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ECONOMIA DO MAR

Atividade construção, manutenção e reparação naval

Contributo para a reflexão do Futuro da Política de Coesão


Portugal Pós 2020

A localização geoestratégica de Portugal e a capacidade existente de investigação, inovação e conhecimento


do mar, criam condições, através dos seus recursos marinhos e energéticos, para que a Economia do Mar dê
um forte contributo para o crescimento do VAB nacional.

Não basta existirem condições, também é necessário que exista ambição, assente numa estratégia que
favoreça todas as atividades ligadas ao mar. Temos de acrescentar valor às riquezas que o mar nos pode dar,
proporcionando a oportunidade de fornecimento de serviços de construção, manutenção e reparação naval
(Indústria Naval).

Além da localização, Portugal tem condições climáticas únicas na Europa e capacidade técnica para o
exercício da Indústria Naval.

Após a retoma da atividade em Viana do Castelo e na Figueira da Foz, a IN está a viver forte crescimento,
mais acentuados na construção naval, em particular na construção de embarcações de recreio e desporto.
Em 2016, o volume de negócios cresceu 11 %, contra 0 % do crescimento total das Indústrias
Transformadoras, registaram-se elevadas remunerações dos capitais investidos e os empresários
manifestaram uma enorme confiança no futuro do setor, apostando na ampliação dos investimentos
correntes em ativos fixos.

Na área da manutenção e reparação naval militar, está em curso a implementação da Plataforma Naval
Global no Arsenal do Alfeite, S.A., realçando-se o projeto de aumento de comprimento da doca seca em 82
metros e a formação de trabalhadores na empresa construtora dos submarinos, Thyssenkrupp Marine.
Estarão assim criadas as condições para a realização da revisão de submarinos em Portugal, em particular, a
primeira revisão intermédia do submarino Arpão que está prevista decorrer entre 2018 e 2020, pelo
montante máximo global de 24 milhões de euros, conforme consta na Lei de Programação Militar.

A concretizar-se este plano, a manutenção de submarinos em Portugal poderá significar uma profunda
transformação da indústria naval em Portugal, em particular na especialização tecnológica que a construção
naval militar exige e na abertura de novos mercados que a Thyssenkrupp nos poderá proporcionar.

A IN foi um orgulho nacional no passado. Para que o volte a ser no presente é necessário reforçar o potencial
económico estratégico da Economia do Mar, para que seja um dos principais fatores de desenvolvimento de
Portugal, incorporando na sua estratégia o aumento da inovação e competitividade da Indústria.
1. Importância da Economia do Mar e da atividade construção, manutenção e reparação
navais

A Economia do Mar apresenta um crescimento sustentado em Portugal à semelhança do que se passa a


nível global. As atividades relacionadas com o mar representaram 3,1% do VAB e 3,6% do emprego no
quadriénio 2010 – 2013 (Conta Satélite do Mar). Neste período, a atividade económica nacional registou
uma redução acumulada significativa, verificando-se diminuições de 5,4% do VAB e de 10,0% do emprego.

Segundo o INE (CSM), a dimensão relativa do “Mar” no VAB da economia portuguesa comparada com alguns
ramos de atividade das Contas Nacionais, apenas foi ultrapassada pela educação (6,5 %) e atividades da
saúde humana (4,7 %).

A Indústria Naval (IN) representou em média 2,5 % do VAB, 2,7 % do Emprego e 3,5 % das Remunerações, no
conjunto das 9 atividades que constituem a Economia do Mar.

Estrutura do VAB na CSM (por agrupamento)


(2010 - 2013)
9. Novos usos e
recursos do mar
7. Infraestruturas 0,2%
e obras marítimas
1,4% 8. Serviços 1. Pesca,
marítimos aquicultura,
15,8% transformação e
6. Equipamento
comercialização
marítimo
dos seus produtos
3,4%
25,7%
5. Construção, 2. Recursos
manutenção e marinhos não
reparação navais 3. Portos, vivos
2,5% transportes e 1,1%
4. Recreio,
desporto, cultura logística
e turismo 14,5%
35,5%

1.1. Volume de negócios

A IN está a crescer mais do que as outras atividades que constituem a Economia do Mar e da generalidade
das empresas que constituem as indústrias transformadoras (IT). Em 2016, registou-se um abrandamento do
crescimento do volume de negócio (VN) das IN, ainda assim cresceu 11 % contra uma estagnação das IT.

Crescimento do Volume de Negócios


1,60

1,40

Indústrias
1,20 transformadoras

1,00
Construção,
manutenção e
0,80 reparação naval

0,60
2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016

Fonte: INE, Sistema de contas integradas de empresas

Aquele abrandamento do VN ficou a dever-se à redução ocorrida na atividade de manutenção e reparação


naval, que se explica pelo anormal crescimento no ano anterior (antecipação de docagens para
manutenção). O VN de construção cresceu pelo segundo ano consecutivo e em breve, estima-se, que
ultrapasse o VN de manutenção, à semelhança do ocorrido no início da década de 2000.

Volume de Negócios de Construção, Manutenção


e Reparação Naval
300

Milhões €
250

200

Construção
150 naval

100 Manutenção
e Reparação
50

0
2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016
Fonte: INE, Sistema de contas integradas de empresas

1.2. Formação Bruta de Capital Fixo

Nos últimos dois anos, assiste-se a uma grande confiança dos empresários no futuro da atividade de
construção naval. Em 2016, o aumento da capacidade produtiva de construção naval, medido por
investimentos correntes em ativos fixos, cifrou-se em 15,2 M€ na construção naval e 3,8 M€ na manutenção
e reparação naval.

FBCF na construção, manutenção e reparação naval

40
Milhões €

Construção
naval
30
Manutenção e
reparação
20

10

0
2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016

-10
Fonte: INE, Sistema de contas integradas de empresas

1.3. Excedente Bruto de Exploração

Em 2015, último valor publicado pelo INE, os EBE, quer na construção como na manutenção e reparação
naval, registaram crescimentos superiores a 120 %, dificilmente encontrados noutros setores industriais. A
IN revela-se assim como um setor de elevada rendibilidade de exploração e muito boa remuneração dos
capitais investidos.

Excedente Bruto de Exploração


40
Milhões €

30
Construção
20 naval

Manutenção e
10 reparação

0
2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015

-10
Fonte: INE, Sistema de contas integradas de empresas
1.4. Indústria Naval Militar

Na construção naval militar, realçamos terem sido criadas condições para que a Arsenal do Alfeite, S.A.
(AA,SA), retome a atividade de construção naval, com a assinatura de um Memorando para a
contratualização da construção de quatro lanchas salva-vidas, duas delas em 2017.

Na área da manutenção e reparação naval de navios da Marinha, está em curso a implementação da


Plataforma Naval Global, realçando-se o projeto de aumento de comprimento da doca seca da AA,SA, em 82
metros, que possibilitará a realização da primeira revisão intermédia do submarino Arpão. Esta decorrerá
entre 2018 e 2020, pelo montante máximo global de 24 milhões de euros de acordo com o planeamento
estabelecido na Lei de Programação Militar, aprovado pelo Senhor Ministro da Defesa Nacional.

As ações de manutenção do submarino Tridente serão realizadas entre 2016 e 2018, pelo valor máximo total
de 23,99 milhões de euros, pela empresa construtora dos submarinos, Thyssenkrupp Marine Systems GmbH
(TKMS), que detém o conhecimento exclusivo de determinadas áreas tecnológicas dos submarinos tipo
209PN.

A Thyssenkrupp e o Arsenal do Alfeite (AA, S.A) encontram-se a desenvolver um trabalho conjunto, cujo
objetivo central consiste em capacitar a empresa portuguesa para desenvolver trabalhos de reparação e
manutenção dos submarinos Tipo 209N. Uma equipa do AA, SA, está a acompanhar a revisão do Tridente na
Alemanha, esperando-se que esta cooperação permita que a Arsenal do Alfeite participe na primeira revisão
intermédia do Tridente, e que a intervenção no Arpão possa ser já efetuada em território nacional nos
estaleiros da Arsenal do Alfeite.

A concretizar-se este plano, considerando que em 2016 a AA,SA, vendeu serviços de manutenção de cerca
de € 14 milhões, a manutenção de submarinos em Portugal poderá mais do que duplicar o VN da AA, SA, e
vai significar uma profunda transformação da indústria naval em Portugal, em particular na especialização
tecnológica que a construção naval militar exige e na abertura de novos mercados que a Thyssenkrupp nos
poderá proporcionar.

2. A evolução recente e perspetivas da economia do transporte marítimo

A indústria naval tem como maior mercado de procura a manutenção e construção de navios mercantes, em
particular a manutenção no caso específico de Portugal.

O transporte marítimo é a base da globalização e está no cerne das cadeias de abastecimento e do comércio
internacional. Os volumes mundiais do comércio marítimo são estimados pela UNCTAD 2016, em mais de
80% do comércio total mundial de mercadorias e em valor entre 55% e mais de dois terços do total de
mercadorias

A forte redução da procura de transporte marítimo, observada nos últimos anos, levou à falência muitas
empresas de transporte por operarem com baixas ou negativas margens de lucro. Nas fases negativas do
ciclo económico, os atores do transporte marítimo e os estaleiros de construção deveriam ter-se adaptado à
procura. As empresas de transporte marítimo não reduziram suficientemente as encomendas de novas
construções, aproveitando os preços abaixo do custo de produção, praticados pelas grandes potências de
construção naval asiáticas, China e Coreia do Sul e, deste modo, contribuíram para uma sobre capacidade da
oferta de transporte e consequentes resultados negativos de exploração.
O desequilíbrio entre a oferta e a procura de transporte marítimo levou à redução das taxas de afretamento
de navios. Segundo dados da Clarkson Research, a taxa de afretamento a um ano do graneleiro tipo Capesize
(150.000 TPB), em 2008, atingiu o valor médio anual de 111.529 US$/dia, o qual caiu para 8.236 US$/dia em
2016. Nos primeiros 4 meses de 2017, as taxas de frete dos navios tanque VLCC (Very Large Crude Carriers –
310.000 TPB) continuaram a evoluir negativamente.

Taxas de afretamento a 1 ano


Milhares $/dia
Petroleiro 310,000 tpb
Moderno
90
Graneleiro Capesize
Moderno
60

30

0
2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017
mai

Segundo dados da Clarkson Research, a frota ativa de navios tanque cresceu 6,3 % em 2016, depois de ter
crescido 2,5 % no ano anterior, reforçando o excesso de capacidade da oferta de transporte e
consequentemente da redução das taxas de afretamento de navios, tendo caído 24,5 % em 2016, para o
valor médio anual 36.585 US$/dia.

Crescimento anual da economia e frota existente


(%)
20

16
PIB mundial
12
Petroleiros ativos
8 5,3 5,1 >10.000 m tpb
3,9 3,2 3,5 3,4 3,1 3,5
2,8 3
4 Graneleiros ativos
>10.000 tpb
-0,6
0
2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017
-4 prev

Entretanto o setor marítimo está a sofrer profundas alterações estruturais que afetam negativamente quase
todos os segmentos da indústria naval e que se refletem na redução da procura de novas construções e de
manutenção/reparação naval. Neste contexto, são de relevar:

 A transformação da indústria de transporte marítimo numa atividade especulativa, em que as empresas


de transporte retiraram a maioria dos seus navios do mercado de afretamento a tempo, optando pelo
frete à viagem o que leva a uma grande variação das taxas de frete e a uma grande
instabilidade/redução da procura de construção e também de manutenção/reparação naval.
 A mutação do comércio mundial no sentido da diminuição das distâncias de transporte, com os
exportadores a incorporar cada vez mais valor às matérias-primas ou a aproximar a produção dos
centros de consumo.

No ano de 2016, às razões atrás invocadas somam-se outras de carácter conjuntural, tais como:

 Redução do Produto Interno Bruto (PIB) mundial e da drástica queda da produção industrial (PI) nos
países da OCDE, tal como no ano anterior, provocando redução na procura de transporte.
 Menor crescimento do transporte mundial de bens e mercadorias, em volume e distância, relativamente
ao crescimento da economia, em particular do transporte de petróleo bruto e menor participação dos
países da OPEP nas exportações.
 Financiamento dos governos da Coreia do Sul e da China, maiores potências mundiais de construção
naval, para a viabilização dos seus estaleiros de construção naval, que desta forma concorrem em
vantagem com os estaleiros europeus.
 Redução global da procura de construção naval, pela conjugação do excesso de oferta do transporte
marítimo com a entrega de navios encomendados antes do início da crise do subprime.

Nos 4 primeiros meses de 2017, a economia tem mostrado sinais de crescimento, impulsionado pela
evolução positiva do PIB dos EUA, embora o transporte marítimo de bens e mercadorias não tenha
acompanhado o crescimento do produto.

Os analistas internacionais do transporte marítimo preveem que a procura de construção naval deverá
aumentar nos próximos anos, embora com níveis relativamente baixos. O aumento espectável das
necessidades de transporte e as restrições ambientais irão influenciar a necessidade de
renovação/conversão da frota mercante mundial. Sectorialmente preveem uma pequena recuperação das
margens de lucro na operação das frotas mercantes em 2017, particularmente nos segmentos do transporte
de granéis sólidos e de carga contentorizada.

A tendência de crescimento, desde o início de 2016, do índice “Baltic Dry Index”, índice que resulta de uma
média compensada de afretamentos das principais rotas mercantes de granéis sólidos, permite perspetivar
um crescimento sustentado do transporte marítimo e porventura da economia mundial (por ser um índice
avançado da economia mundial).

Índice Baltic Dry Index


1600

1400

1200

1000

800

600

400

200

0
02-01-15
02-02-15
02-03-15
02-04-15
02-05-15
02-06-15
02-07-15
02-08-15
02-09-15
02-10-15
02-11-15
02-12-15
02-01-16
02-02-16
02-03-16
02-04-16
02-05-16
02-06-16
02-07-16
02-08-16
02-09-16
02-10-16
02-11-16
02-12-16
02-01-17
02-02-17
02-03-17
02-04-17
02-05-17
02-06-17
02-07-17
02-08-17
02-09-17

Fonte: Clarkson Research

Contrariamente, no transporte de petróleo bruto, fruto da estagnação da produção global e da redução da


produção no Golfo Pérsico, que implica menor distância de transporte, a acrescer ao aumento da capacidade
de oferta de navios tanque, estimam-se reduções das taxas de afretamento a tempo, superiores a 20 %.
Também se fazem notar sinais moderados de retoma económica nos mercados offshore, reflexo do
aumento do preço do petróleo relativamente ao ano de 2016.
Construção naval mundial

A conjugação dos fatores anteriormente referidos explica que a construção naval mundial esteja em queda e
que, em 2016, tenha ocorrido a maior crise da construção naval na última década, com a produção mundial
a cair 2,7 %, sendo essa queda liderada pela China, cuja produção caiu 13,5 %.

Produção mundial de construção naval


(milhões TBC )

EU 27 +
Noruega
China

Coreia do
Sul
Japão

2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016

Fonte: Sea Europe - IHS-Fairplay

Muitos estaleiros encerraram em todo o mundo, embora bastantes estaleiros asiáticos se mantivessem
abertos, beneficiando dos auxílios financeiros dos respetivos estados e com alguns diversificando a sua
atividade para o mercado de conversão e reparação naval.

De facto, a crise que ocorre na construção naval foi precedida pela recessão económica iniciada em 2008,
tendo provocado, entre 2007 e 2009, uma queda de 80,6 % da procura de novas encomendas, expressa em
toneladas brutas compensadas (TBC), que por sua vez, face ao crescimento da produção (satisfação das
encomendas em carteira), resultou numa queda de 52,5 % do número de encomendas, no período 2008 –
2012.

A partir de 2013, face ao menor crescimento do transporte marítimo de mercadorias, iniciou-se uma fase
negativa do ciclo da procura de novas construções, que, em 2016, caiu 26,4 %. A China e a Coreia do Sul
foram responsáveis por este valor, dado que a procura nestes países diminuiu 75 % e 80 %, respetivamente.
Em 2017, a crise aprofundar-se-á dado que, como referido, as encomendas de novas construções caíram 75
%, provocando uma descida da carteira de encomendas em 20 %.

Construção naval global


(milhões TBC)
Novas Encomendas
Carteira encomendas
Produção

2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016
Fonte: Sea Europe - IHS-Fairplay

Reparação naval mundial

A procura mundial na indústria de reparação, conversão e manutenção de navios mostrou uma maior
resiliência a todos os fatores estruturais e conjunturais, não deixando, todavia, de registar reduções
significativas no que respeita ao volume de negócios, incidindo particularmente os estaleiros de grande
dimensão.
No caso concreto da Europa, à redução da procura na indústria de reparação, conversão e manutenção,
acresceu a competição proveniente dos estaleiros de construção que reconverteram a sua atividade para a
reparação naval.

A manutenção, reparação e conversão (MR&C) naval de navios de grande porte, sofreu os mesmos
constrangimentos da construção naval por falta de liquidez financeira dos armadores para investir na
conversão dos navios às novas exigências das Convenções Internacionais (IMO) e Diretivas Comunitárias e na
correta manutenção das suas frotas.

A imposição das Convenções da IMO e das Diretivas da Comissão Europeia relativamente à segurança e
proteção ambiental, em particular no que respeita à regulação das emissões de (SO)x e CO2 e Controle e
Gestão da Água de Lastro e Sedimentos de Navios irão criar oportunidades para os estaleiros nacionais de
maior dimensão e para as empresas de projeto e fornecedores de equipamento, pela exigência de converter
grande número de navios em prazos, em algumas situações, muito limitados de tempo.

Dado o elevado preço da instalação daqueles equipamentos, alguns armadores procederão à substituição
dos navios de maior idade ou à conversão daqueles navios que ainda têm um período de vida útil que
justifique o investimento.

Construção naval europeia

Num contexto altamente competitivo e globalizado, o sector europeu da construção naval enfrenta graves
desafios desde 2008, resultando numa significativa reestruturação das empresas.

Nos últimos anos, a indústria naval europeia não sofreu quebras financeiras idênticas às registadas nos
estaleiros asiáticos, tendo demonstrado maior resiliência à crise. Há já alguns anos que os estaleiros
europeus diversificaram o seu mercado, para a construção de navios especializados, tecnologicamente mais
evoluídos e sofisticados, com um elevado valor comercial, de entre os quais sobressaem os navios de
passageiros, que registam uma procura muito elevada e, também, dragas, navios de apoio ao offshore, Oil &
Gaz e aproveitamento de energia e exploração de recursos marinhos, atividades que não dependem do
transporte marítimo. Também encerraram estaleiros, quer por não se terem adaptado a um mercado
diferente daquele dos estaleiros asiáticos, ou por estarem dimensionados e vocacionados para navios de
transporte de grande porte, ou muito dependentes do mercado offshore. Conforme é visível no gráfico
seguinte, a retoma europeia (União Europeia mais Noruega) iniciou-se em 2012. Em 2017, existem sinais de
retoma económica nos mercados offshore, reflexo do aumento do preço do petróleo relativamente ao ano
de 2016.

Construção naval na UE + Noruega


(milhões TBC)
20
Novas Encomendas
Carteira encomendas
15
Produção

10

0
2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016
Fonte: Sea Europe - IHS-Fairplay

Tal como aconteceu na China e na Coreia do Sul, em 2016, a procura de novas construções também caiu,
mas apenas 15,7 % e ao contrário daqueles países a produção europeia subiu 38,5 %. Face à capacidade de
produção daquelas regiões, é possível concluir, que o número de anos de produção face à atual carteira de
encomendas, em 2016, aumentou na Europa de 2,7 para 3,3 anos, contra uma manutenção em 3 anos, nas
outras regiões.

N.º de anos de produção face à carteira de


encomendas
5,3 Mundo
4,6 Europa
4,0
3,8 3,7 3,5 3,7
3,0 3,3
4,2 2,7
3,7 3,7 2,5 2,5
2,2
3,0 1,9 3,0
2,9 2,7
2,4 2,4 2,3
2,1
1,6

2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2.016
Source: Sea Europe - IHS-Fairplay

Se a análise de mercado se fizer em USD em vez de TBC, a situação da construção naval europeia é mais
positiva, devido ao seu maior conteúdo tecnológico e valor, resultando num crescimento da sua quota de
mercado, que subiu de 10 % em 2015 para 16 % em 2016. A evolução menos negativa das encomendas
recebidas pelos estaleiros europeus, que ainda assim registou um valor de € 18 mil milhões, correspondente
a 52 % do total mundial.

Valor novas encomendas construção naval em


2016
(10*9 USD)
18

7,4
3,9
2,5 1,8
0,5 0,5

Coreia do China Japão Europa Brasil EUA Resto


Sul Mundo

Fonte: Sea Europe - Clarkson

3. O contexto da indústria naval em Portugal

A indústria naval portuguesa está sujeita aos mesmos condicionamentos e oportunidades da indústria
europeia, devendo por isso seguir o seu exemplo no que respeita à especialização e inovação. As
oportunidades são muitas, fruto da implementação de conversões e adaptações dos navios ao cumprimento
de Requisitos Regulamentares Internacionais mais rigorosos e de alterações para aumentar a sua eficiência
operacional. Do mesmo modo, a digitalização do transporte marítimo proporcionará novas oportunidades
para conversão dos navios existentes a par da incorporação em novas construções.

Como foi referido, a construção naval europeia é líder mundial, no que respeita à construção de navios
especializados, mercê da inovação tecnológica dos produtos e processos produtivos. A IN é hoje uma
indústria tradicional que incorpora elevada tecnologia e inovação, condição necessária para ser competitiva.
O mesmo acontece na indústria naval nacional.

Em Portugal, a manutenção e reparação naval de grande dimensão, que concorre no mercado mundial,
exige o domínio de tecnologias de ponta. Como exemplo, para responder à procura de conversão de navios,
para cumprir com as imposições das Convenções IMO e Diretivas da CE, como atrás referido, os estaleiros
utilizam a tecnologia LASER, modelação 3 D, a partir da vectorização da nuvem de pontos, e posterior
tratamento AUTOCAD, para levantamento dimensional dos sistemas e estruturas das partes dos navios onde
vão ser instalados os novos equipamento e sistemas (engenharia inversa). Esta mesma tecnologia Laser é
utilizada para otimização do modelo matemático em elementos finitos, para modelação da flexão das lajes
de betão do fundo das docas, na qual assentarão os berços em que os navios vão assentar.

Na construção naval podemos referir dois casos de inovação do produto. Está em curso o projeto de
investimento, a iniciar no segundo semestre de 2017, num estaleiro de construção e reparação de Mega-
Iates. A construção de Mega-Iates é muito exigente no que respeita à responsabilidade de cumprimento de
exigências tecnológicas e prazos de entrega, entre outras. Para este projeto foi contratada uma equipa de
quadros técnicos com Know-How dos estaleiros similares holandeses. O investidor conta já com uma
encomenda de 6 Iates no valor de 193M€. O investimento previsto, segundo a empresa, anda na ordem dos
30M€. Também na Madeira está prevista a transformação de um estaleiro já existente, para a reparação de
Mega-Iates.

4. Limitações à competitividade da construção e reparação naval nacionais

Os estaleiros nacionais para competirem no mercado internacional e entrarem em mercados mais


especializados, têm de investir mais na I&i e na qualificação da mão-de-obra. No nosso país não existe mão-
de-obra com as qualificações que a indústria naval necessita, não existe oferta de formação dedicada, senão
aquela que é dada pelos estaleiros, sem quaisquer incentivos. É urgente reforçar os referenciais de formação
para esta indústria, que constam no Catálogo Nacional de Qualificações.

Defendemos, face ao que se escreveu, que a indústria naval seja considerada uma indústria estratégica. A
construção naval em Espanha necessitou deste reconhecimento, a partir do qual, se abriram apoios para
incentivos ao investimento produtivo, à facilitação de financiamento e garantias bancárias e à qualificação
da mão-de-obra.

O Programa Nacional de Reformas do XXI Governo Constitucional considera a economia do mar, um ativo
central para o desenvolvimento económico do país, mas apenas apresentou uma estratégia para o aumento
da competitividade portuária para os próximos dez anos, sendo omisso quanto à construção, manutenção e
reparação naval.

Assim, propõe-se que no Capitulo 4. Portugal e o Futuro da Política de Coesão, no objetivo – Reforçar o
potencial económico e estratégico da Economia do Mar, seja crescentada a IN, ficando a seguinte redação:

 Melhoria da competitividade do sistema portuário, do transporte marítimo e da construção,


manutenção e reparação navais.

AIN, 10/10/2017

José Ventura de Sousa


Secretário-Geral da AIN

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