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Nascido no reino de Alanor, na cidade de Caedyr no extremo leste do Cinturão

de Tenkoff, um dos nove reinos das terras centrais, Balder tinha oito anos e era o filho
de Asimus Helgarth e seu único herdeiro. A família Helgarth era da alta nobreza de
Alanor e uma dentre os grandes senhores de terra. O nome Helgarth remonta aos
tempos antigos, onde as lendas se perdem no tempo. Segundo uma destas lendas,
cantadas ao som do alaúde dos bardos, os Helgarths eram aqueles que traziam luz
aos mais fracos e necessitados nos tempos de escuridão.
Seus pais eram bons governantes e amados por todos nas terras de Caedyr.
Asismus era um Senhor justo e correto com o seu povo, era responsável por manter a
fronteira com os demais reinos pela parte norte, guarnecida. Os guardas de Caedyr
eram orientados e treinados a agirem sempre com justiça e nobreza, pois estes eram
representantes da família Helgarth. Quando por algum motivo algum servo da nobreza
de Caedyr agia com injustiça ou crueldade, este era repreendido com tal severidade
que há muito não se escuta sobre nenhum abuso de poder. Desta forma a família
Helgarth segue cumprindo seu papel junto ao rei, e ao mesmo tempo fazendo de suas
terras um lugar justo e bom para se viver.
Balder apesar de ser um nobre, ainda era uma criança, e sempre se perdia em
bagunças e molecagens junto aos seus amigos, a maioria filhos de servos da família.
Este sempre que conseguia uma folguinha entre seus estudos e treinamentos
aproveitava para correr e brincar com as outras crianças. Mas com o avanço de sua
idade, o tempo que lhe sobrava era cada vez menor, pois já dedicava muitas horas às
praticas de equitação, esgrima, arquearia, cavalheirismo, estudava línguas, geografia,
Heráldica, engenharia, religião, história e muitas outras praticas que roubavam o seu
precioso tempo de brincadeiras. Nas práticas de combate passou a ter certa
predilência por armas de haste, preferindo lanças longas, glaive e outras. E por mais
que Asimus fizesse questão de reforçar o treino com a espada, Balder acabava por se
destacar com as armas longas. Dado ao fato que o garoto manejava a espada com
certa facilidade Asimus acabou cedendo, e procurando um instrutor adequado para
armas de haste.
Numa noite, após uma longa refeição à mesa junto aos seus pais, e cansado
das inúmeras horas dedicadas ao estudo e treinos, Balder tendo a autorização de
seus pais se retira mais cedo para o quarto, pois já estava a ponto de dormir sobre o
prato de comida a sua frente. Após se trocar e “cavar” um caminho debaixo das
pesadas mantas e cobertores, pois estavam na época das águas, os ventos fortes, as
chuvas constantes e o frio eram constantes praticamente todos os dias. Nesta mesma
noite, Lyria deixando seu marido na biblioteca após o jantar, como de costume se
dirige ao quarto do filho, a fim de verificar se está tudo bem, e lhe dar um beijo de boa
noite, como fazia todas as noites desde que Balder havia nascido. Se aproximando do
quarto do filho, ao escutar gritos, ela adentra apressada, e o vê se remexendo pela
cama em quanto gritava, Balder estava tendo um pesadelo, neste momento Lyria se
senta ao seu lado e de forma materna e tenra, tenta acalmá-lo, aos poucos o garoto
vai se acalmando e acaba por acordar. Balder ainda com o olhar assustado, nos
braços de sua mãe, começa a contar sobre o pesadelo que havia tido. Ela aos poucos
vai conseguindo acalmar o filho e o convence que tinha sido apenas um sonho e que
logo esqueceria tudo aquilo. Não foi tão rápido quanto sua mãe havia dito, mas Balder
acabou esquecendo-se do pesadelo, o qual nunca mais tornou a ocorrer e passou a
ser apenas uma lembrança, raramente recordada.
Lyria, era de família nobre, nascera em Evorin, se casou com Asimus por
questões políticas, para firmar uma aliança entre Alanor. No início teve dificuldades na
aceitação de Asimus, pois apenas o conhecera no dia do casamento. Mas com o
tempo e a convivência, foi percebendo e descobrindo nele o amor, a cada detalhe, a
cada olhar, nas inúmeras virtudes presentes naquele homem que se faziam tão
marcantes, e davam ao mesmo todo um ar de nobreza, muito além das posses, algo
como a honra imaculada de um cavaleiro. E com o tempo esse amor foi crescendo e
tomando forma, e com a chegada de Balder, passaram a ser realmente uma família.
Balder, já com 12 anos, era um garoto muito esperto, estudioso e dedicado,
vinha se moldando num autêntico cavalheiro, um Helgarth não só de sangue e nome.
Mostrava-se com iniciativa, junto aos colegas, exercia liderança e dado ao porte
herdado do pai se destacava nas lutas durante os treinos e nas brigas com outros
jovens. Nesse ano, eles fariam uma visita às terras de sua mãe em Evorin, para rever
seus avós maternos. Seria sua primeira viagem para fora de Alanor. Até aquele
momento já havia tido a oportunidade de viajar com seu pai por suas terras, visitar até
mesmo a capital, mas jamais havia saído de Alanor. O dia se inicia, o céu estava limpo
de um azul forte e o sol altivo em seu lugar acima das nuvens, as carruagens estavam
enfileiradas, os soldados montados em seus cavalos, as rodas começavam a girar.
Balder não se aguentava de expectativa, ia olhando tudo ao seu redor. Viajava ao lado
do velho condutor, pois pedira ao seu pai para que o deixasse ir ali, onde pudesse
apreciar melhor a viagem. Aos poucos Caedyr ia ficando para trás em quanto às
montanhas de Galmagh em seu lado direito se faziam imponentes. A viagem se fazia
na forma de uma pequena aventurar para Balder, ela seguia de forma tranquila, mas
propiciava para uma criança ainda marcada pela inocência a alegria das coisas
simples. A cada parada um novo piquenique, aproveitava para explorar as coisas ao
seu redor, mas sempre mantendo certa distância como havia orientado sua mãe.
Olhava atento para as plantas e montanhas, acompanhava com os olhos os soldados
atentos em serviço, observava os pássaros, tudo era especial aos olhos de Balder,
principalmente o fato de a viagem ser feita por toda a família reunida. A pedido de
Asimus a comitiva saiu um pouco fora de seu caminho, ele queria mostrar algo ao
filho, após algumas horas de viagem, com o sol já se pondo, chegam ao lugar onde
Asimus mostra ao seu filho onde Alanor, Fanor e Evorin se ligavam e se dividiam
através da fronteira que os separava. Ambos, Asimus e Balder conversaram a sós por
alguns momentos, aquele fora um momento entre pai e filho. Agora estavam mais
próximos de Everill do que de seu destino que era Grain. Como a noite já caíra sobre
suas cabeças, acamparam ali mesmo e desfrutaram de um alegre divertido jantar. Um
dos soldados que era habilidoso com o alaúde e com as palavras, fez alegres e
divertidos contos criados de improviso sobre a viagem que estavam tendo.
Na manhã seguinte retomaram o caminho mais ao norte, visto que Grain
estava na fronteira mais para as encostas de Galmagh, ainda levariam alguns dias até
chegar ao seu destino, quanto mais ao norte se dirigiam maiores e mais imponentes
se tornavam as montanhas a sua frente. Após alguns dias já tendo cruzado a fronteira
entre Alanor e Evorin, já era possível avistar as fazendas e casas ao redor de Grain,
aos poucos iam passando pelos campos, em algum momento vinha um aceno ou
cumprimento por parte dos fazendeiros pelo caminho, um pouco a frente, encontraram
com alguns soldados, trajando armaduras simples, com a peitoral de aço e em seu
centro o escudo prata com cruz dourada, símbolo de Evorin e dos cavaleiros da
Ordem da Luz. Ao perceberem aquela grande comitiva e soldados com símbolos da
casa de Helgarth, se aproximaram a fim de identificar de quem se tratava, mas já
haviam sido orientados que seriam visitados pelo Lorde Asimus de Alanor e passaram
a conduzir os mesmos pelo caminho mais rápido até o castelo de Grain.
Balder estava inquieto, olhando tudo ao seu redor, intrigado com as novidades
e muitas coisas que não via em sua cidade. Além disso, seria a primeira vez que iria
conhecer seus avós, os pais de Lyria. Quando nascera, sua mãe o havia trazido até
eles para que os mesmos o conhecessem, mas não se lembrava do fato, pois era
apenas um bebê na época. Sabia apenas que seu avô se chamava Asthan e sua avó
Nyana, nada mais conhecia sobre eles. Passando pelas ruas da cidade com algumas
barracas, lojas e alguns comerciantes com suas carruagens cheias a transitar de um
lado ao outro buscando vender e trocar suas mercadorias. Aos poucos iam se
aproximando do castelo, o mesmo já era visível a Balder que o olhava nos mínimos
detalhes. Uma enorme construção acima das demais se destacava pela altura e
enormes vitrais, fora construída com as costas coladas nas montanhas de Galmagh, à
frente uma enorme e maciça muralha com cerca de seis metros de altura cercava e
protegia o castelo, duas grandes torres de vigília uma de cada lado se tornavam
pequenas se comparadas às altas torres do castelo mais ao fundo. Passaram pelo
enorme portão de entrada, e o castelo se tornou mais imponente visto de perto, um
largo e pavimentado caminho levava até à entrada do castelo, em suas laterais jardins
bem cuidados, e ao meio de uma espécie de “praça” uma enorme fonte com a estátua
de uma mulher, onde de suas mãos saiam água a alimentar a fonte principal que por
sua vez através de finos dutos parecia irrigar todo o jardim, que devido ao céu limpo e
o sol a brilhar tornava-o muito mais majestoso do que realmente era. O castelo
possuía muitas janelas com bonitos vitrais dando um colorido à construção cinza.
Quando a comitiva parou à porta do hall de entrada um casal de velhos
cercados por vários empregados os aguardava com sorrisos nos lábios, estes eram o
senhor Asthan e a senhora Nyana. Asimus e Lyria desceram e cumprimentaram o
casal, Balder aguardava mais atrás como mandavam os bons costumes, até que foi
chamado e apresentado aos seus avós.
Aos poucos todos iam sendo acomodados em seus quartos, os empregados se
ocupavam das bagagens, os soldados foram conduzidos a um alojamento na parte
externa da casa, banhos foram preparados e mais tarde teriam um grande jantar de
boas vindas para comemorar a vinda do jovem Balder. Durante o jantar Lyria e Nyana
conversaram bastante, coisas de mulheres, de mãe e filha, em quanto Asimus e
Asthan conversaram pouco, ao tempo que aproveitavam a comida e a bebida que
eram servidos. Sentado à mesa Balder prestava bastante atenção a tudo que era dito,
observava os vários quadros pendurados pelo grande salão, já havia comido mais do
que o de costume. Após o jantar mãe e filha se dirigiram para uma sala a fim de
conversarem por mais algum tempo, em quanto Balder que já vinha se perdendo em
longas piscadelas fora conduzido ao seu quarto onde rapidamente adormeceu. Asimus
e Asthan foram para o escritório do grande salão para em fim tratar dos assuntos de
homens, das políticas, em quanto saboreavam um forte rum. Algumas horas se
passaram, e Balder que estava num sono profundo em seu quarto, acorda com um
barulho vindo do corredor, algumas vozes, gritos, o som seco como o bater de um
martelo, outro barulho como o de um jarro se partindo ao cair no chão, o jovem mais
que inquieto, começa com algum receio a sair de sua cama, meio assustado, mas ao
mesmo tempo superando o medo que crescia em seu coração que naquele momento
estava mais do que acelerado. Quando dava alguns passos em direção à porta, essa
abriu bruscamente, Lyria entrava agitada chamando o nome do filho, nesse momento
uma imagem a muito perdida no passado veio à mente do jovem que estava
paralisado diante da mãe. O garoto tentava balbuciar algumas palavras em quanto era
empurrado para debaixo da cama por sua mãe, Balder naquele momento viu uma
cena que permearia os seus sonhos por longos anos vindouros. Sua mãe agachada
próxima à cama, com lágrimas a escorrerem pelo rosto, em quanto mantinha um
sorriso no rosto e dizia ao filho que tudo ficaria bem, e que este deveria se manter
forte não importando as dificuldades. E no brilho dos olhos da mãe, naquele rosto
aterrorizado, um sorriso sincero nos lábios que diziam:
“Eu te amo meu filho, sua mãe sempre te amará”.
Nesse momento Balder via por de baixo dos lençóis que pendiam por cima da
cama, sua mãe ser arrastada bruscamente em quanto uma luz esverdeada tomava
conta do quarto, da direção da porta passos adentravam o recinto, em quanto Lyria se
debatia a gritava, Balder com o coração prestes a explodir de tanto que pulsava rápido
e forte, via em seus pensamentos as lembranças do passado, bem ali, bem diante dos
seus olhos, aterrorizado por tudo aquilo, não fora capaz de mover um único musculo
sequer, respirava com bastante dificuldade, não havia ao menos notado a grande
quantidade de lágrimas que vertiam de seus olhos, assim como não notara que de
tanta força que arranhava inconscientemente o chão havia ferido gravemente as
pontas dos dedos de ambas as mãos. Junto ao som dos passos que adentrava no
quarto, uma silhuete moldada pela luz esverdeada, desenhava no chão próximo a
cama uma sombra, a sombra de um homem. Balder apenas pode escutar sua voz,
que era seca e cansada como a de um velho, mas tinha algo de estranho, algo de
peculiar, como um chiado. Aquela silhueta dizia como que para ninguém, como se
falasse consigo mesma:
“Um dia de cada vez, um dia para que a luz se perca na noite e jamais torne.
Assim tem sido e assim será”.
Perdido nas palavras daquela voz e nas lembranças aterrorizantes que lhe
tomavam a mente, Balder não havia percebido que sua mãe jazia inerte no chão logo
a sua frente. Não notou em que seus últimos instantes tentaram balbuciar algo para
ele. Perdido no medo, na escuridão e no frio que tomam conta de seu corpo. Aos
poucos os gritos foram sumindo, aos poucos os sons se foram, aos poucos um
silêncio velado tomava conta do castelo de Grain. Mas Balder também não havia
percebido isso. Em sua mente apenas a imagem de sua mãe morta diante dos seus
olhos. Lá fora as coisas se acalmavam, em quanto apenas uma voz temerosa ecoava
pelos corredores daquele enorme castelo. Era Asimus a clamar pelo nome da esposa
e filho. Ao adentrar o quarto do filho ficou alguns instantes parado diante do corpo de
sua esposa, mas mesmo chocado, se agachou, a pegou no colo em quanto a
abraçava forte, como que se assim ela não pudesse partir. Em seus olhos lágrimas
vertiam de uma forma singela, certo cansaço se abatia sobre aquele enorme guerreiro.
Foi no momento em que deitava o corpo da esposa no chão com tal delicadeza que o
tempo parecia estar congelado, que notara o filho deitado em baixo da cama. Asimus
chamou por seu nome algumas vezes, puxou-o pelo braço, teve que fazer alguma
força a fim de tirar o filho de baixo da cama, este parecia estar perdido, não expressa
nenhuma reação, e foi somente depois de algum tempo, no calor dos braços do pai,
que o jovem se recobrou e seus olhos verteram em lágrimas constantes.
No quarto em pé algumas pessoas presenciaram aquela cena de tamanha
tristeza, o filho perdido em lágrimas nos braços do pai, que de alguma forma tentava
se manter firme, e ao lado de ambos, no chão, o corpo frio e pálido de Lyria.
Em pé, próximos, estavam Asthan, Dogmar e alguns servos da família
Uthidrasker. Aquela cena permaneceu por um longo tempo, sem que alguém tivesse
coragem de dizer uma única palavra se quer. Até que com passos apressados vindo
do corredor, um dos guardas do castelo veio relatar o andamento das ordens do
senhor Asthan, nesse momento todos se retiraram do quarto em quanto o garoto era
levado para o quarto do pai, lá algumas servas do castelo lhe prestavam atenção, e
após muita insistência fizeram que o jovem tomasse um chá e pouco depois viesse a
desmaiar num sono pesado.
Já no início da tarde do dia seguinte, Balder acorda e levanta da cama com
certo temor, de que tudo não tivesse sido apenas mais um sonho, como o ocorrido no
passado. E logo viu o pai, uma figura cansada e tomado pela tristeza, jogado sobre
uma cadeira no quarto, este pareceria dormindo se não fossem as lágrimas que
vertiam de seus olhos. Neste momento Balder não conseguiu se conter, mesmo que
diante do pai tivesse feito uma enorme força e também começa a chorar. Nesse
momento Asimus nota que o filho havia acordado e se senta ao lado do mesmo na
cama. Nenhuma palavra foi dita.
Os dias foram passando, aos poucos as coisas no castelo foram tomando seus
devidos lugares, um enterro fora organizado para Lyria e todos os que haviam morrido
naquela noite, pois vários soldados e servos tinham sido vítimas daquele ataque,
alguns dias de luto tomaram conta de Grain. Balder fora apresentado ao amigo de
Asimus, Dogmar, que já vinha se fazendo bastante presente nos últimos dias. Não fora
descoberto muito sobre os atacantes daquela noite nem o motivo por trás do ocorrido.
Balder passou a conversar bastante com Dogmar e descobriu que este era um
paladino de Sauchar. O garoto acompanhou Dogmar algumas vezes ao templo que
Lyria havia desejado levar o filho. Asimus apesar do luto, tendo uma mente
matemática e bastante afiada para a guerra, rapidamente tomou as decisões que
precisava. Reuniu seus soldados e determinou o dia do retorno a Caedyr. Numa
conversa com Dogmar foi convencido a deixar seu filho sob a tutela do amigo, pois
Balder havia mostrado grande interesse pelo caminho que seu amigo seguia, e que
naquele momento faria bem ao garoto ter novos ares. Assim ambos os amigos
acertaram os detalhes, se abraçam lamentando o infortúnio do momento que os
permitiu se encontrar após tantos anos. E assim a comitiva de Asimus parte em
direção a Caedyr, enquanto para trás, às margens da cidade, a imagem daquele
imponente guerreiro e o triste e quieto jovem ao seu lado.
Após Balder ver seu pai partir, Dogmar tentou confortá-lo, a seu próprio modo,
dizendo: “Sua causa é nobre, Balder. Se esforce e traga honra à sua família e orgulho
a seu pai! Vamos embora daqui, filho...”. Dogmar sabia que permanecer ali, no local
onde Balder vivenciou tantos horrores e viu sua mãe ser morta, não faria bem algum
ao treinamento do garoto. No entanto, como um experiente guerreiro, ele sabia
também que Balder teria que voltar àquele lugar e superar seus traumas se quisesse
mesmo se tornar um paladino. Eles começaram os preparativos e iriam se dirigir a um
vilarejo próximo à cidade em que estavam, onde Dogmar já começaria o treinamento
do jovem Balder. Chegaram ao vilarejo já quase ao anoitecer e Dogmar alugou um
quarto numa pousada, onde passariam os próximos dois dias e depois seguiriam
viagem para terras mais distantes. Depois do jantar, após retornarem ao quarto em
que estavam acomodados, Dogmar decidiu conversar um pouco com Balder sobre os
motivos de ele ter decidido ir treinar, longe de sua casa, de sua família, do amor e
proteção de seu pai. Suas respostas seriam decisivas para iniciar o treinamento do
garoto. Balder o surpreendeu ao seu firme em seu posicionamento, logo após
tamanha perda, dizendo, com lágrimas nos olhos: “Eu quero vingar minha mãe e
acabar com todos os que matam inocentes, Dogmar! Não quero que inocentes
morram nunca mais!”. Naquele momento Dogmar compreendeu que Balder não era
mais um garoto comum e que daquele dia em diante, ele o treinaria para ser um dos
melhores os paladinos. Na manhã seguinte, Dogmar acordou Balder e eles fizeram a
primeira refeição do dia juntos, sem trocar muitas palavras. Logo após terminarem,
Dogmar o chamou pra ajudar a carregar algumas coisas e eles foram pra uma
campina, a apenas alguns quilômetros do vilarejo. Ao chegarem, descarregaram o que
haviam levado. Um pouco de comida, a alabarda de Dogmar e alguns utensílios. Eles
se assentaram na grama, próximo a uma árvore e Dogmar começou a fazer algumas
perguntas a Balder:
- Balder, você tem algum treinamento em combate? Consegue manusear
alguma arma?
- Sim Dogmar. Há uns quatro anos eu já comecei a treinar com espadas,
apesar de preferir armas de haste. Meu pai não gostou muito de início, mas acabou
aceitando e arrumou um instrutor de armas de haste pra mim.
- Bom, nesse caso, vamos ver o que você pode fazer.
Então Dogmar se levantou, pegou um bastão longo que havia comprado no vilarejo e
o jogou para Balder. Dogmar era um excelente guerreiro com armas longas e apesar
de parecer ser durão, era muito gentil. Era um devoto de Sauchar e tinha facilidade
para ensinar. Nesse primeiro dia, Balder ainda acanhado, teve um pouco de
dificuldade em demonstrar suas habilidades... Voltaram para a pousada ao entardecer,
conversaram um pouco, jantaram e foram dormir depois de organizar as coisas para
partirem na manhã seguinte. Logo pela manhã, bem cedo, comeram coisas leves e
partiram para oeste. Dogmar queria ir para o lado oposto de Alanor, mas antes iria
para o sul, a fim de fazer uma parada em uma grande cidade mercante que tinha
próximo do ponto central do cinturão. Durante a viagem, Dogmar aproveitava todas as
oportunidades que tinha durante o dia para treinar com Balder e ensiná-lo a perícia
nas armas de haste. Durante a noite, estudavam a história dos paladinos e também
sobre Sauchar. Quando chegaram à cidade mercante, Balder ficou maravilhado com
todo aquele movimento de pessoas, todas aquelas coisas à venda nas barracas
espalhadas no meio das ruas, todas as diferentes culturas que se misturavam ali...
Como estavam cansados por causa da viagem, Dogmar achou melhor irem para a
pousada de uma vez, apesar de ainda ser dia claro. Ao chegarem, Dogmar preferiu
pagar a estadia deles por dia, já que não sabia bem ao certo quanto tempo ficariam ali.
Balder quis enviar uma carta para seu pai em Alanor e Dogmar o deixou escrevendo
enquanto ia resolver algumas coisas na cidade. Balder escreveu quase um rolo de
pergaminho inteiro para seu pai, contando tudo o que já havia aprendido com Dogmar,
sobre sua viagem e principalmente sobre a cidade em que estavam. Nem se deu
conta de que o tempo passara tão rápido desde que chegaram e já era noite quando
ele terminou de escrever. Em seguida Dogmar retornou e disse que enviaram a carta
logo pela manhã. Enquanto Balder dormia, Dogmar escreveu para Asimus sobre o
talento que seu filho demonstrava em combate e nos estudos, apesar do pouco gosto
que tinha por essa parte, e colou em sua carta o lugar onde se instalariam a oeste. Era
uma cidade comum onde Dogmar residiu durante seu próprio treinamento. Dogmar,
por viajar muito, foi obrigado a aprender a consertar seu próprio equipamento e
acabou tomando gosto pela profissão, se tornando um bom ferreiro. Claro que não
chegava perto dos especialistas, mas conseguia se virar muito bem. Ele quis passar
Esse conhecimento a Balder, mas ele não se interessou muito e acabou aprendendo
só o básico, necessário para consertar alguns equipamentos... Balder e Dogmar
passaram alguns dias ali nessa cidade mercante, onde Dogmar conseguiu uma
pequena lança, uma armadura de couro barata e alguns apetrechos para Balder e
então seguiram viagem, rumo ao extremo oeste do cinturão de Tenkoff, onde ficariam
durante o resto do treinamento de Balder. Quando finalmente chegaram à cidade,
mais de um ano já havia se passado. Balder já havia evoluído bastante e estava no
caminho certo para se tornar um grande guerreiro! Ali naquela cidade havia uma
biblioteca, onde Dogmar recomendou que Balder estudasse. Lá haviam muitos
manuscritos sobre combate e principalmente sobre Sauchar. Alguns dias depois de
terem chegado, eles receberam uma carta de Asimus, contando sobre como estava às
coisas em suas terras e que ele estava muito orgulhoso de Balder. Os anos foram se
passando e cada vez mais, Balder se aprimorava naquilo que mais gostava, a arte do
combate. Estava se tornando um guerreiro muito talentoso, equilibrado entre ataque e
defesa e versado nos ensinamentos da ordem. Já com seus 19 anos, Balder estava
bem preparado para se tornar um paladino de verdade. Foi quando ele, sempre focado
no juramento que havia feito quando criança foi conversar com Dogmar sobre uma
decisão peculiar. Encontrando Dogmar em seus aposentos, ao anoitecer, Balder
começou a falar sobre o que tinha em mente, dizendo:
- Dogmar, eu andei pensando muito no juramento que fiz quando era criança e eu
pensei em ter algo que inspirasse medo nos meus inimigos e que me tornasse um
símbolo para as pessoas.
- O que tem em mente Balder?
- Ah, não sei... Talvez alguma coisa na minha armadura, um símbolo... Uma arma...
- Uma arma? Vá direto ao ponto e não me enrole! Conheço-te bem e sei que você tem
alguma ideia louca nessa sua cabeça!
- Então, eu estava pensando em usar uma foice no lugar das lanças e alabardas...
- UMA FOICE? – Dogmar deu gargalhadas da ideia de seu aluno – Você acha mesmo
que isso vai colocar medo em alguém? Você só pode estar brincando.
- Dogmar... – Balder tinha uma expressão séria e de fúria – Minha mãe foi
assassinada diante de mim, vi coisas horríveis, pessoas inocentes sendo mortas... Eu
jurei vingar minha mãe e acabar com todos os que praticam o mal. Por favor, leve
essa questão a sério.
- Tudo bem. – Dogmar havia compreendido a seriedade do jovem Balder. – Vou
pensar a respeito e amanhã conversamos mais sobre isso. Agora vá dormir garoto!
Seu treinamento ainda não terminou e você deve acordar cedo.
Balder seguiu para seus aposentos, mas não pôde parar de pensar naquelas cenas
horríveis que vivenciou, toda a sua dor, todo o horror que jamais havia visto. Dogmar
pensou sobre a conversa que havia tido com Balder e refletiu durante algum tempo.
Por fim, decidiu levar em consideração as vontades do garoto e ainda algumas outras
coisas que o ajudariam. No dia seguinte, Dogmar foi procurar Balder bem cedo, mas
não o encontrou. Quando foi procurá-lo, ele já estava treinando. Dogmar esperou o fim
do dia e ao anoitecer foi conversar com Balder, dizendo que aceitava o pedido do
garoto e que ele mesmo se empenharia em forjar a arma para ele. Balder não
conseguiu se conter de tanta alegria. Nos dias que se seguiram, Balder treinou ainda
mais intensamente, dado sua ansiedade e alegria e no final de uma semana, sua nova
arma estava pronta. Dogmar havia se superado e com a ajuda do ferreiro da cidade,
havia forjado uma foice de duas mãos para Balder. Balder jurou que um dia retribuiria
tudo o que Dogmar havia feito e ainda fazia por ele. Levou algum tempo até que
Balder se acostumasse com sua nova arma, mas quando o mesmo se acostumou a
ela, se tornou muito habilidoso em questão de meses... Mais alguns anos se passaram
e Dogmar vendo o progresso de seu aluno, o quanto ele tinha crescido, o homem que
havia se tornado já com seus 23 anos, decidiu que ele já estava pronto para retornar à
Evorin e superar seu passado! Dogmar conversou com ele, que prontamente aceitou e
decidiram que partiriam dentro de poucos dias, assim que terminassem os
preparativos. Balder agora já era um paladino, devoto à Sauchar e conhecedor da
ordem, juramentado e perito em combate. Estava 100% pronto! Eles partiram em mais
uma viagem, agora, uma de retorno. Passados alguns meses, estavam chegando a
Evorin e assim que avistaram o reino, Balder começou a se recordar de tudo que
presenciou ali. No mesmo instante ele hesitou, ficou receoso de entrar novamente
naquela cidade, mas Dogmar o encorajou, dizendo:
- Você não tem mais o que temer garoto. Você é um paladino agora!
Balder aceitou os fatos e decidiu encarar aquela situação, a fim de superar seus
traumas. Tudo correu bem e Balder foi recebido por seus avós com grande alegria. Ele
pôde visitar novamente os aposentos onde tudo ocorreu e apesar da lembrança, ela
não mais o atormentava. Mas agora ela dava forças a Balder para seguir em frente.
Ele enviou uma carta a seu pai dizendo que estava voltando para casa e que Dogmar
seguiria com ele. Ficaram pouco mais de uma semana em Evorin e depois partiram
para Alanor, para as terras a que pertencia. Viajaram por algum tempo e foram
recebidos por uma grande comitiva já quando se aproximavam do castelo de seu pai.
Asimus aguardava ansiosamente nos portões de entrava do castelo. Estava trajado
em vestes finas comemorativas e havia preparado uma grande festa para receber seu
filho em casa novamente, depois de 12 longos anos sem vê-lo. Quando a comitiva
chegou e Asimus viu seu filho já adulto, não se conteve e correu em seu encontro. Os
dois deram um longo abraço e lágrimas não foram contidas. Ambos conversaram
muito nos dias que se seguiram e Asimus pôde aproveitar um tempo com seu velho
amigo Dogmar também. Balder já havia completado seus 24 anos quando chegou em
casa e ficaria ali por pouco tempo. Desfrutando de um precioso tempo com seu pai,
pesquisando sobre o ataque à Evorin e se preparando para seguir para o palácio do
rei, onde receberia um treinamento mais sofisticado em armas de haste, com o
príncipe Galiel, um dos filhos de Galiard e excepcional combatente com armas de
haste. Asimus estava muito orgulhoso de seu filho e sabia que um dia ele seria um
excelente lorde. Dias antes de Balder seguir sua jornada, seu pai o chamou para um
passeio pela cidade. Durante o passeio, Asimus deixou claro a seu filho o quanto o
amava, todo orgulho que sentia por ele, que apesar de não querer se separar dele
novamente, compreendia que ele tinha que partir e compartilhou com ele que via em
seu filho um brilhante futuro lorde e que ele seria um sucessor maravilhoso. Voltando
para o castelo, Asimus mandou preparar um banquete para brindar seu filho.
Comeram e se fartaram, tiveram um maravilhoso momento entre pai e filho, e após o
jantar, Asimus havia preparado uma surpresa para Balder. O acompanhando a seus
aposentos, Asimus abriu as portas e mostrou a Balder um presente de despedida para
o filho. Era uma armadura de lorde, negra, com o símbolo da ordem de Sauchar
embutido no peitoral, túnicas que se estendiam abaixo do peitoral até os pés,
proteções para os ombros, mãos e braços, era uma armadura pesada, mas que se
parecia muito com uma vestimenta nobre, um anel de família, para Balder nunca se
esquecer de suas origens e deveres para com o povo e um cordão que continha uma
memória de sua mãe. Era uma pequena pedra de rubi que ela sempre carregava
consigo que foi dada a ela por Asimus no dia em que se casaram. Balder agora com
seus 24 anos, estava preparado para partir em sua jornada! Depois de preparar tudo,
Balder deu um abraço longo em seu pai, agradecendo por tudo o que ele havia feito e
partiu. A viagem para o palácio do rei Galiard foi um pouco longa, dada às condições
adversas do clima da estação da água. Quando Balder estava mais ou menos na
metade do caminho, foi emboscado por um grupo de quatro bandidos. Eram ladrões
comuns que estavam esperando um viajante solitário passar por ali. Porém, não
sabiam que aquele não era um viajante comum. Balder imediatamente pulou do cavalo
pensando em voz alta:
- Essa é a chance perfeita para testar as habilidades que ganhei no treinamento com
Dogmar.
Os bandidos perceberam, pela arma e armadura, que não era um simples viajante,
mas um guerreiro que estava diante deles. Porém, pensaram que por ser quatro
contra um, seria fácil matá-lo. Quando o primeiro atacou, correndo e saltando na
direção de sua “presa”, Balder sacou sua foice e num movimento gracioso em forma
de meia lua o golpeou de baixo pra cima, cravando sua foice na barriga do inimigo
ainda no ar. Balder tinha uma força muito acima da média, e para ele foi fácil segurar a
foice com o inimigo cravado nela, já que era um humano baixo e magro. Nesse
instante, os outros três ficaram amedrontados e meio hesitantes correram na direção
de Balder ao mesmo tempo. Como se fosse a própria morte, Balder, que odiava muito
criminosos e pessoas injustas, baixou a ponta de sua foice com rapidez, jogando
brutalmente o primeiro bandido já morto no chão e com uma velocidade surpreendente
para alguém do seu tamanho, girou sua foice no ar, na altura certa para cortar a
cabeça dos três. Porém um, que era um pouco mais ágil, conseguiu se abaixar pouco
antes da lâmina ceifar sua vida. Ele deslizou pelo chão na direção de Balder. Porém,
Balder já estava preparado para situações como aquela e num movimento rápido ele
golpeou o último bandido com um chute certeiro de cima para baixo. Como usava uma
armadura completa, o inimigo ficou atordoado pelo chute “de ferro”. O que facilitou
para Balder puxar sua foice até na altura da lâmina e a crava no peito de seu último
inimigo. Balder recolheu sua foice e a limpou, depois a envolveu em um manto de
couro e voltou para o seu cavalo, que era bem adestrado e o esperava um pouco mais
à frente. Balder eliminou seus inimigos sem piedade, pois odiava pessoas que
optaram pelo caminho do mal. Ele era uma boa pessoa, mas não tratava os maus
como pessoas normais. Antes de voltar ele procurou algum ouro nos seus inimigos e
encontrou algumas moedas. Seguindo seu caminho mais adiante, encontrou uma
pequena vila onde parou para descansar. Ele não precisava daquele ouro, então o deu
a um mendigo que estava na chuva e o mandou se abrigar em alguma estalagem e
fazer uma refeição. Parando numa taverna mais à frente, Balder comeu e disse que
ficaria ali por uma noite e pagou adiantado. Na manhã seguinte, logo bem cedo,
Balder arrumou suas coisas e partiu para o palácio. Já estava perto e chegou lá em
pouco mais de meio dia de cavalgada. Asimus já havia enviado uma mensagem
avisando da chegada de seu filho, mas por conta do incidente com os bandidos ele
acabou se atrasando em um dia. Na entrada do palácio ele foi abordado pelos guardas
e logo mostrou seu anel da família, dizendo que era Balder Helgarth, filho de Asimus
Helgarth e que sua chegada era esperada. Imediatamente um dos guardas foi
comunicar ao responsável do palácio e logo ele foi levado para dentro do palácio. Na
entrada um garoto que parecia ser mais jovem que ele estava à sua espera. Era bem
magro, de aspecto frágil, cabelos dourados e olhos firmes. Ele e alguns empregados o
recepcionaram e o garoto se apresentou como Seff, o filho mais novo do rei Galiard.
Balder imediatamente fez uma reverência, mas logo o jovem Seff dispensou e disse
que ele era um convidado de honra e toda aquela formalidade não era necessária.
Pelo que Balder viu do lado de fora, o castelo do rei era de proporções absurdamente
grandes e ele precisaria de um tempo até se acostumar. Seff pediu que alguns
serviçais descarregassem seu cavalo e acompanhassem Balder até seus aposentos.
Já era início de noite e Balder estava cansado e completamente encharcado por causa
da chuva. Imediatamente os servos acataram a ordem. Seff disse que conversariam
melhor na manhã seguinte, quando Balder já estivesse descansado e acomodado.
Balder agradeceu e foi para seus aposentos com os serviçais. Chegando lá, os
serviçais colocaram suas coisas no quarto e um deles ficou para ajudar a organizar as
coisas e para ajudar a remover a armadura de Balder. Esse mesmo serviçal explicou
como funcionava a banheira e tudo mais e pegou toda a roupa suja de Balder e levou
para a lavanderia do castelo. Balder tomou seu banho, se secou rapidamente por
causa do frio e vestiu roupas bem quentes. Uma refeição foi servida em seu próprio
quarto e logo depois de fazê-la, Balder caiu adormecido em sua cama. Seu quarto era
muito grande, muito além de suas expectativas. No ponto central se encontrava sua
cama, logo depois dela, na parede um grande vitral muito bem trabalhado. Muito mais
detalhado e delicado que os de Evorin. No ponto mais distante da cama, ao fundo no
quarto, se encontrava uma grande cômoda com muitas vestes, para todos os tipos de
ocasião. Do outro lado dela, se encontrava a banheira, toda feita em mármore, aonde
chegavam dutos com agua quente e fria. Sua cama era muito grande, o suficiente para
dormir um casal com muito espaço de sobra e era feita de madeira maciça e muito
bem trabalhada e ornamentada. Do alto dela desciam véus que era usados tanto para
decoração, como para proteção contra insetos. O quarto havia sido perfeitamente
preparado para Balder, contando tripés para colocar sua armadura e raques para
colocar suas armas. Além de um baú onde poderia guardar o resto de seus pertences.
A porta do quarto era muito grande, tanto em altura, quanto em largura. Ela era toda
de madeira maciça e espessa e possuía muitos detalhes em ferro, além de trancas
robustas. O baú era trabalhado com fios de outro sobre uma madeira avermelhada. Os
fios de ouro formavam ramos em torno de todo o baú, que tinha aproximadamente um
metro de largura por meio metro de altura e uns quarenta centímetros de
profundidade. Ali se encontravam todos os demais pertences que Balder trouxe de sua
viagem. Como estavam na estação da agua e no mês do orvalho, chovia praticamente
todo o tempo e as noites eram frias e gélidas, com temperaturas negativas, além de
dias quase tão escuros quanto à própria noite e muito curtos. Logo pela manhã, Balder
despertou com um serviçal batendo à sua porta. Ele com muito custo saiu de debaixo
de todos aqueles cobertores pesados e vestiu um casaco de peles muito pesado e
quente. Foi até a porta e perguntou quem batia, quando o serviçal respondeu, dizendo
que todos o aguardavam para a refeição da manhã. Balder rapidamente se arrumou,
foi até perto da banheira onde se encontrava um balde com agua limpa e lavou o
rosto. Quando abriu a porta, o serviçal já havia ido embora e quem o esperava era
Seff, com um sorriso no rosto. Seff era muito gentil e extremamente inteligente, além
de levar muito a sério as questões que tinha para resolver como chefe de estado. Era
uma pessoa muito influente na família real. Seff o cumprimentou e Balder, que havia
recebido uma educação muito aplicada na sua infância, devolveu o cumprimento, com
a postura de um nobre. Seff disse que iria apresenta-lo a todos naquela manhã.
Quando chegaram ao grande salão, estavam todos assentados à mesa, já comendo.
Seff apresentou Balder a cada um de seus irmãos que ali se faziam presentes, assim
como a seu pai e sua mãe. Balder foi muito bem recebido por ser filho de um dos
lordes e generais mais importantes do reino. Poucas pessoas da família real não se
encontravam ali. Uma delas era Galiel, que seria seu tutor. Seff disse que mais tarde o
levaria até ele. Durante a refeição, Seff inquiriu Balder sobre muitas coisas, sobre o
motivo de ele estar ali, sobre seu passado, seu treinamento com Dogmar, que era um
paladino reconhecido em todo o reino e tudo mais. Assim que terminaram, Seff disse a
Balder que fosse colocar um traje de treino, pois começaria naquele dia mesmo, já que
estava lá para isso. Balder se despediu de todos, agradeceu pela refeição e um
serviçal o levou para seus aposentos. Ele não teve que se preocupar com seu
equipamento, pois tudo já havia sido devidamente preparado. Ele se trocou e um
serviçal o levou à Seff, que estava esperando por ele juntamente a Galiel. Seff
apresentou os dois e os deixou ali próximos ao pátio de treinamento e voltou para
seus afazeres, que não eram poucos. Galiel era mais velho que Balder uns quinze
anos, beirando os quarenta, mas era extremamente ágil e forte. De constituição
robusta, mas nem tanto quanto Balder. Depois de feitas as apresentações e antes de
darem inicio ao treino, Galiel conversou com Balder sobre seu treinamento com
Dogmar e explicou como seria a rotina dele dali em diante. Ele seguiria a mesma
rotina que Galiel agora e os dois passariam a maior parte do tempo juntos, treinando.
Pela manhã fariam um treinamento mais teórico e de resistência e na parte da tarde
treinariam as habilidades de combate. Galiel era um guerreiro feroz e um dos
melhores lanceiros do reino, se não o melhor. Eles começaram imediatamente com
Balder descrevendo tudo o que sabia sobre o manuseio de armas de haste. Galiel
testou a resistência física de Balder pela parte da manhã e logo após comerem por
volta do meio dia, iniciaram um treinamento de combate para testar as habilidades de
Balder. Este, por sua vez, surpreendeu Galiel, pois ele não imaginava que ele teria
tanto talento. Porém, Balder ainda não era páreo para Galiel, mesmo com todo o seu
dom para este tipo de arma. Balder disse que no dia seguinte estaria mais bem
preparado para o treinamento de combate, pois agora conhecia melhor seu
adversário. No dia seguinte, Balder levantou bem cedo, antes de todos no castelo e foi
ter sua refeição com Galiel, como seria todos os dias. Comeram rapidamente e logo
Galiel foi explicar alguns conceitos, fraquezas e pontos fortes sobre o estilo de
combate de Balder. Novamente fizeram um treinamento de resistência e na parte da
tarde, partiram pra um treinamento de combate. Nesse dia, diferentemente do dia
anterior, Balder estava com uma feição mais séria, uma concentração maior e bem
focado no seu adversário. Ele esperou Galiel fazer seu primeiro movimento com a
lança, que foi uma estocada na direção do peito de Balder, que rapidamente esquivou
com um giro e partiu em disparada na direção de Galiel, com uma velocidade muito
alta para alguém do seu tamanho. No momento em que se aproximou, Galiel que era
muito mais ágil, deu um salto para trás e com a rapidez de uma serpente, golpeou
Balder com sua lança em um arco de cima para baixo. Balder bloqueou o ataque
segurando sua lança na posição horizontal acima da cabeça. Mas como Galiel era
mais experiente e ágil, usou a própria força de Balder a seu favor, fazendo do bloqueio
de Balder um apoio para usar sua lança como catapulta o lançando para o alto e para
trás de Balder, que não teve como se desviar, nem bloquear o chute que Galiel deu
para trás, acertando as costas de Balder com uma força surpreendente. Balder foi
empurrado para frente, mas pela sua constituição grande, ele logo se recuperou
girando o corpo com a lança em apenas uma das mãos, estendida à frente do corpo,
com o intuito de acertar Galiel pela lateral esquerda, na altura de suas costelas. Galiel
facilmente desviou o ataque de Balder com sua própria lança, fazendo com que a
lança de Balder passasse por cima de sua cabeça e dando um meio giro para a
direita, um pouco abaixado, fazendo uma investida rápida com a lança em direção de
Balder, estendendo-a na direção de seu pescoço e parou o ataque a milímetros do seu
alvo, com uma precisão incrível. Eles pararam o treinamento naquele momento porque
chovia muito e ambos precisavam descansar depois daquele combate épico. Balder
percebeu que apesar de toda a sua habilidade, ele necessitava mais experiência.
Além da sua força excepcional, ele precisava de mais agilidade, mais inteligência em
combate. Balder progrediu muitos nos dias que se seguiram, aprendendo cada vez
mais sobre inimigos que poderia encontrar e como combatê-los, técnicas de combate,
estratégias, ganhando mais agilidade, se tornando ainda melhor no manuseio de sua
arma. Com o passar dos meses, Balder começou a conversar mais com Seff durante
os jantares. Ambos foram se entrosando mais, ganhando mais intimidade, até que se
tornaram bons amigos e podiam conversar sobre qualquer coisa. Seff era um pouco
mais novo que Balder, beirando seus 21 anos. Não era versado em combate devido à
sua saúde um pouco frágil, mas era um exímio burocrata. Tratava de todas as
questões que o reino precisava e estava sempre muito atarefado. Apesar de jovem,
ele era muito inteligente e sábio, além de muito competente, pois estava sempre
adiantado sobre com suas tarefas. Em uma de suas conversas com Balder, já num
local mais reservado, Balder o inquiriu sobre alguns assuntos, pois havia percebido
uma certa movimentação no palácio. Então Seff lhe contou sobre o ataque que havia
ocorrido ao palácio pouco tempo atrás e sobre a disputa entre os dois filhos mais
velhos, o príncipe Alaron, filho de Anabel e o segundo filho mais velho, filho de
Alandra, a concubina do rei. Era uma disputa interna pela sucessão do trono, herdado
da disputa de suas mães pela preferência do rei. Essa disputa havia se intensificado
desde o ataque, pois expôs a fragilidade do trono. Desde então, Seff reuniu magos
especiais que podem resistir cancelar magia. Quando uma magia é direcionada a eles,
ela simplesmente se torna mana de novo, voltando à sua forma original. Essas
pessoas são muito raras, mas Seff, por ser muito influente, conseguiu reunir um grupo
dessas pessoas para acompanhar cada um da família real. Seff tinha dois agentes
especiais, que eram Mitrael e Nagashi, um mago e um guerreiro, respectivamente.
Balder os havia visto algumas vezes tendo reuniões com Seff, mas não sabia bem ao
certo quem eram e que tipo de trabalhos faziam para Seff. Balder ficou muito
interessado no ataque ao palácio, pois foi exatamente igual ao ataque a Evorin, que
acabou com a morte de sua mãe e uma devastação no reino. Quando inquiriu Seff a
respeito do ocorrido, contou também que já havia presenciado um ataque similar em
sua infância. Seff disse a Balder que iria investigar mais a fundo sobre o ocorrido e
sobre os responsáveis. Algumas semanas depois, num período de descanso de
Balder, ele foi chamado à sala de Seff por um serviçal. Ele e Galiel interromperam o
treinamento pelo resto daquele dia. Adentrando a sala de Seff, ele pediu para que
Balder se sentasse, pois teriam uma conversa um pouco longa. Seff o inquiriu sobre
alguns detalhes do ataque ocorrido a Evorin em sua infância e aos poucos foi ligando
um ataque a outro. Seff contou a Balder que havia descoberto os responsáveis, um
grupo de magos que se denominavam Ordem do Manto Púrpura. Mas que pensava
que o ataque ao palácio estava diretamente ligado ao passado da esposa de Alaron,
Gwen, que era uma ex-manto púrpura. Haviam evidencias de que o ataque tinha
ocorrido para eliminar Gwen, como uma queima de arquivos e, portanto, não entendi o
motivo do ataque a Evorin, mas iria investigar mais. Seff enviou três pessoas para
oeste no reino, com uma missão especial que ninguém, senão eles, conheciam o
objetivo. Algum tempo depois, Seff comunicou Balder de que, juntamente com
Nagashi, teria que viajar para leste também, mas que mandaria noticias. Pouco tempo
depois de sua partida, Balder foi acordado por um serviçal batendo em sua porta. Ele
o atendeu e o serviçal o entregou uma carte com o selo usado por Seff e aqueles que
trabalhavam para ele. Balde rompeu o selo e leu o que estava escrito na carta. Nela
dizia que Seff estava em Vaniar e que havia encontrado algumas pistas sobre a
Ordem do Manto Púrpura lá. Eles estavam fazendo uma movimentação nas sombras e
estavam planejando alguma coisa na cidade. Balder escondeu a carte em meio aos
seus pertences e foi dormir. Na manhã seguinte, ele foi conversar com Galiel. Acordou
em dúvida sobre o sono que havia tido, se ainda era noite ou se já havia amanhecido,
pois o dia estava muito escuro. Abrindo a porta de seu quarto, um vento gélido o fez
voltar para dentro e vestir um agasalho mais quente. Assim que saiu de seu quarto,
não viu muita movimentação nos corredores, mas logo que dobrou uma esquina, se
deparou com um senhor muito bem agasalhado que pensava já ter visto no castelo.
Era um senhor mais de idade, alto, com nariz fino e pontudo e cabelos grisalhos. Este
era um dos servos de Seff e perguntou e cumprimentou Balder pelo seu nome de
família e perguntou se poderia ajudar em algo. Balder estranhou, pois não o conhecia.
Apenas lembrava vagamente de já o ter visto nos arredores do castelo uma vez ou
outra. Mas já que ele havia o encontrado, perguntou onde se encontrava Galiel. O
senhor de nariz pontudo disse que Galiel já estava no pátio de treinamento. Balder
agradeceu e quando ia passando por ele, se voltou e o inquiriu sobre o paradeiro de
Seff. Ele sabia que ninguém no palácio sabia onde Seff estava realmente e nem o que
fazia a oeste, mas perguntou assim mesmo, para se certificar que aquelas
informações da carta eram de conhecimento só dele. Logo após receber sua resposta
negativa, como já esperava, ele se despediu e foi encontrar Galiel. Se aproximando da
saída que dava acesso ao pátio de treinamento, ele viu Galiel já a todo vapor, fazendo
movimentos rápidos e graciosos com sua lança. Ele o chamou ao longe:
- Galiel! – Exclamou Balder já se aproximando dele.
Imediatamente Galiel recolheu sua lança junto ao corpo e viu que Balder não treinaria
aquele dia, pois estava em trajes normais e não em trajes de treinamento e também
não portava sua lança de treinamento, como de costume. Eles se aproximaram e
Balder disse:
- Podemos conversar um pouco? Tenho algumas perguntas a fazer.
- Claro! Mas primeiro vamos sair desta chuva.
Eles se retiraram para debaixo de uma marquise, que ficava próximo ao pátio de
treinamento e Balder continuou:
- Galiel, preciso saber quanto tempo falta para concluir meu treinamento. Você tem
alguma ideia de tempo?
- Balder, por que me pergunta sobre isso?
- É que preciso resolver algumas coisas a leste. Portanto, precisarei viajar por um
tempo e partirei amanhã mesmo. Gostaria de me certificar que estou pronto pro que
posso encontrar no caminho.
- Balder, você está mais do que preparado. Você tem um talento nato para o combate
que, pelo visto, puxou de seu pai. Pode partir com a consciência tranquila e sabendo
que será sempre bem vindo em nossa casa quando voltar. Só não deixe de praticar
todos os dias, mesmo que não esteja em batalha. Você precisa mesmo partir assim
tão depressa?
- Sim Galiel. É questão urgente que preciso resolver.
- Bom, se é assim, mandarei que preparem seu cavalo amanhã pela manhã. Você
precisará de alguma coisa?
- Apenas o suprimento para a viagem. Muito obrigado, Galiel!
- Desejo-lhe boa sorte meu amigo!
Quando Balder se virava para sair, Galiel o chamou de novamente:
- Balder! Vou a Alanor daqui algumas semanas me encontrar com seu pai. Deseja lhe
enviar alguma mensagem?
- Diga a ele que seu filho estará em casa muito breve, assim que retornar do oeste.
- Claro! Ele ficará feliz em saber do retorno de seu filho.
- Não se preocupe Galiel. Eu mandarei cartas para você e para ele.
Eles se despediram e Balder seguiu para seus aposentos para arrumar suas coisas.
No dia seguinte, Balder levantou cedo e logo um serviçal estava à sua porta. Ele
entrou e o ajudou a vestir sua armadura, pegar seus pertences e desceram para a
entrada do palácio. Galiel estava lá para de despedir e o presenteou com uma espada
longa, ornamentada e disse:
- Balder, assim como eu, você se tornou um excelente combatente com armas de
haste. Mas não confie somente nela. Uma hora ou outra você precisará usar outra
arma, então, esteja preparado para essas ocasiões também. Sei que aprendeu a
manejar uma espada também e mesmo que não seja necessário, é bom mantê-la
sempre com você.
Balder agradeceu e se despediram. Balder montou em seu cavalo e partiu
rapidamente para Vaniar, debaixo de muita chuva e ventos fortes.

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