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Este foi um discurso feito perante o Unitarian

Ministers' Institute, em outubro de 1890. Ele foi reproduzido


no volume 7, número 15, do jornal Liberty, de 15 de
novembro de 189

Senhoras e Senhores,

Presumivelmente, a honra que me foi concedida


pelo convite para falar a vocês sobre "A relação do
estado com o indivíduo" se deve principalmente
ao fato de que as circunstâncias me tornaram um
expoente um tanto notável da teoria do Moderno
Anarquismo — uma teoria que começa a ser
considerada como uma das poucas sustentáveis
como base da vida política e social. Em seu nome,
então, eu discutirei esta questão, a qual é a base
ou tem conexão próxima com quase todos os
problemas práticos com que esta geração se
depara. O futuro das tarifas, dos impostos, das
finanças, da propriedade, da mulher, do
casamento, da família, do sufrágio, da educação,
das invenções, da literatura, da ciência, das artes,
dos hábitos pessoais, do caráter privado, da ética
e da religião será determinado pela conclusão à
qual a humanidade chegar quanto à questão de
quanta fidelidade o indivíduo deve ao Estado.

O Anarquismo, ao lidar com a questão,


considerou necessário, primeiramente, definir
seus termos. As concepções populares da
terminologia política são incompatíveis com a
exatidão rigorosa requerida pela investigação
científica. A propósito disso, um afastamento do
uso popular da linguagem é acompanhado pelo
risco da falta de compreensão pela maioria, que
ignora persistentemente as novas definições; mas,
por outro lado, a conformidade a ela carrega
consigo a alternativa ainda mais deplorável da
confusão aos olhos dos competentes, que teriam
justificação ao atribuir inexatidão de pensamento
onde há inexatidão de expressão. Tome-se o
termo "Estado", por exemplo, com o qual hoje
estamos especialmente preocupados. É uma
palavra que está em todos os lábios. Mas quantos
daqueles que a utilizam têm qualquer idéia do
que querem dizer ao empregá-la? E, dos poucos
que têm, quão variadas são suas concepções! Nós
designamos pelo termo "Estado" instituições que
incorporam o absolutismo em sua forma extrema
e instituições que o temperam com uma certa
liberalidade. Nós aplicamos igualmente a palavra
a instituições que não fazem nada além de
agredir e a instituições que, além de agredir,
exercem em certa medida as funções de proteção
e defesa. Mas qual seria a função essencial do
Estado, agressão ou defesa, poucos parecem saber
ou se importar. Alguns defensores do Estado
evidentemente consideram a agressão o seu
princípio, embora a encubram de si mesmos e do
povo sob o termo "administração", que eles
parecem desejar estender em todas as direções
possíveis. Outros, pelo contrário, consideram a
defesa seu princípio, e desejam limitá-la à
execução de certos serviços policiais apropriados.
Outros ainda parecem pensar que ele existe tanto
para a agressão quanto para a defesa, combinadas
em variadas proporções de acordo com os
interesses temporários ou com os caprichos
daqueles que o controlam em determinado
momento. Defrontados com essas diversas visões,
os Anarquistas, cuja missão no mundo é a
abolição da agressão e de todos os males que dela
resultam, perceberam que, para serem
compreendidos, eles precisavam atribuir algum
significado definido e reconhecido aos termos
que eram obrigados a empregar, e especialmente
às palavras "Estado" e "governo". Buscando,
então, os elementos comuns a todas as
instituições às quais o nome "Estado" foi
aplicado, eles encontraram dois: primeiro, a
agressão; segundo, a presunção de autoridade
única sobre uma dada área e sobre todos dentro
dela, exercida geralmente para o propósito duplo
de uma maior opressão sobre aqueles que lhe são
sujeitos e da expansão de suas fronteiras. Que
este segundo elemento seja comum a todos os
Estados, penso eu, não se negará — ao menos, eu
não tenho conhecimento de qualquer Estado que
tenha tolerado um Estado rival dentro de suas
fronteiras; e parece claro que qualquer Estado
que fizesse isso deixaria assim de ser um Estado e
de ser considerado como tal por qualquer um. O
exercício da autoridade sobre a mesma área por
dois Estados é uma contradição. Que o primeiro
elemento, agressão, tenha sido e seja comum a
todos os Estados é admitido de forma menos
generalizada, provavelmente. Entretanto, eu não
tentarei reforçar aqui a conclusão de Spencer, a
qual ganha maior aceitação diariamente, de que o
Estado tenha tido sua origem na agressão, e que
tenha continuado como uma instituição agressiva
a partir de seu nascimento. A defesa não era
originalmente um elemento do Estado, tendo
vindo a ser exercida pela necessidade; sua
introdução como uma função estatal, embora
efetivada sem dúvidas com o objetivo de
fortalecer o Estado, em verdade foi o princípio de
sua destruição. Seu crescimento em importância
não é senão uma evidência da tendência do
progresso em direção à abolição do Estado.
Tomando esta visão da questão, os Anarquistas
afirmam que a defesa não é essencial ao Estado,
mas que a agressão é. Agora, o que é agressão?
Agressão é simplesmente um outro nome para o
governo. Agressão, invasão e governo são termos
intercambiáveis. A essência do governo é o
controle, ou a tentativa de controle. Aquele que
tenta controlar outro é um governante, um
agressor, um invasor, e a natureza de tal invasão
não é modificada se ela for perpetrada por um
homem sobre outro homem, à maneira de um
criminoso comum, ou por um homem sobre
todos os outros homens, à maneira de um
monarca absoluto, ou por todos os outros
homens sobre um homem, à maneira da
democracia moderna. Por outro lado, aquele que
resiste à tentativa de outro homem de controlar
não é um agressor, um invasor, um governante,
mas simplesmente um defensor, um protetor; e a
natureza de tal resistência não é modificada se
ela for oferecida por um homem a outro homem,
como quando um homem repele o ataque
violento de outro, por um homem a todos os
outros homens, como quando um homem se
recusa a obedecer a uma lei opressiva, ou por
todos os homens a um homem, como quando um
povo submisso se insurge contra um déspota, ou
como quando os membros de uma comunidade
voluntariamente se unem para deter um
criminoso. Esta distinção entre invasão e
resistência, entre governo e defesa, é vital. Sem
ela, não é possível existir uma filosofia política
válida. A partir desta distinção e das outras
considerações já mencionadas, os Anarquistas
formam as definições desejadas. Esta, portanto, é
a definição Anarquista do governo: a sujeição de
um indivíduo não-invasivo a uma vontade
externa. E esta é a definição Anarquista do
Estado: a incorporação do princípio da invasão
em um indivíduo, ou em um bando de
indivíduos, que presumem agir como
representantes ou mestres de todo o povo dentro
de uma determinada área. Em relação ao
significado do termo restante do assunto em
discussão, a palavra "indivíduo", eu penso que há
pouca dificuldade. Deixando de lado as sutilezas
metafísicas defendidas por alguns, pode-se usar
esta palavra sem riscos de má compreensão. Se as
definições a que chegamos são geralmente
aceitáveis ou não é uma questão de menor
importância. Eu afirmo que elas foram alcançadas
cientificamente e que se servem ao propósito da
clara expressão do pensamento. Os Anarquistas,
tendo tomado o devido cuidado para serem
explícitos, têm justificação para ter suas idéias
julgadas de acordo com estas definições.

Agora vamos à questão propriamente: Que


relações deveriam existir entre o Estado e o
Indivíduo. O método usual de determinação
destas questões é o de aplicar alguma teoria ética
com base numa obrigatoriedade moral. Neste
método os Anarquistas não têm confiança. A
idéia de obrigatoriedade moral, de direitos e
deveres inerentes, é totalmente descartada por
eles. Eles consideram todas as obrigações não
como morais, mas como sociais, e mesmo assim
não são de fato obrigações, a não ser que tenham
sido assumidas consciente e voluntariamente. Se
um homem faz um acordo com outros homens,
estes podem combinar-se para compeli-lo a
cumprir seu acordo; mas, na ausência de tal
acordo, nenhum homem, pelo que sabem os
Anarquistas, fez qualquer acordo com Deus ou
com qualquer outro poder de qualquer ordem.
Os Anarquistas não são apenas utilitaristas, mas
egoístas no sentido mais completo. Em relação a
direitos inerentes, o poder é sua única medida.
Qualquer homem, atendendo pelo nome de Bill
Sykes ou de Alexander Romanoff, e qualquer
conjunto de homens, sendo os corruptos chineses
ou o Congresso dos Estados Unidos, tem o
direito, se tiver o poder, de matar, coagir os
outros homens ou tornar o resto do Mundo
subserviente a seus fins. O direito da sociedade
de escravizar o indivíduo e o direito do indivíduo
de escravizar a sociedade são desiguais apenas
porque seus poderes são desiguais. Sendo esta
posição subversiva de todos os sistemas de
religião e moralidade, é claro que eu não posso
pretender ganhar aquiescência imediata da
audiência à qual eu falo hoje; o tempo à minha
disposição também não permite que eu a
sustente por um exame elaborado, ou mesmo
resumido, dos fundamentos da ética. Aqueles que
desejam adquirir uma maior familiaridade com
este assunto deveriam ler um profundo trabalho
alemão, Der Einzige und sein Eigenthum, escrito
anos atrás por um autor relativamente
desconhecido, o Dr. Caspar Schmidit, cujo
pseudônimo era Max Stirner. Lido apenas por
alguns poucos acadêmicos, o livro foi enterrado
pela obscuridade, mas está destinado a uma
ressurreição que, talvez, venha a marcar uma
época.

Se esta fosse, então, uma questão de direito, ela


seria, de acordo com os Anarquistas, puramente
uma questão de poder. Mas, felizmente, não é
uma questão de direito: é uma questão de
conveniência, de conhecimento, de ciência; a
ciência de viver em conjunto, a ciência da
sociedade. A história da humanidade tem sido em
geral uma longa e gradual descoberta do fato de
que o indivíduo é quem mais lucra com a
sociedade pela exata proporção em que a
sociedade é livre, e da lei de que uma condição
para uma permanente e harmoniosa sociedade é
a maior quantidade de liberdade individual
compatível com a igualdade de liberdade. O
homem médio de cada nova geração tem dito a
seu predecessor: "Meu vizinho não é meu
inimigo, mas meu amigo, e eu sou seu amigo
igualmente, se ambos reconhecermos
mutuamente o fato. Nós nos auxiliamos para que
desfrutemos de uma vida melhor, mais completa
e mais feliz; e este auxílio seria bastante
aumentado se nós deixássemos de restringir,
limitar e oprimir uns os outros. Por que não
podemos concordar em deixar cada um viver sua
própria vida, sem que nenhum de nós transgrida
o limite que separa nossas individualidades?" É
por este raciocínio que a humanidade está se
aproximando de um verdadeiro contrato social,
que não é, como pensava Rousseau, a origem da
sociedade, mas, em vez disso, o resultado de uma
longa experiência social, o fruto de suas loucuras
e desastres. É óbvio que este contrato, esta lei
social, desenvolvida à sua perfeição, exclui toda
agressão, toda violação da igualdade da liberdade,
toda invasão de todo tipo. Ao considerarmos este
contrato com a definição Anarquista do Estado
como a incorporação do princípio da invasão,
vemos que o Estado é antagônico à sociedade; e,
sendo a sociedade essencial à vida e ao
desenvolvimento individual, a conclusão que
salta aos olhos é que a relação do Estado para
com o indivíduo e do indivíduo para com o
Estado deve ser de hostilidade, a qual persistirá
até que o Estado desapareça.

"Mas", perguntar-se-á aos Anarquistas neste


ponto do argumento, "o que será feito com
aqueles indivíduos que indubitavelmente
continuarão a violar a lei social invadindo seus
vizinhos?" Os Anarquistas respondem que a
abolição do Estado deixaria em existência uma
associação defensiva, não compulsória, mas
voluntária, que impediria os invasores por
quaisquer meios que fossem necessários. "Mas
isso é o que temos agora", seria a resposta. "O que
você realmente quer, então, é apenas uma
mudança de nomes?" Não tão rápido, por favor.
Poderia sobriamente pretender por um momento
que o Estado, mesmo na sua forma pela qual ele
existe na América, é uma instituição puramente
defensiva? Certamente não, a não ser aqueles que
observam o Estado apenas em sua manifestação
mais palpável: o policial da esquina. E não seria
necessário observá-lo muito de perto para ver o
erro desta impressão. Pois o primeiro ato do
Estado, a coleção compulsória de impostos, é ele
próprio um ato de agressão, uma violação da
igual liberdade e, dessa forma, inicia todos os
atos subseqüentes, mesmo aqueles atos
puramente defensivos que seriam financiados por
um tesouro abastecido somente por
contribuições voluntárias. Como é possível
sancionar, sob a lei da igual liberdade, o confisco
das riquezas de um homem para financiar uma
proteção que ele não procurou e que não deseja?
E, se isto é um ultraje, que nome deveríamos dar
a esse confisco quando à vítima é dado, em vez de
pão, uma pedra, em vez de proteção, opressão?
Forçar um homem a pagar pela violação de sua
própria liberdade é de fato uma adição de insulto
à injúria. Mas isso é exatamente o que o Estado
faz. Leia o "Registro do Congresso"; siga os
procedimentos das legislaturas do Estado;
examine os livros-estatuto; teste cada ato
separadamente pela lei da igual liberdade e você
verá que cerca de nove nonos da legislação
existente serve, não para executar a lei social
fundamental, mas para ditar os hábitos pessoais
ou, ainda pior, para criar e sustentar monopólios
comerciais, industriais, financeiros e
proprietários, que privam o trabalho de grande
parte do pagamento que receberia num mercado
perfeitamente livre. "Ser governado", diz
Proudhon, "significa ser observado, inspecionado,
espionado, dirigido, legislado, regulamentado,
cercado, doutrinado, admoestado, controlado,
avaliado, censurado, comandado; e por criaturas
que para isso não tem o direito, nem a sabedoria,
nem a virtude. Ser governado significa que todo
movimento, operação ou transação que
realizamos é anotada, registrada, catalogada em
censos, taxada, selada, avaliada monetariamente,
patenteada, licenciada, autorizada, endossada ou
desaconselhada, frustrada, reformada,
endireitada, corrigida. Ser governado significa,
em nome da utilidade pública e do bem comum,
ser tributado, treinado, redimido, explorado,
monopolizado, extorquido, pressionado,
mistificado, roubado; então, ao primeiro sinal de
resistência, à primeira palavra de protesto, somos
reprimidos, multados, desprezados, humilhados,
perseguidos, empurrados, espancados,
garroteados, aprisionados, fuzilados,
metralhados, julgados, sentenciados, deportados,
sacrificados, vendidos, traídos e, para completar,
ridicularizados, escarnecidos, ultrajados e
desonrados." Estou certo de que não é necessário
enumerar as leis existentes que correspondem e
justificam quase todos os pontos da longa
acusação de Proudhon. Quão impensada,
portanto, é a afirmação de que a ordem política
existente possui caráter puramente defensivo, em
contraste com o Estado agressivo que os
Anarquistas pretendem abolir!

Isto leva a outra consideração que tem relação


com o problema do indivíduo invasivo, que é um
monstro imaginário dos oponentes do
Anarquismo. Não seria o tratamento acima
descrito o responsável em grande parte por sua
existência? Eu ouvi ou li em algum lugar uma
inscrição inscrita a respeito de uma certa
instituição de caridade:
"Este hospital foi construído por uma
pessoa pia
Mas ela primeiro tornou pobres aqueles que lá
colocaria"
É o que ocorre, parece-me, com nossas
prisões. Elas estão cheias de criminosos criados
pelas iníquas leis criadas por nosso virtuoso
Estado, seus brutais monopólios e as horríveis
condições sociais que deles resultam. Nós
colocamos em vigor muitas leis que fabricam
criminosos e, então, umas poucas que os punem.
Seria demais esperar que as novas condições
sociais que se seguissem à abolição de toda
interferência na produção e distribuição de
riqueza no fim mudaria os hábitos e propensões
dos homens, de forma que nossas cadeias e
prisões, nossos policiais e soldados, em suma,
todo o nosso aparato defensivos, se torne
supérfluo? Essa, pelo menos, é a crença dos
Anarquistas. Soa Utópica, mas em verdade ela
tem bases rigidamente econômicas. Hoje, porém,
falta tempo para explicar a visão Anarquista da
dependência da usura, e portanto da pobreza, dos
privilégios monopolísticos, especialmente o
privilégio bancário, e para mostrar como uma
minoria inteligente, educada pelo princípio do
Anarquismo e determinada a exercer aquele
direito de ignorar o Estado em que Spencer, em
seu Social Statics, insiste tão hábil e
admiravelmente, poderia, ao desafiar as
proibições bancárias nacionais e estatais, e
estabelecendo um Banco Mútuo em competição
com os monopólios existentes, dar o primeiro e
mais importante passo rumo à abolição da usura
e do Estado. Simples como pode parecer esse
passo, dele se seguiria todo o resto.

Meia hora é um tempo demasiado curto para


discutir a relação do Estado para com o
indivíduo, e eu devo me desculpar pela brevidade
da minha abordagem de uma sucessão de
considerações, cada uma das quais necessitaria de
um ensaio inteiro para seu desenvolvimento. Se
eu delineei o argumento inteligivelmente, eu
realizei tudo o que esperava. Mas, na esperança
de imprimir a idéia do verdadeiro contrato social
mais vividamente em suas mentes, na conclusão
eu tomarei a liberdade de ler outra página de
Proudhon, a quem eu devo a maior parte do que
sei, ou penso saber, sobre este assunto.
Contrastando a autoridade com o livre contrato,
ele diz, em seu livro A Idéia Geral da Revolução no
Século XIX:
"Sobre a distância que separa estes dois
regimes, nós podemos julgar pela diferença em
seus estilos.

"Um dos mais solenes momentos na evolução do


princípio da autoridade é aquele da promulgação
do Decálogo. A voz do anjo comanda o Povo,
prostrando no sopé do Sinai:

"Adorarás o Eterno, e somente o Eterno.

"Não invocarás Seu santo nome em vão.

"Guardarás seus feriados, e pagarás seus dízimos.

"Honrarás teu pai e tua mãe.

"Não matarás.

"Não pecarás contra a castidade.

"Não roubarás.
"Não levantarás falso testemunho.

"Não desejarás a mulher do próximo.

"Não cobiçarás as coisas alheias.

"Pois o Eterno ordena, e foi o Eterno quem os fez


o que são. O Eterno é o único soberano, o único
sábio, o único valoroso; o Eterno pune e
recompensa. É poder do Eterno torná-los felizes
ou infelizes, à Sua vontade.

"Todos os legisladores adotaram este estilo;


todos, falando a homens, empregam a formula do
soberano. O hebraico dá ordens no futuro, o
latim no imperativo, o grego no infinitivo. Os
modernos não fazem diferente. A tribuna do
parlamento é um Sinai tão infalível e terrível
quanto aquele de Moisés; qualquer que seja a lei,
de quaisquer lábios que venha, ela é sagrada
assim que é proclamada por aquela trombeta
profética, que conosco é a maioria.

"Não se reunirás.
"Não imprimirás.

"Não lerás.

"Respeitarás teus representantes e teus oficiais,


advindos do acaso do voto ou da boa fortuna com
que Estado te proveu.

"Obedecerás as leis feitas por eles em sua


sabedoria.

"Pagarás teus impostos fielmente.

"E amarás o Governo, teu Senhor e teu Deus, com


toda a tua dedicação, toda a tua alma e toda a tua
mente, porque o Governo sabe melhor do que tu
o que tu és, o que tu vales, o que é bom para ti,
tem o poder de punir aqueles que desobedecem
seus comandos, e pode recompensar até a quarta
geração daqueles que a Ele se submetam.

"Com a Revolução é bastante diferente.

"A busca por causas primeiras e causas finais é


eliminada da ciência econômica da mesma forma
que das ciências naturais.

"A Idéia de Progresso substitui, na filosofia, à do


Absoluto.

"A Revolução sucede a Revelação.

"A Razão, assistida pela Experiência, revela ao


homem as leis da Natureza e da Sociedade, então
diz a ele:

"Estas leis são aquelas da necessidade. Nenhum


homem as fez; nenhum homem as impõe sobre
você. Elas foram descobertas, e eu existo somente
para dar testemunho a elas.

"Se você as observar, será justo e bom.

"Se as violar, será injusto e perverso.

"Eu não ofereço a você nenhum outro motivo.

"Muitos de seus companheiros já reconheceram


que a justiça é melhor que a iniqüidade para
todos; e concordaram com os outros em
mutuamente manter a boa-fé e a retidão — isto é,
em respeitar as regras de transação que a
natureza das coisas indica a eles como capazes de
assegurar o máximo de bem-estar, segurança e
paz.

"Você deseja aderir ao pacto deles, para formar


uma parte daquela sociedade?

"Você promete respeitar a honra, a liberdade e os


bens de seus irmãos?

"Você promete jamais se apropriar, através da


violência ou fraude, da usura ou da especulação,
do produto ou da possessão dos outros?

"Você promete jamais mentir e enganar, seja na


justiça, nos negócios ou em quaisquer de suas
transações?

"Você é livre para aceitar ou recusar.

"Se recusar, você se torna parte da sociedade de


selvagens. Fora da comunhão da raça humana,
você se torna objeto de suspeita. Nada o protege.
Ao menor insulto, qualquer pessoa poderá
levantar a mão contra você sem incorrer em
qualquer outra acusação além da de crueldade
desnecessária praticada sobre um bruto.

"Se, pelo contrário, você se juntar ao pacto, você


se torna parte da sociedade de homens livres.
Todos os seus irmãos passam a ter um
compromisso com você, prometem a você
fidelidade, amizade, auxílio, trabalho, comércio.
Em caso de infração da parte deles ou da sua,
através de negligência, paixão ou malícia, vocês
são responsáveis pelo dano, pelo escândalo e pela
insegurança dos quais foram a causa: esta
responsabilidade se pode estender, de acordo
com a gravidade do perjúrio ou das repetições da
infração, até a excomunhão ou morte.

"A lei é clara, a sanção é ainda mais clara. Três


artigos, que formam não mais que um; este é
todo o contrato social. Em vez de fazer um
juramento a Deus e a Seu príncipe, o cidadão faz
um juramento por sua consciência, perante seus
irmãos e perante a Humanidade. Entre esses dois
juramentos há a mesma diferença que há entre a
escravidão e a liberdade, entre a fé e a ciência,
entre as cortes e a justiça, entre a usura e o
trabalho, entre o governo e a economia, entre o
nada e o ser, entre Deus e o homem."

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