Evangelho de Jesus é o mais belo poema de esperanças
e consolações de que se tem notícia. É, também, precioso tratado
de psicoterapia contemporânea para os incontáveis males que afligem a criatura humana, ensina a benfeitora Joana de Angelis, no livro Psicoterapia à luz do Evangelho de Jesus.
Come esta ótica busca-se refletir sobre a resposta do
Mestre a uma questão que lhe fora formulada, cuja narrativa encontra-se em Mateus 22, versículos 15 a 21.
Conta-nos Mateus que um grupo de fariseus, observando
Jesus falar às multidões sobre o reino de Deus, confabularam entre si com o propósito de encontrar uma forma para criar uma situação desfavorável a Jesus perante o povo e perante Roma. Juntaram-se a um grupo e de herodianos e, então, dirigiram-se a Jesus, perguntando-lhe: Mestre, bem sabemos que és verdadeiro, e ensinas o caminho de Deus segundo a verdade, e de ninguém se te dá, porque não olhas a aparência dos homens. Dize-nos, pois, que te parece? É lícito pagar o tributo a César, ou não? Jesus, porém, conhecendo a sua malícia, disse: Por que me experimentais, hipócritas? Mostrai-me a moeda do tributo. E eles lhe apresentaram um dinheiro. E ele diz-lhes: De quem é esta efígie e esta inscrição? Dizem-lhe eles: De César. Então ele lhes disse: Dai, pois, a César o que é de César, e a Deus o que é de Deus. E eles, ouvindo isto, maravilharam-se, e, deixando-o, se retiraram. (Mateus 22:15-22).
Os fariseus eram um grupo de judeus extremamente
conservadores a quem competia zelar pela pureza dos rituais prescritos na Torá. Eram fiscais da vida alheia, eram hipócritas, porque sustentavam uma aparência de bons homens, mas o coração era cheio de pecados.
Jesus criticou muito os fariseus. Eles, por sua vez,
também não simpatizam com Jesus e tudo faziam para desacreditá- lo perante o povo e fosse preso pelas autoridades judaicas e romanas.
Naquela época, Roma comandava praticamente quase
todo o mundo conhecido e, como tal, a Palestina havia sido conquistada pelo império romano.
César, era o título de nobreza e poder concedido aos
onze imperadores romanos que sucederam a Júlio Cesar. Na época de Jesus, Tibério César, imperador de Roma, impunha pesados impostos aos povos conquistados, e, assim, os judeus eram devedores de altas cargas tributárias à Cesar. Dívida de impostos à Roma resultava em escravidão do devedor e toda sua família, fato que obrigava os judeus a trabalhar muito para entregar ao império quase tudo o que ganhavam e isso os revoltava sobremaneira, levando-os a formar grupos de rebeldes para enfrentar Roma.
A narrativa também faz referência aos herodianos.
Naquela ocasião, Herodes era considerado reis dos judeus, escolhido não pelos judeus, mas nomeado por Roma. Os judeus toleravam Herodes, mas não o aceitavam, porque ele defendia os interesses de Roma. Os herodianos não eram um grupo religioso, como os fariseus, mas um grupo político, formado para favorecer e fortalecer a autoridade dos Herodes entre os judeus, e os seus membros mostraram forte hostilidade para com Jesus Cristo, em diversas ocasiões. Os fariseus e os herodianos não se simpatizavam, mas para destruir Jesus eles se uniram.
A pergunta foi formulada para comprometer Jesus, pois a
resposta, se fosse positiva, contrariaria os seguidores do Cristo; se fosse negativa, Jesus seria preso pelas autoridades romanas, como conspirador. A pergunta era, na verdade, uma cilada. A resposta, por sua vez, foi um dos maiores ensinamentos que o Mestre deixou à humanidade.
Atualíssima a resposta do Cristo, porque os seus
ensinamentos são universais e para todo o sempre. São palavras de vida eterna.
Mas a pergunta que fica para nós: O que tem a sociedade
atual com César? Cesar representava o poder político, o poder econômico, as leis.
Atualmente, como poder político e econômico é possível
identificar o símbolo representado por Cesar de outrora, na sociedade atual, nos órgãos estatais que administram os serviços públicos e cobram tributos para a administração desses serviços.
Enfim, como expressão de poder, Cesar está em todas as
organizações humanas, que se sustentam por meio da contrapartida monetária paga pelo povo.
No entanto, apesar de toda a organização, a estrutura,
que impõe regras de condutas e que cobra pesados impostos para administrar, o Estado não consegue garantir a igualdade e a felicidade no mundo, e é por isso que há tanta injustiça, sob todos os aspectos. Este é um fato real que incomoda o povo. Paga-se uma carga tributária pesadíssima e o mundo continua injusto e desigual, agravado pela corrupção no poder, onde os administradores públicos desviam para si os recursos públicos que não lhes pertence.
Esta realidade, que a imprensa não esconde, leva as
pessoas a formularem para si a mesma pergunta que os fariseus fizeram a Jesus: É certo pagar todo o imposto que o Estado exige? Sonegar, diante de tanta corrupção no poder e mau uso dos recursos públicos, seria uma opção legítima, do ponto de vista moral e ético?
Ainda hoje a voz do Cristo, que atravessou os milênios,
ressoa firme: é preciso devolver a César o que é de César.
Ressalta-se que, embora as traduções utilizem o verbo
dar, na tradução do original em grego, o verbo empregado é restituir. Jesus teria dito, então, para restituir a César o que é de César, compreendendo-se que só se pode devolver aquilo que não pertence a quem o possui.
Indaga-se, no entanto, por acaso o salário do empregado,
pelos serviços prestados, não lhe pertence? A riqueza não pertence a quem a detém? Os recursos materiais acumulados não pertencem a quem os acumulou honestamente?
A revelação espírita afirma que a matéria pertence a
matéria. Os espíritos, viajores do universo cósmico, só possuem os bens e os valores que podem carregar para qualquer dimensão do universo infinito. A parábola do rico insensato revela essa verdade.
Por isso, Jesus manda devolver.
Ainda que Injustas as leis e injustos os tributos, importa
sejam honrados, pois são frutos de um mundo injusto, de provas e expiações, onde o mal predomina. E, depois, na Terra só encarnam espíritos igualmente injustos.
São injustos os comportamento que sonegam imposto,
que descumprem as leis, que desrespeita o meio ambiente, jogando lixo nas ruas, que estaciona em local proibido ou reservado, que fura a fila, que retém o troco que foi dado por equivoco, que reserva lugares e cadeiras em ambientes públicos ao amigo que ainda não chegou, mais injustos, ainda, os os comportamentos apelidados de “jeitinho brasileiro” que capta ilegalmente a água, a energia, os sinais de tv à cabo, telefone, internet, etc. São pequenos comportamentos igualmente injustos como aqueles outros cometidos, em maior dimensão, pelos políticos e governantes injustos.
Com esses comportamentos, largamente adotado pelo
cidadão, a semelhança de outros não enumerados, o desejado mundo melhor fica cada vez mais longe.
É isso que Jesus está ensinando no texto. O mundo pode
ser injusto, mas é obrigação de cada um ser justo e cumprir com todas as obrigações impostas pelas organizações do mundo em que vive. O discípulo do Cristo não é aquele que aparenta ser, como eram os fariseus. O discípulo do Cristo é aquele que vive seus ensinamentos. Dar a Cesar o que é de César é cumprir todas as exigências do mundo material, por pior que sejam.
Descumprir as exigências e as regras do mundo,
especialmente aquelas que impõem obrigações, sob o argumento de que são injustas, escondem, na verdade, um outro propósito que o ser abriga em sua intimidade e que merece ser enfrentado.
Trata-se do interesse pessoal.
Na questão 895, do livro dos espíritos, Allan Kardec
pergunta:
Além dos defeitos e vícios sobre os quais ninguém se
enganaria, qual o sinal mais característico da imperfeição? Resposta: o interesse pessoal.
E concluem os imortais que o apego às coisas materiais é
um sinal notório de inferioridade, porque quanto mais o homem se prende aos bens deste mundo menos compreende sua destinação.
Pelo desinteresse, ao contrário, prova que vê o futuro sob
um ponto de vista mais elevado.
Essa é a grande lição que Jesus deixou, quando
recomenda que se deve devolver ao mundo o que pertence ao mundo. Jesus convida o ser a crescer para Deus, porque é de Deus. Está no mundo, mas não pertence ao mundo.
Cumprir as obrigações que o mundo impõe é regra de
ouro para quem pretende viver num mundo melhor, porquanto honrar as regras de um mundo injusto é exercício para o desapego. E o desapego representa libertação das imperfeições, afigurando-se como um cartão de embarque para um mundo melhor.