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As Síndromes Psicóticas

Campo de Trigo com Corvos, 1890. 50.2 cm × 103 cm (19.9 in × 40.6


in). 
Van Gogh Museum, Amsterdam
ESQUIZOFRENIA

Júlio César Hoenisch

Salvador, 2019
As síndromes psicóticas caracterizam-
se por experiências como alucinações e
delírios, desorganização marcante do
pensamento e/ou do comportamento
ou comportamento catatônico.

(Janzarik, 2003; APA, 2014; CID-11,


2018), citado por Dalgalarrondo, 2019.
• São condições, de modo
geral, de acentuada
gravidade (Schimid, 1991;
Gaebel; Zielasek, 2015).
• O termo psicose tem mais de uma
acepção, inclusive na
psicopatologia;

• Isso dá-se em virtude de que este


campo de saber também divide-se
em escolas.
• Portanto...

• Na orientação psicodinâmica:
tendência a dar ênfase à perda de contato
com a realidade e/ou a distorções muito
marcantes na percepção e na relação
com a realidade.
• O “teste de realidade”:
• é a função do ego em avaliar e julgar de
modo objetivo o mundo externo;

• estaria gravemente prejudicada na


psicose (tal visão tem origem nas noções
de Freud e de Bleuler de esquizofrenia).
Na orientação fenomenológica

Formula que na psicose ocorrem


alterações básicas na estrutura de
experiências fundamentais, como
as do espaço e do tempo. Há,
então, perda de elementos
normalmente compartilhados do
senso comum (a chamada folk
epistemology).
Ocorre transformação de
como o indivíduo se dirige
ao mundo e às pessoas,
uma mudança do vetor da
intencionalidade.
O mundo invade, por assim
dizer, a consciência. Há, assim, a
chamada inversão do arco
intencional da consciência.

Na visão fenomenológica,
profundas modificações do eu
corporal e do senso de agência do
self estariam na base da psicose.
Esse modo de entender o que é
psicose, em certo sentido, se
contrapõe à orientação da
psiquiatria clínica.

Esta dá ênfase à noção de psicose


como presença de sintomas
psicóticos = delírios, alucinações,
desorganizações marcantes de
pensamento e comportamento.
Entretanto:

é consensual que pacientes psicóticos


geralmente têm insight muito prejudicado
(precária consciência da doença) em
relação aos seus sintomas e a sua condição
clínica geral (Mella et al., 2011; Dantas et
al., 2011) apud Dalgalarrondo, 2019.
ESQUIZOFRENIA
É a principal forma de psicose
ou síndrome psicótica, por sua
frequência e sua importância
clínica.
Internacionalmente:

Tem incidência anual (casos novos por ano)


em torno de 15 a 42 por 100 mil habitantes e
prevalência pontual (point prevalence) de
0,4% (4,5 pessoas por 1.000 habitantes).

Dalgalarrondo, 2019.
O conceito de
esquizofrenia
Emil Kraepelin (1856-1926), em 1896 = a
nomeou dementia praecox (“dementia” pela noção
de que a maior parte dos pacientes teria
evolução muito ruim e “praecox” pelo seu início
frequente em jovens e adultos jovens).

Eugen Bleuler (1857-1939) propôs, em 1911, o


termo esquizofrenia, enfatizando à desarmonia
interna do funcionamento mental e à quebra
radical do contato com a realidade que ele
notava nesse transtorno (cisão).
Trata-se de uma entidade clínica estável;
pouco mudou. A maior parte das
descobertas e compreensões dos grandes
mestres da psicopatologia continuam
valendo.

Mesmo o advento dos antipsicóticos não


retrataram mudanças de base, salvo na
condução clínica.
EMIL KRAEPELIN (1856-1926)

• Alterações da vontade (perda do elã vital,


negativismo)
• Aplainamento até embotamento afetivo
• Alterações da atenção e da compreensão
• Transtorno do pensamento, no sentido de
associações frouxas
• Alterações do juízo, da avaliação da realidade
• Alucinações, especialmente auditivas
• Vivências de influência sobre o pensamento
• Evolução deteriorante (83% dos casos) no
sentido de embotamento geral da
personalidade
EUGEN BLEULER (1857-1939)

• Alterações formais do pensamento, no sentido de


afrouxamento até perda das associações
• Aplainamento até embotamento afetivo
• Ambivalência afetiva; afetos contraditórios vivenciados
intensamente ao mesmo tempo
• “Autismo”, como tendência a isolamento psíquico
global em relação ao mundo
• Dissociação ideoafetiva, desarmonia profunda entre as
ideias e os afetos
• Evolução muito heterogênea; muitos casos podem
apresentar evolução benigna
KARL JASPERS (1883-1969)

• Ideias delirantes primárias, não compreensíveis


psicologicamente
• Humor delirante precede o delírio
• Alucinações verdadeiras, primárias
• Vivências de influência, vivências do “feito”
• Analisando-se a vida total do paciente, nota-se que
ocorreu quebra na curva existencial, transformação
radical da personalidade e da existência da pessoa
KURT SCHNEIDER (1887-1967)

• Percepção delirante
• Vozes que comentam a ação
• Vozes que comandam a ação
• Eco ou sonorização do pensamento
• Difusão do pensamento
• Roubo do pensamento
• Vivências de influência no plano corporal, dos
• afetos, das tendências, da vontade ou do pensamento;
De acordo com o CID 11

Podem estar presentes alterações em múltiplas dimensões


mentais e comportamentais, inclusive:

• pensamento (delírios e/ou desorganização da forma do


pensamento)
• percepção (alucinações)
• experiências de alterações do self (experiência de que os
sentimentos,
• impulsos, pensamentos ou atos estão sob controle de forças
externas)
• perdas cognitivas (déficits na atenção, na memória verbal e
na cognição social)
• alterações da volição (perda da motivação)
• alterações dos afetos (aplainamento emocional)
• alterações psicomotoras, inclusive catatonia
• São considerados sintomas nucleares:

• delírios e/ou alucinações persistentes,


transtornos formais do pensamento, experiências
de influência, passividade ou controle.

• Os sintomas devem estar presentes por, pelo


menos, um mês.
No DSM V

Dois ou mais dos seguintes sintomas (de 1 a 5) devem estar


presentes com duração significativa por, pelo menos, um mês:

• Delírios alucinações
• discurso desorganizado
• comportamento grosseiramente desorganizado ou catatônico
• sintomas negativos (embotamento afetivo, alogia, avolição)
• Disfunções sociais, no trabalho e/ou no estudo, denotando
perdas nas habilidades interpessoais e produtivas.
• Duração dos sintomas principais de pelo menos um mês (de
A. 1 a 5) e do quadro deficitário
• (sintomas prodrômicos ou residuais) de pelo menos seis
meses.
Esquizofrenia “simples”:

Neste caso, apesar de faltarem sintomas


característicos, seria observado:

• um lento e progressivo empobrecimento


psíquico e comportamental,
• com negligência quanto aos cuidados de si
(higiene, roupas, saúde),
• embotamento afetivo
• distanciamento social.
Classificação da esquizofrenia em tipos
nos sec. XIX e XX

Esquizofrenia Paranoide:

• Delírios tipicamente persecutórios ou grandiosos,


ou ambos.
• Os delírios podem ser múltiplos.
• As alucinações são relacionada ao tema do delírio.
• A pessoa apresenta ansiedade, raiva, afastamento
e tendência a discussões.
• Pode predispor ao suicídio pelos delírios
persecutórios ou predispor a violência.
Esquizofrenia catatônica:

• marcada por alterações motoras,


• hipertonia, flexibilidade cerácea
• e alterações da
• vontade, como
• negativismo,
• mutismo
• e impulsividade;.
Esquizofrenia Hebefrênica:

• Mudanças afetivas,
• comportamento irresponsável,
• maneirismos,
• pensamento desorganizado e incoerente.
• Tem um mau prognóstico devido ao
embotamento afetivo e rápido desenvolvimento
dos sintomas negativos.
Por que essa classificação mudou no CID 11 e no
DSM V?

Não se revelaram suficientemente úteis, pelas


seguintes razões (Braff et al., 2013):

• não são estáveis ao longo do tempo (pacientes com


frequência “mudam” desubtipo ao longo dos
anos);
• não predizem padrão de evolução da doença;
• não predizem resposta a tratamentos
farmacológicos ou psicossociais;
• são muito heterogêneos em relação às bases
genéticas e neuronais da esquizofrenia;
• a delimitação dos subtipos tem sido cada vez
menos utilizada em pesquisas.
• não são estáveis ao longo do tempo
(pacientes com frequência “mudam”
desubtipo ao longo dos anos);
• não predizem padrão de evolução da doença;
• não predizem resposta a tratamentos
farmacológicos ou psicossociais;
• são muito heterogêneos em relação às bases
genéticas e neuronais da esquizofrenia;
• a delimitação dos subtipos tem sido cada vez
menos utilizada em pesquisas.
• não são estáveis ao longo do tempo
(pacientes com frequência “mudam”
desubtipo ao longo dos anos);
• não predizem padrão de evolução da doença;
• não predizem resposta a tratamentos
farmacológicos ou psicossociais;
• são muito heterogêneos em relação às bases
genéticas e neuronais da esquizofrenia;
• a delimitação dos subtipos tem sido cada vez
menos utilizada em pesquisas.
Mais recentemente opta-se por
enfatizar os sintomas e
comportamentos.

• Daí ser mais de interesse


“estadiar” a evolução da doença
observando-se a progressão e a
regressão desses sintomas e
dimensões sintomatológicas ao
longo do tempo.
Principais grupos de sintomas da
esquizofrenia:

• Sintomas negativos
• Sintomas positivos
• Sintomas de desorganização
• Sintomas psicomotores/catatonia
• Sintomas/prejuízos cognitivos
• Sintomas de humor
Principais grupos de sintomas da
esquizofrenia:

• Sintomas negativos
• Sintomas positivos
• Sintomas de desorganização
• Sintomas psicomotores/catatonia
• Sintomas/prejuízos cognitivos
• Sintomas de humor
Sintomas negativos - (síndrome
negativa ou deficitária):

Os sintomas negativos das psicoses


esquizofrênicas caracterizam-se pela
perda de certas funções psíquicas e pelo
empobrecimento global da vida afetiva,
cognitiva e social do indivíduo.
Principais grupos de sintomas da
esquizofrenia:

• Sintomas negativos
• Sintomas positivos
• Sintomas de desorganização
• Sintomas psicomotores/catatonia
• Sintomas/prejuízos cognitivos
• Sintomas de humor
Os principais sintomas ditos negativos
nas síndromes esquizofrênicas são:
• Distanciamento e aplainamento afetivo ou
afeto embotado;

• retração social ou associalidade.

• Alogia ou empobrecimento da linguagem e


do pensamento, que se constata pela
diminuição da fluência verbal e pelo discurso
empobrecido.
• (avolição), que se expressa geralmente
por diminuição da iniciativa e por
hipopragmatismo,

• Anedonia, diminuição da capacidade


de experimentar e sentir prazer.
Sintomas negativos primários e
secundários:

Primários: decorrentes da própria


esquizofrenia

Secundários: decorrentes dos


antipsicótipicos, isolamento social, depressão.
Relacionados aos sintomas negativos,
surge a negligencia grave para com si
mesmo:

Dentes apodrecidos
Não cuidar do asseio pessoal
Expor-se a riscos, etc
.
Relacionados aos sintomas negativos,
surge a negligencia grave para com si
mesmo:

Dentes apodrecidos
Não cuidar do asseio pessoal
Expor-se a riscos, etc
.
Sintomas positivos (síndrome
positiva ou de sintomas
produtivos):

Alucinações
Ideias delirantes (delírio),
distorção da realidade
Sintomas positivos (síndrome
positiva ou de sintomas
produtivos):

Alucinações
Ideias delirantes (delírio),
distorção da realidade
Max Klinger - "Ängste" (Anxieties) Technique: Etching, size of actual
image: 11 x 23.9 cm
Sintomas de primeira ordem

Proposto pelo psicopatólogo alemão Kurt Schneider


(1887-1967)

• Percepção delirante
• Alucinações auditivas características
• Eco do pensamento
• Difusão, divulgação ou publicação do pensamento.
• Roubo do pensamento
• Distúrbios da vivência do eu.
Sintomas positivos (síndrome
positiva ou de sintomas
produtivos):

Alucinações
Ideias delirantes (delírio),
distorção da realidade
O estudo Schizophrenia, Just the Facts
(Tandon; Keshavan; Nasrallah, 2008; Tandon et
al., 2009), apud Dalgalarrondo, 2019.
As características convergentes da
esquizofrenia, de acordo com esse estudo
são:

1. A esquizofrenia se caracteriza pela combinação


de sintomas positivos, negativos, desorganização,
sintomas cognitivos, psicomotores e de humor;
2. surgimento dos sintomas psicóticos ocorre, de
modo geral, na adolescência e no início do
período adulto.
3. é uma doença crônica, com surtos recorrentes; não há,
de modo geral, remissão completa depois dos surtos.

4. As causas (etiologia) da esquizofrenia não são


conhecidas.

5. A pior evolução se associa a: sexo masculino,


surgimento mais precoce da doença, períodos mais
prolongados sem tratamento (duration of untreated
psychosis), gravidade do acometimento cognitivo
(sobretudo da cognição social) e dos sintomas
negativos.
6 - A diferenciação nosológica entre a
esquizofrenia e outros transtornos mentais graves
pode ser pouco clara, sobretudo com outros
transtornos que ocorram com sintomas psicóticos
(alucinação, delírio e desorganização).

7 - Há considerável heterogeneidade entre os


pacientes acometidos pela esquizofrenia em
termos de bases neurobiológicas, manifestações
clínicas, curso e resposta ao tratamento.
8 - A gravidade dos diferentes sintomas e
clusters (agrupamentos) de sintomas varia muito
entre os pacientes e ao longo do curso da doença.

9 - Há perdas ou acometimentos cognitivos


globais, mas de intensidades muito variáveis,
entre os pacientes.
10 -
Seu início pode ser lento (meses, anos) ou
abrupto (dias, semanas.)

Suas causas não estão estabelecidas, acredita-se


em fatores genéticos e ambientais.

A intervenção no primeiro episódio é


fundamental no prognóstico do paciente.
Cada novo episódio faz com que o paciente
fique cada vez mais desorganizado e cronificado.

Nos homens costuma ser mais precoce do que


nas mulheres.

Difícil diagnóstico (exclusão)

Necessário presença de sintomas por 6 meses,


no mínimo.
TIPOS

Paranoide: Delírios tipicamente persecutórios ou


grandiosos, ou ambos.
Os delírios podem ser múltiplos.
As alucinações são relacionada ao tema do delírio.
A pessoa apresenta ansiedade, raiva, afastamento e
tendência a discussões.
Pode predispor ao suicídio pelos delírios persecutórios
ou predispor a violência.
Esquizofrenia Desorganizada: Os discursos são
desorganizados, comportamento desorganizado e afeto
embotado ou inadequado, risos imotivados.

Leva a uma severa perturbação na capacidade de


executar atividades da vida diária (banho, vestir-se)
Esquizofrenia Catatônica:
Perturbação motora grave, imobilidade ou
atividade excessiva.

Extremo negativismo, mutismo, ecolalia ou ecopraxia.

A imobilidade motora pode manifestar por estupor.

A atividade motora excessiva é aparentemente


desprovida de sentido e não é influenciada por
estímulos externos.
Esquizofrenia Hebefrênica

Mudanças afetivas, comportamento irresponsável,


maneirismos, pensamento desorganizado e incoerente.

Tem um mau prognóstico devido ao embotamento


afetivo, rápido desenvolvimento dos sintomas
negativos.
 
ASSISTÊNCIA DE ENFERMAGEM
INTERNAÇÃO
• Atenção às necessidades individuais
• Orientação (mesmo em situações de surto)
• Riscos
• Autonomia
• Educação
• Efeitos adversos medicamentoso
• Reações adversas do tratamento
ALTA/AMBULATÓRIO
Educação família:
• Aspectos da doença
• Tratamento
• Identificar sinais de reagudização e riscos
potenciais
• Busca por atendimento
• Diminuir reinternações
• Melhor qualidade de vida.
Obrigado!

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