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Não é bem o que parece – uma pedra no

sapato da imprensa.
Pra mostrar que realmente não existe conhecimento inútil e nem conceito
tão restrito que não possa ajudar a entender outras áreas, vou usar alguns
temas de posts do blog pra mostrar uma interpretação possível pro que
aconteceu semana passada no Rio.

Pra começar, publicidade. O Nizan Guanaes – publicitário, hoje um dos


homens mais influentes do Brasil segundo o Financial Times, além de
fundador da DM9 – tem como uma de suas frases mais conhecidas a que diz
que “A publicidade não tem nada a ver com a verdade. Quando você quer
seduzir alguém conta a verdade? Mostra os seus piores defeitos?”. A
questão aqui é que uma cobertura jornalística não deveria ser publicidade.
Deveria se preocupar com isenção e pluralidade de fontes e discursos. Mas
o que se viu mesmo (e olhe que eu moro no Rio, acompanhei a cobertura,
participei das discussões na universidade sobre o tema e posso dizer que
essa percepção é geral) foi um peso enorme para as declarações do Estado
e outro muito menor para a população dos lugares mais afetados pelos
conflitos. Se existe um termo que defina a atuação da mídia convencional
nesses eventos, esse termo é braço publicitário do Estado.

E não é pra menos. Afinal, mais viral do que a Susan Boyle no Youtube foi a
mudança na visão das pessoas sobre a polícia carioca. De repente, fomos
dormir com a polícia mais degradada do país e acordamos do lado dos
heróis da pátria.

Se essa imagem não conseguiu se incorporar com mais força no imaginário


carioca como verdade incontestada, não é exagero nenhum dizer que isso
vai praticamente pra uma conta só: a das redes sociais. Definitivamente, a
semana passada foi uma oportunidade espetacular de se entender o tipo de
transformação com que os veículos de informação estão tendo que lidar por
causa das redes sociais e como eles estão sofrendo pra se adaptar a ela.
Antes, os jornalistas podiam ser chamados de Gatekeepers, porque
detinham de fato as chaves dos portões da informação. Pra conseguir se
espalhar, o fato tinha que passar primeiro pelas mãos deles, e daí vinha a
tal denominação de “4º Poder” pra Imprensa. O que agora está patente é
que o jornalista passou a ser no máximo um Gatewatcher. Hoje, o melhor
que ele pode fazer é monitorar os portões da informação, porque não tem
mais nas próprias mãos nem o poder de emissão nem o de transmissão.

Vejam só que incrível: a população hoje pode impor pauta aos grandes meio
de comunicação! Ela pode anunciar por si mesma a irrupção dos fatos! Todo
mundo ainda assiste a Globo? Assiste, é claro. Mas com o Twitter do lado.
Eu juro pra vocês: eu tenho uma colega que monitorava tão bem os twits
que recebia que conseguiu acompanhar até traficante atualizando Orkut no
meio do conflito. Não estou dizendo que seja já a regra. Mas uma tendência
é. Não dá pra negar: se o governo teve que instalar, essa semana, uma
corregedoria exclusivamente para registrar os casos de abuso de poder por
parte de policiais durante as operações no Alemão, isso se deve única e
exclusivamente à avalanche de denúncias desse tipo dos moradores via
Twitter. Vai me dizer que alguém ouviu uma vírgula sobre algum abuso no
RJ-TV antes disso? Enquanto deu par abafar, foi abafado. Afinal, o Ganaz já
disse que defeito não é mesmo bom de mostrar quando você está tentando
seduzir. Mas chega um momento em que não dá mais. Se impõe.

A população é meio que aquela “ex” que pode queimar o seu filme no meio
do jantar e por isso você tenta não convidar. Só que agora ela é dona do
restaurante. Torça pra ela não ter dar boa noite perguntando daquele seu
probleminha com o Pelé...

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