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Título:
Resumo:
Introdução
Segundo Ramírez (2018, p.46), a guitarra elétrica tem adquirido cada vez mais
um papel de relevo nos centros acadêmicos não somente refletindo nos processos
criativos em diversificados gêneros musicais, mas também “nas investigações que
buscam demonstrar a diversidade de opções composicionais e interpretativas deste
instrumento, inclusive dentro do campo específico da música acadêmica
contemporânea1”.
Este autor faz uma análise crítica de alguns trabalhos mais recentes 2 e estabelece
uma reflexão com o estado atual em que diversos autores têm desenvolvido seus
1
“Entende-se por Música Académica Contemporânea o repertório criado a partir da segunda metade do
século XX, vinculado à tradição acadêmica (também conhecida como clássica, erudita, culta, de arte ou
de concerto). Esta inclui a música acústica, mista (meios acústicos e eletrônicos), gêneros como a música
experimental, a arte sonora e seu emprego para outros campos artísticos como a dança, a arte áudio-
visual, o teatro e outros”. [tradução nossa] (Círculo Colombiano de Música Contemporánea, 2010, p.1.
Disponível em: https://ccmc.com.co/estatutos/ ).
2
Tomaro, R. “Contemporary Compositional Techniques for the Electric Guitar in United States Concert
Music”, 1994. Courribet, B. e Quintans, S. Guitarra eléctrica y creación musical contemporânea, 2010.
Mackie, Z. The Electric Guitar in Contemporary Art Music, 2013. Acrescentaríamos também este
trabalho não citado pelo autor: JAMESON, B. T. Negotiating the Cross-Cultural Implications of the
Electric Guitar in Contemporary Concert Music, 2017.
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trabalhos artísticos3, projetando um cenário emergente muito rico entre novas formas de
se pensar a composição musical contemporânea integradas a práticas performáticas
multifacetadas e também como campo instigante de investigações nas artes.
Posto esta primeira condição de abertura, propomos uma primeira questão: quais
seriam os elementos fundamentais em que o meio específico (guitarra aumentada)
estaria influenciando significativamente o processo de criação e as estratégias
composicionais, incluindo os diversos tipos de notação? E a partir desses elementos,
como estabelecer uma “experiência” com a guitarra, a guitarra como resistência
(LACHENMANN, 2004), a guitarra como espaço criativo, como instrumento
morfológico e genuinamente estendido?
lutherie is a source of expanded sonic and musical possibilities, as well as composition strategies based on
the emergent properties of a network of sound processing modules”. (O. L¨ahdeoja, B. Navarret, S.
Quintans, A. Sedes, 2010)
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Pensar a guitarra nesse outro espaço de criação e resistência nos aponta para uma
apropriação dos diversos exemplos de produções para guitarra experimental postas num
6
Cf.: BAILEY. Improvisation: its nature and practice in music, 1992.
7
Este autor pertence ao grupo de compositores da New Complexity, junto com Brian Ferneyhough, Chris
Dench, James Dillon e Michael Finnissy.
6
Em meados dos anos sessenta, via a guitarra elétrica como um lenço em branco,
vazio, um objeto para contemplar e imaginar: que podia fazer com esta coisa?
Ajudou a prestar atenção nas imagens cubistas de violões e me perguntar como
elas soariam. Minha dissertação foi sobre os violões de George Braque. O
sentido libertador que surgiu ao me afastar do instrumento e abandonar a técnica
tradicional foi extraordinário. Apliquei diretamente os processos das artes
visuais a este instrumento elétrico: o de Pollock quando postava minha guitarra
sustentada em sua caixa interagindo sobre a superfície. O de Duchamp ao
utilizar objetos encontrados tais como facas, ventiladores, coqueteleiras para
tocá-la. A Rauschenberg ao integrar um rádio. Tocar como se pintava oferecia,
quase imediatamente uma nova linguagem para o instrumento. (ROWE, 2016)
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“By physically removing a substantial portion of muscular memory from the equation, Rowe couldn’t
fail but to free himself from at least a certain amount of the tendency to fall back into known routines.
The electric guitar was uniquely accommodating to such na idea in that its electronic nature allowed for
sounds to emanate from it for a given period without the direct application of breath, hand/finger
manipulation, etc. He could at one blow virtually eliminate the sort of instrumental control issues that
dominated – and would continue to dominate – most improvising musicians while at the same time
opening up an entirely new and vast area of choices which would have less to do with the specific
instrument involved and more with the group sound as such, a recession into the kind of “egolessness”
that would became a vitally important element of the finest electro-acoustic improvisation of the coming
decades, very different from the virtuosic practices of many others in ostensibly the same field.”
(OLEWNICK, 2018, p.118)
7
Objetivos
Específicos:
Justificativa
Fundamentação Teórica
A partir dessa noção de gesto, nos remeteremos ao problema dos modos de uso 9
da guitarra e sua relação com o que Agamben chama de profanação dos dispositivo.
Para o filósofo, um dispositivo seria “qualquer coisa que tenha de algum modo a
capacidade de capturar, orientar, determinar, interceptar, modelar, controlar e assegurar
os gestos, as condutas, as opiniões e os discursos dos seres viventes” (AGAMBEN,
2009, p.40-41).
Nessa perspectiva, quase tudo são dispositivos, ou seja, sempre “algo” está nos
controlando de algum modo específico, conscientemente ou não. Daí que pensar em
dinamismos específicos operando nos limiares do sensível pode lançar aberturas para
processos criativos que jogam com a suspensão da dialética entre o sentido e o sensível,
o inteligível e o informe, como modo de “profanar” o domínio das representações pré-
determinadas e fixas. É nesse jogo de oscilação constante entre uma “produção de
sentido” e uma “produção de presença10” que nos interessa aquilo que Hans Ulrich
9
Cf.: FRANCISCHINI. Modos de uso da guitarra elétrica em práticas musicais experimentais, 2018.
10
Cf.: GUMBRECHT. Produção de Presença: o que o sentido não consegue transmitir, 2010.
11
Metodologia
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“a performance é virtualmente um ato teatral, em que se integram todos os elementos visuais, auditivos
e táteis que constituem a presença de um corpo e as circunstâncias nas quais ele existe” (ZUMTHOR,
2005, p.69).
12
Cf.: GUMBRECHT. Atmosfera, ambiência, Stimmung: sobre um potencial oculto da literatura, 2014.
13
Cf.: CHAPMAN, 2011; RIBEIRO, 2018.
12
cada caso será necessário verificar quais elementos e aspectos são mais
significativos e relevantes de acordo com a poética do compositor e de
determinadas questões que possam nos ajudar nas ideias e proposições dos
trabalhos de criação.
Comparando com a peça Zap’s Init de Claude Ledoux, a notação deixa uma
margem maior de liberdade ao intérprete, como pode-se observar já logo no início,
a indicação para improvisar sobre uma nota variando um efeito de pedal:
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Por fim, uma terceira atividade irá focar na produção de alguns projetos de
performance dentro daquilo que delineamos como dinamismos e limiares sensíveis,
buscando uma hibridização e interação com múltiplos dispositivos (utilização de
rádios, vídeo, improvisações livres, live-eletronics etc). Se num primeiro momento
nossa metodologia está direcionada para a realização de trabalhos em criação mais
formalizados, com base na análise e modelos composicionais, nesta outra proposta
há uma ruptura e desvio para um método mais rizomático 14, cartográfico15,
etnográfico. As possíveis performances (individuais ou coletivas) não seguirão
modelos ou proposições fechadas e/ou dissociadas de contextos concretos. Tudo vai
depender das contingências, dos agenciamentos entre demandas, desejos e
viabilidades.
Cronograma
14
Cf.: DELEUZE, G.; GUATTARI, F., 1995.
15
Cf.: PASSOS, E.; KASTRUP, V.; ESCÓSSIA, 2009.
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Referências:
AGAMBEN, Giorgio. Notas sobre o gesto. Artefilosofia, Ouro Preto, n.4, p. 09-14, jan.
2008.
BAILEY, Derek. Improvisation: its nature and practice in music. USA: Da Capo Press,
1992.
BROOKS, Aaron. A radical idiom: style and meaning in the guitar music of Derek
Bailey and Richard Barrett and Energy Shapes, an original composition for electric
guitar and electronic sounds. Thesis for the degree of Doctor of Philosophy. University
of Pittsburgh, 2014. Disponível em: http://d-scholarship.pitt.edu/21260/
LÄHDEOJA, O., NAVARRET, B., QUINTANS, S., SEDES, A. The electric guitar: an
augmented instrument and a tool for musical composition. Journal of Interdisciplinary
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MESA, Inti; ROWE, Keith. La Escucha sin Fondo. Cidade do México: Buró-Buró,
2017. Disponível em: http://elnicho.org/publicaciones/la-escucha-sin-fondo
OLEWNICK, Brian. Keith Rowe: the room extended. PowerHouse Books: Brooklyn,
NY, 2018.