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AÇÕES COLETIVAS INTERROMPEM A PRESCRIÇÃO DAS PRETENSÕES

INDIVIDUAIS TRABALHISTAS?

MOISÉS BUENO LOPES NETO

Vivemos em uma sociedade massificada, globalizada, em que multiplicam-se direitos


sociais, mas também problemas socioeconômicos, como o desemprego e o crescimento do
trabalho informal, a exclusão social, as discriminações, etc. Dessa forma, frente à fragilização
a que está sujeito o trabalhador isolado, o legislador brasileiro assumiu uma posição de
vanguarda e criou novos instrumentos jurídicos (e aperfeiçoou os já existentes), a fim de
promover o “acesso coletivo a um moderno sistema integrado de tutela jurisdicional dos
direitos ou interesses metaindividuais” 1, o que facilita o acesso e possibilita uma maior
efetividade na defesa dos referidos direitos sociais.
A principal forma de acesso coletivo para a defesa dos interesses metaindividuais se dá
através da Ação Civil Pública, regida pela Lei 7.347/85. Tal ação é cabível no processo do
trabalho, conforme interpretação sistemática das seguintes normas: art. 1º. da Lei 7.347/85,
inciso V, cominado com o art. 129, inciso III, da Constituição Federal e (especialmente) com
o art. 83 da Lei Complementar 75/19932.
A Lei 8.078/1990 organizou no Brasil os interesses e direitos metaindivuais, gênero do
qual há três espécies, os direitos e interesses difusos, os coletivos e os individuais
homogêneos. Segundo seu artigo 81, temos os interesses ou direitos difusos, que são aqueles
transindivuais, de natureza indivisível, de que são titulares pessoas indeterminadas e ligadas
por circunstâncias de fato3; os interesses ou direitos coletivos, que são “os transindividuais de
natureza indivisível de que seja titular grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre si
ou com parte contrária por uma relação jurídica base”4; e os interesses ou direitos individuais
homogêneos, esta uma nova categoria de interesses, criada pela referida lei, que a conceitua
como a dos direitos de origem comum5.
Os direitos difusos são, então, “transindividuais (ultrapassam a órbita individual)”,
apresentam “indeterminação dos sujeitos, na medida em que atingem um número
1
LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Ação Civil Pública. São Paulo, LTr, 2001. Pp. 88-9.
2
SARAIVA, Renato. Curso de Direito Processual do Trabalho. São Paulo: Método, 2005, p.
700.
3
SARAIVA, Renato. Curso de Direito Processual do Trabalho. São Paulo: Método, 2005, p.
701.
4
BRASIL. Lei 8.078, de 11 de setembro de 1990, art. 81, parágrafo único, inciso II.
5
SARAIVA, Renato. Curso de Direito Processual do Trabalho. São Paulo: Método, 2005, p.
704.
indeterminado de pessoas cuja identificação é impossível dada a amplitude do bem jurídico
tutelado, e indivisibilidade do objeto, pois esse não pode ser quantificado e dividido ou
fracionado entre os pretensos interessados”, bem como seus titulares não possuem vínculo
associativo ou relação de base jurídica entre si, estando ligados apenas por circunstâncias de
fato6. Sua tutela é, obrigatoriamente, coletiva, uma vez que seu sujeito é indeterminado e seu
objeto, indivisível7, isto é, seria impossível para um juiz determinar quem foi atingido por
determinado dano, e em que proporção.
Os direitos coletivos, por sua vez, são transindividuais, abrangem um número de
sujeitos não determinado, mas determinável, um vínculo associativo entre estes, e, ainda,
interesse, ou objeto, indivisível, isto é, “afeto a todos indistintamente e a nenhum
pessoalmente”8. E, nas sábias palavras do autor: “tal como ocorre com os direitos difusos, em
regra os interessados não têm legitimidade para pleitear a tutela dos interesses e direitos
coletivos de forma individual. Os direitos coletivos só permitem a tutela coletiva”.
Chegamos, dessa forma, aos direitos metaindividuais que admitem tutela individual e
nos trazem à questão inicial: ações coletivas interrompem a prescrição das pretensões
individuais trabalhistas?
Estamos falando dos direitos individuais homogêneos, que são direitos individuais com
origem comum e titulares determinados; tais direitos são tuteláveis individualmente, mas
também coletivamente; conforme alguns doutrinadores, são direitos “essencialmente
individuais, mas acidentalmente coletivos”9, ou ainda, “materialmente individuais e
processualmente coletivos”10. Isso porque, embora tuteláveis individualmente, a tutela
coletiva também dessa categoria de direitos metaindividuais é uma importante forma de
pacificação social e de garantia de efetividade da tutela jurisdicional, para apresentar aqui dois
argumentos apenas, dentre tantos outros, também relevantes.
Em relação à interrupção da prescrição, temos a Orientação Jurisprudencial 359, da
Seção Especializada em Dissídios Individuais do TST, de 14 de março de 2008: “A ação

6
DANTAS, Adriano Mesquita. A prescrição da pretensão relativa a interesses e direitos
metaindividuais: enfoques trabalhistas. 2006. Disponível em
http://www.esmat13.com.br/art_normal.php?id.noticia=381. Acesso em 05 de junho de
2010.
7
Ibidem.
8
Ibidem.
9
LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Ministério Público do Trabalho: doutrina, jurisprudência
e prática. 2. ed. rev., aum. e atual. São Paulo: Ltr, 2002, pp. 162-3.
10
Ibidem.
movida por sindicato, na qualidade de substituto processual, interrompe a prescrição, ainda
que tenha sido considerado parte ilegítima ad causam”11.
Isso porque, analisando o artigo 202 do código civil, temos que interrompe-se a
prescrição, “I – por despacho do juiz, mesmo incompetente, que ordenar a citação (na justiça
do trabalho, a distribuição da ação, pois não há citação do devedor na fase de conhecimento –
grifo meu), se o interessado a promover no prazo e na forma da lei processual”, e também,
“VI – por qualquer ato judicial que constitua em mora o devedor”. Assim, o sindicato, ou
qualquer outro ente legitimado, ao entrar com ação coletiva para proteção de direitos
individuais homogêneos, interrompe o prazo prescricional para as ações individuais pautadas
sobre as mesmas causas de pedir (e apenas em relação a essas).
Parece claro que, ao ingressar com a ação coletiva (a qual será distribuída, e é, em si
própria, um ato judicial que constitui em mora o devedor), o trabalhador sai de sua inércia
(mesmo que através de substituto processual, o que está autorizado pelo art. 203, do código
civil/2002, que determina não ser personalíssimo o direito à interrupção da prescrição), e
“avisa” o devedor, de maneira que este, a partir de então, não mais pode eliminar documentos
e provas.

BIBLIOGRAFIA
BRASIL. Lei 8.078, de 11 de setembro de 1990.
DANTAS, Adriano Mesquita. A prescrição da pretensão relativa a interesses e direitos
metaindividuais: enfoques trabalhistas. 2006. Disponível em
http://www.esmat13.com.br/art_normal.php?id.noticia=381. Acesso em 05 de junho de 2010.
LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Ação Civil Pública. São Paulo, LTr, 2001.
_______. Ministério Público do Trabalho: doutrina, jurisprudência e prática. 2. ed. rev.,
aum. e atual. São Paulo: Ltr, 2002.
SARAIVA, Renato. Curso de Direito Processual do Trabalho. São Paulo: Método, 2005.
SILVA, Homero Batista Mateus da. Impactos do artigo 8º., III, da Constituição Federal de
1988, sobre a substituição processual na Justiça do Trabalho. Disponível em
http://www.cursofmb.com.br/cursofmbjuridico/artigos/download.php?
file=panoramadasubstituição. Acesso em 05 de junho de 2010.

11
SILVA, Homero Batista Mateus da. Impactos do artigo 8º., III, da Constituição Federal de
1988, sobre a substituição processual na Justiça do Trabalho. Disponível em
http://www.cursofmb.com.br/cursofmbjuridico/artigos/download.php?
file=panoramadasubstituição. Acesso em 05 de junho de 2010.

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