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Dedicatória
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Dedico a todos os morada-novenses que descobriram a
“fórmula da juventude” e ultrapassaram os 100 anos de
idade.
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Agradecimento
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Agradeço aos amigos radialistas Renato Guimarães,
Rosimar Feitosa, Marcos Freitas e Suely Saraiva por
incentivarem os ouvintes a adquirirem meus contos.
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CASTELO SEM CASTELO
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Desceram do ônibus e não viram nada de diferente,
apenas algumas casinhas e uma maior que se destacava
das demais. Tudo muito tranquilo.
Os garotos foram recebidos por um casal de idosos.
Eram os pais da professora, que anualmente recebiam os
alunos da filha com o maior carinho e atenção.
A casa era enorme, com vários quartos, paredes
grossas e telhas que pareciam ser bastante pesadas. Na
parede da sala existiam vários quadros com imagens de
santos. Eles eram uma família muito religiosa. A jovem
professora se chamava Luzia. Ela havia nascido no dia de
algum daqueles santos na parede que se chamava Luzia,
Santa Luzia.
O grupo ficou dividido. As meninas ficaram
deitadas em colchões e os meninos foram convidados a
jogar bola no imenso terreiro em frente à casa de alpendre.
O dia estava nublado e o vento gostoso daquela manhã
estimulava parte da turma a passar horas jogando.
— Etelví, você quer ficar no gol? — gritou um de
seus colegas tentando envolvê-lo na brincadeira. Mas,
como eles sabiam que Etelví nunca gostou de jogar, o
máximo que ele poderia fazer seria ficar pegando as bolas
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que caíssem para longe. Assim ficou. Ficou por horas
pegando as bolas que caíam perto de uma mata cheia de
plantas espinhentas ao lado do casarão.
Entre uma partida e outra, despertava no garoto o
desejo de entrar na mata. E não demorou para que a bola
caísse mais longe, entre as plantas que despertavam sua
curiosidade.
A bola caiu entre as moitas de forma que para achá-
la somente entrando no matagal. Etelví entrou no mato
enquanto os meninos providenciavam outra bola, pois ele
iria demorar achar aquela entre as plantas.
Com muita dificuldade adentrou a mata. Tudo
estava muito silencioso. Foi aí que avistou o que parecia
ser a entrada de uma caverna, cheia teias de aranhas e
troncos secos que dificultavam a passagem. Criou
coragem e entrou na gruta.
Mesmo sendo pequeno teve dificuldades para entrar
no local. À medida que ia entrando na gruta sentia um
forte cheiro de chocolate e começou a imaginar que ali
havia uma fábrica do produto.
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Para sua surpresa, avistou no meio da caverna,
deitada sobre uma pedra, uma garotinha vestida como uma
princesa, dormindo um sono profundo.
Era uma garotinha que parecia uma princesinha da
cor de chocolate.
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REINO DE MORADA NOVA
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— Então sente-se aí. É uma longa história. Bem, me
chamo Júlia, tenho 10 anos, quer dizer, era a idade que
tinha até quando fui enfeitiçada e guardada naquela
caverna. Sou filha de escravos que vieram de muito
distante para a construção deste reino. Meus pais eram um
casal de escravos que faziam seus trabalhos com muita
dedicação ao ponto de chamar a atenção do rei, que
gostava muito dos dois.
Como o rei era muito bom e não tinha familiares,
pois quando sua amada esposa faleceu não quis casar-se
com mais ninguém, resolveu que deixaria o castelo nas
mãos de meus pais, que se sentiram muito felizes com a
proposta.
Porém, existia uma jovem que achava que seria a
pessoa ideal para receber a herança do rei em vez dos
meus pais. Ela procurou o rei e disse que merecia ganhar
suas heranças, pois desempenhava, assim como meus pais,
suas atividades com muita perfeição no castelo. A
majestade reconheceu que de fato ela era uma boa
ajudante.
Então o rei lançou um desafio: quem engravidasse
primeiro e que ao nascer a criança fosse do sexo feminino,
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receberia o Reinado da Morada Nova para governá-lo
quando o mesmo viesse a falecer.
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O AMIGO BANABUIÚ
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Desde o dia que fui encontrada, nunca mais o cheiro
de chocolate saiu do meu corpo e as pessoas achavam que
eu havia virado uma criança de chocolate.
Aproveitaram para espalhar a mentira de que tudo
que eu viesse a tocar viraria chocolate, e o povo
acreditava. A fonte e o lago bem no centro da cidade
viraram chocolate líquido. Desde aquele dia fiquei longe
da fonte a frente do castelo e tudo que contivesse água.
Sempre fiquei longe de tudo e de todos.
Meses depois o rei faleceu e meus pais assumiram o
trono. Enquanto isso, eu era proibida de tocar em qualquer
coisa. Inclusive, fiquei com muito medo de água.
Minha mãe acreditava que eu poderia desmanchar
caso eu fosse molhada ou pegasse chuva, por exemplo.
Tempos depois a água do reino estava acabando e eu
fui a culpada, pois toda água estava virando chocolate e
não havia água para evaporar e chover no reino da Morada
Nova.
Foi aí que a malvada mulher, que queria tomar o
trono a qualquer preço, reuniu o povo, que já estava
frustrado com a seca terrível, para expulsar minha família
daquele lugar.
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Meus pais foram expulsos e voltaram a ser escravos
bem longe dali, e eu, que já tinha 10 anos, aproveitei para
fugir. Andei por vários dias sem saber o que fazer até que
ouvi uma voz que me chamava. Ao olhar para trás pude
perceber que quem estava tentando se comunicar comigo
era um rio.
— Ei, qual seu nome?
— Minha nossa, um rio que fala? — me indaguei no
pensamento.
— Meu nome é Júlia. — falei ao rio, que logo
tomou forma de uma criatura com olhos e boca.
— Meu nome é Banabuiú! Por que está triste,
menina?
— É que fui expulsa com minha família do Reino de
Morada Nova que meus pais ganharam.
— Humm, já ouvi falar!
— Fomos expulsos porque tudo que toco vira
chocolate.
— Pois me toque! — falou o rio Banabuiú sem
temer o que pudesse lhe acontecer.
A princípio fiquei apreensiva, mas depois pus meu
dedo do pé no rio, que não virou chocolate.
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— Nossa!
— Viu só como não virei um rio achocolatado?!
Naquele instante, o rio Banabuiú abriu meus olhos
para o que tinha acontecido. Ele me contou que a malvada
mulher, se aproveitando da ocasião em que todos achavam
que eu tinha poderes para transformar tudo em chocolate,
jogava produtos para a fabricação de chocolate nas águas,
de forma que culpassem a mim. — finalizou a garotinha
com sua história.
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CONHECENDO O REINO
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de cabelos brancos. O menino se aproximou e falou: —
Olá, meu nome é Etelví, trouxe um recado de uma amiga
de vocês.
Eles passaram alguns minutos conversando sobre
quando eram crianças. E de fato eram eles mesmos, os
irmãos Fontes. Ficaram admirados com o fato de Júlia
estar viva durante todos aqueles anos.
— Nossa amiga foi raptada quando andava sozinha
e nunca ficamos sabendo onde ela estava. Já
acreditávamos que estivesse morta. — falou um deles.
— Eu a encontrei em uma caverna a alguns
quilômetros daqui. Eu sou de uma cidade que também se
chama Morada Nova. — acrescentou Etelví aos homens.
Eles ficaram admirados com sua história e por ele ser de
um lugar que mais parecia ser delírio do jovem garoto.
Os dois irmãos guardaram suas ferramentas e saíram
em direção aonde Júlia os aguardavam.
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REENCONTRO DE CHOCOLATE
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— Bem, Júlia, os seus pais não estão mais entre nós
como você já deve ter concluído ao olhar para nós e vê que
já estamos bem envelhecidos. Muitas coisas mudaram
depois que aquela mulher má, ou melhor, a bruxa, assumiu
o trono do reino da Morada Nova. — acrescentou um dos
Fontes.
— Bruxa? — indagou o menino aos irmãos Fontes.
— Isso mesmo, meu caro Etelví. Aquela mulher não
se contentou apenas com o trono que tomou e então fez
um feitiço para que nunca morresse. Feitiço daqui, feitiço
dali, logo acabou virando uma bruxa para impor medo ao
povo escravizado.
Etelví, Júlia e os Fontes saíram à procurar o rio
Banabuiú, pois creditavam que ele pudesse orientá-los
sobre alguma forma de tomarem o reino que pertencia a
Júlia por direito.
Assim fizeram. Foram à procura do rio, que estava
bem cansado. Suas águas estavam poucas, escorrendo
como um pequeno riacho. Parecia que ele não estava bem.
— Olá amiguinha, Júlia. Há quanto tempo! — falou
o Banabuiú com um sorriso de causar admiração aos
irmãos e a Etelví, que nunca tinha visto um rio falar.
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— Viemos aqui para que você pudesse nos orientar
sobre como enfrentar a bruxa. — falou Júlia.
Eles ficaram reunidos na beira do rio, conversando
na tentativa de encontrar uma forma de ajudar sua amiga
Júlia.
O rio chamou a atenção para o fato de eles serem
num pequeno número e precisariam de mais reforços, pois
os soldados da bruxa eram fortes, gigantes e bem
treinados.
Não havia a mínima possibilidade de Júlia, uma
garotinha, os irmãos Fontes, e Etelví, um garoto de apenas
9 anos, enfrentar uma legião de soldados.
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CAVERNA DO TEMPO
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— Tenho que voltar lá e trazer uma prova de que
aquele mundo existe. — pensou o menino. Sem uma prova
ia ser difícil contar com a ajuda dos seus amigos.
Etelví se preocupava sobre como ele poderia provar
que o reino existia e conquistar o apoio de seus amigos
para salvar o reino da princesinha de chocolate. Sem uma
evidência não iria adiantar. Eles não iriam acreditar que
aquele ambiente existia, pois nem parecia que Etelví havia
saído do lugar para procurar a bola entre as moitas.
Disse aos seus amigos que ia procurar a bola
novamente e voltou a entrar na gruta, saindo logo mais
onde a princesinha estava.
Ao chegar do outro lado da caverna, Júlia
questionou sobre o mundo fora da gruta, ou seja, o mundo
de Etelví. Ficou curiosa para conhecer. O garoto se propôs
a trazê-la para que conhecesse seus amigos.
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VOLTANDO À MORADA NOVA
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Abriram a entrada da caverna retirando algumas das
pedras que conseguiam pegar. Retornaram para próximo
do castelo de forma que os soldados pudessem cair na
armadilha.
Como haviam premeditado, os soldados seguiram os
garotos e, ao entrarem na caverna, viraram centenas de
sapos que se espalharam nos túneis, assustando as colegas
de Etelví.
A partir daí parecia ser fácil tomar o reino das mãos
da bruxa.
Procuraram o rio Banabuiú para terem uma sugestão
de como tomariam o castelo, pois a bruxa havia fechado
todas as portas.
— Bem, o que eu poderia fazer seria juntar uma
grande quantidade de água e jogar sobre o castelo na
tentativa de tirar a bruxa de lá. — falou o Banabuiú.
— Mas isso poderia acabar derrubando o castelo. —
disse um dos irmãos Fontes.
Ainda que apreensivos, todos concordaram em
correr o risco! O Banabuiú jogou uma enorme quantidade
de água no castelo ao ponto de derrubá-lo. A bruxa ficou
soterrada entre os escombros.
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Todos que estavam naquele lugar se propuseram a
construir um novo castelo. Os irmãos Fontes fizeram uma
pesquisa popular para saber onde construiriam a nova
obra. O povo concordou que seria construído ao lado de
um grande lago, que ainda estava cheio de chocolate. Tudo
seria diferente. Um novo reinado.
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CONSTRUINDO UM NOVO REINO
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real para que não acontecesse nada de ruim à cidade
encantada que eles estavam tendo o prazer de conhecer e
tudo parecia estar interligado.
Naquele instante, um dos garotos havia falado que
apenas tinha pensado no trabalho da escola onde falaria
sobre o uso de agrotóxicos em plantas no Perímetro
Irrigado.
— Então é isso! — tudo que nós pensamos ou
imaginamos acaba acontecendo no reino que estamos. —
disse Etelví aos demais amigos.
O garoto acrescentou que os gigantes, o dragão, a
bruxa, entre outras coisas, se tornaram reais quando eles
imaginaram tais criaturas!
— Fui eu quem pensou no desfile de carruagens! —
falou uma das colegas do garoto.
Ao mesmo tempo que perceberam ser interessante
imaginar aquelas coisas, concluíram que poderia ser
perigoso usar a mente para pensar coisas ruins.
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DE VOLTA DA AVENTURA
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— Tá vendo aí como é importante sair um pouco da sala
de aula? Um simples passeio como este já serviu para
renovar toda a turma. Estão falando até em princesas e
dragões!
O que eles não imaginavam era que a princesinha
cor de chocolate também havia entrado no ônibus e se
escondido atrás das caixas de ferramentas do motorista.
O cheiro de chocolate que circulava no interior do
veículo não levantava a desconfiança de que a garota
estivesse ali, pois achavam que fosse devido a restos de
lanches em vasilhas abertas.
Minha bisavó concluiu a história dizendo:
— Nunca desconfiaram que a princesinha ficou no ônibus
até todos saírem. E que passou a morar em Morada Nova,
tendo construído uma linda família.
A história contada por minha bisavó foi muito
interessante e despertou em mim a curiosidade de um dia
me encontrar com a tal princesinha que havia deixado o
seu reino para morar no nosso mundo real.
Quando nos despedíamos para retornar ao Estado
onde eu morava com meus pais, minha bisavó me chamou
e abraçou-me forte por alguns segundos. De repente o
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vento sacudiu os seus cabelos e saiu um agradável cheiro
de chocolate, no mesmo momento falei com um tom de
espanto:
— É a senhora! A princesinha de chocolate?!
Ela fez um sorriso leve e pediu baixinho no meu
ouvido que eu guardasse com muito carinho o segredo da
princesinha cor de chocolate.
FIM
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Olegário Gomes é chargista do jornal Folha do Vale;
trabalha na empresa Studio Edbenes; artista
plástico; professor de desenho e nas horas vagas se
dedica a escrever livros.
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