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“O domínio de uma profissão não exclui o

seu aperfeiçoamento. Ao contrário, será


mestre quem continuar aprendendo”.
Pierre Furter

DISCIPLINA
DIDÁTICA DO ENSINO SUPERIOR

PPRROOFFEESSSSOORR RREESSPPOONNSSÁÁVVEELL
PPaauulloo AAllccaannttaarraa

Mestrando em Educação
Especialização em Formação de Educadores
Pós-Graduado em Direito do Trabalho
Juiz do Trabalho

e-mail: professor.alcantara@yahoo.com.br
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PLANO DA DISCIPLINA

Justificativa

A disciplina de Didática do Ensino Superior pretende contribuir


para formação do professor, mediante a compreensão das especificidades
do trabalho docente, na situação institucional formativa e curricular
do ensino superior. Supõe compreender o trabalho docente, tanto na
perspectiva da construção de saberes sociais, pedagógicos e docentes
tácitos, construídos nas diversas relações pedagógicas no contexto da
sociedade, bem como no sentido da sua formalização, através da
Didática.
Entende-se esta disciplina, como campo de estudo sistematizado,
intencional, de investigação e de prática, na ótica do ensino, numa
perspectiva contextualizada que considere a historicidade dos fatores
condicionantes econômicos, sócio-culturais, políticos e educacionais
contemporâneos, como também, as influências das diversas subjetividades
individuais e coletivas envolvidas numa determinada prática pedagógica.
Esta proposta elege a sala de aula, como núcleo de referência
da Didática, e enseja a análise de práticas pedagógicas docentes
concretas, com o objetivo de apreender as suas relações (professor-
aluno, ensino-apredizagem, ensino-pesquisa, teoria-prática, conteúdo-
forma, educação-sociedade) e os seus significados ideológico-políticos,
sócio-culturais e pedagógico-didáticos.
Espera-se assim, que a disciplina venha oferecer elementos
teórico-práticos que possibilitem condições para (re)significar
práticas pedagógicas no ensino superior, apontando alternativas de
atuação que se voltem para sinalização de uma nova prática, na
perspectiva da formação de um homem pensante (crítico, independente,
autônomo), criativo (sensível) e comprometido ética e politicamente com
as mudanças na sociedade contemporânea.

Objetivos

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? situar a Didática no contexto do ensino superior, tendo como
referência alguns marcos histórico – sociais, no âmbito das
tendências do pensamento educacional e pedagógico;
? analisar a prática pedagógica docente como uma prática social nas
suas múltiplas determinações, dimensões formativas e relações
envolvidas;
? (re)significar práticas pedagógicas docentes, com base num processo
de reflexão/ação coletiva, a partir de situações concretas
observadas e/ou vividas no cotidiano do ensino superior;
? (re)organizar experiências de ensino, sob a forma de um plano de
disciplina e de aula, ou de projetos integrados (interdisciplinar),
observando os elementos constitutivos de um plano: dados de
identificação, justificativa, objetivos, conteúdos,
meios/procedimentos metodológicos/avaliativos.

Programação das temáticas/encontros semanais/05 horas-aula

1º Encontro
? Sondagem para caracterização do grupo
? Apresentação e discussão da proposta da disciplina
? A formação do professor como intelectual e os desafios da sociedade
contemporânea

Texto básico:
SANTOS, Milton. "O professor como intelectual na sociedade
contemporânea”. Conferência de Abertura do IX ENCONTRO NACIONAL DE
DIDÁTICA E PRÁTICA DE ENSINO, realizado em Águas de Lindóia - SP, de 4
a 8 de maio de 1998.

2° Encontro
? O caminho percorrido pelo conhecimento
? Características requeridas do professor
? As perspectivas em contraste

Texto básico:

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EGARTER, Elisabeth Johanna. O caminho do conhecimento Disponível em:
http://www.psicopedagogia.com.br/artigos/artigo.asp?entrID=273. Acesso
em 02.agosto.2004

3° Encontro
? A didática e o contexto do ensino superior
? Conhecimentos e habilidades pedagógicas
? O domínio cognitivo e afetivo
? A didática e as tendências pedagógicas

Textos básicos:
LIBÂNEO, José Carlos. "A didática e as tendências pedagógicas”. In
Revista Idéias. São Paulo, 11. 1991: 28-38.

4º Encontro

? Formação, docência e currículo no ensino superior


? A atividade docente
? O processo de avaliação do ensino
? A avaliação: conceito, funções pedagógicas e sociais
? Cultura avaliativa e as questões de poder
? Procedimentos de avaliação/critérios/contrato didático e
? Avaliação geral da disciplina

Metodologia

A metodologia do curso basear-se-á num processo de ação-


reflexão-ação individual e coletiva, tomando como foco a relação entre
ensino e produção do conhecimento.
Durante o curso serão desenvolvidas as seguintes atividades:
? exposição dialogada;
? seminários;
? trabalhos individuais e em grupo;
? produção de textos.

Avaliação

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A avaliação do curso será contínua, tomando por base a produção
do conhecimento individual e coletiva. Isto implica num acompanhamento
de situações teórico-práticas vivenciadas ao longo do curso, acerca do
ensino, com vistas a um redirecionamento crítico–reflexivo (técnico-
político) da prática docente.
A sistemática de avaliação do curso constará de verificação do
desempenho dos alunos nas seguintes atividades:

Atividades individuais:
Resenhas, esquemas, observação e registro de aula no ensino e
produção de relatos.
Atividades de grupo:
Planejamento/execução/avaliação de seminários;
Produção de textos;
Sistematização de um texto sobre o tema: a Didática do ensino
superior.

Critérios de avaliação:
Assiduidade e participação nos encontros na sala de aula;
Leitura e produção de textos (apresentando os critérios de
sistematização teórico-prática, fundamentação lógica,
contextualização, crítica, criatividade).

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METODOLOGIA DO ENSINO

O PROFESSOR

CARACTERÍSTICAS REQUERIDAS DO PROFESSOR

FÍSICAS E PSICOTEMPERAMENTAIS INTELECTUAIS


FISIOLÓGICAS
Resistência à fadiga Estabilidade Inteligência abstrata
emocional
Capacidade funcional Versatilidade Inteligência verbal
do sistema
respiratório
Clareza vocal Iniciativa Memória
Acuidade visual Autoconfiança Observação
Acuidade auditiva Disciplina Raciocínio lógico
Paciência Rapidez de raciocínio
Cooperação Precisão de raciocínio
Estabilidade de ritmo Imaginação
Atenção difusa Discriminação
Associação
Orientação
Coordenação
Crítica

AS PERSPECTIVAS EM CONTRASTE

Perspectiva Clássica Perspectiva Humanista Perspectiva Moderna


Adaptação dos alunos Adaptação da escola Harmonização entre as
aos objetivos da às necessidades dos necessidades dos alunos
escola alunos e os valores sociais
Certeza Dúvida Probabilidade
Competição Cooperação Crescimento
Autocracia Laissez-faire Participação
Disciplina Liberdade Responsabilidade
Reprodução Descoberta Criatividade
Orientação para o Orientação para o Orientação para a
conteúdo método solução de problemas
Ênfase no ensino Ênfase na Ênfase no processo
aprendizagem ensino-aprendizagem

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CONHECIMENTOS E HABILIDADES PEDAGÓCICAS

O professor precisa dispor de conhecimentos e habilidades


pedagógicas, que podem ser obtidas e aperfeiçoadas mediante leituras e
cursos específicos. Estes conhecimentos e habilidades podem ser
definidos como requisitos técnicos e envolvem:

a) Estrutura e Funcionamento do Ensino Superior — O professor deve ser


capaz de estabelecer relações entre o que ocorre em sala de aula com
processos e estruturas mais amplas. Isto implica a análise dos
objetivos a que se propõe o ensino universitário brasileiro, bem
como dos problemas que interferem em sua concretização. E exige
conhecimentos relativos à evolução histórica das instituições e à
legislação que as rege.

b) Planejamento de Ensino — A eficiência na ação docente requer


planejamento. O professor precisa ser capaz de prever as ações
necessárias para que o ensino a ser ministrado por ele atinja os
seus objetivos. Isto exige a cuidadosa preparação de um plano de
disciplina e de tantos planos de unidade quantos forem necessários.

c) Psicologia da Aprendizagem — O que o professor espera de seus alunos


é que aprendam o conteúdo da disciplina que pretende lecionar. Neste
sentido conhecimentos de Psicologia poderão ser muito úteis, pois
esclarecem acerca dos fatores facilitadores da aprendizagem.

d) Métodos de Ensino — A moderna Pedagogia dispõe de inúmeros métodos


de ensino. Convém que o professor conheça as vantagens e limitações
de cada método para utilizá-los nos momentos e sob as formas mais
adequadas.

e) Técnicas de Avaliação — Não se pode conceber ensino sem avaliação.


Não apenas a avaliação no final do curso, mas também a avaliação
formativa, que se desenvolve ao longo do processo letivo e que tem
por objetivo facilitar a aprendizagem. Assim, o professor
universitário precisa estar capacitado para elaborar instrumentos
para a avaliação dos conhecimentos e também das habilidades e
atitudes dos alunos.

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O DOMÍNIO COGNITIVO ENVOLVE SEIS CATEGORIAS:

1. MEMORIZAÇÃO — Evocação de algo que tenha sido aprendido. Os


objetivos desta categoria podem ser expressos pelos verbos: citar,
identificar, listar, definir etc. Por exemplo: “Definir o conceito
de Administração Científica”.

2. COMPREENSÃO — Reafirmação do conhecimento sob novas formas. Neste


nível, o indivíduo conhece o que está sendo comunicado e pode fazer
uso do respectivo material ou idéia. Não se torna, porém, capaz de
relacioná-lo a outro material ou de perceber suas implicações mais
complexas. Os objetivos desta categoria podem ser expressos pelos
verbos: ilustrar, exemplificar, traduzir etc. Por exemplo:
“Exemplificar as regras de concordância verbal”.

3. APLICAÇÃO — Uso de abstrações em situações particulares e concretas.


As abstrações podem apresentar-se sob a forma de idéias gerais,
princípios técnicos ou regras de procedimento que devam ser
aplicadas. Os objetivos desta categoria podem ser expressos pelos
verbos: aplicar, demonstrar, usar, inferir etc. Por exemplo:
“Aplicar o princípio da resistência a situações práticas em
Aerodinâmica”.

4. ANÁLISE — Separação de um todo em partes componentes. Em sua forma


mais elementar, a análise envolve uma simples relação de elementos.
Num nível mais elevado implica determinar a natureza do
relacionamento entre esses elementos. Os objetivos desta categoria
podem ser expressos pelos verbos: analisar, distinguir, categorizar,
discriminar etc. Por exemplo: “Distinguir juízos de fato de juízos
de valor”.

5. SÍNTESE — Combinação conjunta de certo número de elementos para


formar um todo coerente. Envolve o processo de trabalhar com peças,
partes ou elementos, dispondo-os de forma a constituir um padrão ou
estrutura que antes não estava evidente. Os objetivos desta
categoria podem ser expressos pelos verbos: resumir, compor,
formular, deduzir etc. Por exemplo: “Resumir uma obra literária”.

6. AVALIAÇÃO — Julgamento acerca do valor do material e dos métodos


para propósitos determinados. Esta categoria constitui o mais alto
nível da taxionomia no domínio cognitivo. Seus objetivos podem ser
expressos pelos verbos: avaliar, criticar, julgar, decidir etc. Por
exemplo: “Avaliar um plano de disciplina, levando em consideração o
conteúdo programático e o nível de conhecimento dos alunos”.

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O DOMÍNIO AFETIVO

O Domínio afetivo envolve cinco categorias:

1. RECEPTIVIDADE — Disposição para tomar consciência de um fato e de


prestar atenção ao mesmo. Esta categoria constitui o nível mais
baixo da taxionomia, e seus objetivos podem ser expressos pelos
verbos: escutar, atender, perceber, aceitar etc. Por exemplo:
“Escutar o que os colegas dizem”.

2. RESPOSTA — Reação a um fato. Neste nível o estudante vai além da


simples receptividade; ele está disposto a receber o estímulo dado,
não o evitando. Os objetivos desta categoria podem ser expressos
pelos verbos: concordar, acompanhar, responder etc. Por exemplo:
“Acompanhar com atenção a exposição do professor”.

3. VALORIZAÇÃO — Reconhecimento do valor de uma coisa, fenômeno ou


comportamento. Dentre os verbos que expressam objetivos desta
categoria estão: reconhecer, apreciar, aceitar etc. Por exemplo:
“Reconhecer a importância das relações humanas no trabalho”.

4. ORGANIZAÇÃO — Organização de valores num sistema. Quando o estudante


encontra mais de um valor relevante para uma situação, ele os
organiza, determina a inter-relação e aceita um como o dominante. Os
verbos organizar, pesar, formar, desenvolver e discutir são
utilizados para expressar objetivos desta categoria. Por exemplo:
“Formar seu próprio código de conduta como dirigente de uma
entidade”.

5. CARACTERIZAÇÃO POR UM VALOR OU COMPLEXO DE VALORES — Neste nível,


que é o mais elevado do domínio afetivo, o estudante age firmemente
de acordo com os valores que aceita, tornando-se este comportamento
parte de sua personalidade. Os verbos revisar, mudar, rejeitar e
acreditar expressam objetivos desta categoria. Por exemplo: “Revisar
sua filosofia educacional a partir da análise das obras de Paulo
Freire”.

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A ATIVIDADE DOCENTE

Toda a atividade docente pode ser entendida como um processo de


comunicação, conforme o esquema:

Emissor ? Codificador ? Mensagem ? Canal ? Decodificador ? Receptor

? O professor é o emissor, que tem um objetivo: fazer com que os


alunos aprendam a matéria.

? Para tanto precisa criar uma mensagem.

? Então, seu sistema nervoso central ordena o seu mecanismo vocal


para exprimir o objetivo.

? Seu mecanismo vocal, servindo como codificador, produz uma


mensagem.

? Essa mensagem é transmitida por ondas sonoras, para que os


alunos a recebam.

? Este é o canal.

? Os alunos são os receptores.

? Seus mecanismos auditivos são os decodificadores, que


decodificam a mensagem em impulsos nervosos e a remetem ao
sistema nervoso central, produzindo o entendimento da mensagem.

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REQUISITOS TÉCNICOS

PREPARO ESPECIALIZADO NA MATÉRIA

Para ministrar determinada disciplina o professor precisa


conhecê-la com profundidade bem maior do que a exigida no programa.
Isto é importante para que ele possa ressaltar os seus aspectos
fundamentais e esclarecer acerca de suas aplicações práticas. E
também para solucionar eventuais problemas formulados pelos alunos
ao longo do período letivo.

No caso de disciplinas de cunho mais prático convém também que


o professor detenha sólida experiência na área. Seria descabido, por
exemplo, um professor se dispor a lecionar Direito Processual Civil
sem ter exercido atividade profissional nesse campo.

CULTURA GERAL

Embora especializado em determinada área, o professor precisa


possuir também cultura geral. Isto é importante porque todas as
áreas do conhecimento se inter-relacionam. É fácil verificar como
qualquer comportamento humano, por mais específico que seja,
apresenta inúmeros condicionamentos – econômicos, sociais,
políticos, etc.

Este tipo de educação, caracterizada pelo ato de depositar,


transferir, transmitir valores e conhecimentos é chamado por Paulo
Freire de “bancária”. Nela:

a) O educador é o que educa; os educandos, os que são educados.


b) O educador é o que sabe; os educandos, os que não sabem.
c) O educador é o que pensa; os educandos, os pensados.
d) O educador é o que diz a palavra; os educandos, os que a escutam
docilmente.
e) O educador é o que disciplina; os educandos, os disciplinados.
f) O educador é o que opta e prescreve a sua opção; os educandos, os
que seguem a prescrição.
g) O educador é o que atua; os educandos, os que têm a ilusão de que
atuam, na atuação do educador.
h) O educador escolhe o conteúdo programático; os educandos jamais
são ouvidos nesta escolha, acomodam-se a ele.
i) O educador identifica a autoridade do saber com sua autoridade
funcional, que se opõe antagonicamente à liberdade dos educandos;
estes devem adaptar-se às determinações daquele;

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j) O educador, finalmente, é o sujeito do processo; os educandos,
meios objetos.
(Freire, 1985, p. 67).

Sabemos, por exemplo, dos benefícios positivos que alcançam os


estudantes cujo objetivo é incrementar a própria competência e conhecer
a fundo o que estudam. Já quanto aos contextos, destacam-se quatro
aspectos essenciais:

— O começo da aula
— A organização das atividades
— A interação do professor com seus alunos e
— A avaliação da aprendizagem.

Saber motivar para a aprendizagem escolar não é tarefa fácil.


Em primeiro lugar, o ser humano, o aluno, é alguém que se move
por diversos motivos e emprega uma energia diferencial nas tarefas que
realiza. Esse caráter de pluridimensionalidade evita a tentação de
interpretar a conduta humana como devida a um só fator e convida à
reflexão pessoal e ao exame das razões por que as pessoas fazem o que
fazem. Respostas simples devem ser descartadas.
Em segundo lugar, motivar para aprender implica lançar mão de
recursos não exclusivamente pontuais que obedeçam apenas a um momento
determinado. O professor pode, é verdade, aproveitar algum recurso
transitório para uma situação de aprendizagem específica, mas,
sobretudo, trata-se de instaurar processos motivacionais que tendam a
realimentar-se nos alunos. Para isso, é necessário promover uma
interação de qualidade com os alunos baseada em seu conhecimento.
Em terceiro lugar, a dimensão do contexto.Saber motivar implica
ter presentes tanto os contextos da aprendizagem mais próximos como os
mais distantes, desde o espaço físico até a família, passando pelos
ambientes informais e legais. Apenas considerando esses contextos,
poder-se-ão entender alguns comportamentos não motivados para aprender.

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Aluno cuja meta é Aluno cuja meta é Diferenças
aprender salvar sua auto-estima
A B
É interessante. Como O que posso contar? Para o aluno A a
poderia contar o que Que chateação! Vai tarefa apresenta um
vi? Vou tentar fazer valer nota! desafio; para o B, uma
um bom trabalho. ameaça.
Vejamos... Vou Vejamos... Segunda- O aluno A se concentra
imaginar que conto feira fomos visitar um no processo a seguir;
para X. Como tornar o museu... Que mais o aluno B, no
texto interessante? conto? Só tenho uma resultado.
hora...
Prof.: A, você cometeu Prof.: B, você O aluno A procura
um erro com o verbo empregou errado o esclarecimento e
“tinha”. verbo “tinha”. valoriza o professor
A: Por que? Escrevi B: Não me dei conta. como um recurso para
corretamente “tinha”. (pensando consigo aprender; ao
Prof.: Mas, quando diz mesmo: Que coisa, não contrário, o aluno B
“tinha muitos deixa passar uma. Será se mostra defensivo,
quadros”, o verbo que que consegui boa nota? se concentra nos
deveria usar é resultados e considera
“havia”. o professor um juiz
A: Obrigado, não vou hostil.
mais esquecer
Mas como posso saber (Voltando para seu O aluno A procura a
se se trata um verbo lugar e dirigindo-se a informação que lhe
ou outro? um colega): O que ele permita aprender,
Prof.: Se substituir falou para você? enquanto o aluno B
“havia” por Corrigiu-lhe quatro procura uma que lhe
“existiam”, o sentido erros? A mim só um. permita salvar sua
continua o mesmo. auto-estima.

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Como aumentar a motivação dos alunos não é um tema fácil.

— O que um professor pode fazer para que seus alunos se


interessem por sua matéria?

— Como assegurar que os alunos serão capazes de realizar o


esforço sistemático que o estudo e a compreensão dos
principais temas requerem?

— Por que determinado aluno não avança em minha matéria quando


as capacidades que intuímos nele são mais que suficientes?

— Como poderia conseguir que o interesse que determinado aluno


tem por outra matéria o tivesse também pela minha?

— De que maneira deveria organizar minha classe para que a


maioria dos alunos se interessasse pelas atividades e
tarefas realizadas?

— Que conteúdos ou que tipo de conteúdo são mais adequados


para que nossos alunos realizem uma aprendizagem
significativa?

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APRENDIZAGEM SIGNIFICATIVA

Definição descritiva Fundamentação epistemológica


É a aprendizagem na qual o aluno, baseando-se na atividade interna
a partir do que sabe conceitos-base
e graças à maneira como o função mediadora
professor apresenta a nova
informação,
reorganiza conflito cognitivo
seu conhecimento do mundo esquemas cognitivos
ao encontrar novas dimensões, interação subordinada ou supra-
ordenada
transfere esse conhecimento a funcionalidade cognitiva
outras situações ou realidades,
descobre o princípio e os significatividade lógica
processos que o explicam
e, portanto, melhora sua aprender a aprender
capacidade de organização
abrangente
para outras experiências, idéias, significatividade psicológica
fatos, valores e processos de
pensamento que adquirirá dentro ou
fora da escola.

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Comparativo entre as chamadas pedagogia do êxito e pedagogia do erro.
PEDAGOGIA DO ÊXITO PEDAGOGIA DO ERRO
1. Consideração do erro
Desvio da norma. Desajuste entre o esperado e o
Comportamento inadequado. obtido
Elemento regressivo, prejudicial Elemento construtivo, inovador
na aprendizagem
Caráter de sanção, punitivo Condição concomitante com a
aprendizagem
Evitação do erro Aceitação e análise do erro.
Diagnóstico
Indicador de resultados não- Sintoma de processos de
conseguidos aprendizagem
2. Enfoque conceitual
Atende a resultados Atenção preferencial a processos
Predomínio de critério de eficácia Predomínio de critério de
eficiência
Relação entre objetivo e produtos Relação entre processo, meio,
produto
Origina pedagogia por objetivos Origina pedagogia de processo
Pesquisa de eficácia no ensino- Pesquisa de processos cognitivos
aprendizagem
3. Papel do professor
Corrige e sanciona erros, Diagnóstico por meio dos erros
equívocos
Planeja ações que assegurem êxito Apresenta situações de
aprendizagem
Dirige a aprendizagem Orienta e guia a aprendizagem
Atitude rígida diante do plano Atitude flexível diante do plano
inicial inicial
Avalia principalmente os Avalia também processos,
conhecimentos estratégias, etc.
4. Papel do aluno
Atitude receptiva para com o plano Atitude participativa no plano de
atividades
Predomina o princípio de Integra individualização e
individualização socialização
Aprendizagem centrada em objetivos Maior amplitude de aprendizagem
de conhecimento
5. Metodologia e avaliação
Exercícios e aplicação Heurística e aprendizagem autônoma
Centrada na avaliação de objetivos Avaliação de processos, meios e
conceituais resultados
Instrumentos objetivos ou Instrumentos objetivos e
objetiváveis subjetivos
6. Modelos e estratégias docentes
Aprendizagem pelo domínio de Método natural de Freinet.
Block. Ensino/aprendizagem criativos.

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Ensino programado. Aprendizagem por resolução de
Planejamentos tecnológicos de problemas.
instrução. Aprendizagem compartilhada...
Ensino assistido por computador.

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RECURSOS PARA USAR NA SALA DE AULA

Recursos Visuais Recursos Auditivos


Quadro branco Rádio
Flanelógrafo Discos
Imantógrafo Fita magnética
Cartazes
Mapas
Flip chart (bloco de papel)
Álbum seriado
Diapositivos
Diafilmes
Transparências
Fotografias
Mural didático
Objetos
Holografia

Recursos Recursos Audiovisuais


Audiovisuais Integrados ao Computador
Tradicionais
Diapositivos com som Videodisco
Diafilmes com som Data-show
Cinema sonoro Projetor de multimídia
Televisão
Videocassete

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UTILIZANDO TRANSPARÊNCIAS OU COMPUTADOR

Slide ___________________________________
1

DIDÁTICA DO
___________________________________
___________________________________
ENSINO ___________________________________
___________________________________
Paulo Alcantara ___________________________________
Pós-graduado em Direito e em Educação
___________________________________

Slide ___________________________________
DIDÁTICA DO ENSINO
2
• “O DOMÍNIO DE UMA PROFISSÃO ___________________________________
NÃO EXCLUI O SEU ___________________________________
APERFEIÇOAMENTO. AO ___________________________________
CONTRÁRIO,
CONTRÁRIO, SERÁ
SERÁ MESTRE
MESTRE QUEM
___________________________________
CONTINUAR APRENDENDO.”
___________________________________
• Pierre Furter
___________________________________

Slide ___________________________________
DIDÁTICA DO ENSINO
3 • Pedagogia vem do grego
grego
___________________________________
paidós = criança ee gogein = conduzir
• paidós
• Assim, a pedagogia referir-
referir- se
se--ia apenas à ___________________________________
educação das crianças.
• Por essa razão é que alguns autores ___________________________________
preferem falar em androgogia (do grego:grego:
andragos = adultos) para se referir aos
esforços sistemáticos destinados àà ___________________________________
formação de adultos.
• Por pedagogia entende
entende- se hoje o conjunto ___________________________________
de doutrinas, princípios e métodos
métodos de de
educação tanto da criança quanto do adulto. ___________________________________

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Slide DIDÁTICA DO ENSINO ___________________________________
4 • A preparação do professor universitário
ainda é bastante precária. ___________________________________
• Seguramente, a maioria dos
professores brasileiros que lecionam ___________________________________
em estabelecimentos de ensino
superior não passou por qualquer ___________________________________
processo sistemático de formação
pedagógica. ___________________________________
• E ainda mostra certo vigor a crença de
que o fundamental para o exercício do ___________________________________
magistério nesse nível é o domínio
adequado da disciplina que o professor
se propõe a lecionar. ___________________________________

Slide ___________________________________
DIDÁTICA DO ENSINO
5 • Mesmo tendo títulos como os de
Especialização, Mestre ou de Doutor, os ___________________________________
professores que lecionam nos cursos
universitários, na maioria dos casos, não
passam por qualquer processo sistemático ___________________________________
de formação pedagógica.
• De acordo com este raciocínio: ___________________________________
– O importante é o domínio dos
conhecimentos referentes à matéria que ___________________________________
leciona;
– Aliado à prática profissional; ___________________________________
– Seus alunos, por serem adultos, estariam
suficientemente motivados para a
aprendizagem. ___________________________________

Slide DIDÁTICA DO ENSINO ___________________________________


6 • Necessidade de habilidades pedagógica.
• Se torna muito freqüente alunos: ___________________________________
– ao fazerem a apreciação de seus professores:
– ressaltar sua competência técnica; e ___________________________________
– criticar sua didática.
• A preparação pedagógica do professor, não
constitui tarefa fácil. ___________________________________
• Primeiro não há uma tradição de cursos
destinados à preparação desses professores
• Depois, porque, em virtude de: ___________________________________
– acomodação, temor de perda de status ou
– de não-reconhecimento da importância da ___________________________________
formação pedagógica
– muitos negam-se a participar de programa de
formação ou aperfeiçoamento nessa área. ___________________________________

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Slide ___________________________________
DIDÁTICA DO ENSINO
7 • Nem sempre se valoriza o professor no ___________________________________
desempenho de suas funções docentes.
• O prestígio de uma universidade é medido ___________________________________
por seus cursos de pós-graduação e pelas
pesquisas que promove.
___________________________________
• O professor, tende a ser valorizado por sua
titulação e por seus trabalhos científicos.
___________________________________
• Seu mérito como professor não é avaliado.
• Chega-se, portanto, à irônica conclusão de ___________________________________
que “nas instituições denominadas de ensino
superior, o ‘ensino’ nem sempre é levado em
conta” ___________________________________

Slide DIDÁTICA DO ENSINO ___________________________________


8 • EVITAR O AMADORISMO PEDAGÓGICO ___________________________________
• NÃO SE PODE MINISTRAR AULAS
USANDO A TÉCNICA DE “ENSAIO E ___________________________________
ERRO”
• ENSINAR NÃO PODE SER CONSIDERADO ___________________________________
SIMPLESMENTE COMO UM “DOM”
• ENVOLVE O DOMÍNIO DE TÉCNICAS ___________________________________
ESPECÍFICAS
• E UM TIPO DE COMPETÊNCIA ___________________________________
PROFISSIONAL (A PEDAGÓGICA)
• NÃO SUBESTIMAR O PEDAGÓGICO NO ___________________________________
TRABALHO

Slide ESTRATÉGIAS DE ENSINO ___________________________________


9 • CONCEITUAÇÃO DE APRENDIZAGEM ___________________________________
• O PROCESSO DE APRENDIZAGEM
– A COMPLEXIDADE DO PROBLEMA ___________________________________
– DIFERENÇAS INDIVIDUAIS
___________________________________
– MOTIVAÇÃO
– CONCENTRAÇÃO ___________________________________
– REAÇÃO
– REALIMENTAÇÃO ___________________________________
– MEMORIZAÇÃO
– TRANSFERÊNCIA ___________________________________

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Slide ESTRATÉGIAS DE ENSINO ___________________________________
10
• APLICAR PRINCÍPIOS PSICOLÓGICOS ___________________________________
– RECONHECER AS DIFERENÇAS INDIVIDUAIS
– MOTIVAR OS ALUNOS ___________________________________
– MANTER OS ALUNOS ATENTOS
– ESTIMULAR REAÇÕES DOS ALUNOS ___________________________________
– FORNECER FEEDBACK
– FAVORECER A RETENÇÃO ___________________________________
– CRIAR CONDIÇÕES PARA POSSIBILITAR A
TRANSFERÊNCIA ___________________________________
• COMO SER UM FACILITADOR DA
APRENDIZAGEM
___________________________________

Slide ___________________________________
DIDÁTICA DO ENSINO
11
• A ATIVIDADE DOCENTE ___________________________________
– PROCESSO DE COMUNICAÇÃO
___________________________________
• EMISSOR ? O Professor
• CODIFICADOR ? Mecanismo Vocal ___________________________________
• MENSAGEM ? Matéria a ser ensinada
• CANAL ? Recursos Visuais/Sonoros
___________________________________
• DECODIFICADOR ? Mecanismos ___________________________________
Auditivos e Visuais dos alunos
• RECEPTOR ? Os Alunos ___________________________________

Slide DIDÁTICA DO ENSINO ___________________________________


12 • A AULA EXPOSITIVA ___________________________________
– Caracterização
– Fundamentos teóricos da exposição
– O modelo clássico de exposição ___________________________________
– A exposição no contexto da moderna ciência
da comunicação ___________________________________
– Aplicação dos princípios de comunicação em
sala de aula
– Em relação à fonte ___________________________________
– Em relação à mensagem
– Em relação ao canal ___________________________________
– Em relação aos receptores
– O uso adequado da aula expositiva ___________________________________

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TEXTO - 01

Conferência de Abertura do IX ENCONTRO NACIONAL DE DIDÁTICA E


PRÁTICA DE ENSINO, realizado em Águas de Lindóia - SP, de 4 a 8 de maio
de 1998.

O PROFESSOR COMO INTELECTUAL NA SOCIEDADE CONTEMPORÂNEA1


Profº Milton Santos2

Nos inícios da história, as técnicas e o trabalho eram


conformados em sua relação com o meio geográfico. Eram técnicas dóceis
às exigências do entorno e do grupo, que assim era capaz de exercer sua
política. Esta se define corno a escolha, no momento dado, das ações
desejáveis e possíveis. E a primeira das ações do homem é aquela sobre
o seu entorno, ao qual se chamava, no passado, natureza, e que, hoje,
podemos chamar espaço, na medida em que o entorno do homem é cada vez
menos natural. A natureza foi, de alguma maneira, expulsa do espaço do
homem, e, o que se põe em lugar dela é um produto da técnica, de tal
modo que, nas cidades, e também nos campos - e o interior do Estado de
São Paulo é uma prova disso - a realização humana acaba sendo uma ação
da inteligência sobre a inteligência. É, aliás, também nesse sentido,
que vivemos o século da inteligência, porque as coisas resultam da
inteligência do homem, sobre as quais a inteligência como ação se
exerce.
Hoje, em sua produção, a técnica se subordina a uma criação
exógena aos grupos, obedientes a uma demanda de ação que é também bem
exógena, comandada pelo que, equivocadamente, mas insistentemente,
ainda chamamos de “mercado global”.
Essa técnica é, de alguma forma, tornada autônoma quanto á
produção local das idéias políticas e quanto à sua concretização como
história. Em lugar, pois, de um tempo dos Homens, o que vimos
assistindo realizar-se é um tempo da técnica-mercado, isto é, a técnica

1
Este texto, ligeiramente modificado pelo Autor, resulta da transcrição de gravação de conferência do Professor Milton Santos,
pronunciada a partir de notas.
2
Professor Emérito da Universidade de São Paulo.

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subordinada a esse “mercado global”. A conseqüência mais importante é
que o grupo passa a atuar sem política própria, o que, aliás, é o caso
do Brasil hoje, onde o Estado e os políticos renunciaram à
política...... e são, afinal, as empresas globais que fazem a política,
jogando o Estado, pelos seus aparelhos, à situação de apenas secundar a
política exigida pelo "mercado global", ao qual se subordina.
Ao mesmo tempo, essa técnica assim imposta leva a uma crescente
separação entre ciência e verdade, entre ciência e saber, ciência e
filosofia. Até o começo deste século, quando nos referíamos a
"ciência", inclinávamo-nos diante dela, certos do que era portadora da
verdade. Hoje, sabemos que freqüentemente ela está em divórcio com a
verdade, quando subordinada a razão técnica, que, ela própria, é
subordinada ao mercado. Neste caso, escolhe algumas ações e afastam
outras e desse modo torna-se distante da verdade. E, sendo cada vez
mais algo do interesse das coisas, isto é, do mercado.
Num mundo cada vez mais dominado pela técnica, considerada como
autônoma, e pelo mercado, considerado como irresistível, a técnica e o
mercado estão se impondo como baluartes da produção e da vida, e
penetrando assim, nos fundamentos do ensino.
Devemos estar atentos para Isso. O mundo que nos cerca não é,
apenas, uma criação do espírito; ele existe concretamente. É dele,
pois, que devemos partir para construir outra coisa, isto é, outro
mundo. Será um equívoco colocarmo-nos de fora do mundo, a pretexto de
criticá-lo. Ao contrário, o que devemos fazer é tentar uma analise do
que o mundo é hoje, porque apenas a partir dessa análise seremos
capazes de propor outra coisa. Toda analise é por si só uma crítica.
Não há forma de analisar que não seja paralelamente uma forma de
criticar, Já que a análise não é nada congelado, nem predeterminado,
resultando da apreciação das condições históricas que se realizam em um
dado momento. As coisas produzidas devem ser vistas de forma dinâmica,
já que a história é jamais repetitiva. Assim também, por mais que
alguns dos malefícios da era presente sejam imputados às técnicas, não
devemos descuidá-las do nosso interesse analítico, se queremos a
partir deste mundo - que é o único que temos - tentar construir outra
coisa, outro mundo.

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O nosso tempo consagra a união da técnica com a ciência e marca
uma grande mudança histórica, com a emergência do que se chama de
“tecno-ciência”. Agora, e de um modo geral, já não é a ciência que
comanda a técnica, mas esta que comanda a ciência. E como as técnicas
acabam sendo comandadas pelo mercado, o trabalho de pensamento dos
homens torna-se limitado o estreito. É essa a tragédia da atividade
científica na era da globalização.
Estamos vivendo, neste ano de 1998, uma formidável mudança de
patamar na história da economia mundial, diante das
concentrações extraordinárias que se estão dando nas duas áreas
centrais da história contemporânea, isto é: a área do dinheiro e a área
da informação. Não esqueçamos de que a nossa era caracteriza-se pela
tirania do dinheiro e pela tirania da informação, sendo esta
indispensável para que se exerça a tirania daquela.
A tirania da informação não é, apenas, a da mídia, porque inclui,
também, o nosso trabalho na universidade. Quero insistir nessa tecla,
porque o nosso trabalho como professores é a base com a qual se educam
e se re-educam as gerações. Quanto mais o nosso trabalho for livre,
mais educaremos para a cidadania. Quanto mais o nosso trabalho for
acorrentado, mais estaremos produzindo individualidades débeis. É
urgente que o ensino tome consciência dessa situação, para esboçar a
merecida reação, sem a qual corremos o grande risco de ficar cada vez
mais distante da busca ideal da verdade. Sabemos que nunca a
alcançaremos completamente, mas essa busca é o nosso destino, o nosso
dever e é, também, a forma com a qual encontramos a nação, que tanto
espera do nosso trabalho. Do outro lado, fica a ameaça do divórcio
entre a função de ensinar e o papel do intelectual.
As conseqüências dessa encruzilhada em que nos encontramos são
várias e algumas das razões dessa situação devem ser de
alguma forma relembradas.
Esse absolutismo das técnicas, a que nos temos referido, tem
muito que ver com a forma como o ensino, hoje, é dado e com a forma
como o ensino é hoje um resultado da perversidade dos nossos tempos.
Há, em primeiro lugar, esse imaginário das técnicas, um enorme, um
extraordinário, imaginário. Um outro dado, levando ao absolutismo das
técnicas, é o papel da informação. Todos somos, mais ou menos,

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seduzidos pelos progressos técnicos, sobretudo na área da informação e,
com freqüência, os aceitamos sem nenhuma crítica, como se o progresso
técnico valesse por si só e não como função da maneira como a sociedade
se organiza. Cremos, também que esse despotismo das técnicas vem do
fato de que, neste fim de século, aquilo que, desde o século XVIII, os
economistas desejavam e os filósofos temiam, acabou por se dar: a
interdisciplinariedade, isto é, a forma como as diversas disciplinas
conversam, passou a ser comandada pela economia, em vez de ser
comandada pela filosofia. E aí nos encontramos, os geógrafos e os
educadores. Os geógrafos sabemos que, seja qual for a ação do homem –
técnica, econômica, política, cultural, moral – ela é um dado da
criação dos lugares na superfície da Terra. Os lugares abrigam todo
tipo de atores – os mais ricos, os mais pobres, as empresas grandes e
pequenas, as instituições poderosas e as instituições subalternas – ali
formando uma unidade, apesar da diversidade de seus componentes. A
interpretação dos lugares – assim unitários e complexos – é, ao seu
modo, uma filosofia das técnicas, também empreendida pela Educação. Da
mesma forma como pretendemos – os geógrafos – realizar uma tal
filosofia, os educadores são também filósofos, quando recusam a aceitar
as coisas como se fossem apenas objetos e buscam entender o que dentro
delas representa para o homem, na realização da sua história e da sua
vida.
Ora, nas circunstâncias atuais, as técnicas parecem exatamente
conduzir a algo que se opõe à vida, com a matematização da existência,
e a algo que se opõe ao pensamento abrangente, impondo um pensamento
calculante, e com este todas as formas de utilitarismos, que conduzem a
imediatismos, levando ao banimento da idéia de futuro. Quando, porém,
consideramos as técnicas em conjunto com a história possível e não
apenas a história existente, passamos a acreditar que outro mundo é
viável. E não há intelectual que trabalhe sem idéia de futuro.
Para ser digno do homem, isto é do homem visto como projeto, o
trabalho intelectual e educacional tem que ser fundado no futuro. É
dessa forma que os professores podem tornar-se intelectuais: olhando o
futuro. E para isto é preciso propor tal visão em cada uma das
disciplinas, mas não numa pretensa disciplina específica do futuro,
como agora estão propondo uma disciplina chamada “educação

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ambiental”... Não é criando uma disciplina que alcançaremos essa meta,
mas levando como ponto de partida, em todas as disciplinas, essa idéia
de que nada existe para durar eternamente, de que tudo é movimento e de
que o futuro não é um só. O que é um só é o presente, ainda que, nas
interpretações, seja vário. Mas, o futuro é, por definição e a priori,
vário. Sem essa atitude, seremos levados a um pensamento calculante, à
matematização das idéias fundada na primazia da técnica, conduzindo a
instrumentalismos e reducionismos, em vez de abrangências.
E nada é mais perigoso para cada um de nós, no trabalho de
educadores, que as diversas formas de instrumentalização: a
instrumentalização pelo mercado, a instrumentalização pelas
militâncias, a instrumentalização pela “politicaria”, a
intrumentalização pelo público, a instrumentalização pela mídia, a
instrumentalização pela carreira.
O mercado instrumentaliza a partir de lógicas externas à pessoas
humana. As militâncias instrumentalizam pela prisão dos slogans e das
palavras de ordem. A “politicaria” instrumentaliza pela centralidade
dos resultados, o império dos meios. A mídia instrumentaliza convocando
o intelectual a produzir manchetes e não verdade, levando-nos a todo
custo a ser fáceis e conduzindo-nos à vontade de ser vistos como
artistas de vaudeville, e não ouvidos naquilo que de sério tenhamos a
dizer. Daí os enormes riscos da televisão no trabalho intelectual.
Todos desejamos que o nosso trabalho seja reconhecido: isso faz
parte da essência do nosso trabalho, essa vontade e essa necessidade de
reconhecimento. Mas, cada vez que nos dobramos a essas diferentes
formas de instrumentalização, aí já não somos intelectuais, porque para
ser fácil a todo o custo, aplaudido a todo custo, e para ter o apoio, a
todo o custo, de colegas e correligionários, freqüentemente
atrasamos a chegada à meta desejada, abandonamos a linha reta da
nossa, deixamos de ser sérios.
O intelectual é aquele que resiste, e para resistir tem que ser
só. É a solidão a grande arma com a qual podem continuar sendo
intelectuais. Cada vez que dizemos "nós", afastamo-nos do ideal do
intelectual, porque estamos manifestando a necessidade do aplauso ou da
cooptação. O intelectual não é aquele que busca aplauso, mas o que

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busca a verdade e que fica com ela, a despeito do que sejam, naquele
momento, as preferências dos seus contemporâneos.
É fácil entender porque, no fim do século XX, quando a maior
parte do trabalho humano se tornou trabalho intelectual, estreita-se a
possibilidade de ser intelectual. Por isso, as faculdades e as casas de
ensino abrigam cada vez mais letrados e cada vez menos intelectuais.
Ser professor não é obrigatoriamente ser intelectual, sobretudo, porque
é, freqüentemente, exercer uma repetição, seja como um porta-voz da
produção alheia, seja através de uma forma repetitiva de produzir. A
globalização agrava essa situação porque traz como uma de suas marcas a
difusão de um pequeno número de autores bafejados pelo mercado, e que
se instalam no mundo como os atores centrais, e dos quais vem a
certificação de validade do conhecimento dos outros. Segundo tais
parâmetros, nossa produção intelectual é considerada menos vigorosa,
menos forte, menos capaz, menos significativa que a produção de fora,
chamada equivocadamente de internacional, quando ela é apenas
estrangeira. Estou me referindo às formas como a carreira se organiza
neste país, levando-a a tornar-se, ao fim e ao cabo, uma grande inimiga
da produção intelectual. Devemos, urgentemente, erguer nossa voz, para
reclamar das autoridades universitárias que, entre outros problemas
atuais, revejam a questão da carreira, dentro de um quadro mais geral,
mais abrangente, agindo como intelectuais, e não como administradores.
Numa universidade autêntica, os administradores apenas governam
as coisas. Os intelectuais são inadministráveis. Por isso, eles são o
fermento de uma verdadeira vida acadêmica, porque são movidos pela
idéia de universidade e pela fidelidade a uma dada universidade. Não há
universidade que possa crescer sem crítica interna. Não basta repudiar
a crítica externa. É preciso todos os dias exercitar a crítica interna
para sermos verdadeiros intelectuais. De outro modo, estaremos
limitados à produção e a prática de meias-verdades, ou de verdades-
interesseiras, que conduzem à teorias utilitárias e ao império
das razões utilitaristas fundadas nas exigências do mercado. Daí, a
tendência a transformar todo tipo de ensino em ensino
profissionalizante. Quantos de nós, ensinando na pós-graduação, já não
ouviu esta frase: "professor, eu não vou ao seu curso, porque o seu
curso não interessa à tese que eu estou escrevendo". É exatamente o

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utilitarismo levado às últimas conseqüências. Com certo ceticismo,
pode-se até sorrir, ouvindo isso; e com certo cinismo, pode-se até
sorrir complacentemente, quando se precisa do voto do estudante para
ser eleito para alguma coisa. Só que esta forma de conivência já é uma
demonstração da renúncia a ser intelectual. Continua-se sendo
professor, mas se renuncia a ser intelectual. Quando renunciamos
à crítica deixamos também, que, dentro de nós, produza-se o assassinato
de um cidadão. Este, dotado de existência política, somente pode sê-lo
plenamente, ao entender criticamente o mundo em torno. Se assim não
entendo o mundo em torno, tampouco sei quem sou, nem posso propor
outro mundo, e passo a aceitar comodamente tudo que me mandam fazer.
É assim que se criam homens instruídos, mas não educados,
desinteressados de qualquer discussão mais profunda, subordinados ao
pensamento técnico e à lógica dos instrumentos. mantendo uma fé cega
nos ritos já dados, nos caminhos preestabelecidos.
Devemos ter muito claro o que fazer frente a certas solicitações
do nosso entorno, das quais mencionarei algumas, já que se estão
tornando tendências da moda. Entretanto, a moda não é o modo, mas
apenas uma escolha, num modo, ou fora dele, daquilo que é previamente
escolhido como comportamento a adotar. O modo é a forma como as coisas
se dão ou se podem dar dentro de uma lógica existencial. A moda é
instrumental a preocupações interesseiras, tendentes n falsear essa
lógica existencial.
Vejamos, por exemplo, as orientações curriculares distribuídas
pelo Ministério da Educação, onde se pede, com vigor, um ensino das
técnicas, mas propondo que sejam ensinadas como se elas fossem dotadas
de um valor absoluto e abstrato. Em si mesmas, as técnicas são um
absoluto. Mas as técnicas são nada sem a vida e somente são
inteligíveis com a vida. E a vida nada tem de absoluto; é, sempre, um
relativo. Quando, naquilo que está escrito nesses famosos volumes,
insiste-se tanto em mostrar a importância da técnica hoje, esquece-se,
porém, de pedir aos professores que ponham abrangência no seu ensino,
mostrando como, a partir da maneira como são elas utilizadas ao longo
da história, desde os primeiro tempos até hoje, a técnica apenas ganha
significado através da política: a política considerada como exercício
da ação humana, a ação possível, ou a ação que se deseja, isto é, o

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projeto político, ou, então, a ação é feita, isto é, a realidade
política. Quando se exclui do ensino esse elemento histórico e se
apresenta a técnica como algo indispensável à vida, mas separando-se do
contexto, o que se está fazendo, na realidade, é esconder dos alunos a
história do presente que determina uma forma particular de uso da
técnica, e não outra, deixando assim, de mostrar aos alunos que essa
não é a forma única de seu uso.
Quando também, páginas e páginas referem-se à educação ambiental,
o que se está propondo é uma educação ambiental enviesada, uma forma de
reducionismo, substituindo a expressão "meio geográfico" pela expressão
"meio-ambiente". Quando escrevo "meio-ambiente", posso estar excluindo
ou fragmentando a história, propondo uma história parcializada, ou
desconsiderando a inteireza do processo histórico ao apresentar uma
natureza existindo fora da sociedade. No começo da história humana, a
sociedade era contida pela natureza. Hoje, não. A natureza é contida
pela sociedade. Por conseguinte, é enganoso o ensino de educação
ambiental que escamoteia o fato de que, a cada momento, é sociedade em
movimento que dá valor a cada pedaço da natureza. Desse modo, a
formação oferecida aos alunos acaba por lhes recusar a condição de
poder intervir na produção da história do país. É tempo de multiplicar
essa advertência, para evitar que a grande sedução da juventude - e da
população em geral - pelos temas da ecologia e, em geral, do chamado
meio ambiente, seja canalizada de modo inadequado. Neste fim de século,
a natureza, como realidade histórica, não existe por si só. Como o
espaço e como o planeta, inteiro, a natureza é objeto do exercício das
idéias do homem, do seu trabalho e das suas intenções e paixões.
No pensamento do que o mundo representa para a humanidade, a
natureza em si deixou de existir. Vejam o caso do turismo chamado
ecológico...O mais remoto rincão da Terra, aquele que pareça o menos
conhecido, está hoje cheio de intenções; pode não ser o domínio
imediato do capital, pode não ser objeto de povoamento, mas é sempre
objeto de intenções, e estas, num mundo globalizado, fazem parte da
produção de uma política global.
O ensino da globalização exige, também, redobrada cautela.
Vivemos, neste fim de século, uma forte tendência para o totalitarismo,
o que, inclusive, aparece no discurso de certos governantes, quando,

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por exemplo nos dizem: "penso assim, se você pensa diferente, você está
contra a nação". Então, o desejável papel pedagógico dos homens de
governo é substituído por um discurso autoritário, que freqüentemente
vai buscar fundamento na chamada "globalização" - a globalização
perversa atual - apresentada como um caminho único, quando, na
realidade, é apenas uma maneira de fazer a história. Somos,
freqüentemente, solicitados a tratar as idéias hegemônicas sobre o
mundo atual como se fossem um dogma, aceitando o pensamento único sob
os seus disfarces mais diversos. Esse pensamento único conduz a
discussão sobre o mundo a partir de premissas viciadas - a respeito das
quais somos convocados a nos pronunciar, em lugar de adotar o caminho
correto, isto é, buscar as premissas verdadeiras.
Outro risco que ameaça o professor, separando-o da possibilidade
de também ser um intelectual, é o de oferecer um ensino fragmentado,
portanto acrítico. Todo o ensino que é separado da história, isto é, do
mundo como atualmente ele é, não supõe crítica. Então, por mais que
apareça como sendo renovador, ele é repetitivo. O mundo é um conjunto
de possibilidades. Nos tempos de Pedro Álvares Cabral, havia um
conjunto determinado de possibilidades. Hoje, esse conjunto de
possibilidades é outro. O nosso mundo, o mundo nosso
contemporâneo, que desejamos entender e temos de ensinar, é um mundo
datado, não é um mundo sem data, abstrato. E a data do mundo – sua
certidão de idade - são as possibilidades reais existentes em
cada momento. Dessas possibilidades, algumas são colhidas por quem
as pode colher, e que as colhem como as podem colher, e... outras não o
são. No mundo de hoje, os que podem colher as melhores possibilidades
são cada vez em número menor e a maioria esmagadora da humanidade fica
fora do essencial das escolhas; apenas segue incompletamente ou
inutilmente protesta.
O essencial é saber que, entre as possibilidades que o mundo
oferece em cada momento, muitas ainda não foram realizadas. Uma análise
que pretenda ajudar a enfrentar o futuro deve partir desse fato muito
simples: não se pode analisar uma situação apenas a partir do que
existe. A análise de uma situação exige que consideremos também o que
não existe, mas que pode existir. Não basta nos fixarmos apenas no que
não existe, sob o risco de sermos voluntaristas. É indispensável tomar

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como referência aqueles elementos de construção do novo oferecidos pela
história do presente e ainda não utilizados.
Como o futuro jamais é um só, é isso que nos pode unir na tarefa
de pensar os futuros e escolher um. Como essa forma de analisar deve
ser feita a partir de tudo o que existe, trata-se de uma forma
existencialista de construção do pensamento. Essa forma existencialista
não exclui a emoção. Esta é, na vida dos homens, freqüentemente uma
expressão despojada, e é por isso que exclui o cálculo. Os compositores
são muito mais expressivos de um povo que os intelectuais acorrentados
a uma linguagem escolástica. Mas nós também podemos evitá-la, tentando,
através da análise, encontrar caminhos que conduzam a formas de
comunicação mais diretas e pessoais, cada vez menos freqüentes entre
nós.
O trabalho do professor é arriscado. Quem teme perigos deve
renunciar à tarefa do ensino. E se quiser ser ao mesmo tempo professor-
intelectual, está fadado a correr riscos ainda maiores. Para avançarmos
nesta direção, entrevejo algumas possibilidades, seja qual for o tema
da nossa conversa com os estudantes, enquanto não nos substituem
completamente por máquinas. Em primeiro lugar, urge reconhecer que, em
qualquer circunstância. Impõe-se um caminho duplo: da análise para a
síntese e da síntese para a análise, porque somente assim estaremos
fazendo, ao mesmo tempo, a crítica das situações e a nossa própria
autocrítica. Da minha experiência, direi que cada vez que me
encontro nessa posição (caminhar da análise para a síntese e da síntese
para a análise) descubro que algo está faltando na minha formulação. A
crítica obriga à consideração das situações como algo dinâmico, a
partir desses dois pólos: a síntese e a análise.
Toda forma de crítica é, também, uma forma de visão dinâmica. É
preciso, também, buscar visões sistêmicas para o que aconteceu ou
acontece, e oferecê-Ias aos alunos. O que temos a ensinar a um
estudante são situações. E as situações são construções sistêmicas,
já que, os elementos de uma dada situação dependem uns dos outros. Isso
pode ser oferecido no ensino de maneira simples. Esses sistemas são
vivos, dinâmicos. Como as situações são também constituídas
por coisas, lembremo-nos de que os objetos não têm vida por si, de modo
a preencher esses sistemas de coisas com a história do presente

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Neste fim de século, tal procedimento torna-se bem mais fácil e
cômodo. Antes não tínhamos a capacidade de saber cabalmente o que se
passava no resto do mundo. Nossa geração tem o privilégio, do que
podemos chamar do cognoscibilidade do planeta, com a capacidade de
saber o que passa em qualquer que seja o lugar. Devemos tirar partido
dessa possibilidade para buscar a construção dos sistemas explicativos
das diversas situações. E temos que, através disso, passar do empirismo
abstrato, isto é, do valor dado às coisas em si e alcançar uma
abstração empírica, isto é, uma generalização que parta do que
realmente exista e que não seja um mero produto da nossa imaginação,
por mais fértil e mais treinada que ela seja. Será assim, creio, que
poderemos construir os novos humanismos, diferentes daqueles do
passado, embora a sua essência continue sendo a essência do homem. O
discurso de alguns pensadores que a todo preço, trazem exemplos do
passado, às vezes nos empolga, mas não nos pode sempre convencer,
porque para serem verazes os exemplos devem ter como conteúdo a
história do presente. Se os homens para os quais estamos
propondo políticas não são considerados como homens do presente,
tampouco como homens: são sombras. Ora, o trabalho do educador, do
professor tornado educador, é esse trabalho de interpretação do mundo,
para que um dia este mundo não nos trate mais como objetos e para que
sejamos povoadores do mundo como homens. Muito obrigado!

DEBATE

Coordenaçâo: Prof.a Alda Junqueira Marin

1ª questão: Várias vezes o senhor se referiu à verdade. Gostaria


que fosse feito um comentário articulando a noção de verdade ao
pensamento pós-moderno no qual são questionados os pressupostos
essencialistas que sustentaram, e sustentam até então, o mundo moderno.
Prof. Milton: Eu agradeço muito essa questão, que me parece uma
questão muito profunda e importante, e envolve um debate muito amplo,
desde a verdade da noção de verdade até o pós-modernismo da noção de
pós-modernismo. A palavra verdade é usada não provavelmente como
metáfora, mas como descrição e interpretação veraz de uma situação na

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qual o agente, isto é, o pensador – que pode ser o pesquisador - se
debruça sobre esta situação com a preocupação única de interpretá-la
após entendê-la, e descrevê-la após interpretá-la. Isto tem que ver com
os pressupostos do próprio método de aproximação das situações. Como o
método de aproximação das situações tem um conteúdo absoluto, as regras
de jogo do pensar, e um conteúdo relativo, isto é, a pertinência
histórica das variáveis com que eu vou jogar, isso conduz a que,
primeiro: pessoas diferentes podem chegar a resultados diferentes
partindo da mesma situação e todas elas, apesar de suas divergências
ocasionais, estarão ativos na mesma busca da verdade, o que não
desmerece qualquer deles, não importam os resultados alcançados. Se
quiserem, vamos mais adiante nisto. Segundo lugar: na situação do mundo
atual, em que as idéias com freqüência são, menos do que no passado, um
resultado das situações, as idéias ganham autonomia em relação com as
situações, isto é, as idéias são preparadas adrede. Como hoje a gente
sabe, a história do presente é uma história em que as coisas, os
comportamentos, as relações, tudo tem como base idéias que são
previamente elaboradas e esse é o fundamento mesmo do que a gente
talvez chamasse de ideologia, palavra que, no mundo de hoje, ganha um
novo contorno, porque se as coisas na sua realização dependem de
idéias, as ideologias se tornaram concretas, e elas entram na história
juntamente com o que, no passado, a gente chamava de verdade. Então, é
possível que eu houvesse cometido um equívoco usando a palavra verdade,
já que as palavras ganham significados diferentes quando a história
muda. Apenas eu tenho que usar as palavras que tenho. Parece que foi
Kant que disse "eu descubro as idéias, são meus alunos que vão
descobrir as palavras... que vão encontrar as palavras". Porque as
idéias são produzidas num contexto que inclui as palavras presentes
naquele momento. Então, pedimos perdão por usar essa palavra "verdade"
e eu pretendo aproximar esta resposta a partir do que disse. Quanto ao
pós-modernismo, é uma expressão que eu nunca consegui levar muito a
sério; não porque os seus autores sejam pouco sérios, não é isto. Eu
sou um geógrafo. Qual é meu trabalho? Aí está o mundo: o mundo, repito,
como esse conjunto de possibilidades latentes, porque o mundo é
latência, o mundo pairando sobre nossas cabeças e nós colhemos dele as
possibilidades que plantamos nos lugares, criando oportunidades; é isso

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o mundo. Eu não construo um mundo de pós. Só que parar por aí pode ser
considerado como um desrespeito a quem perguntou, a quem fez a
pergunta, e não farei isso. Mas, insisto em que o meu papel é entender
o que o mundo é hoje. Aquilo que há uns vinte anos atrás propus como
forma de interpretação dos lugares, a consideração do que eu chamava de
modernizações sucedendo-se umas as outras e criando outros mundos...
Então, o meu ponto de partida não seria a pós-modernidade, o que me
exclui de uma definição substantiva do que hoje está se passando; e
pode me conduzir, como freqüentemente essa expressão conduz, a
apreciações de ordem adjetiva. E eu não trabalho com adjetivos, e busco
trabalhar com substantivos, quer dizer, as situações tal como são elas.
Então, o que eu vou buscar são as variáveis históricas do presente que
conduzem a produção desta latência, que é o mundo atual, e dessas
existências, que são as situações concretas atuais. Eu acho que é
um pouco isto. Então, a pós-modernidade, ela pode ser crítica do
essencialismo, mas se eu adoto como ponto de partida o
entendimento do atual sistema de tempo, característico deste
pedaço do transcurso e desta fração da história na qual vivemos, eu
estou, pela mesma ocasião, dando as costas a um enfoque essencialista,
e tentando produzir um enfoque existencialista, onde as essências são
pura possibilidade, se acaso, e onde o que existe é aquilo que, junto
com o que efetivamente pode existir, me interessa. Eu não pretendo ter
respondido; apenas quero dar sinal do esforço que ando fazendo para
não desonrar a pergunta tão inteligente que me foi endereçada.
2a questão: Há um conjunto de questões que dizem respeito ao
trabalho individual, à solitude do trabalho intelectual, à
possibilidade do trabalho conjunto, esse falar "nós"... Como fica esta
questão da solitude do trabalho do professor, do pesquisador, diante da
necessidade da mediação humana, diante da concepção de práxis política
coletiva, diante da necessidade de que as pessoas não sejam sós para
poder resistir, e de uma produção que possa ser mais coletiva, não
individualista. Então, há um conjunto de questões que se referem ao
eixo da fala do senhor sobre a questão da solitude versus o coletivo em
diversas caracterizações que o senhor fez.

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Prof. Milton: Muito obrigado por esta pergunta. Eu creio que se
nenhuma outra pergunta houvesse sido feita, esta somente justificaria a
minha presença aqui. Porque eu acho que esse debate é extremamente
importante e a pergunta que foi feita com tanta delicadeza, parece-
me que vai nos colocar no coração da discussão do mundo
contemporâneo. Ele pode ser um indivíduo sem ser individualista. Assim,
ele é eu, ele não é nós. Imaginar que o indivíduo existe
obrigatoriamente numa situação de individualismo é descrer do
indivíduo. O indivíduo forte é aquele que busca aperfeiçoar a sua
consciência, e todos os dias luta para ser consciente, consciente do
mundo, do seu lugar, da sua sociedade, de si mesmo. A sociedade é forte
quando ela é um conjunto de indivíduos. Um indivíduo forte não recusa
as opiniões opostas, ele apenas constrói outra opinião, nada impede que
amanhã ele abandone a opinião de hoje. Ouando me meto a reler o que
escrevi há quarenta anos atrás, vejo que muitas coisas abandonei
completamente. Talvez, as houvesse abandonado mais rapidamente se
houvesse uma interlocução. No caso do Brasil, isso é muito
difícil, porque isolados os intelectuais freqüentemente acabam por
se tornar remplis deles mesmos e correm o risco de ficar vaidosos, pela
ausência de crítica. A crítica acelera a produção do pensamento e é
a isso que podemos chamar de produção coletiva do
pensamento, mas sempre a partir, naquele momento, daquilo que
cada qual encontrou. Isso não quer dizer que amanhã, ou que no minuto
posterior, não se deixe de lado o que foi encontrado. Mas, cada
vez que consulto alguém para emitir um pensamento, torno-me
incapaz de ir adiante. É nesse sentido que a solitude é
fundamental. Eu não tenho que pedir licença a ninguém para pensar. Eu
não tenho que subordinar o meu pensamento ao cânone que vai me levar a
um promoção ou um prêmio. Eu não tenho que ter o meu pensamento apoiado
pelo partido, que seja o meu. E é por isso que nas condições do Brasil
atual é difícil, quase impossível, ser intelectual e ser um homem de
partido, porque a negociação prévia à expressão da idéia, atrasa a
elaboração da idéia. As idéias não são feitas para serem postas na
gaveta, mas elas têm que ser publicadas, jogadas no mercado das
idéias, e voltam aos autores que revêm os seus pontos de vista, uma
forma de revisão permanente. Por conseguinte, falar "nós" já é uma

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recusa à idéia. O sujeito que sobe aqui e diz "nós pensamos assim" é um
candidato a partidário ou simplesmente a vereador, mas não é
candidato a intelectual. Eu tenho que arcar com a responsabilidade
sozinho, não tem nenhuma importância que a sala inteira discorde. Essa
coragem dos intelectuais vem da consciência do exercício de
aproximação da verdade. Aliás, os chamados "sucessos" na vida
acadêmica e na carreira intelectual, quando chegam cedo com freqüência
esterilizam os que os detêm. Cada vez que me fazem festas - e
atualmente há uma certa mania por me fazer festas - digo que "a
academia devia festejar também os insucessos dos professores, dos
intelectuais", porque é através dos fracassos que a nossa têmpera se
enrijece, o nosso caráter se torna mais cristalino, que à nossa força é
acrescida, essa vontade de nos manter como que imaginamos ser a
verdade, a despeito da não aceitação... Devemos valorizar a dúvida
enorme que nos assalta diante de um papel que acabamos de escrever, e
que acabamos guardando sem a coragem de dar a público. Quem já não
conheceu essa reação? Essa dúvida, uma forma de humildade diante dos
fatos, derrotando-me a mim mesmo na vontade de mandar para a rua um
papel escrito, e preservando a possibilidade de melhorar mais adiante.
Uma vida acadêmica feita apenas de sucessos raramente é uma vida
acadêmica produtiva. A busca do sucesso é uma forma de busca da não
solitude, da companhia, pela qual se paga um preço muito alto, o
sucesso efêmero freqüentemente acompanhado por uma vocação à fatuidade,
à esterilidade. Então, era isso um pouco que eu quis dizer, é evidente
que... a certa altura da vida, acho que meu papel é esse mesmo, o de
provocar, eu penso até que a Selma me convidou exatamente para isso.
Essa pergunta me pôs no centro da problemática que é o professor-
intelectual. Porque a práxis coletiva? A práxis coletiva não é uniforme
e é tanto mais rica quanto mais diferentes são os pontos de vista.
Quanto mais diferentes somos, mais rica é a nossa produção comum,
porque um debate mais amplo se instala, ainda que a partir dos nossos
silêncios. Eu creio que não há uma práxis coletiva totalitária. A
práxis coletiva é o lugar da presença simultânea de uma multiplicidade
de interpretações, porque a práxis é ação e sendo ação ela é
interpretação, interpretação do mundo, interpretação de cada um de nós
frente à necessidade de agir, frente à possibilidade de agir. Por

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conseguinte, quando a práxis se dá a partir de verdades, de crenças
profundas, é uma práxis muito mais rica, e é por isso que as práxis a
partir do que é pragmático, das ordens verticais, as práxis comandadas
pelos comandos da globalização globalitária, são práxis pobres. E é por
isso que, a economia hegemônica no mundo de hoje não é dinâmica e o
dinamismo acaba ficando com as pequenas empresas. O dinamismo é dos
pobres, enquanto aqueles que, por andarem depressa, chamam-se
dinâmicos, são apenas velozes. Quem sabe um dia os pequenos e médios
empresários descobrirão que os seus aliados são os pobres, e aí, com a
riqueza desse pensamento, poderemos alcançar uma revolução política.
3ª questão: Há um outro conjunto de questões, professor, que diz
respeito ao trabalho intelectual enquanto condições de trabalho
adversas... horas de trabalho, como professores contratados em C.L.T.,
a questão da carreira, concepções, critérios para ascensão na carreira,
e também o fato de que a educação, apesar de existirem pessoas que
pensam e que falem como o senhor, como os intelectuais, a despeito
disso a educação tem dado passos para trás. Há um conjunto de
possibilidades aqui que dizem respeito às condições de fato existentes
para esse tipo de trabalho e o avanço da educação.
Prof. Milton Santos: Bom, estamos entrando na crítica de dentro
da escola, quer dizer, estamos aceitando a idéia de criticar a escola
de dentro. Essa questão das horas de trabalho me apaixona, porque o
trabalho intelectual é feito sempre do bulício e da calma. É preciso
bulício. Então a gente vem aqui, se excita, e a discussão excita um
pouco mais, ela é um prêmio e ao mesmo tempo uma incitação. Depois vem
a calma. O que, hoje, está acontecendo na universidade brasileira?
Conheci, antes, uma universidade que tinha esses dois momentos, a calma
e o bulício, eram pelo menos quatro meses de calma. A ditadura
estabeleceu as férias de trinta dias, a democracia de mercado na qual
estamos mergulhados manteve as férias de trinta dias, sem que se veja
muita gente protestar contra isso. Quando é que as pessoas lêem um
livro inteiro? Quando é que elas escrevem um ensaio que vai ter vida
longa, sem calma? E ainda mais, dentro das férias a gente aceita com
freqüência que um aluno simpático venha nos seduzir solicitando que
façamos passar um exame, que leiamos uma tese, etc... Devíamos recusar

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em nome deles estudantes. Nosso trabalho intelectual é feito de forma
inadequada no Brasil atual, porque - não é questão de oito horas de
trabalho ou de quatro ou quarenta horas - é a forma como esse tempo é
distribuído que impede que a gente se debruce longamente sobre um tema
e que corra o barco atrás. E é por isso que, com freqüência, a gente vê
nas teses que nos são dadas para ler, citações de citações e não mais
busca original. O estudante – eu ia dizendo, o colega também - com
freqüência não vai ver adiante. Então como é que ele sabe que o outro
citou corretamente? Mas ele não vê. E, com freqüência, o outro drama
que vem daí é o desconhecimento da história dos conceitos. Uma boa
parte das pessoas não sabe como surgem e evoluem os conceitos. Isso
está ligado à moda das citações de textos que não têm mais de cinco
anos... "cinco anos está velho, não precisa mais"... Então, não se sabe
como tal ou qual idéia surgiu, como ela foi evoluindo ... e aí, passa-
se a imaginar estar a descobrir tudo de novo. E freqüente a gente ler
essa frase: "ninguém tinha escrito nada sobre isto, etc...".

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TEXTO - 02

O Caminho do Conhecimento

Elisabeth Johanna Egarter

“This way? That way? Right? Down? Back?”

“Quando não se sabe para onde se quer ir qualquer caminho


serve”.

Este trabalho é um estudo do movimento do processo ensino-


aprendizagem através da história da humanidade. Foi baseado em leituras
de autores diversos e na observação da postura de professores e escolas
do Brasil no início do terceiro milênio. Apresenta opinião sobre
possíveis caminhos a serem tomados pela educação para o desenvolvimento
do ser humano dentro de uma visão holística.

This paper was written after some reflections on the


movement of the process of learning through the history of
mankind. It was based on thoughts of different authors expressed
on different books and on the attitudes developed by teachers and
schools in the beginning of the third millennium in Brazil. Some
opinions about the possible paths to be taken by education are
expressed aiming the development of human beings.

Na antigüidade aprender era uma coisa natural, instintiva, tão


instintiva como a sucção do leite, na simbiose com a mãe. Aprender era
uma pulsão de vida, apoiada por famílias e clãs. Aprender se fazia por
contar e recontar histórias e lendas, ao aconchego do fogo; por ouvir
os visitantes de outros clãs; por observar o céu, o sol, a chuva, a
neve e a água. Aprender se fazia por observar a caça e o caçar, por
fazer a ferramenta para caçar, por esperar a caça, por caçar apenas o
necessário para o alimentar-se e alimentar seu povo... Aprender se
fazia para toda a vida.

Na pré história a educação se fazia naturalmente nas trocas


individuais e entre as clãs.

No antigo oriente visava à supressão da individualidade e o


culto ao passado. Entre os gregos, ao contrário, foi dada grande ênfase
ao desenvolvimento individual e aos aspectos intelectuais e estéticos.
Sócrates e Platão foram importantes pensadores e estudiosos da educação
na Grécia. Cícero, entre os romanos, fundamentou o desenvolvimento
pedagógico para o Império Romano.

Passando por um período da história da humanidade, chegamos à


Idade Média, ao Teocentrismo, às ordens religiosas e aos feudos. Na
Idade Média o ensino subordinou-se à religião. Aprender naquela época
significava sobreviver. Os homens olhavam para a colheita produzida e
viam nela a bondade de Deus. Ao olhar para a tempestade ou sofrer com

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as pestes, viam a ira de Deus. O conhecimento ainda era compreendido
como um todo, não era compartimentalizado.

Naquela época os mais ricos podiam ter preceptores para seus


filhos, a pouca educação que havia era tutorada pela Igreja. As
crianças, em geral, e também os adultos eram, em sua maioria,
analfabetos. Os que podiam ser aprendizes de uma profissão seriam, um
dia, mestres das novas gerações.

Na Idade Média tudo era voltado para Deus. Para que se


compreendesse melhor este Deus, julgou-se que esse conhecimento deveria
ser oferecido em partes. Começou, naquela ocasião, a
multidisciplinaridade.

Com a industrialização foi necessário oferecer conhecimentos


que fizessem o trabalho mais produtivo e mais lucrativo. A educação
voltou-se para o trabalho.

Naquele momento, a educação deixou de ser formadora do homem e


passou a ser formadora da mão de obra. Não era mais educação e sim,
apenas instrução.

O conhecimento passou a ser centrado no conteúdo, pois o


importante era aquilo que poderia ser ensinado para produzir melhor
trabalho. O homem não era mais importante, também não era importante o
que pensava o homem como ser total, o importante era o que ele poderia
produzir, o capital que poderia gerar.

Dessa forma, o professor passou a escolher, quando livre para


isso, os conteúdos que julgava importantes para sua disciplina escolar,
sendo as disciplinas escolhidas para formar uma grade curricular que
atendia à formação de mão de obra. Estes conteúdos formavam uma
seqüência progressiva e encadeada das partes do conhecimento. Formavam
partes, pois o pensamento foi fragmentado e perdeu-se a noção do todo.
As disciplinas e os conteúdos diversos não se integravam, não dando uma
visão da construção. Havia o momento da Matemática, da Geografia, da
História, todos eles sem um elo para a formação do todo. Não tendo
praticidade, pois não eram úteis na vida real, os conteúdos precisavam
de fixação feita por exercícios que nada tinham que ver com a vida do
estudante. Estava perdida a noção do todo, da relação homem- universo,
da relação educação- vida. Nascia a competição, o desejo de ser o
melhor para ocupar a melhor posição, para ser mais competitivo, para
produzir mais e ganhar mais.

A avaliação não podia ser feita pelo desenvolvimento de cada


um, mas pela medida do suficiente para estar preparado para o trabalho.
Se foi oferecido um balde de água, deveria ser cobrado um balde de água
e o valor seria o da quantidade de água devolvida no balde, não a
aquisição de conhecimentos. A avaliação passou a incentivar a maior
aquisição de conhecimentos úteis à produção de riquezas, à geração de
produtos.

Esta foi a educação que chegou aos nossos dias.

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Vista desta forma, a educação passou a ser apenas informativa
para o aluno e formativa de padrões determinados e desejados pela
sociedade.

A criança, ao ir para a escola, desconecta da vida para ligar-


se ao conteúdo- centrismo. O objetivo desta escola irreal é levar a
uma vida perfeita. Tenta reproduzir, em formas idênticas, formatos pré-
estabelecidos ou seja, parte de uma metodologia da ordem e de uma
utopia de uma sociedade sem conflitos e sem desordem, sem lugar para a
diferença e a inovação.

Esta irrealidade, acrescida da formação do professor que se fez


dentro dos mesmos moldes, levou a nossa escola à ineficiência. Nossos
professores não sabem ensinar a aprender, pois não foram ensinados a
refletir sobre o que fazem, nem a pensar porque o fazem e como o
fazem. Como outros profissionais, os professores foram “domesticados”
para agir apenas como reprodutores de conhecimento.

Não tendo recebido em seus conteúdos e em sua grade curricular


o embasamento para o refletir sobre o aprender, o professor adota
posturas não condizentes com o fazer pedagógico. Apenas reproduz
conhecimentos, em um processo de informação hoje já ultrapassado pelos
outros canais informativos, bastante mais modernizados.

O professor não acredita na curiosidade natural para o


conhecimento e, assim, incapaz, ele mesmo, de buscar novos
conhecimentos através do pesquisar, do relacionar, do trazer para a
realidade do viver cotidiano, informa o que ele mesmo possui, sem fazer
este conhecimento útil para o aluno.

É avaliado como ineficiente pela escola, pela família e pela


sociedade, resultando em sua baixa estima e seu alto grau de
insegurança, que lhe roubam a afetividade necessária ao seu
relacionamento com o processo de aprendizagem e os seres em processo de
desenvolvimento.

A escola avalia seus professores dentro do contexto da grade.


Poderíamos dizer que há uma grade de avaliação. Há uma avaliação de
posição enfileirada, de ordem, embora a escola não avalie sua própria
participação como escola, sua posição de produção de conhecimento, sua
maneira de ver o mundo e de se relacionar com ele como promotora de
educação.

A escola precisa parar de centrar-se em si própria e colocar o


aluno como centro do processo. Para isto é necessário que a escola e o
professor tenham o embasamento de como acontece a aprendizagem, o
desenvolvimento biológico e mental do ser humano, a influência das
emoções, do meio social e ambiental etc...

É preciso conhecer melhor o ser humano e fazer dele o objeto do


trabalho, não colocando no conteúdo este objeto.

É necessário que a escola e o professor vejam um mundo não


compartimentalizado, um mundo global onde vivem seres totais,

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pertencentes a uma natureza que se completa a todo instante. Neste
mundo há conflitos, desafios e soluções a serem encontradas.

O educador precisa olhar para o currículo e ver a lógica de uma


organização dialógica que inclui diferenças, erro e acaso, incompletude
e incertezas.

As situações- problema permitirão o uso de conceitos em


contextos variados, levando à evolução para habilidades e competências.
Este trabalho, em geral, não leva a um conceito já definido como, por
exemplo: “Ilha é um pedaço de terra cercado de água por todos os
lados”. Forma, porém , a crítica, o pesquisar, o discutir, o falar
sobre, o dialogar e o aprender.

Esta forma de aprender não é desconectada da vida como a


vivemos hoje, faz parte dela e com ela e para ela é possível aprender.

A vida hoje é como uma rede que se entrelaça toda ou, melhor
definida por Deleuze, como um rizoma com suas centenas de brotos e
ramificações entrelaçadas e milhares de possíveis inícios e fins.

Hoje não há razão para compartimentalizar. O caminho para o


rizoma se dá através de projetos interdisciplinares - que tragam
situações- problema para serem resolvidas. Parte-se de uma situação
geral, de uma generalização, para uma conceituação particular que deve
estar totalmente conectada à vida.

Neste caso, o currículo deve ser interdisciplinar , assim como


o problema é interdisciplinar. Não basta o olhar de cada disciplina,
mas muita troca entre as disciplinas, pois uma entra na área da outra
com muita discussão.

É necessário manter o apoio aos professores, às relações entre


os grupos e às relações entre professor e aluno.

As situações- problema estão no nosso dia a dia, questionadas e


discutidas. Podemos citar, como exemplo, a água, que embora pareça
abundante, sabemos que está faltando no planeta Terra. Como aliviar
esta questão? O projeto abrange todas as disciplinas e se interliga.

Se o professor precisa atribuir graus a esta aprendizagem, deve


ter como parâmetros o antes e o depois e, especialmente, o que foi
adquirido no processo.

Para lidar com este saber pedagógico, o educador deverá ter o


embasamento das teorias cognitivas-evolutivas de Piaget, sociais-
cognitivas de Vygotsky e grupais de Pichon Reviére, pois foram eles

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que, “intuitivamente,” pensaram o homem como intimamente ligado ao seu
meio sócio-econômico-cultural. E é através desta inter/intra relação do
homem consigo mesmo e sua comunidade que, ele próprio dirá porque
acredita na sua capacidade, como encontrar, junto com seus pares, a
solução dos problemas criados pelo “vício” de “gerar riquezas” e
produzir , ou reproduzir, conhecimento gerador de mãos de obra em um
momento da história da humanidade, quando se fazem necessários cérebros
e almas totalmente em sintonia com o corpo e com o universo, formando
seres felizes, autênticos e cidadãos.
Bibliografia
ARMSTRONG, Karen. A history of God. New York: Ballantine
Books,1993.
__________________Beginning the world. New York: Ballantine
Books,1992.
AUEL, Jean M. The valley of horses. Oregon:Bantam Books,1991.
BARBER, Richard. The penguin guide to medieval
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BRUBACHER, John.S. Modern philosophies of education. Michigan:
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DURANT, Will. The Mansions of philosophy. ( ?)
FREITAS, Maria Teresa de Assunção. Vygotsky e Bakhtin.
Psicologia e educação: um intertexto. Rio de Janeiro: Atica, 1997.
GROSSI, Esther Pillar., BORDIN, Jussara.(orgs)Construtivismo
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PIAGET,J.,INHELDER,B. A psicologia da criança. São Paulo:
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PERRENOUD, P.. Dez novas competências para ensinar. Porto Alegre: Artes
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no Ensino Superior. São Paulo: Cortez, 2002, 279 p.
VASCONCELOS, Maria Lúcia M. Carvalho. A Formação do Professor do Ensino
Superior. 2. ed. atual. São Paulo: Pioneira, 2000, 74 p.

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SUGESTÕES DE LEITURA

1. Pedagogia do Oprimido — Paulo Freire - 15ª edição - Ed. Paz e


Terra, 1985.

2. Metodologia do Ensino Superior — Antonio Carlos Gil - 3ª edição


- Ed. Atlas, 1997.

3. O Construtivismo na Sala de Aula — César Coll – 5ª edição – Ed.


Ática, 1998.

4. Construindo o Saber — Maria Cecília M. de Carvalho – Ed. Papirus,


1988.

5. Fundamentos de Metodologia Científica — Aidil Jesus da Silveira


Barros/ Neide Aparecida de Souza Lehfeld – 2ª Edição Ampliada –
Ed. Makron Books.

6. Guia dos Métodos de Estudo – Michel Coéffé – Martins Fontes

7. O Corpo Fala – Pierre Weil e Roland Tompakow – 49ª Edição – Ed.


Vozes

8. PowerShift – As Mudanças do Poder – Alvin Tofler – Ed. Record

“O professor medíocre expõe;

O bom professor explica;

O professor superior demonstra;

O grande professor inspira”.


William Arthur Ward (1921-1994)

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FACULDADE MAURÍCIO DE NASSAU
CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO
DISCIPLINA: DIDÁTICA DO ENSINO SUPERIOR
PROFESSOR: PAULO ALCANTARA
ROTEIRO DE ELABORAÇÃO DO TRABALHO PARA AVALIAÇÃO FINAL
O trabalho deverá ser feito, obedecendo as seguintes instruções:
? O trabalho final é composto de duas partes:
o PRIMEIRA – construção de planejamento de disciplina na área do Direito
contendo justificativa, conteúdo a ser ministrado, objetivos, metodologia e
critérios de avaliação;
o SEGUNDA – construção de plano de uma aula da disciplina planejada
anteriormente.
? O trabalho equivale a 100% da Avaliação Final, devendo ser entregue na Secretaria
da ESMAPE no prazo devido;
? Dúvidas, esclarecimentos, sugestões, orientações: dirigir-se ao professor, via e-mail
? As normas da ABNT deverão ser seguidas;
? Os Trabalhos não deverão ultrapassar 12 laudas, digitadas em folha de papel A4,
com letra tamanho 12, fonte Times New Roman ou Arial, espaço entre linhas 1,5 (um
e meio), margens esquerda e superior com 3,0 cm, e margens direita e inferior 2,0
cm.
? As páginas deverão ser numeradas após o Sumário, sendo contabilizadas a partir da
folha de rosto. A numeração aparece no canto superior direito.
? Não será aceita a entrega do projeto de pesquisa após a data prevista pela
ESMAPE;

Prof. Paulo Alcantara

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DDIISSC
CIIPPLLIIN
NAA :: D
DIID
DÁÁTTIIC
CAAD
DOOE EN NSSIIN NOO SSU UPPE ERRIIO
ORR
PPRROOFFE ESSSSOORR RREESSPPO
ONNSSÁÁV
VEELL::PPaauulloo A
Allccaannttaarraa
O presente trabalho deverá ser realizado em grupos, com no máximo 05 participantes,
devendo o grupo discutir as questões levantadas abaixo, devendo ao final apresentar texto escrito e o
nome de todos os participantes do grupo.

O trabalho será avaliado para a nota final e poderá ser atribuído até 03 pontos.

Tema: A ATIVIDADE DOCENTE

Questões:

1. O que é ser professor nos dias atuais?

2. Como se dá a formação do docente e o que contribui para a competência do professor?

3. Justifica-se o ensino de Didática?

4. Você considera o “saber docente” um conhecimento estratégico para a sociedade


brasileira?

5. A sociedade contemporânea valoriza o trabalho do docente?

Estabeleça em grau de importância para a nossa sociedade os seguintes profissionais da


Educação:
( ) professor de educação infantil
( ) professor do ensino fundamental
( ) professor do ensino médio
( ) professor do ensino superior
( ) professor de pós-graduação

Ordene em grau de valorização para a nossa sociedade os seguintes profissionais da


Educação:
( ) professor de educação infantil
( ) professor do ensino fundamental
( ) professor do ensino médio
( ) professor do ensino superior
( ) professor de pós-graduação

Prof. Paulo Alcantara

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