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ALAIN DE MIJOLLA
'
1
DICIONÁRIO
INTERNACIONAL
DA PSICANÁLISE
CONCEITOS, NOÇÕES, BIOGRAFIAS, OBRAS,
EVENTOS, INSTITUIÇÕES
**
Comitê Editorial:
Sap ie de ~ira-Mellor, Roger Perron, Bernard Golse
t .J ~ r iflv ·
1
V I Tradução:
IMAGO
4f.;tJ.,,...--
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, . Esse originário vem a ser nesse ca- a "tabu" (termo adotado da língua polinésia),
tr1!'lâl'lº·ndição de poss1'b'l'd
rir,~ 11 ade para iniciar
0 ...,aco . .. - d . a "proibido" e a "lei".
50 uw sso de h1stoncizaçao o SUJeito em A transgressão é constituída de tudo o que
,,roee
tll11 r; à duas geraçoes - precedentes ou mais.
ªº
re1aÇ acesso s . ulaçao
de vmc - entre gerações manifesta, tanto no desenrolar do tratamento
analítico quanto no funcionamento inconsci-
Esse pr ...,ediatizado por uma identificação
ente conflitual, inclusive no âmbito da aborda-
pºde ser.ente "' revelada no mesmo processo de
gem psicanalítica, o fato de infringir regras
. consc1 -
ili nstrUçao. explícitas ou implícitas.
(re)c0 conceituação do intergeracional não
Essa saber se é necessano ,. recuar cada vez Assim, portanto, a transgressão real e fan-
a tasmática encontra-se no âmago de todos os
procur. 0 tempo cronol'og1co: . e1a está centrada
mecanismos psíquicos como resultado ou fon-
..ia1s
w
n ntingenc1as a ransferenc1a,
A • d t " . na escuta
te de um conflito. Também está presente, du-
nasco . d . .
anacronismos o mconsc1ente e na rante uma psicanálise, em tudo o que se opõe
do~ onstrução das "verdades históricas" ao enquadramento explicitamente fixado: o
(r~e~d,S,, 1937d). Nessa medida, ela tampou- quadro, a regra fundamental. Mas a transgr~s-
~ procura antecipar, na base de eventos co- são manifesta-se ainda, e desta vez de maneira
cm ouns, 0 que o pr?cess~ anal'ti' 1 ~o podena
· elu-
positiva, no desejo de Freud e dos psicanalis-
'dar pois correria o nsco de so reencontrar 0 tas de penetrar segredos aparentemente ób-
c~e -á tinha sido elucidado. Ainda mais: os vios e, a exemplo de toda pesquisa científica,
q 1 li • • li
11•
onceitos transgerac1ona1s ou mtergeracio- no desejo de compreender e de dominar as leis
~ais" a que o necessário trabalho de elabora- do funcionamento humano, sobretudo quan-
ção ligado à situação transferencial permite do elas são obscuras.
chegar não a poderiam, em nenhum caso, re- Por isso é difícil datar a primeira aparição
presentar sem se converter em esquemas de da noção, visto que, a posteriori, pode-se dis-
explicação unívocos. Só evitando toda reifi- cernir sua presença nas entrelinhas desde os
cação dessa espécie é que se pode escutar o primeiros escritos de Freud e no seu desejo de
inconsciente lá onde ele fala: lá onde nem o vir a ser um herói fora do comum. Em A inter-
analisando nem o analista o esperavam. pretação dos sonhos (1900a, cap. IIl), a idéia de
transgressão apresenta-se por oposição à de
Haydée Faimberg desejo não satisfeito, suscetível de, não obs-
tante todos os freios e interdições, acarretar
alguma satisfação pelos caminhos oblíquos do
Bibliogr.: Faimberg, H. (1985); Guyotat, J., Fedida, sonho. Com os sociólogos, os psicanalistas
P.(1986); Kaes, R. et al. (1993); Mijolla, A. de (1999); constatam que toda lei é acompanhada de
Tisseron, S. et ai. (1995). suas práticas delituosas, cuja presença ela as-
Complementos: Abraham, Nicolas; identificação sinala e cujos atos registra. Com os etnólogos,
(fantasias de-); prematuro-prematuridade; terapia os psicanalistas constatam igualmente que as
familiar (psicanalítica); transmissão cultural. leis mais severas se fazem acompanhar sem-
pre de rituais.
Era muito natural que, num movimento
dialético, o interesse por tudo o que pode im-
1 transgressão pedir a realização de um desejo - e, em parti-
cular, essas limitações formalizadas, absolutas
Anoção de transgressão só gradualmente en- e indiscutíveis que são as leis e os tabus - se
controu seu lugar na psicanálise. Trata-se, de transmita ao que os pode corromper, desviar
fato, de uma palavra de significado bem esta- ou violar, ou seja, aos mecanismos de trans-
belecido, a qual tinha adquirido uma dimen- gressão. É natural que, numa preocupação de
~o nocional em etnologia, ciência que ins- ordem, em que a moral tem seu lugar, a trans-
Pll'ou Freud. De certa maneira, sua signifi- gressão tenha sido vivida e apresentada pri-
caçã0 . •- meiro sob seus aspectos negativos ou patoló-
se enuncia negativamente, por opos1çao
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1920 transgressão DICIONÁRIO INTER
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gicos, muito embora Freud te~a ini~ialmente berta podem levar a provoc 1lr.
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insistido sobre o aspecto ind1Scutivelmente radamente as regras . area v·10
morais ~r
complementar do desejo_ e da l~i, da lei e da . No decorrer de cada se : 50ciais de11~
transgressão. As discuss~s clín~cas em to~o instala-se o conflito tr ssao de p : .
. . , avado s1c
da perversão, como m~festaçao _patológica as res1stênc1as e defesa d entre O ª'¼1~
ou como solução neurótica, gravitam todas s1'l"enc10 • que eles acarr st o pac1•ente reca1 \li.,"'
. e arn, a . ,ea 9. ,
em redor do status moral da transgressão, da se10 comum do psicanat· ss1rn co 1ei 0
~~ d ~ ~
mesma maneira que o mal-estar sociocultural forçarem essa lei. Esse con . e . o Pacie Odi.
contemporâneo se manifesta em di~ersas di~- projetado e figurado na r 1fh~o Interno /te de
ciplinas, inclusive no seio da comurudade rs1- Pode-se afirmar que tode açao transferenass.1rr,
canalítica, em tomo dos debates sobre a ética. l1'tica é construída , a partia adrefieXao • ps·c1a1
· . r ess 1can
O modelo conflitual que serve de base para ep1stemológ1ca transgress· ª curiasid
1va. A . ªd
a.
a reflexão psicanalítica pode ser observado de enquanto corpus científico h Psicanái•e
. , e Oca-º"
. fron~I !Se,
diversos pontos de vista: segundo o lugar, men te com as 1eis do recal J'C
quer se trate da cena inconsciente, do enqua- também com a moral univequel Interno, n,,:
d a repressao _ sexual, com a rec rsa ou "''V\.lden~1
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dramento da sessão de análise ou da vasta
. enfim, com as no usa dos desejas
reflexão psicanalítica; segundo o modelo de agressivos, 1
. . tíf'
representação escolhido, essencialmente o gica c1en 1ca e.ementar e rednnas
t de 1,,,,"'11aló-
. u ora.
modelo edipiano ou o do parricídio; segundo O modelo ed1p1ano é O ápice d
a escala e esse balanceamento entre nível indi- psicanalítica. O violento desei·o aª co~truíào
- . a criança
vidual intrapsíquico e nível coletivo mais ou re1açao ao gerutor do sexo opost . . em
menos preciso que permite realizar, em inter- desejo agressivo de ocupar O lug: ~:phc_ao
valos definidos, os atos interditados. O carna- do mesmo sexo. Esse desejo é, por s gel\itor
val é um exemplo disso. Os mitos têm o mes- temente reprimido .
em função do ua vez,for.
amor edo
mo papel que os sonhos em relação às leis temor que a cnança sente por esse
• S mesmo
proibitivas internas: "A lenda de Édipo é pro- gerutor. uperar esse conflito é, de certa for-
veniente de uma matéria de sonho arcaica" ma, encontrar o meio de transgredir ad l
(19OOa, cap. III); por último, segundo o modelo m · terd'1çao - do incesto
· e da evicção. Aviolênda up a
de funcionamento escolhido, princípio de pra- agressiva reprimida por ocasião do conflito
zer/ princípio de realidade, pulsão de vi- edipiano tem, sem dúvida, uma origem ante-
da/pulsão de morte, peso do Supereu. rior, mais arcaica; ela provém do desejo de
A transgressão está por toda parte no palco
morte do pai às mãos da horda de irmãos com
do Inconsciente. O funcionamento psíquico o objetivo de possuir, de interiorizaredecon·
testar os poderes paternos autoritários, por
está baseado numa gestão dos conflitos entre
mais vagos e imaginários que sejam.
diversas instâncias. O caráter forma-se em tor-
no de regras de funcionamento que indicam É óbvio que o essencial das manifestaç~
autorizações e proibições. de transgressão no sentido psicanalític? s~ s1•
tua numa escala individual, intraps1quica.
No decurso da evolução, certos momentos Mas Freud percebeu como essa face do ,c~n·
críticos ou de mutação favorecem a tentação flito estrutural do pensamento humano ~ tm·
da transgressão. São os períodos críticos de portante no âmbito dos fenômenos coletivos.
maturação da vida; a evolução é neles rápida, De Totem e tabu (1912-13a) a Ofuturo~: u":°
o comportamento particularmente ativo. Du- ilusao . _ t civ1/iza(ao
(1927c) ou O ma1-es ar na . .0 é
r~nte os primeiros tempos da infância, o pe- (193Oa [1929)), ele mostra que ~ º~~~~rais
nodo anal, a "idade do não" é uma fase no constante entre as forças repressivas . dade
decorrer da qual a criança desafia constante- e "essa qualidade perigosa [•·,] ª proprte de 0
mente a lei parental. Na adolescência ou mais de instigar a ambivalência do ho1:1emde·ção"
precisamente, em certos momentos da lenta induzir a tentar transgre dir. ª. inter
• I
1
é a5ocie-
evolução da adolescência, o sentimento de ex- (1912-13a). Quanto mais repressi~a eleàin•
pansão, de potência nova, e o desejo de desco- dade, mais o recalque organizado ,mp
r
DE MIJOLLA 1921
ALAI N transgressao