos fé nele. Mas
nada disso implica o anticientífico e o antifilosófico. A fé depositada no dogma
da evolução segundo Darwin implica o anticientífico e o antifilosófico. E isto é
mantido por gerações e gerações de cientistas, por um número sucessivo e
amplo de Estados, por todos os Estados, isto é mantido como um dogma
universal. É lamentável, mas assim é.

Estudemos, no tempo que nos resta hoje, talvez tenha que ultrapassar um
pouquinho a medida hoje, os Princípios da Natureza. Vejam que este é o nome
de um Opúsculo de Santo Tomás, Os Princípios da Natureza. Já vimos, na aula
passada, as relações entre princípio, causa e elemento. Isto se verá ao longo
deste Opúsculo também, esta distinção. Vimos que toda causa pode dizer-se
princípio, mas que nem todo princípio é causa. Veremos uma aplicação, aqui,
disto. E veremos que todo elemento pode dizer-se causa, mas nem toda causa
é elemento. Isso já vimos.

Na impressionante carreira, na impressionante vida de nosso Santo


Tomás, produziu ele este admirável Opúsculo. Vejam que ele ainda era,
provavelmente, estudante. Diz a apresentação da Edição Leonina das obras de
Escola Tomista – Apenas para uso dos alunos Página | 16

Santo Tomás, que provavelmente ele fez isto como anotações para algum
colega, para ilustrar, para ajudar algum colega e, com efeito, a primeira palavra
do texto latino é “nota”, “tenha em conta”, “tenha em consideração”. É o que
primeiro se lê aí. Ele está ofertando esta obra a alguém. Ele vai comentar aqui,
não ao modo como ele fará nos Comentários, que já são obras da maturidade,
os Livros I e II da Física, de Aristóteles. Ele o fará segundo sua leitura dos árabes
(Averróis e Avicena), sobretudo da Metafísica de Averróis, mas também,
sobretudo segundo o que ele aprendeu com Boécio – ele era um jovenzinho, um
estudante – ele aprendeu com Boécio e seu professor, Santo Alberto Magno.
Uma das provas de que é bem inicial este Opúsculo é que se nota claramente
que ele usa a tradução da Física feita de segunda mão, ou seja, do grego para
o árabe e do árabe para o latim, ao passo que a obra, uma das obras seguintes,
ainda de juventude, o imenso Comentário às Sentenças de Pedro Lombardo, ele
já usa a tradição latina, direto do grego. Essa é uma das provas de quão inicial
é este Opúsculo na vida e na carreira de Santo Tomás. Tampouco vai ele discutir
o sujeito da Física, como nós fizemos nas últimas três aulas. Ele não vai discutir
isto. Ele vai centrar-se sobre o que se pode chamar de princípios intrínsecos e
extrínsecos, e mais profundamente, das causas. Das causas é que não
poderemos tratar aqui mais profundamente. Ele vai centrar-se nisso e, embora
seja produto de todas estas leituras, vai ele negar, já, a tese de Avicena, com
respeito à Física. Que dizia Avicena? Lembrem-se da nossa discussão do sujeito
da Física, dizia ele: a Física não tem sujeito próprio. Quem tem sujeito próprio é
a Metafísica. A Física serve, segundo a linguagem que usamos nas últimas
aulas, de base indutiva de fenômenos, de explicações de fenômenos, para a
verdadeira ciência, que seria a Metafísica. Nega-o rotundamente Averrois, e
segue nisso Santo Tomás a Averrois, a este mesmo que ele chamava, no início
de sua carreira, com grande admiração, O Comentador (de Aristóteles), para
depois, ao enfrentar-se os averroístas em torno da unidade do intelecto, dizê-lo
O Corruptor (da Doutrina de Aristóteles). Mas, então, receba ele essas fontes,
haure ele dessas diversas fontes, e, no entanto, já está ali, não Aristóteles, já
está ali Santo Tomás, já está ali a síntese tomista, é impressionante. Já
apontaram no Opúsculo certas... não imperfeições... certa desordem na
exposição. Não importa, era um jovem. E ele vai aprimorá-lo até o fim da vida,
até a sua obra-prima de ordem, que é a Suma Teológica. Ele vai aprimorando-o
pouco a pouco, isto é muito natural. Mas o que está dito na Suma Teológica está,
em 98% dito, já, e já como síntese, neste seu primeiríssimo Opúsculo, um dos
seus primeiríssimos opúsculos, que são os Princípios da Natureza. Tentemos
resumi-lo, sobretudo em sua primeira parte, porque penso em dar, ao final do
curso, uma orientação bibliográfica com muitas informações e estará aí este
Opúsculo como um elo de ligação entre os estudos iniciais seus, Lógicos, e a
Física. A Física de Aristóteles segundo o Comentário de Santo Tomás. Ou seja,
tudo muito introdutório ainda, mas segundo aquilo que eu considero justo no
estudo de Santo Tomás, helicoidalmente. Primeiras leituras lógicas, primeiras
Escola Tomista – Apenas para uso dos alunos Página | 17

leituras filosóficas, primeiras leituras metafísicas, volte-se para a lógica, e assim


sucessivamente.

Tentemos, então, dar os Princípios da Natureza segundo Aristóteles e,


mais precisamente ainda, segundo Santo Tomás, segundo essa divisão entre
princípios intrínsecos ausentes e princípios extrínsecos ausentes. Lembremos
ainda que ele não trata aqui de definir a natureza. Deixará para fazer isso no
Comentário à Física. Pois bem, tudo quanto há na natureza – e veja que estamos
cingidos ao mundo do ente móvel, ao mundo sensível, ao mundo corpóreo.
Estamos restritos a isto. Pois bem, tudo quanto é, tudo quanto existe, ou é em
ato, ou é em potência. Ou tem o ser em potência, ou tem o ser em ato. Tudo já
é algo, ou pode ser algo. Tudo quanto vemos tem essa mescla, de poder ser
algo e de já ser algo. Em outras palavras, de ser ou ente em potência, ou de ser
ente em ato. Mas há dois tipos de ser. Existe o ser substancial e existe o ser
acidental. Já vimos isso naquele nosso núcleo duro e podemos agora começar
a compreender a importância daquele núcleo duro, daquela exposição exaustiva,
cansativa, repetitiva de noções, conceitos e teses fundamentais. Há o ser
substancial e há o ser acidental, porque há o ser potencial para ser ser
substancial e há o ser acidental para ser ser acidental. Há o ser em potência
para ser um ser em ato acidental. Expliquemos tudo isto.

O homem tem ser substancial, é um ente com ser substancial. Já vimos


isto. E o esperma humano, do macho humano, e o sangue menstrual feminino
(era assim que eles consideravam que se gerava o embrião, da mescla de
sêmen com sangue menstrual, mas substituamo-lo para o óvulo feminino), eles
têm potência, como dito nesta mesma aula, para gerar o homem, e este homem
tem ser substancial. Este homem já gerado, por sua vez, tem potência para ser
branco. E a brancura tem ser acidental. Por quê? Porque se dá no sujeito que é
a substância, que tem ser substancial, ou seja, no nosso caso, o homem.

De maneira geral e prévia, tudo quanto tem potência para ser algo em ato,
todo ser em potência, para nos ser em ato, pode chamar-se matéria. Isto, em
primeira instância; numa primeira aproximação, tudo é matéria. E tudo quanto dá
o ato, o que faz ser esta matéria algo em ato é forma, pode dizer-se forma.
Temos aí o primeiro par ontológico. Matéria e forma. Neste sentido, tanto o
esperma e o óvulo feminino, em combinação, são matéria para o homem, que
tem forma substancial. Mas também o homem é matéria para ser branco, está
em potência (matéria é tudo quanto está em potência) para ser branco, e a
brancura é uma forma. É uma atualidade daquela potência, daquele ser em
potência que estava no homem: o homem tem potência para ser branco, e a
brancura é uma forma acidental. A primeira forma, aquilo que faz o homem ser
homem em ato se chama forma substancial. E a brancura, uma forma acidental.

Mas, numa segunda aproximação, isso que indistintamente chamamos,


num primeiro momento, matéria, pode subdividir-se: o esperma humano, junto
Escola Tomista – Apenas para uso dos alunos Página | 18

com o óvulo humano, são matéria propriamente dita, ex qua, da qual se parte
para chegar à atualidade, ao ente ato que dá a forma substancial humana, dado
pela forma substancial humana, ex qua, de que, de que se parte. Mas aquilo que
também chamamos matéria, ou seja, o homem, que tem potência para a forma
da brancura para ser branco em ato, já não se trata de uma matéria ex qua, mas
sim de uma matéria in qua, na qual, se lembram disso? O acidente é aquilo que
se dá no sujeito, por isso, na substância. Por isso, propriamente, isto que, num
primeiro momento chamamos matéria, agora havemos de chamar sujeito. Está
entendido? Propriamente falando, matéria é aquilo de que se parte, ex qua, para
haver um ser em ato dado pela forma substancial, ou seja, é a própria
constituição da substância (homem, tigre, laranjeira, pedra, madeira, um pedaço
de madeira, árvore), ao passo que os acidentes são in qua, ou seja, as formas
acidentais (tomemos o homem ainda, o branco, o preto, o amarelo, o vermelho)
são in qua e, neste sentido, é preferível chamar, então, no nosso exemplo, o
esperma e o óvulo humano matéria propriamente dita, e chamar o homem, com
respeito à brancura, à negrura ou amarelo, sujeito. Temos, assim, matéria e
sujeito. Mas, de maneira geral, tudo aquilo que está em potência para o ser pode
dizer-se matéria, e tudo aquilo de que se recebe o ser, pode dizer-se ato. A
fórmula aristotélica, repetida sempre por Santo Tomás, Forma dat esse, a forma
é que dá o ser. E a forma, como já vimos, pode dá-lo duplamente: ou dar o ser
substancial – a alma, no homem, por exemplo – ou dar o ser acidental – a
brancura no homem. O esperma e o óvulo humanos estão em potência para
receber da alma humana sua forma substancial. A alma humana é a forma
humana e dá ao ser humano aquilo que estava em potência para ser humano, o
esperma e o óvulo. Mas a brancura dá uma forma acidental ao homem.

Se tudo quanto se pode dizer matéria é ser em potência, tudo de que se


recebe o ser, ou seja, a forma, pode dizer-se ato. Muito bem. Isto está
compreendido? É o pilar da doutrina de Aristóteles e, no campo filosófico, o da
doutrina tomista. Mas, atenção! Não é como o queria Manser O. P., como já
vimos várias vezes, não é a essência do tomismo. É seu pilar! No campo daquilo
que se pode alcançar, é o pilar. Pilar não quer dizer essência. Já vimos que a
essência do tomismo é a doutrina do Esse enquanto atualidade de todos os atos
e da distinção entre esse, ser por essência e ser por participação. Veremos isso
mais adiante, na Metafísica.

Lembram-se, agora, de que, ao falar dos pares de movimentos, das


espécies de movimento, o primeiro par era o da geração e corrupção? Viram?
Pois bem. Há dois tipos de geração e corrupção. Há a geração e corrupção
substancial e há a geração e corrupção acidental. A primeira se chama geração
per se, essencial. A segunda, geração per accidens, acidental. Toda geração é
um ir do não-ser ou não-ente a dado ser ou ente. E o que é a corrupção? É o
inverso: é o ir de dado ente ou ser para um não-ser ou não-ente. É o inverso. A
corrupção é o inverso da geração.
Escola Tomista – Apenas para uso dos alunos Página | 19

Mas não se dá a geração desordenadamente. Não se gera algo de outro


algo universalmente. Se não que só há geração, repita-se, repita-se, daquilo que
tem potência para algo. Só se gera algo a partir de um ente ou de um ser em
potência, se este ser em potência tiver efetivamente potência para ser algo. Por
exemplo, a água, como já dissemos, não tem potência para tornar-se uma
estátua. Já o tem o cobre, o bronze, melhor dizendo. O bronze tem potência para
estátua. A água não tem. Logo, a geração e sua correlativa corrupção não
podem dar-se universalmente indiferentemente. A geração só se dá de um ente
em potência para algo, e deste ente para este algo. E a corrupção só se dá ao
inverso, deste ente que é algo para um não-algo, para um não-ente, para um
não-este-ente. Mas já que falamos em bronze, sigamos o exemplo da estátua, o
caso da estátua. Pode-se ver, na relação entre o ente em potência, que é o
bronze, e o ente em ato, que é a estátua, somente isto, somente estes dois
princípios? Não. Havemos de ver três princípios: o primeiro princípio é que o
bronze está em potência para ser estátua, ele tem potência para ser estátua. E
podemos ver o segundo: ele tem potência para ser estátua, e é a figura da
estátua o que faz, aqui, as vezes da forma. Ou seja, o que dá a forma de estátua
é a figura da estátua impressa pelo escultor naquele ente em potência, naquela
matéria que se chama bronze. (Como a escultura é uma espécie de linguagem
e, portanto, tem significado, em verdade, em verdade, só se pode dizer que a
figura da estátua é sua forma se se considera o lado apenas da arte escultórica,
apenas seu lado fabril. Se lembram da diferença entre artes fabris e artes
liberais, entre artes servis e artes liberais? Só enquanto se observa, se mira seu
aspecto fabril, é que se pode dizer que a figura é sua forma. Num estudo mais
aprofundado das chamadas artes do belo, haverá que considerar a forma o
significado desta estátua). Não podemos aprofundá-lo aqui.

Consideremos que a forma, agora, está do lado da figura da estátua, é o


que dá o ser à estátua, que partiu do ente em potência bronze para ser estátua.
Só estes dois princípios bastam? Não. Há um terceiro no meio. É a privação.
Então temos matéria, potência, privação e ato. Matéria, privação e forma. Vejam,
o que é a privação neste exemplo que estamos tratando? O bronze, que é um
ente em potência, é uma matéria para o ente em ato que é a estátua, a forma,
ele, no entanto, não está configurado, ainda, como estátua. Vocês não hão de
concordar que o mesmo pedaço de bronze pode, aliás, ser outra coisa que uma
estátua? Então ele teria potência para várias coisas. Mas ainda não está
configurado nem para esta outra coisa, nem para estátua. Está, pois, privado da
forma de estátua. Então, temos já o terceiro princípio: a privação. A privação é o
terceiro princípio. Mas vejam, estamos usando com o bronze e a estátua um
exemplo de forma acidental. Já sabemos que forma substancial a tem o bronze,
lembram-se? Tem quididade os artefatos humanos? Não, não têm senão na
mente do artífice e na do usuário que o vai consumir. Tem forma? Tem forma.
Mas é uma forma acidental. Forma substancial a tem o bronze, que tem matéria
e forma. Tem aquilo em que é feito, aquilo de que se parte para ser feito, e aquilo
Escola Tomista – Apenas para uso dos alunos Página | 20

em razão do qual tem o ser bronze. É a matéria e a forma. Elas estão presentes
no bronze. E isto é a forma substancial. A forma estátua é acidental a isto que já
é um todo substancial, um composto substancial.

Então, demos o exemplo, ainda, do sêmen, do esperma e do óvulo


humano. Eles são ente ou ser em potência para ser humano, o ser humano é
dado pela forma, que é ato, e que, por isso mesmo, faz com que aquilo que está
em potência esteja em ato, forma dat esse, a forma dá o ser, mas há o terceiro
elemento, que é a privação. O esperma, o sêmen e o óvulo humanos ainda não
estão informados pela forma, ainda não receberam, ainda não estão
configurados, ainda não estão informados, melhor dizendo (configurado vale
mais para a estátua, que é uma forma acidental), pela forma, ou seja, a alma
humana, que dá o ser humano aquele ente em potência, que é o esperma e o
óvulo humano, que estão em potência para ser homem. E, enquanto estão em
potência, também estão privados da devida forma humana. Esses são três
princípios que andam juntos. Mas sempre? Não, não. Claro que a matéria e a
privação se dão no sujeito, e assim como a forma. É claro que o ente em
potência, o que está privado da informação ou da configuração, e o ente em ato
se dão no próprio ente, é óbvio. Mas vejam, assim que recebe o ser da forma,
assim que a matéria ou o ente em potência para homem recebem o ser homem
de sua alma ou forma, que é a que está em ato e que dá o ato àquela matéria,
desaparece o princípio privação, entendem? A matéria... no homem está a
matéria e está a forma. E a privação? Já se foi. A privação é prévia a que a forma
dê o ser ao ente. Então, conquanto sejam três os princípios, no ente já formado,
em ato, que já recebeu o ser da forma (que também se pode chamar ato),
desaparece o elemento privação. Ademais, não se diz privação
indiferentemente. Por exemplo: o embrião humano, assim que se constitui, ele
está privado de algo. Da visão. Não é verdade? Ele ainda não vê. E isto é
privação. Mas pode dizer-se que a pedra está privada de visão? Não. Porque só
está privado de algo aquele ente em potência que tem potência para ter, para
possuir este algo. Está claro? Pode dizer-se da pedra que ela tem privação de
visão ou privação de ser humano? Impossível. Ela não tem potência para essas
coisas. Logo, trata-se de privação quando se trata de algo, de uma privação, de
uma ausência ainda, de algo que certo ente em potência tem potência para ter
ou para ser. No outro caso, trata-se de uma simples negação. A pedra não vê,
não pode ter visão. Isso é uma simples negação. Agora, que o embrião humano,
assim que se forma, ainda não veja, é uma privação. Que o conjunto, ou
separadamente, de esperma e óvulo humano ainda não tenham a forma humana
é uma privação, porquê? Porque eles têm potência para ter a forma humana,
para receber o ser humano da forma, para ter o ato de ser humano, mediante o
ato que é a mesma forma. São distinções importantíssimas. Mas igualmente
importante e muitíssimo mais difícil de explicar é a matéria-prima. Vejam. Até
agora vimos matéria em vários sentidos. E vimos que, por exemplo, no bronze,
há matéria e forma. Vimos que no homem há matéria e forma. Vimos que na
Escola Tomista – Apenas para uso dos alunos Página | 21

grama há matéria e forma. Vimos que na árvore há matéria e forma. No peixe,


na pedra, há matéria e forma. É o composto de matéria e forma. Pois bem. Mas
há algo anterior a esta matéria destes compostos. É a aptidão universal a ter
toda e qualquer forma, a ter esta ou aquela forma. A ter aquela outra forma, ou
est’outra. Ter qualquer forma. Vejam que, até agora dissemos o quê? Que a
matéria, enquanto ente em potência, não é indiferente. Algumas têm potência
para certas coisas e outras para outras coisas e não para aquelas. Mas agora,
não. Se trata de um princípio anterior, que é a matéria-prima. Aquela que é
potencial para todas as formas. Vejam, vai dizer Santo Tomás, anotar Santo
Tomás, no Comentário à Física, que ela também é criada de nada. Mas já é
criada com múltiplas formas. Não se há de entende-la como Rodin nos mostra
em sua bela escultura, A Mão de Deus, em que na palma da mão de Deus está
algo que é parte matéria-prima, parte já informado pela forma. Esta é uma visão
artística. Mas tampouco se considere o primeiro versículo do Gênesis, “e a terra
era caos e confusão”, como querendo dizer que a terra era a matéria-prima ainda
sem forma. Se o fosse, não seria a terra. Ela já tinha forma de terra. Ela era
confusão e caos enquanto estava em potência para as coisas que iriam povoá-
la, incluindo a vida. Mas tampouco é a matéria-prima no sentido platônico. Para
Platão, a matéria-prima em si, sem forma nenhuma, é eterna, tão eterna como
as ideias do Hiperurânio. Estava equivocado. Estava duplamente equivocado:
que a matéria prima fosse eterna e que pudesse dar-se sem forma alguma.
Aristóteles incorrerá no erro de Platão, manterá o erro de Platão quanto à
eternidade por si, isto se explicará no apêndice – se se contradiz Santo Tomás,
ao dizer que não repugna à razão a eternidade do mundo, ou seja, não nega a
eternidade por si da matéria, mas diz que ela não se dá de modo algum sem
alguma forma, e nisto, corrige pela metade, pela parte mais importante, do
ângulo filosófico corrige a seu mestre Platão. Não, não se trata disto. Se trata de
um princípio universal, ele é real. Sem este princípio real, não seria possível as
coisas que nós vemos no mundo sensível. Não seria possível. Pois bem. Se se
entendeu bem, já vamos entende-lo melhor, que este é um princípio potencial
para toda e qualquer forma, e não aquele ente em potência, veja, o ente em
potência é um grau ontológico acima. Aqui é pura potência, ali já é algo, já é um
ente em potência para algum ser. Dizia Aristóteles que a matéria-prima é
incognoscível. Sim, mas há que se dizer que é possível conhecê-la a partir do
momento em que, vendo tudo informado, se conclui que é preciso haver um
princípio universal que seja potencial para toda e qualquer forma. Se se
entendeu isso, e já se vai entender, creio, um pouquinho melhor, diga-se desde
já: a matéria prima e as formas nem se geram, nem se corrompem. Conquanto
se criem, e conquanto se criem juntas. Se a matéria prima se gerasse, era
preciso que ela se gerasse a partir de algo, de outra matéria, que seria a prima.
Mas se a matéria-prima fosse gerada, esta matéria-prima requereria outra
matéria-prima de que se partisse para ser matéria-prima. O mesmo se diga das
formas. Se a forma propriamente se gerasse, necessitaria de outra forma que
lhe fosse anterior, que aí funcionaria um pouquinho ao modo de matéria, e tudo
Escola Tomista – Apenas para uso dos alunos Página | 22

isto ao infinito, nos dois casos. E o mesmo se diga do inverso, da corrupção.


Porque se é impossível a geração, impossível será seu correlativo, a corrupção.
Na verdade, o que se gera e se corrompe é o composto. Composto de quê? De
forma e matéria segunda. O que é a matéria segunda? É a matéria-prima já
informada. Então, quando se falava daquele ente em potência para a forma, se
falava de matéria já informada. Se pressupunha uma matéria já informada. Isto
é importante! A matéria-prima como princípio universal para toda e qualquer
forma, e que não se gera nem se corrompe, assim como a mesma forma, sob
pena de irmos ao infinito, o que não é fazer ciência. Ir ao infinito na série de
causas é anticientífico e impede o próprio conhecimento, impede o próprio saber.
Não signifique isso, não se entenda mal, que não haja o infinito. Há o em ato e
há o em potência. Não é disso que se está falando. Se está falando na série de
causas que vão ao infinito. Veja. Se a forma se gerasse, e como ela é aquilo de
que se recebe o ser, seria preciso ter uma forma anterior de que ela recebesse
seu ser, e assim ao infinito. Então vejam, pelos dois ângulos é impossível tanto
a geração quanto a corrupção. Nem a matéria-prima se corrompe nem se gera,
nem se gera nem se corrompem as formas. O que se corrompe e se gera, o que
se gera e se corrompe é o composto, e neste composto, a forma sim, matéria
segunda, já informada. Não podemos conhecer - e nesse sentido é que deve
valer a afirmação de Aristóteles, da incognoscibilidade da matéria-prima - não
se pode conhecer sem formas, sem nenhuma forma, conquanto se possa
conhecer, enquanto se conclui da multiplicidade de formas, que há um princípio
universal potencial. Veem a que grau é preciso, na nossa marcha filosófica,
elevar-se conceptualmente da imagem sensível? A noção de matéria-prima não
corresponde, não pode ser representada nem impropriamente, nem muito
impropriamente por nenhuma imagem sensível. Estamos no ápice, digamos
assim, de nossa impossibilidade de valer-nos do sensível para concebê-la. Pois
bem, dentro dos limites que nos são dados aqui, espero ter tratado
razoavelmente os princípios intrínsecos. Mas vejam: estes princípios intrínsecos
reduzem-se a dois: a matéria e a forma. Já vimos que a privação só perdura
antes de que a coisa se faça. Só perdura até aí. Depois, desaparece. A matéria-
prima é sempre segunda, ou seja, o que há nos entes sensíveis, nos entes
móveis que nos é dado estudar na Física, existem dois princípios: o material e o
formal. A matéria e a forma. Matéria segunda, mas a matéria e a forma. Ora,
como já visto em alguma aula, já não recordo qual, a matéria se reduz à causa
material e a forma à causa formal. A matéria se reduz à causa material e a forma
à causa formal, que são duas das quatro causas que descobriu Aristóteles, que
são quatro e somente quatro, nem mais nem menos, contra todas as tendências
científico-filosóficas modernas que, negando este número perfeito de causas,
acaba por incorrer em paralogismos e em becos-sem-saída intelectuais.

Mas também já vimos em alguma aula, creio que na Introdução à Física,


que são a causa eficiente e a causa final as que dão maxime, maximamente, o
ser e o fazer-se aos entes. O ser e o fazer-se, conquanto seja a forma que dá o
Escola Tomista – Apenas para uso dos alunos Página | 23

ser, já o vimos, forma dat esse, maxime, maximamente, o que dá o ser e o fazer-
se aos entes, são estas duas causas, a causa eficiente e a causa final, que são
causas o que? Extrínsecas. Aquelas duas primeiras, a causa material e a causa
formal são causas intrínsecas. Estas duas, a eficiente e a final, são causas
extrínsecas. Lembremo-nos sempre que as demais causas que vocês lerem em
Santo Tomás, causa ocasional, causa instrumental, causa meritória, se
reduzem, de alguma maneira a esta ou àquela das quatro causas aristotélicas.

Entendido tudo isso passa nosso Santo Tomás, em seu belíssimo e jovem
opúsculo, a tratar das causas, cada uma de per si, e em sua múltipla relação em
ordem aos entes da natureza, em ordem à natureza. Isto já não podemos tratar
aqui, já não temos tempo. É preciso passar para a Introdução à Metafísica,
capítulo importantíssimo de nosso curso, como que seu ápice, e ápice tão belo
que emociona, mas o que se deu aqui já parece suficiente, assim como o que se
deu de Lógica já me parece suficiente para ler alguns livros lógicos, o que já se
deu aqui me parece suficiente para que leiam este mesmo opúsculo Os
Princípios da Natureza. Recomendo que não se leia agora, ok? Deixem para o
final do curso. Segundo uma bibliografia orientada, explicada, comentada, em
que se apontará – cada dia mais amadureço a ideia – em que se apontarão os
erros de tradução comuns, porque nem todos de vocês podem ler em latim ainda,
ou nunca o lerão. Como já disse, é importantíssimo saber latim, mas não é
essencial. Era importantíssimo saber o grego na época de Santo Tomás e na
época de Santo Agostinho, mas nenhum dos dois sabia o grego. Conheceu
Santo Tomás a Aristóteles por traduções, primeiras, ao latim, de segunda mão,
vindas do árabe, e depois em tradução direta pelo seu irmão de religião, Frei
Murbeck, conheceu sempre por traduções ao principal filósofo, ao que mais
contribui para constituir o arcabouço, o edifício de sua síntese. Embora
fundamental, tomara todos pudessem saber latim, mas ainda que não o possam
por dificuldades da vida, por falta de tempo, por qualquer razão que seja, é
possível ler as traduções, as melhores traduções que indicarei das obras de
Santo Tomás, mas com as observações respeitantes a estas traduções que farei.
Então, sugiro, é uma sugestão, não posso mais que isso, que não se leiam
agora, mas ao final, dando-me tempo para que amadureça o conjunto dessa
bibliografia, dessa leitura orientada.

Terminamos, hoje, então, esta segunda Introdução à Física, belíssima,


mas que prepara como um estribo, como um escalão, como degrau, a beleza da
sabedoria humana primeira, que é a Metafísica. Até a próxima aula!

Você também pode gostar