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Design Gráfico Moderno

Centro Universitário Maria Antônia

Curso design e humanidades 2010_

Katia Regina de Oliveira

Abril de 2010
Modernidade e modernismo
Para entender o que é design gráfico moderno é importante situar as características que
delimitam a qualificação de “moderno”. Para isso, é importante diferenciar os termos
modernidade e modernismo.
A modernidade é um processo histórico mais amplo. Esboça-se já no século XVII e se
consolida com a revolução Industrial. Alguns aspectos marcantes desse processo:
 a necessidade de expansão política e comercial estimula a mobilidade e permite a
consciência de que os valores da cultura podem ser relativos;
 o pensamento burguês traz consigo a idéia de um “indivíduo” dono de suas
vontades que é capaz de agir sobre o mundo;
 o desenvolvimento da ciência afirma o poder da razão técnica humana sobre a
natureza, desembocando na idéia de progresso.
Nos séculos que se seguem, esse processo ajudará a compor o cenário marcado pelo
desenvolvimento da indústria, pela formação das grandes metrópoles, pela afirmação de
uma elite burguesa intelectualizada e, cada vez mais, pela consciência de que os valores
estéticos podem ser decididos em função de necessidades do presente.
Vale dizer que esse processo não ocorre sem conflitos. O capitalismo se desenvolve às
custas da opressão da classe proletária e os intercâmbios culturais não impedem os
extremismos nacionalistas. De todo modo, as heranças desse processo histórico estão
claramente delineadas no século XIX, quando se estabelece de fato a consciência do que
é "ser moderno". Briony Fer cita Baudelaire para definir essa consciência:
"por 'modernidade' entendo o transitório, o fugidio, o contingente, a metade da arte cuja
outra metade é o eterno e o imutável". Essa dualidade transitório- eterno, contigente-
imutável cria uma tensão produtiva entre eles. Ser moderno não é só acompanhar as
rápidas mudanças da moda mas buscar constantemente a renovação e transformação.
(Fer, 1998:9)
Isso significa que não basta ao artista moderno estar em sintonia com seu tempo, é
preciso ser agente das transformações em curso. Assim, o “design gráfico”, para ser
moderno, precisa conhecer as condições que permitem seu desenvolvimento e do papel
que exerce nesse jogo de transformações.
Assumindo tal consciência, o “modernismo” é um dos resultados desse processo
histórico. Esse termo qualifica os movimentos artísticos que ocorreram entre a última
década do século XIX e as primeiras do século XX. Segundo Giulio Carlo Argan (185),
as tendências modernistas estão marcadas por algumas características que constroem um
terreno fértil para a afirmação do design:

 renúncia aos modelos históricos em favor de questões lançadas pelo presente;


 busca por um modelo de linguagem internacional;
 desejo de aproximar as artes aplicadas das artes maiores como a arquitetura,
escultura e pintura;
 anseio por uma concepção de estética que não dissocia a forma da funcionalidade
dos objetos.
Esse vocação para as rupturas é particularmente agressiva nos movimentos modernistas
denominados de “vanguarda”, que surgem numa tentativa de restabelecer o vínculo entre
a arte e a vida, balizando a experiência estética por idéias políticos e conferindo às obras
o papel de transformar o mundo. Tal aspecto “panfletário” é importante para o
desenvolvimento do design gráfico porque os artistas entendem que seu ideário deve ir
além dos círculos eruditos. Ou seja, precisam encontrar uma forma ao mesmo tempo
inovadora e que permita a “comunicação” com o público.
A construção do design no ambiente moderno
O delineamento do design como linguagem já é produto do pensamento moderno, na
medida em que tenta colocar as novas produções técnicas em diálogo com os valores da
arte. Da idéia de “aplicar um gosto” aos objetos até a possibilidade de construir
efetivamente uma estética adequada às suas funcionalidades, há uma longa trajetória.
Conforme Ana C. Gruszynski (2000:45) vários movimentos “compõem uma intrincada
rede de tensões e influências que não seguem uma ordem evolutiva sistemática e linear
rumo ao estabelecimento da profissão (do designer gráfico) que se dá no período
moderno”. Nesse sentido, há experiências que ajudam a construir a noção de design
gráfico moderno sem, no entanto, merecer ainda essa qualificação.
A Era Vitoriana (1819-1901) é caracterizada pela mistura de estilos e um certo caos
estético. A indústria, numa tentativa de atrair consumidores, abusa da ornamentação e das
técnicas disponíveis. Nesse contexto, a indústria veste forçosamente seus produtos de
uma beleza tradicional, ligada ainda aos produtos artesanais consumidos por uma
burguesia de elite. Essa imitação de estilo é denominada de kitsch.
Em 1851, no Palácio de Cristal, ocorre uma importante exposição de produtos industriais
que revelam essa estética rebuscada e pouco convincente. Contra isso, intelectuais como
J. Ruskin e W. Morris passam a defender uma educação estética da sociedade por meio
da retomada de parâmetros de qualidade por meio de uma produção mais artesanal. Essa
revitalização demarca o surgimento do Arts & Crafts, com uma contribuição que eleva os
padrões de qualidade das produções gráficas, algo importante para o desenvolvimento
subseqüente do design. No entanto, permanecem traços de conservadorismo que estão em
contradição com o espírito moderno.
Com o crescimento da classe média na Europa, uma camada mais ampla da burguesia
sente a necessidade de ter representatividade. Com o Art Nouveau, ela estabelece um
novo repertório estilístico em sintonia com a produção industrial sem abrir mão de
qualidade. O expansão comercial propicia um convidativo choque cultural entre o
ocidente e o oriente. Mesmo com influências mais amplas (como o japonismo), alcançam
uma unidade formal de estilo, ao contrário do que ocorreu na era vitoriana. Há emoção
nas formas e racionalismo na técnica, estabelecendo-se um diálogo entre os artistas e a
indústria.
Segundo Philip Meggs (2009:249), esse estilo, apesar de transitório, foi de fundamental
importância para a evolução do design, pois libertou a criação do historicismo, isto é, do
apego quase servil às formas e estilos anteriores.
Contribuindo para a simplificação das formas, destaca-se no final do século XIX o
trabalho de Frank Lloyd Wright que via o espaço como essência do design, e foi
inspirador para artistas que evoluíam do curvílineo do Art Nouveau para a organização
retilínea do espaço.
Surge nesse contexto The Studio, uma importante publicação inglesa que mostrou
trabalhos de Breadsley e Toorop, que influenciaram alunos da Escola de Glasgow. Nos
trabalhos desenvolvidos por artistas como R. Mackintosh, observa-se o uso de linhas
simples e pronunciadas e cores chapadas. Destaca-se também a verticalidade ascendente.
Inspirado em Glasgow, Gustav Klimt lidera o movimento de oposição ao Art Nouveau, a
Secessão Vienense. Destacam-se nesse movimento alguns recursos que apontam para o
design moderno, como o uso de letras simples, sem serifa, além de um padrão geométrico
e modular dos layouts.
Na última década do século XIX, Van de Velde aprofunda o diálogo do design gráfico
com a lógica de produção industrial, estudando o funcionamento das máquinas de
impressão para viabilizar a execução de seus projetos. A partir de 1901, Peter Belrens
segue esse mesmo caminho e passa a trabalhar como arquiteto e artista gráfico,
desenvolvendo todo material publicitário para a empresa de produtos elétricos AEG. Ele
é pioneiro quando estabelece o “estilo da casa” que nada mais é do que aquilo que se
entende hoje como manual de identidade visual.
Essas experiências, além de serem oscilantes no que diz respeito ao espírito moderno,
representam um esforço realizado por intelectuais e artistas, que ainda não constituem
propriamente uma linguagem efetiva que se possa chamar de “design gráfico”.
 
Contrutivismo e a consolidação do design gráfico moderno
O construtivismo nasce na esteira da liberdade conquistada pelos primeiros movimentos
modernistas da Europa e, com o espírito transformador das Vanguardas, coloca palavras e
imagens a serviço da revolução russa.
Seu nome é baseado no “Manifesto Realista”, que prega o ideal de “construir ” a arte
como reflexo do mundo moderno e de sua tecnologia, utilizando-se para isso de materiais
próprios da indústria. É a expressão de uma sociedade de massa na era da máquina.
Trata-se de um momento histórico em que as características modernas se manifestam
com grande maturidade. Além disso, seu caráter ideológico faz desse movimento um
lugar fértil para a consolidação do design gráfico, que se desenvolve em consonância com
outras artes. Temos aqui algo que podemos chamar com segurança de “design gráfico
moderno”.
El Lissítzki é considerado um dos principais nomes do Construtivismo Russo. Arquiteto,
designer gráfico, fotógrafo e tipógrafo, seu trabalho influenciou movimentos posteriores
como a Bauhaus e o De Stijl.
As peças gráficas de Lissítzki uniam abstração geométrica com funcionalismo. Ele
acreditava que era necessário propor novos modos de utilização para tipografia, e pregava
que “as palavras impressas são para ser vistas, não ouvidas” e que ‘uma seqüência de
páginas faz com que um livro se pareça um filme. (cf. Hollis, 2000:46)
Análise da peça gráfica

El Lissítzki, cartaz de exposição, 1929.

O construtivismo não é apenas um modelo estético que se aplica a um objeto. Como


estilo, ele já nasce considerando as necessidades e influências de várias linguagens dentre
elas a do design gráfico.
Podemos identificar nesse trabalho aquilo que Richard Hollis (2000:2) define como
características constitutivas do design gráfico: o desenvolvimento do projeto tendo em
vista a produção mecânica e cumprimento das funções básicas das artes gráficas:
“identificar”, “informar e instruir” e “apresentar e promover” uma idéia. Na prática isso
aparece da seguinte forma:
1. escolha de uma tipografia com alta legibilidade
2. uso das cores preto e vermelho com uma dupla função: baratear o custo de
produção e identificar os ideais revolucionários soviéticos
3. exploração de formas simples e funcionais
4. diálogo entre texto e formas como no encaixe do título na perspectiva da imagem
Algumas outras características que tem grande afinidade com o ideário moderno:

 uso da fotografia, linguagem que surge como síntese de conhecimentos técnicos


conquistados na modernidade
 O uso da montagem, procedimento que opera com a lógica da produção industrial
e que cria unidade a partir de “peças” produzidas separadamente.
 Formas geométricas em consonância com outras tendências modernistas
(futurismo, cubismo, suprematimo)
 O uso de elementos simbólicos sem rebuscamentos alegóricos. Exemplos:
o o uso contra-plongé (o enquadramento de baixo para cima) que representa,
a dignificação do homem e de seu trabalho.
o A fusão da mulher e do homem que sugere uma posição igualitária para
ambos e tem significado inovador para uma sociedade tipicamente
dominada pelo masculino.

Referências Bibliográficas
ARGAN, Giulio Carlo. Arte Moderna. São Paulo:Companhia das Letras, 1992
FER, Briony [et alii]. Modernidade e Modernismo- Pintura Francesa no século XIX.
Cosac & Naify, 1998
GRUSZYNSKI, Ana Cláudia. Design gráfico: do invisível ao ilegível. Rio de
Janeiro:2AB, 2000.
HOLLIS, Richard. Design gráfico: uma história concisa. São Paulo: Martins Fontes,
2000.
MEGGS, Philip B.; PURVIS, Alston W. História do design gráfico. São Paulo: Cosac &
Naify, 2009.

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