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Pax

Sara Pennypacker

RESUMO
A raposinha Pax e o menino Peter formam uma dupla inseparável desde o dia
que o garoto a resgatou perdida em uma floresta. Ambos jamais imaginavam que,
em decorrência de uma guerra, o pai obrigaria o filho a abandonar seu bichinho.
Motivado pela culpa e pela vontade de ter seu amigo de volta, Peter decide fugir
para reencontrar seu companheiro. Enquanto Pax enfrenta os perigos da vida
selvagem, Peter terá que aprender a lidar com suas emoções para cumprir sua
missão.

RESENHA
<p>Inspirada em clássicas fábulas infantojuvenis, “Pax” se apresenta,
inicialmente, como uma história simples e ingênua. Entretanto, a cada página, os
acontecimentos que envolvem as personagens demonstram uma narrativa profunda
e complexa, revelando um enredo que desperta reflexão sobre diversos aspectos da
vida.<p>
<p>A história de Peter e Pax se entrelaça no dia em que o menino encontra o
animalzinho perdido no meio da floresta, órfão, abandonado, ainda nos primeiros
dias de vida. Desde o encontro, os dois se tornam amigos fiéis, unidos em uma
relação de companheirismo e amor entre uma criança e um animal.<p>
<p>Peter é um garoto muito carente, pois, após a morte precoce de sua mãe,
ele passou a viver apenas com o pai, um homem frio e insensível que se preocupa
apenas em sustentá-lo, sem dar o apoio emocional. A chegada de Pax em sua vida
vem para sanar o vazio em seu coração.<p>
<p>Porém uma terrível guerra se aproxima e, devido às mazelas dos
conflitos, a trajetória dos dois sofre uma ruptura. O pai de Peter ao ser chamado
para exército, obriga o garoto a abandonar seu amigo porque o menino ficaria sob
tutela do avô, que não aceita animais em casa. Peter então parte com o pai e seu
bichinho em direção a uma estrada perto de sua casa e solta Pax do carro. Assim
que o veículo arranca, Peter se arrepende de deixar seu melhor amigo na mata,
totalmente desprotegido, sem a experiência de um animal acostumado com a vida
selvagem.<p>
<p>A jovem raposa inicia sua luta pela sobrevivência, sem saber como achar
comida e abrigo, na esperança que o seu dono voltaria a qualquer momento.
Exausto e de barriga vazia, Pax desiste de esperar e sua nova caminhada começa
ao se embrenhar na floresta em busca de alguma coisa para se alimentar.<p>
<p>Arrasado pela falta de sensibilidade dos homens da família, Peter passa a
sofrer pela falta de Pax, seu parceiro nos melhores momentos e seu alento nos
piores. Revoltado com a separação, ele decide fugir da casa do avô em direção à
floresta que abandonara seu bichinho — um lugar que, a esta altura, já estava
tomado pelos confrontos da guerra. Nesse meio-tempo, Pax segue desamparado no
meio da floresta, com saudades de seu menino, sentindo medo de cada pedacinho
do mundo.</p>
<p>A partir daí os capítulos se alternam mais rapidamente entre Peter e Pax.
Desse modo, acompanhamos a trajetória do garoto em um capítulo e da raposa no
outro, à espera do grande reencontro. Ambos prosseguem em suas jornadas: Peter
obstinado em ter de volta o afago de seu amiguinho; Pax aprendendo a cada dia
como se comportar na vida selvagem. O contato com as duas perspectivas oferecem
uma visão do progresso físico e psicológico de um e outro diante das
dificuldades.<p>
<p>No decorrer da narrativa, descobrimos que, mesmo cheio de
inseguranças, Peter é uma criança extremamente sensível e inteligente, e Pax,
apesar de ser um animal inexperiente, ainda guarda seus instintos mais profundos
como qualquer raposa.<p>
<p>Por ser uma literatura voltada para um público mais jovem, a construção
das personagens é prática e direta, apresentando poucas figuras, e apenas três são
mais trabalhadas: os dois principais e Vola, uma veterana de guerra que tem papel
fundamental no percurso do rapazinho. Outras personagens secundárias, que
aparecem no caminho de Pax, merecem destaque na trama: a raposinha fêmea
Arrepiada, o pequeno Miúdo, irmão mais jovem de Arrepiada, e Cinzento, uma
raposa macho-alfa experiente. Assim como os protagonistas, todas as personagens
que aparecem na história têm suas vidas marcadas de forma negativa pela
guerra.<p>
<p>Os capítulos de Pax percorrem com raras falas entre as raposas,
expressadas por meio de pensamentos. Quando ocorrem, os diálogos são curtos e
necessários, com o intuito de estabelecer uma comunicação rápida entre os bichos.
Apesar das poucas conversações, os animais do livro têm personalidade complexa e
agem de maneira racional. Uma das interações mais importante se dá quando
Arrepiada revela à Pax a trágica história de sua família, destroçada por humanos
perversos. O passado de Arrepiada mostra um lado das pessoas que, por ter sido
muito amado pelo humano que o cuidou, até então, Pax desconhecia: o lado
sombrio, da falsidade e da maldade. Sem demora, a tal guerra começa a fazer
sentido na pequena cabecinha de Pax.<p>
<p>Pano de fundo da história, a guerra faz parte do livro, e não apenas altera
o rumo das personagens como já começa influenciando a vida de todos. O núcleo
principal só acontece devido à guerra. Cada pessoa ou animal do enredo passa por
algum problema em consequência dos conflitos.<p>
<p>Hoje em dia, ainda vivemos em um mundo onde muitos lugares são
assolados por conflitos armados, levando devastações severas para a natureza. A
história de Pax expõe o assunto de maneira sensível, evidenciando como todos os
seres vivos são afetados enquanto uma guerra está acontecendo. Porém, o livro vai
além, e traz uma interpretação profunda sobre o porquê dela acontecer.<p>
<p>Os animais do livro tratam a guerra com muito mais conhecimento e
sensibilidade que os humanos. Dentre as várias lições do romance, os bichinhos
buscam demonstrar a verdadeira realidade dos conflitos, de maneira incrivelmente
sensível mas sem deixar de evidenciar as mazelas em suas vidas. Na perspectiva
das raposas, conhecemos o confronto interno e externo da guerra para os
humanos.<p>
<p>Já no lado das pessoas, a guerra é tema complexo entre Peter e Vola, a
mulher que salva Peter em um determinado momento da narrativa. A senhora conta
ao garoto as piores coisas das batalhas: o sequestro da esperança; a morte de
crianças e animais inocentes; a destruição dos lares; a desunião entre os povos; e
as terríveis consequências mentais e físicas do pós-guerra, que ela mesmo
sofrera.<p>
<p>Ao lidar com o que escapa do controle em momentos tão difíceis, cada
uma das figuras do livro tem o fardo que carrega consigo: a raposinha aguardando
seu dono; Vola tentando se reencontrar depois de muitos traumas; o pai de Peter
indo para a guerra e prejudicando o filho e Peter carregando a culpa por ter aceitado
abandonar seu melhor amigo.<p>
<p>As primeiras experiências na jornada revelam um Peter ainda dominado
pelo medo. Diante dos contratempos, ele tem dificuldade em decidir o que fazer e o
que falar, tornando-o vulnerável por diversas situações. A mudança acontece após a
convivência e os ensinamentos de Vola, uma personagem que altera completamente
o pensamento do pequeno rapaz e, aos poucos, o conquista. O contato entre eles é
cercado de aprendizado, dos dois lados, um prato cheio para quem quer refletir
sobre vida, morte, coragem, filosofia e solidão.<p>
<p>A temporada de Peter com a solitária mulher é cercada de desafios,
superações e dificuldades, mas acaba sendo exatamente tudo o que o menino
precisava para prosseguir. Vola, apesar de não ser considerada uma personagem
principal, é essencial no livro — tanto quanto os protagonistas. A experiente
camponesa acaba sendo uma grande professora para Peter. As poucas semanas do
garoto com ela valem mais do aprendera em sua vida inteira, tanto para suas
emoções quanto para as aptidões adquiridas, que são peça-chave na sequência dos
acontecimentos.<p>
<p>Acompanhar uma criança tão nova se aventurar por tantos quilômetros,
em uma jornada impossível, onde o fracasso parece estar cada vez mais próximo é
angustiante, porém, a não desistência de Peter e a maneira humana como a
personagem é tratada nos faz acreditar que sua missão será cumprida. O amor do
rapazinho pelo seu amigo traz diversas questões: até onde iríamos para ter nossos
entes queridos por perto? Faríamos a mesma coisa que ele? Até que ponto um
animal tem o mesmo espaço no nosso coração que uma pessoa?<p>
<p>Por outro lado, o enredo de Pax é emocionante e perigoso do começo ao
fim, e a raposinha aprende tudo na dureza, sem espaço para erros ou desistências.
Logo no começo, os problemas afetam o pequeno animal: fome, inexperiência,
predadores e humanos “doentes de guerra” — designação das raposas quando
humanos estão guerreando. Sem a fraternidade de seus novos amigos, que o
auxiliam com comida, abrigo e dicas, a sobrevivência de Pax seria impossível.<p>
<p>O que os dois protagonistas jamais esperavam era o quanto suas
trajetórias seriam difíceis e exaustivas, e que o amor que os envolvia daria força de
vontade nos piores momentos. Durante a caminhada, raposa e menino descobrem
que o mundo lá fora é cruel, portanto, ambos teriam que agarrar com força os laços
que os unem para que as coisas ruins não os sucumbissem.<p>
<p>As decorrências da guerra no mundo do livro demonstra como todos os
seres vivos são afetados, tanto para os que estão no meio das batalhas quanto para
os que são atingidos de maneira indireta.<p>
<p>Um ponto em comum em ambas as trajetórias é a mudança de
personalidade e o desenvolvimento das personagens: enquanto o menino aprende a
lidar com as emoções, Pax redescobre seus mais profundos instintos —
adormecidos devido à vida fácil com os humanos. Resumindo, tanto animal qua
estão em busca de suas próprias naturezas.<p>
<p>Mesmo com uma jornada marcada pela destruição e superação, a
narrativa é suave e cativante, e tudo isso ensina lições importantes na vida como
enfrentar os medos e os fracassos para não desistir. Na verdade, o ponto forte da
história é a suscetibilidade que as temáticas são tratadas, despertando emoções
diferentes a cada capítulo. “Pax” é uma história que poderia ser real, indicada tanto
para os filhos quanto para os pais.<p>
<p>“Pax” é, primeiramente, um livro que contém muitos ensinamentos —
comportamento animal, humano e da natureza — e estimula a reflexão: há a
oportunidade de pensar sobre tudo o que acontece para fazer boas conclusões
sobre os acontecimentos.
<p>Ao terminar a leitura, os episódios finais são capazes de mudar nossa
percepção de mundo, e isso é um dos pontos mais fortes do enredo — a capacidade
de sensibilizar do começo ao fim. A essência da trama proporciona muitos
questionamentos e, à medida que o fim se aproxima, as emoções se afloram.
Apesar de ser uma literatura infantojuvenil, “Pax” é capaz de cativar todos os tipos
de público, basta virar as primeiras páginas para começar a se emocionar com as
aventuras.<p>
<p>Uma lição muito importante é sobre como a amizade e o amor
incondicional ultrapassam barreiras. Outros temas também ganham destaque no
decorrer da história: autoconhecimento; ações humanas na natureza; pertencimento;
e liberdade.<p>
<p>O livro vai muito além da amizade entre uma criança e um animal,
abordando sobre como é difícil separar de quem amamos, seja pela morte, guerra
ou simplesmente porque os caminhos da vida se distanciam. Aprendemos sobre
sobre como cada pessoa reage a dor e como enfrentá-la, mesmo que não seja
fácil.<p>
<p>A mensagem mais forte que fica é a da amizade. A narrativa demonstra
que o sofrimento da separação existe, mas que apesar de tudo existe a força que
uma amizade gera, ou seja, um elo que é capaz de fazer buscar poder onde nem
sabíamos que existia dentro de nós.<p>
<p>O romance cria uma enorme empatia com as crianças e os animais,
fazendo com que quem não tenha um bichinho considere significativamente cuidar
de um, ou dar um para uma criança, para que ela nutra valores como a amizade por
um animal.<p>
<p>Por fim, ficam algumas perguntas: Quais são os danos de uma guerra na
natureza e nas vidas? São necessários tantos sacrifícios? Estamos em equilíbrio
com os outros seres vivos? Quais são nossos limites com quem amamos? Estamos
realmente sensibilizados com as plantas e os animais?<p>
<p>E se algum dia quiser ter e se apaixonar por um bichinho, lembre-se da
história de Pax para que um grande vínculo possa vir a ser construído.<p>

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