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Nicolas Schneider Blanco 00305669

O caminho do bom aluno na Ética Nicomaqueia de Aristóteles

A introdução para o conteúdo do livro pode ser resumida a uma pergunta


simples 'como nós devemos viver?'. É com essa singela indagação que
Aristóteles inicia a sua tese. Nela vemos muitos conceitos chaves e distinções
nos sendo apresentados e costurados em um esquema maior que nos
possibilite alcançar a Eudaimonia, que parece ser a realização de nossa
essência em todos os aspectos da vida.

Em um primeiro momento do discurso de Aristóteles, em que ele busca


esclarecer o papel do argumento da função própria. Em sua tese Aristóteles
toma como exemplo um objeto ou artefato qualquer, no caso uma faca. A
função da faca é cortar, sendo a função desse tal objeto, ela teria em suas
propriedades, vide a sua forma, as características que lhe possibilitam
funcionar de tal e tal maneira, fazendo aquilo que lhe é próprio, função que ela
desempenha em vista da espécie de coisa que ela é.

Ainda no exemplo da faca, há uma distinção que é necessária para o propósito


de Aristóteles, entre ser algo e ser em vista de algo e a relação intrínseca de
ambos. Existe uma relação evidente entre a causa formal e a causa final, a
causa formal sendo aquilo que manifesta a essência do ser, e que o torna
propriamente aquilo que ele é, mas sob o aspecto final, ou seja, o objetivo pelo
qual a coisa exerce suas funções é aquilo em vista do que a coisa existe, o
objetivo ultimo da coisa na cadeia das causas, estando a função então
relacionada intimamente com o que é essencial ao ser, e o isto com o fim em
vista do qual o ser é, e vista do que, ele realiza sua função, ou seja através de
suas propriedades e suas potencias.

Visto que é o objetivo de Aristóteles aplicar esse conhecimento teórico na


pratica efetiva do homem, ele buscara então distinguir a função própria do
homem enquanto homem. Para além das funções que o homem compartilha
com os seres dos outros reinos da natureza, sendo elas a vegetativa, e a
sensitiva. É a função racional que para Aristóteles é a capacidade da alma que
é característica ao homem, ou como ele afirma, a vida ativa do elemento que
tem um principio racional, e possuímos a razão tanto no sentido de que somos
capazes de obedecer a esse principio racional, quanto de exercê-lo na prática.
No decorrer da explicação Aristóteles deixa evidente para o leitor que se
tratando do exemplo da faca e do homem no argumento da função própria, há
um significado relativo às coisas e outro âmbito relativo a nós, e a excelência
que cada um possui em sua função é a sua mediania, novamente um tipo
relativo a nós e outro tipo relativo às coisas. Aristóteles ressalta repetidamente
em seus exemplos a capacidade do ser de extrair o que é de melhor em si no
exercício de sua função, não só ela, mas sua atividade excelente caracteriza
essa capacidade virtuosa intrínseca ao ser ou ainda extrínseca em sua
atividade, alcançando no ato o seu objetivo final, o fim sem mais.

Em seguida Aristóteles traz o bem como resultado do exercício virtuoso da


função própria, se a função da faca é cortar, uma boa faca será aquela que
corta bem, o desempenho da função de um ser na sua excelência é o bem para
ele, pois esse bem residiria justamente na realização na função tendo como fim
ele mesma. Então a virtude de um ser é aquilo que o permite realizar
adequadamente a sua função, no seu desempenho ele encontra então a sua
excelência. A Eudaimonia está como fim ultimo no desempenho da atividade
racional no homem, pois sendo a razão aquilo que lhe é peculiar, a sua
atividade mais virtuosa será o bem para ela.

No Inicio do Livro II, Aristóteles apresenta uma primeira distinção entre a


virtude moral e a virtude intelectual, onde a primeira seria adquirida através do
habito, e a segunda através do ensino, parece então que elas se diferenciam em
aprendizado teórico e aprendizado prático, e a partir disso o aprendizado em
sentido forte da virtude moral encontra a sua efetivação na atividade prática.
Não é possível nesse sistema entender antes de aprender, já entendido que há
ações que são boas para o ser humano, que são tomadas como boas elas
mesmas e não em vista de outras, então o habito como prática reiterada de
certas ações em certa direção teria poderes cognitivos assimilativos naquele
que as pratica evidenciando agora em primeira mão o prazer apropriado na
ação virtuosa, tendo ela como fiz em si mesma.

Em II-6 Aristóteles continua a explorar a virtude moral e seu significado para


nós, ela diz respeita as nossas ações e paixões, a tendências ao excesso, a
carência e ao meio termo, elas são então certas disposições de caráter, e por
isso se relaciona com os prazeres e com as dores, e por isso deve ser sentidas
de forma apropriada, no momento apropriado e ter a atitude apropriada
perante essas tendências. A virtude moral deixa em boas condições a coisa de
que é excelência, sendo da parte desiderativa da alma do homem, ela traz
então excelência aos aspectos emocionais do mesmo, as suas funções em
relação ao bem e o bom exercício delas.

A virtude moral seria então uma mediania na parte desiderativa da alma que
traz a excelência moral, mas ainda cabe apresentar através de que
procedimento se utiliza para alcançar a excelência na pratica das ações
virtuosas.

Ele prossegue dizendo que é necessário não apenas saber que uma coisa é
certa e possui o bem em como objetivo, nesse caso como disposição da alma,
também é necessário saber a sua justa regra e o modo apropriado de sua
aplicação, como no exemplo do médico. Decisões que estão de acordo com a
deliberação de quem possuem o conhecimento prático.

Ele procede então com a divisão das virtudes da alma, sendo elas virtudes do
caráter e o do intelecto, e faz algumas observações a respeito da alma,
respectivamente a virtude moral é privada de razão, aparentemente volitiva e
inclinada a acatar as suas tendências ao prazer e a dor, já a parte intelectual das
virtudes possui um principio racional que qual possui a capacidade
deliberação sobre as volições da alma. Sobre o principio racional, ele o divide
em duas partes, uma parte contemplativa que contempla verdades invariáveis
(Sophia), e outra que contempla as coisas variáveis, pois cada parte conhece
os objetos que lhes são semelhantes e quando esses se encontram separados as
suas partes também diferem em seu conhecimento. Uma parte que é
calculativa e outra que é cientifica. Uma que delibera e calcula sobre o que é
variável e outra que contempla verdades teóricas invariáveis, que são causas
reconhecidas pelo intelecto, diferente das verdades práticas que são realizadas.

A deliberação gira em torno de coisas a serem feitas pelo próprio agente, e as


ações tem em vista outra coisa que não elas mesmas. Em seguida ele diz que
apenas o meio pode ser objeto de deliberação, parece que a decisão da escolha
é feita em outro âmbito, a parte analítica calculativa da alma lida apenas com
os meios, o intelecto atua de forma a avaliar praticamente o modo de proceder
na ação, pois como diz há muitos modos de errar, mas apenas um de acertar.

Parece ser então a faculdade intelectiva da alma, que analise e calcula, parece
exercer a sua função em uma dupla via uma que intelege o conteúdo
emocional da alma, aquele ligado as disposições de caráter, em outra via é a
capacidade de tomar a decisão que cabe em cada momento se, executada com
o fim no bem, se torna uma boa deliberação. Que feita em si mesmo, gera a
boa ação. A deliberação é feita em vista de uma escolha, porém a escolha não
é objeto de deliberação, a sua finalidade já está bem definida quando
deliberamos. Quando ele diz que a busca mais eficaz de alcançar esse primeiro
principio que na ordem de descobrimento é o ultimo, parece fazer referencia
ao objetivo ultimo da ação, e todas aquelas que são feitas em vista de outro
fim, são feitas em referencia a Eudaimonia, que na ordem da realização, ou
seja, o processo de deliberação dos meios que conduzam a ação, nesse caso
feitos da melhor maneira e da forma correta, pois isso que caracteriza a ação
como boa.

A deliberação tem como principio motor o homem, ele é o agente da ação,


valendo-nos da distinção entre ações voluntarias e involuntárias, vemos que o
homem só age bem no sentido estrito, se suas escolhas são intencionais, ou
melhor, quando são deliberadas.

Em VI-6 Ele estende a sua explicação sobre a função do homem, o elemento


racional da escolha, e que há uma meta a qual ele esta orientado a cumprir, a
sua reta razão parece ser a agulha da bussola moral do individuo, estando em
consonância com o desejo apropriado, ele pode identificar a mediania na sua
disposição de caráter e no bem localizado na escolha em si mesma na hora de
deliberar sobre os melhores meios de realizar essa ação.
Ações racionais oriundas de uma escolha deliberada são justamente o que
caracteriza a Eudaimonia, o circuito que o bom aluno deve seguir parece estar
completo nesse esquema; então fica a questão: 'para que precisamos da
prudência?'. Cabe evidenciar que há uma conexão intima entre a virtude moral
e a sabedoria prática, pois não há como chegar à sabedoria prática antes de
sermos virtuosos, e não há como nós mantermos na virtude sem possuir a
sabedoria necessária para agir em cada caso. Sem a sabedoria prática a virtude
seria apenas um ato mecânico e repetitivo, sem entender as razões que tornam
tal ação virtuosa seria um conhecimento em sentido fraco, pois devemos
através do habito nos apropriarmos daquele entendimento, de modo a
apreender em sentido estrito, pela própria experiência, que há uma finalidade
nas boas ações. A prudência vai atuar no aspecto cognitivo do exercício das
virtudes, ela ira avaliar as circunstancias da ação, e emitir um julgamento
relativo aos meios de realizar uma ação, essa é uma disposição complexa, que
parece ser composta de varias outras virtudes que estão conectadas a parte
desejante, sendo a prudência da parte deliberativa, sendo para Aristóteles
virtude da sabedoria prática que tem função executora no homem, que executa
de acordo com o reto desejo, ao fazer bem se torna sábio prático.

No fim Aristóteles sugere que a escolha, que dá movimento a ação, é uma


questão que se origina na opinião do sujeito, que pode ser melhor ou pior
fundamentadas, pois parece assim, não haver um bem universal que seja o
mesmo para todos em todos os casos, mas através da experiência e educação
nas boas ações, possa o bom aluno descobrir o bem para si, sendo esse um
processo gradual em que as virtudes morais e a sabedoria prática se
desenvolvem simultaneamente, pois as virtudes da parte desiderativa da alma
implicam a sabedoria prática de como empregá-las adequadamente. Desde a
criação do habito nas boas virtudes estamos colocando em nossa ação a
racionalidade prática identificando nas conseqüências se agimos bem ou não.

Ele nos leva a concluir que devemos dispor de modo racional todas as virtudes
morais, para que sejam empregadas sempre na justa medida com excelência.
Perece que, é voltando-se a para um ideal de harmonia, que concilie nossas
disposições, desejos e emoções, que na hora da deliberação, nossa razão esteja
em acordo com o reto desejo e não ocorra um conflito, nos desviando assim da
ação no bem, nos tornando no máximo continentes ou incontinentes. A
unidade das virtudes parece estar em sincronia com o exercício adequado de
nossa racionalidade. Sendo essa disposição geral um modelo direcionador da
ação a perfeição em todos os aspectos da vida, mas nesse caso uma perfeição
que é um objetivo alcançável, pois o melhor e mais perfeito está como um
ideal estabelecido na escolha do individuo.

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