Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
6 As estimativas são sempre alvo de desavenças, mas decidi utilizar as trazidas por Tony Judt. JUDT,
Tony. Postwar: a History of Europe since 1945. New York: Peguin Press, 2005. p. 17-18.
7 JUDT, Op. Cit. p. 14.
8 JUDT. Op. Cit. p. 15
Foi também um conflito que permeou estratégias diferentes. Enquanto se
percebia, na Primeira Guerra Mundial, uma guerra de trincheiras, de ocupação lenta e
gradual do espaço físico, a Segunda Guerra foi caracterizada por um conflito de
invasão, na qual as táticas da blitzkrieg ou da guerra relâmpago fizeram a Alemanha
rapidamente controlar boa parte do território europeu no começo da década de 1940
para depois alterarem-se para a guerra de ocupação. Os avanços tecnológicos em termos
bélicos, a ascensão da ideologia nazifascista e o espectro do comunismo também deram
bases para a iminência destrutiva.
Todavia, com o fim do conflito, questões ligadas à moralidade do mesmo
passaram a ser pertinentes: são definitivamente descobertos os campos de concentração
e trabalho forçado alemães, bem como a massiva aniquilação de judeus, como uma
indústria da morte e a vitória dos aliados leva ao questionamento as ações daqueles que,
de uma forma ou de outra, auxiliaram os nazistas. Os colaboracionistas, como ficaram
conhecidos de forma distintiva e pejorativa, tiveram papel bastante proeminente na
discussão da pós-guerra. Apesar de existirem falseamentos quanto ao apoio dado aos
alemães9, uma boa parte do auxílio à guerra movida pela máquina nazista advinha de
indivíduos que aceitaram e até foram cúmplices de suas práticas.
No entanto, mais que apenas criar uma dicotomia homogênea entre
“colaboracionistas” e “resistentes”, é preciso entender que as particularidades de cada
população era definitiva para tais questões. Alguns belgas, falantes do flamengo,
aceitaram o domínio alemão em troca de uma possível quebra da elite de língua
francesa; nos países do Báltico e na Finlândia, os alemães eram vistos como uma saída
ao domínio soviético; Eslovenos e Croatas viam a presença nazista como forma de
estabelecer nações independentes. Essa complexidade ainda é mais profunda quando se
estabelece as ações tomadas em cada região10, as diferenças internas, as questões raciais
e sociais, as disputas políticas e os desarranjos da guerra 11. Boa parte da experiência no
conflito pode ser percebida como uma guerra civil, especialmente nos Bálcãs 12. Ou seja,
apesar de existirem indivíduos que cooperaram como traidores confessos, poucos o
9 Vide exemplo de Peter Davies retirado de Maugham RCF sobre a publicação do jornal Insel Zeitung.
DAVIES, Peter J. Dangerous liaisons. London: Pearson Longman, 2004. p. 9.
10 Nas diferenciações notórias entre os tratamentos dados pelos alemães no leste e oeste da Europa,
como mencionado anteriormente.
11 Peter Davies exemplifica tal questão através da noção de “parceria” que políticos e até cidadãos de
modo geral observavam em relação ao que se poderia alcançar com a Alemanha Nazista. Ora, no
momento inicial da guerra nada se sabia (ou pouco se imaginava) sobre os caminhos que viriam na
posteridade DAVIES, Peter. Op. cit. p. 10
12 JUDT. Op. cit. p. 34.
foram em totalidade mas sim como aqueles que “rather dealt with the ocupiers because
they had to and because there was no alternative”, desenvolvendo “mecanismos de
sobrevivência” que foram importantes em termos de relação com os invasores mas
questionáveis do ponto de vista ético pois se tratavam de uma ambiguidade entre
conquistador e conquistado, ocupante e ocupado13.
O caso de Joseph Joanovici tratado pela produção de “Era uma Vez na França”
faz uma representação bastante exemplar sobre tal fato. A obra apresenta as relações que
fizeram a personagem tomar decisões ambíguas, apesar de sempre ser tratado, quanto
aos negócios, como um homem frio, calculista e focado no objetivo de garantir os
ganhos empresariais, uma espécie de mafioso que via no conflito a possibilidade de
expandir sua receita. Essa mesma percepção é presente em vários momentos da
narrativa da vida de Joanovici: primeiro tem seus pais mortos pelo exército do Czar
Nicolau II à sua frente, enquanto escondido sob a casa invadida pelos militares. É nesse
momento que conhece sua primeira esposa, Eva, e, num terror ante a passagem da
cabeça decapitada de um homem, a tranquiliza; na trama de sua fuga os policiais que o
tentavam prender, é extremamente calmo e racional; na chegada à França e em sua
relação com o Tio Krugh até o controle dos negócios do ferro-velho.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
DAVIES, Peter J. Meaning and Varieties. In: ______. Dangerous liaisons. London:
Pearson Longman, 2004. p. 9-29.
HOFFMANN, Stanley. The effects of World War II on French Society and Politics.
French Historical Studies. Vol. 2, nº. 1, Spring 1961, p. 28-63.
JUDT, Tony. Postwar: a History of Europe since 1945. New York: Peguin Press, 2005.
FONTES
Era uma vez na França: O Império do Senhor Joseph. Livro I. Galera Record, 2007.
Era uma vez na França: O Voo Negro dos Corvos. Livro II. Galera Record, 2008.