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ENTRE ANÁLISES

Juliana Pamplona
ENTRE ANÁLISES

Juliana Pamplona

Personagens:

D2

D3

D4

LADRÃO

// - Indica simultaneidade (o ponto a partir do qual a fala seguinte deve entrar).

B.O. - Black out.


PARTE 1

(Orientação espacial: à esquerda a cadeira do paciente, à direita a cadeira do analista.

Ao início apenas duas cadeiras estão em cena. Os que entram depois de A e B trazem suas
próprias cadeiras.)

A – (Chegando. B a espera) Desculpa o atraso... (A tira um casaco comprido, gorro, cachecol,


luvas ect.)

B – Febre?

A – Estava frio agora mesmo... eu saí de casa era inverno.

B – (B faz anotações numas folhas) Como você está se sentindo hoje?

A - Como uma pessoa traída... O tempo me traiu. Agora. Neste instante. O tempo está me
traindo. (A é empurrada. Cai e se levanta como se estivesse acostumada) é como...

(Tentando ser compreendida. Explicativa. Desiste.) eu me sinto.

B – E o que você vai fazer a respeito?

A - Eu... (rebelde) Sei lá! Caguei!

(A é empurrada novamente. Cai.)

B - (grave) Sério.

A - (ela tenta falar se levantando, a palavra não vem, tenta de novo, de novo. golfadas de
não-palavras) Você viu isso? Ele me traiu de novo. Agora mesmo.

B – (blasé) Perseguição.

A - Não! Eu juro! Eu perdi o tempo.

B - De que?

A - De fa... (a fala é emperrada novamente) B - Você se sente culpada?

A - Eu não tenho culpa! Tenho? Eu não concedi... Ou será que eu... (Tempo. Aponta para si
mesma) Eu estou concedendo. Agora. (Tempo. Surpresa como se falasse de outra pessoa)
Viu só como eu sou? Eu deixo! Olha que fácil... (Tempo) Imagine só que eu permito isso.
Debaixo do meu nariz. Eu posso contar o tempo pro tempo me trair. Eu posso criar esse
tempo pra ele.

B - Você está pedindo!

A - Estou? Será que ele me espera... se eu... sei lá... marcar uma hora, será que ele pára? Eu
marco uma hora!

B - É sobre marcar tempo?

A - Marcar hora, minutos, segundos.

B – Não é preciso marcar. O tempo simplesmente acontece. (Ela é empurrada. Cai e se


levanta.)

A - Eu não gosto de sustos. Eu gosto de sustos. Mas só quando eu tenho a chance de


escolher os meus próprios sustos.

B – E depois é traída pelo tempo...

A - Então é por isso...?

B - Há de ser.

A - Não me interprete, ok? Não me analise. Eu não quero ser analisada. Pára de me ler!
Pára! Não olha pra mim! Pára! Você parou? Porque você ainda está me lendo?

Por que se sente responsável? Não precisa. Eu te libero. Eu estou dizendo que eu venho
aqui para você não me analisar. Olha pra lá! (O analista joga uma porção de folhas soltas
nela. Ela não reage)

A - Se eu tivesse um nome, isso me tornaria mais confiável?

B - (B observa as reações de A enquanto o tempo passa.) Ao contrário. (para si) Por favor
faça sentido! Por favor faça sentido!

A - (Se abre. Fala com dificuldade) Eu estou desconfiada de que eu não existo realmente...
mas me matar é um risco muito grande e pode ser tarde demais pra descobrir o contrário
depois.

B - Entendo.

A – (indignada) É o melhor que você tem pra me dar?

B – (simples) Compreensão?

A – Tem razão. (considera) Na verdade é... bastante coisa.


B – (para si) Por favor faça sentido! Por favor faça sentido! (para A) Pode ser complexo.

A – Grave?

B – De inexistência.

A – Complexo?

B – De inexistência.

A – (para si) Por favor faça sentido! Por favor faça sentido!

B - O que também não significa que você exista só porque tem complexo.

A – (repentinamente nervosa. Som de batimentos cardíacos.) Meu deus! (tremendo) O

meu coração está disparado.

B - O que foi?

A - Eu sou uma pessoa horrível?

B - O que aconteceu?

A - Eu acho que eu matei alguém...

B - Quando?

A - Quando? (se lembrando) Ah, não. (Some o som de batimentos cardíacos. blasé) Isso
ainda não aconteceu. (rápida) Era agora! (tira uma arma do casaco e atira em B.

Som de batimentos cardíacos).

B – (Assustado)... Você arriscou?! Comigo você arrisca, mas com você, você simplesmente
não tem coragem!

A – Foi inútil!

B – Como inútil? Eu não morri. Quer dizer que você não existe!

A – (Cessa o som de batimentos cardíacos) Ou é você quem não existe. É tão frustrante.
Continuo sem saber...

B – Você me traiu!
C entra a tempo de ouvir a última fala de B. Observa B de longe. A e C não vêem ou escutam
um ao outro. C tem papéis e caneta na mão. É analista de B.

C – (para B) Boa tarde.

A – Eu fui honesta. Eu avisei que eu era uma pessoa horrível.

B – Não a tempo.

A – Mas é esse o meu ponto fraco, você devia saber!

C – Agitado hoje?

B – (confuso) Estou...

A – Eu faço isso... às vezes... pra ter certeza que eu estou aqui. Às vezes eu me corto, pra ver
se sangra... aquela velha velha história...//pra ver se eu sinto alguma coisa. Me queimo com
cigarro... eu tento variar vez em quando experimentando nos outros...

Foi muito importante pra mim isso de você ter sobrevivido. (emocionada) Isso significa
tanto... Sinceramente, eu ficaria muito mal sem analista... Nem sei do que eu seria capaz!

C – Olha pra mim. Quem te traiu?

B – (para C) Ela!

C – (para B) Quem é ela?

A – (para B) Ela?

B – (para A) Você.

A – (se defendendo) Eu só queria tirar uma dúvida.

C – Você reconhece este espaço?

B – É um consultório.

A – Ninguém está seguro em lugar nenhum. Especialmente você que trabalha com malucos.

C – Muito bem. Eu quero saber como você está hoje?

B – (ri durante toda a frase) Eu quase morri só para alguém se sentir melhor.

A – (ri também.) É verdade. Foi um ótimo momento.


C – Quer me contar essa história?

B – (rindo ainda) Eu preferiria que tivesse feito outras coisas para se sentir melhor.

A – (séria) Tipo sexo?

B – Sexo?

C – Quem é a moça?

A – (sem graça) Levei como uma cantada, não era?

B – (para A) Er... eu não tinha pensado nisso...

A – Que mentira. Não é possível. Não é convincente.

C – Não pensou em quem ela é?

B – (para C) Claro que pensei!

A – (surpresa) Você quer?

B – (para A) Não sei...

C – O que sabe dela?

A – Isso está ficando um pouco desconfortável...

B – Eu não quis dizer... ai... mas quem aqui falou em sexo!?

A e C – Você.

B – Não foi isso que eu disse...

A – Ah, não? Vai retirar? // C – Disse o que então?

B – (confuso) Eu... não acho.. que seria... “certo”?

A – Tipo ética?

B – Você tentou me matar ainda agora!

A – Ah, isso... (entediada)

C – (levanta) Ninguém tentou te matar. Calma. Olha pra mim. Você está seguro aqui,
entendeu?

B – Eu...
A – Olha pra mim.

C – Olha pra mim.

A – Me encara.

C – Concentra.

A – Aqui.

B – (fecha os olhos) Eu não consigo mandar ela embora.

C – Ela quem?

B – Não consigo mandar ninguém embora. Não consigo em geral, mas ela não sabe e há
momentos em que isso realmente me tranqüiliza.

A – (fala rápido) Sem ofensa, mas eu queria falar sobre mim. Eu não me importo com a sua
vida pessoal. Eu estou bastante preocupada com o meu tempo.

C – (“coaching”) Vamos lá, você está indo bem.

B – (para A) Tem a ver com você.

A e C – Comigo?

B – (para C) Não.

C – (ignorando) Não se reprima.

(A e C escutam atentamente. A e C tentam focar o olhar de B neles, mas desta vez apenas
com gestos sutis, como tocá-lo no ombro, no joelho, se reposicionar melhor para ficar na
frente dele. Eles vão se deslocando sutilmente ao longo da cena neste jogo)

B – Eu falhei. Toda essa expectativa, como se eu realmente fosse capaz de analisá-la...

e eu não tenho uma pista. Claro, que eu penso ALGUMA COISA a respeito. Eu penso o pior
dela.

A – (Fala baixo. Para si) Eu só queria tirar uma dúvida...

B – Aquilo que você me falou fica martelando na minha cabeça... que “pode-se tomar a sua
vida sem te dar a morte em troca”.

C – Eu disse isso? (orgulhoso) Isso é bom! (anota) A – Foi uma coisa que eu li...
B – Eu vou ser terrivelmente franco aqui: Não acredito que tenha solução. Isso está me
consumindo. Eu pensei em desistir tantas vezes... Talvez realmente tenham esquecido de te
dar “algo em troca”...

C – É um processo doloroso. Você não deve desistir.

A – (transtornada) Estou com uma puta vontade de chorar.

B – (para A) Por que você não chora?

C – Eu estou bem...

A – Porque não tem nada a ver com o momento.

B – Seria bem apropriado, na verdade.

A – (considerando) Jura?

C – A dor é sua.

(A tenta chorar e faz barulhos estranhos. C observa B que observa A) B – Acho que nós a
perdemos... (fala baixo para A não ouvir) Ela está me traumatizando...

C – (rapidamente para B) O seu tempo acabou. Se vira. Cala a boca. Vai pra casa e dorme.

(Entra D. D posiciona sua cadeira longe demais de C, depois se levanta para calcular melhor
o espaço.)

B – Nós estávamos progredindo. ... (levanta-se vai até A que ainda tenta chorar buscando
registros de sons diferentes). Ela não pode congelar aqui. (B empurra A. A não cai). Se vai
chorar, chora logo. Rapidinho. (A continua tentando chorar. B a empurra A mais uma vez. A
não cai)

C – Você acredita mesmo em progresso? Você vem e vai, fala coisas despropositadas, blá blá
blá. Não há progresso. Há rotina. (para D) Olá. (D pisca para C. Se senta com calma muito
perto de C.)

// (Entra o Ladrão de cena - “contra-regra” - que coloca A no colo e a retira de cena


rapidamente, enquanto C fala com B)

B – (virando-se para onde estava A, com um lenço de papel na mão) Já!? Ninguém é tão
rápido...

C – (para B) Pois é. O seu tempo acabou.

(B recolhe seus papéis do chão e sai com a cadeira de A) C – (para D) – Onde você estava?
D – (Gritando – como se estivesse longe - mas em um tom de voz doce. Ela gesticula quase
batendo em C sem querer.) Eu estava aqui o tempo todo, você não me viu?

C - Você acabou de aparecer.

D – (alto) Eu estava do seu lado... Perto... Mais ou menos. Longe.

C – Não é possível.

D – (alto) Cheguei com você. Então?

Voz de B em off – (para A) Seria mais apropriado você parar de chorar agora. (A chora).

C – Ainda está por aqui... Não é possível, está por aqui...

D – (alto) Onde? É barata? (pula na cadeira) C – Não... Não é barata...

(D anda, quase atropela C, mas desvia)

C – Cuidado!

D – Calma, não tem nada.

(D posiciona sua cadeira mais longe de C, mas agora sussurra achando que está muito
perto. D é extremamente cuidadosa em seus movimentos para não “derrubar” nada ou
esbarrar em “C”. O diálogo deve ser rápido e intimista da parte de D).

D – Aqueles sonhos voltaram?

C – O que?

B em off – Eu não disse nada.

D – Aqueles sobre construção civil...

C – Não ouvi...

B em off – Eu não disse nada.

D – Construção civil...

C – Pode falar mais alto?

B em off – Eu não disse nada!

D – Dá pra notar, né?

C – O que?
D – Que eu estou perdida?

C – Do que está falando?

B em off – Desisto. (barulho de telefone fora do gancho) D – (agora em tom de voz normal)
Parece que errei o lugar. Perdi o endereço. Não sei onde deixei o meu carro. Peguei um
ônibus. Saltei longe. Andei pouco. Cheguei logo.

(faz gesto de incompreensão com as mãos)

C – Deixa eu te ajudar... (C pega a cadeira de D e a posiciona corretamente) D – Obrigada.


(Quase senta fora da cadeira, mas C a coloca no lugar). Mas a gente estava falando dos seus
sonhos.

C – Da casa flutuante.

D – Construção civil em alto mar.

C – É um sonho bom, mas eu tenho medo de não conseguir voltar pra casa um dia.

(Barulho de sirene. Só D escuta.)

D – É isso! As coisas mudam de lugar. O problema não é você, é o andar das coisas!

C – Será?

D – Claro, hoje em dia é assim. Se eu não agarrar essa cadeira, daqui a pouco eu estou no
chão. E mesmo assim é capaz deu ficar paradinha, quieta, e ela me levar pra outro lugar.
Sempre que eu vou dormir eu rezo pra acordar num lugar próximo do meu carro...

C – O que eu devo fazer?

D – Não se preocupe com a sua casa, da mesma forma que as coisas vão, elas voltam.

Se não as mesmas coisas, são coisas muito muito similares. É como o fluxo de canetas bic.
Você nunca sabe se a que você tem nas mãos é a sua, e onde a que você comprou realmente
foi parar...

C – Exatamente!

D – Vem comigo.

C – Ok.

D – Quero que você registre o nosso trajeto. (ela pega duas câmeras. Usa uma delas e
entrega a outra para C) Vamos começar da porta.

(andam em direção a uma porta que está supostamente fora de cena).


D – Estranha essa porta. Está tão perto, mas nunca chega.

(Filmam na mesma direção e de uma mesma distância. Vemos num telão dividido em dois,
a mesma porta perto e longe, uma filmagem um pouco tremida que parece estar sendo
capturada na hora).

C – Aquela lá...? (aponta para fora de cena) D – Não, esta aqui. (referindo-se a mesma
“porta”. corre) Vai bater! (desligam a câmera. barulho de porta fechando. D sai de cena.)
Voz de D em off: Você deve filmar as suas trajetórias para não se perder.

C – (pega a câmera, mas resiste) Não acho que seja necessário... foi só um sonho...

Voz de D em off: Olha pra mim. (C liga a câmera novamente e filma em direção a D

que se encontra fora da visibilidade do público. Aparecem novamente na tela duas imagens
simultâneas, uma referente à filmadora de cada um. D filma em close, C

parece estar mais perto. A imagem de D filmada por C dá a impressão que ela está mais
longe – que talvez seja mais coerente com a percepção do público).

(silêncio)

D – Engraçado... Acho que é a primeira vez que eu realmente olho pra você.

C – Devo me preocupar? Isso é meio chato de ouvir da sua analista...

D – Ah, desculpe! Esqueci onde a gente estava...

C – Não, não... Estava brincando, pensei alto. Eu quero saber o que você vê agora. Me conta.
É importante.

D – Tá bom... Vou tentar.

C – E então?

D – Tira isso do seu rosto.

(C abaixa a câmera, mas continua filmando D, agora de outro ângulo, com o seu rosto livre.
Ele ora olha diretamente para D, ora olha para a tela da câmera.) D – (decepcionada)
Passou...

C – Como?

D – Eu havia visto alguma coisa em você. Mas se foi... Não consigo mais lembrar.

Não aparece mais pra mim. Simplesmente não está mais em você. De repente era eu.

C – Tenta! Por favor...


D – (agora usando o zoom in e zoom out, se esforça) Hm... (C se mexe um pouco se
ajeitando na cadeira) isso!

C – Viu alguma coisa?

D – Quase... não sei... acho que está no movimento. (C se mexe mais, um pouco desajeitado)
isso é bom... hm... não... não é interessante afinal ...

(Vemos pela tela o Ladrão que coloca D no colo e a retira do “enquadramento”

rapidamente. A câmera de D é desligada.)

C – Huh? (para si) O que foi isso? (projetando para fora de cena)... Devo esperar? (C

repassa três vezes a gravação do ladrão levando D e não compreende).

(B.O.)
PARTE 2

Barulho de vidro estilhaçando. O Ladrão entra com um CD player de carro. A partir deste
momento a trilha “musical” da peça é feita pelo Ladrão. Ele escuta um indie rock e toma um
suco vermelho num copo transparente com canudo. Na medida em que ele bebe o suco a
iluminação (no momento da cor do suco) vai ficando mais fraca, até um B.O. completo.

POST-ITS

‘E’ coloca post-its no chão fazendo uma trilha até o seu consultório.

(B.O.)

FILME

No escuro:

(entra a trilha do filme a definir)

D e B em cena.

Um cigarro aceso. B brinca com o cigarro fazendo círculos.

D – (baixo) Tem isqueiro? ...Tem isqueiro?

B – Fogo? (estende o isqueiro a uma certa distância) Tenho. Toma.

D – Assim você me queima!

B – O que? Deixa que eu acendo. (B se aproxima e ascende o cigarro de D) (ficam dois


pontos de cigarro acesos no palco. Aos poucos estes dois pontos vão se afastando. Entram C e
E. Um pouco depois do início do filme entra A que fica no centro. A, B, C, D e E assistem ao
filme que é projetado em cima deles, mas eles olham para frente como se vissem uma tela
atrás da platéia.).
B e D são os atores mudos do filme. As imagens são em preto de branco, com falhas e partes
manchadas. Toca uma música de fundo permanente.

Projeção: Seqüência de olhares em close de B e D até os dois se juntarem num mesmo frame.
Beijo em close.

Em cena: B e D assistem com indiferença. Não se reconhecem.

Projeção: A câmera se distancia bem aos poucos. (zoom out) Começa a pegar fogo na película.

Em cena: ‘C’ vai embora reclamando, depois ‘E’, ‘B’ e ‘D’. ‘A’ permanece imóvel.

Projeção: B e D aparecem de corpo inteiro até ficarem na mesma proporção de ‘A’

que está ao vivo em cena.

Em cena: ‘A’ fica posicionada exatamente no meio do beijo projetado.

A película queima por completo.

B.O.

POST-ITS

‘D’ segue a trilha de post-its lendo cada bilhete em voz alta. Quatro atrizes fazem o mesmo
papel de ‘D’, aqui representadas como D2, D3 e D4.

Post-it 1: me siga

(entra D2)
Post it 2: continue

(entra D3)

Post it 3: só mais um

(entra D4)

Post it 4: é aqui!

(D2, D3 e D4 se olham e se dispersam.) ELEVADOR - B e D

(A iluminação recorta um espaço quadrado. Barulho de elevador.)

Voz eletrônica – Bom dia.

D entra.

Voz eletrônica – Porta fechando.

B entra correndo atrás de D. Fica preso na porta.

Voz eletrônica – Porta fech... Porta f... Porta...

B consegue entrar.

Voz eletrônica – Bom dia. Porta fechando.

B – (sem fôlego) Eu estava ansioso pra falar com você.

D – Aqui?

B – Qual é o problema?

Voz eletrônica – Segundo andar.

D – Diga logo.

B – Você sumiu.

D – Não é nada pessoal. Eu sou assim.

B – Nem deixou um bilhete.

D – Deixei sim. Só não me pergunte onde.


Voz eletrônica – Quinto andar.

(silêncio constrangedor)

Voz eletrônica – Oitavo andar.

B – Eu te amo.

D – Não sei o que dizer...

B – Diga o que sente.

D – Você está confundido tudo...

B – Não é confuso. Eu sei o que eu sinto. Quero saber o que você sente.

Voz eletrônica – Sétimo andar.

D – Eu não posso retribuir.

B – Por quê?

D – Eu “gosto” de você, mas é outra coisa.

B – Ok. Carinho. Conheço. Mas, além disso, eu também sinto uma atração enorme.

Você sente atração por mim?

Voz eletrônica – Quarto andar.

D – Não.

Voz eletrônica – Térreo.

(silêncio)

Voz eletrônica - Bom dia. Porta Fechando.

(silêncio)

Voz eletrônica – Terceiro andar.

B – Eu estou sendo sincero, gostaria que você também fosse.

D – Você acha que eu estou mentindo?

B – Você nunca sentiu tesão por mim?

Voz eletrônica – Sexto andar.


D – É diferente, já te disse.

B – Ou é mais confortável desta maneira?

Voz eletrônica – Nono andar.

D – Talvez eu tenha sentido. Uma vez. Duas. Três vezes no máximo. Não importa. É

lisonjeiro de qualquer forma tudo isso... Mas eu não quero.

Voz eletrônica – Sétimo andar.

B – Posso te dar um beijo?

Voz eletrônica – Quinto andar.

D – Não.

(Som de elevador despencando).

Voz eletrônica – Térreo.

D – Chegou! Finalmente. Adeus. Vou indo.

Voz eletrônica – Bom dia.

B – Cuidado!

Voz eletrônica – Porta Fe...

D – (assustada) Barata?

B – Não... Não é barata...

(D chega bem perto de B)

D – (Gritando – como se estivesse longe - mas em um tom de voz doce) Te vejo por aí.

B – (desconcertado) Sim, sim...

Voz eletrônica – Bom dia.

B bate no painel “invisível” do elevador. B se joga contra a parede e escorrega até o chão.

Voz eletrônica – Bom dia. Bom dia. Bom dia. Bom dia. Bom dia. Bom dia. Bom dia.

(B.O.)

O elevador se desfez. Apenas D está em cena.


A voz eletrônica continua ao longo desta cena, só que em volume mais baixo.

Voz eletrônica – Bom dia. Bom dia. Bom dia. Bom dia. Bom dia. Bom dia. Bom dia.

(B.O)

CADEIRAS

E sentada na cadeira da analista (à direita), olha para uma cadeira vazia (à esquerda).

Ela espera, sem gestos ilustrativos como olhar no relógio. (40 segundos e B.O.)

ELEVADOR - A e D

(A iluminação recorta um espaço quadrado no palco. Barulho de elevador.)

Voz eletrônica – Bom dia.

‘A’ entra.

Voz eletrônica – Porta fechando.

D entra correndo atrás de A. D fica presa na porta.

Voz eletrônica – Porta fech... Porta f... Porta...

D consegue entrar.

Voz eletrônica – Bom dia. Porta fechando.

D – (sem fôlego) Finalmente te encontrei. Estou querendo falar com você..

A – Agora?

D – Qual é o problema?

Voz eletrônica – Segundo andar.

A – Diga logo.
D – Fiquei te esperando.

A – Não é nada pessoal. Eu sou assim.

D – Nem ligou pra avisar.

A – Deixei um recado. Só não me pergunte quando.

Voz eletrônica – Quinto andar.

(silêncio constrangedor)

Voz eletrônica – Oitavo andar.

D – Eu te amo.

A – Não sei o que dizer...

D – Diga o que sente.

A – Você está confundido tudo...

D – Não é confuso. Eu sei o que eu sinto. Quero saber o que você sente.

Voz eletrônica – Sétimo andar.

A – Eu não posso retribuir.

D – Por quê?

A – Eu “gosto” de você, mas é outra coisa.

D – Tá, mas... Atração. Você sente atração por mim?

Voz eletrônica – Quarto andar.

A – Não.

Voz eletrônica – Térreo.

(silêncio)

Voz eletrônica - Bom dia. Porta Fechando.

(silêncio)

Voz eletrônica – Terceiro andar.

D – Eu estou sendo sincera, gostaria que você também fosse.


A – Você acha que eu estou mentindo?

D – Quer dizer que você nunca sentiu tesão por mim?

Voz eletrônica – Sexto andar.

A – É diferente, já te disse.

D – Ou é mais confortável desta maneira?

Voz eletrônica – Nono andar.

A – Talvez eu tenha sentido. Uma vez. Duas. Três vezes no máximo. Não importa. Eu não
quero.

Voz eletrônica – Sétimo andar.

D – Posso te dar um beijo?

Voz eletrônica – Quinto andar.

A – Não.

(Som de elevador despencando).

Voz eletrônica – Térreo.

A – Chegou! Finalmente. Adeus. Vou indo.

Voz eletrônica – Bom dia.

D – Espera!

Voz eletrônica – Porta Fe...

A – (assustada) Eu ainda estou aqui?!

D – Não... não, você já foi...

A – Até já. Até mais...

D – (desconcertada) Sim, sim...

Voz eletrônica – Bom dia.

D bate no painel “invisível” do elevador. Aperta o botão de emergência.

O botão de “emergência” dispara.


(B.O.)

CADEIRAS

‘E’ sentada na cadeira da analista (à direita), olha para duas cadeiras vazias (à esquerda).
Ela espera, sem gestos ilustrativos como olhar no relógio. (40 segundos e B.O.)

METRÔ

A, o Ladrão e B sentados nesta ordem em fileira. O ladrão ouve música num i-pod. A e B
estão no celular. Em hora nenhuma eles se olham.

A – Tenho que desligar.

B – Saudades...

A – Como você conseguiu esse número? Eu troquei de propósito...

B – Não fala assim, amor.

A – Um pouco menos...

B – Parece que nada do que eu digo é suficiente...

A – É excessivo.

B – Posso te ver?

A – Me dá um tempo.

B – Sinto tanta falta... poderia morrer disso.

A – Preciso de espaço.

B – Também?

A – Um não faz sentido sem o outro.


B – Nada faz sentido sem você.

A – Nada faz sentido de qualquer maneira.

B – Saudades.

A – Vou desligar.

B – Parece que te vejo por toda parte.

A – Você está me seguindo?

B – Quero que você conheça a minha mãe.

A – Vou chamar a polícia! (o ladrão treme, depois relaxa novamente) B – Eu fico com
ciúmes...

A – Argh! (desliga o telefone)

B – Às vezes eu fico pensando... O que vem depois? Tem o “gosto de você”, o “te

adoro”, o “te amo”... O que vem depois? Estou nesse estágio do depois, com certeza.

No “depois-do-eu-te-amo”.

(o celular de A toca novamente. A tenta ignorar.) B – Não desliga... deixa eu ouvir a sua voz
só mais um pouquinho. O que que eu fiz?

Eu só te trato bem. Me perdoa, é muito amor. Não fala assim como? Falo por que sinto, ora.
Isso agride?

A – (atende) Não adianta ligar do orelhão, eu sei que é você. (desliga. O celular toca
novamente)

B – Não quero te atrapalhar... Só queria dizer que você é tão importante pra mim, tão tão
tão... eu estou aqui, tá? Pra você.

A – (atende) Pára de me ligar e não posso ficar trocando de número por sua causa!

(desliga. O celular de A volta a tocar.)

B – Eu sei que está difícil agora, meu bem, mas fiz uns planos pro final de semana... É

claro que te inclui... Então, nas férias... Ah, gripada? Eu cuido de você, pego a sua gripe e
depois você cuida de mim. Entendo... Posso fazer uma visita rápida... Sei. Eu nem preciso
entrar, você me dá tchau pela janela. Hm... é verdade, não quero ser inconveniente... Eu
espero na portaria. Te vejo quando você for comprar um pão, quando for na farmácia... Em
alguma hora você deve sair mesmo... Não, mas você nem precisaria parar não. Você faz o
que tem que fazer, eu só quero te olhar, juro...

Imagina se eu vou ficar na passagem! Eu fico num cantinho.

A – (atende) Morra! (desliga)

B – Amor? Taí? (olhando pro aparelho de celular) Caiu.

(B liga novamente. Aguarda. O celular de A toca, ela olha para o aparelho sem acreditar.
Permanecem assim durante algum tempo. O Ladrão curte o som do i-pod. A e B levantam
para descer. O ladrão sorri satisfeito. A e B saem de cena. O ladrão tira duas carteiras
debaixo de sua bunda – o ator deve estar sentado nelas durante toda a cena – confere o
dinheiro, e as guarda em seus bolsos)

(B.O.)

CADEIRAS

‘E’ sentada na cadeira da analista (à direita), olha para três cadeiras vazias (à esquerda). Ela
espera, sem gestos ilustrativos como olhar no relógio. (40 segundos e B.O.)

RUA

A e B na rua, cada um andando para um lado, ambos vão diminuindo o passo na medida em
que vasculham os bolsos. Param. Xingam o ar em silêncio. B telefona. O

celular de A toca.

B – Você não vai acreditar no que me aconteceu! (sai) (A joga o seu celular no lixo e sai em
seguida) (B.O.)
PARTE 3 – Ds e E

Consultório de E com uma cadeira para ‘E’ e quatro para ‘D’. As demais ‘D’s estão espalhadas
pelo espaço cênico. Podem estar sentadas entre as pessoas do público ou em outro ponto fora
do consultório. Entram aos poucos.

D entra no consultório.

E – Finalmente! Como foi o seu percurso?

D – Instável. Posso fumar?

E – À vontade.

D – Não consigo me concentrar num lugar só. É difícil. Eu queria me concentrar.

E – Não se preocupe. Venha em pequenas doses.

D – Eu realmente gostaria de me concentrar aqui. (procura o maço nos bolsos) Onde


coloquei o meu maço? (procurando) Estou completamente espalhada... Não sei o que fazer...
Sabe, chegar de uma vez? Sem precisar... O que eu estava falando...? Perdi.

Sei lá... meu cigarro... (entra D2 naturalmente como uma continuação independente de D,
tira o maço do bolso, pega dois cigarros)... Achei! (fala enquanto D2 entrega um cigarro a D.
D e D2 gesticulam com o cigarro apagado) Pelo menos eu cheguei...

(contente) estou aqui, certo?

D2 – (contente) Inacreditável! Conversando com você.

E – Certo. (responde sempre como se D fosse uma só) D – (aliviada) Isso é tão bom.

(D abraça E. Quando D larga E, D2 a abraça).

E – (D abraçando) Tá legal... (D2 abraçando) Pode largar agora.

D2 – Vou confessar, não foi nada fácil…

D – tive um probleminha...

D2 – fui ao cinema.
D3 – (entrando com um cigarro aceso e um isqueiro) Quando vi, estava completamente
projetada. (D3 ascende o cigarro das outras) (pausa)

E – (sem saber o que dizer) Gostou do filme?

D – (sensível) Achei bem emocionante.

D2 – (emocionada) Muito bonito mesmo.

D – (indiferente) Bonito.

D2 – (seca) Emocionante.

D4 – (entra fumando) Eu realmente gostaria de me concentrar aqui.

(As Ds fumam. Soltam uma fumaça concentrada em cima de E.) E – (incomodada) O


cinzeiro... (estende a mão com o cinzeiro para D3 que está mais próxima, mas é D4 quem
pega o cinzeiro).

D – Ah, sim!

D2 – Obrigada. (D3 bate a cinza.)

E – O que você me conta?

D – Eu sei que eu vim pra falar alguma coisa importante, mas não consigo chegar no ponto...

D2 – O dia está confuso//

D3 – essa cadeira mudou de lugar?

E – Sempre esteve aí.

D4 – Estranho.

D2 – (explicativa) Eu sei que eu tenho algo a dizer. Algo que faz sentido. Talvez se eu me
exigisse... focasse //

D3 – Se eu ficasse bem firme//

D4 – Se eu me convocasse pra conversa//

D2 – Tem uma coisa que está muito próxima de ser dita//.

D4 – ou pensada//

D3 – ou sentida...
(As Ds quase têm um insight.)

D4 – mas não chega... (Se frustram)

(pausa. Ds afundadas na cadeira)

D – (tem um insight. alegre) Eu ando me sentindo tão mal!

(As Ds resmungam).

D4 – (deprimida) péssima//

D3 – (deprimida) deslocada//

D2 – (deprimida) incompreendida//

D – (deprimida) sem valor

(respiram fundo)

D3 – (com pena de si) É… ando triste... choro à toa... falo sozinha...

D2 – (angustiada) Está insuportável...//

D4 – (angustiada) Eu estou sofrendo.//

D2 – (angustiada) Como que pára isso?//

D – (angustiada) Essa sensação.//

(as Ds estão ansiosas por uma resposta)

D4 – (implorando) Por favor...

D – (implorando) Me diz o que que eu faço!//

D3 – (implorando) Qualquer coisa!

D2 – (implorando) Eu obedeço!...

E – Não posso.

D3 – Mas eu venho aqui toda semana... Você me conhece. Deve ter alguma pista...

(‘E’ faz um “não” com a cabeça)

D2 – Eu queria ter raiva de você. (‘E’ se surpreende) Ou de mim. De mim.

D3 – Desculpe. Estou num estado de coração pouco inteligente.


D4 – Talvez tenha um macete. Você os tem?

E – Inútil. Macetes só se pega com a prática. O início é mais difícil. Qualquer coisinha
estraga tudo.

E – Somos tão frágeis. Fiz de novo? Projeção? Lugar. O problema é sobre lugar, meu deus!

D2 – (como se tivesse levado um soco no estômago) Oh, não.

D3 – (idem) Deus não.

D4 – Eu voltei a sofrer de um mal quase superado. Pra mim era muito penoso acreditar em
deus. Abandonei. Eu sempre imaginava ele rindo da minha alma. Era pouco saudável. Deus
fodia com a minha auto-estima.

D3 – Me sinto um inseto.

D4 – Não.

D2 – Um inseto teria mais chance de se locomover.

D3 – Falo dos que voam, óbvio. Não vou me comparando com qualquer formiga.

D2 – (num esforço sincero) Estou com a impressão de que tem a ver com as medidas entre
os lugares.

D3 – As medidas dos espaços. //

D2 – tem algo de errado com elas ultimamente.//

D3 – não é que eu não saiba as medidas!//

D4 – Não é isso. Eu as reconheço.//

D3 – O meu cálculo está perfeito. (demonstrativas) “Está longe? (As Ds fazem sinais de
“não”) Falta muito? (fazem sinais de “positivo” ou “mais ou menos”) Ta chegando? (fazem
sinais de “negativo” e “mais ou menos”) “Está perto?” (fazem sinais de “não”).

D – Eu reconheço as distâncias.//

D2 e D4 – Perfeitamente.//

D3 – Eu só não concordo com elas.//

D – Há de convir que as distâncias raramente fazem sentido.//

(Nota-se que E está sonolenta, mas disfarçando) D4 e D2 – ninguém comentaria isso de


qualquer maneira.
D2 – Eu falei em voz alta?

D3 – Não me arrependo.

D2 – Me arrependo sim.

D – Honestamente: o que?

D2 – E se eu entendesse “o espaço”? Acharia mais lugares vazios. E se eu entendesse o


tempo? Eu me apagaria agora, aqui na sua frente, e apareceria só nos momentos e lugares
certos. Se pelo menos eu entendesse o tempo…

D3 – É perigoso?

D – Pra quem?

D2 – (rápida) Às vezes eu penso que dava pra me virar nas equações se eu agisse de uma
forma que eu não conheço. E eu quero ter recursos para viver tudo, claro, é isso que
importa. Tudo que se relativiza demais se desfaz, enfraquece. Alguém certamente
discordaria.

D3 – E discutiria tanto.

D4 - Até diluir a questão.

(‘E’ dorme. A cabeça pesa, ela perde o equilíbrio na cadeira e acorda. As Ds estão

indignadas)

D – Não acredito.

D4 – Você dormiu?!

D3 – Como eu devo me sentir...?

E – Desculpe... foram uns remédios que eu tomei.. Provavelmente...//

D3 – Eu estou aqui me expondo...

E – Ah. Eu estava ouvindo...//

D2 – Estava nada...//

D2 – Você dormiu!

E – Olha, sinto muito. Caí no sono. Posso compensar esse tempo.

D3 – Não estou acreditando....


D2 – É muito descaso.

E – Acontece, não tem a ver com você…

D4 – Mas tem que ser na minha sessão?//

D3 – Tem?//

D4 – É comigo o problema.//

D3 – Eu sei que é.//

D4 – Admite.

D2 – Você não presta atenção em mim.//

D3 – Acha tudo o que eu falo desinteressante.//

D4 – Acha a minha vida um saco.//

D3 – Um tédio.//

D2 – Um fiasco.//

D – Ficaria mais contente se eu me matasse...

E – Que isso?!

D – Contente não sei, mas pelo menos você compreenderia melhor...//

D3 – Com certeza...

D4 – Se eu me matasse...

D – Você acharia que faz mais sentido.//

D3 – Com certeza...

D2 – Alguém como eu...

D – “Meu deus! Por que ainda tenta!? Qualquer um já teria desistido!”//

D3 – Com certeza...

E – Não acho nada disso, você está se vitimizando.

D – Uma vez te peguei revirando os olhos.//

D3 – Na minha cara!//
D – Revirando os olhos!

E – (revirando os olhos) Mania de perseguição...

Ds – Eu?

D2 – (descrente) Mania de perseguição... até parece.

D3 – (preocupada) Só o que falta…

D2 – (preocupada) Já tenho problemas o suficiente…

D3 – (com medo) Será?

D4 – Você está falando isso só pra me confundir.

D2 – Ou é sério?

D – Eu tenho mania de perseguição?

E – Não. Não tem. Me expressei mal. Quis dizer que você está exagerando. Às vezes pode
ficar excessiva.

D – Excessiva?//

D2 - O que isso quer dizer?

D – Então, eu não sou agradável o suficiente?

D2 – Eu poderia ser uma pessoa melhor...

D3 e D4 – Claro.

D4 – Mas talvez não seja essa a minha prioridade...

D2 – Você me trata como se eu fosse uma louca.

D3 – (acusando) Você me subestima!

E – Pelo contrário. Eu levo a sério o que você fala. Te trato como uma pessoa sã.

D3 – (acusando) Você me superestima!

(As Ds têm um ataque de raiva)

Ds – Argh! (batem os pés)

(falam quase que simultaneamente):


D2 – Você está me testando! //

D – Isso é sadismo. //

D3 – Me recuso a passar por isso!//

(‘E’ tenta falar algumas vezes, mas é cortada pelas Ds que falam ininterruptamente) D4 –
Vou embora! //

D3 – Não quero mais saber!//

D4 – Eu me dou alta!//

D3 – Isso!//

D2 – Pronto.//

D – Estou ótima.//

D2 – Curada.//

D3 – Com medo.//

D4 – Com medo coisa nenhuma!//

D – Vou pensar que me acho super corajosa. Está resolvido!//

D2 – É o que eu acho!//

D – Equilibrada//

D4 – Me torno uma pessoa melhor.//

D – Não piso mais aqui. //

D3 – Que estivesse minimamente acordada.//

(Tentam sair. Cada uma vai numa direção diferente formando um retângulo. Voltam ao
centro e repetem a mesma ação quatro vezes. Murmuram as palavras abaixo repetidas
vezes).

– Nunca mais.

(Conseguem sair juntas para a mesma direção. D2, D3 e D4 saem de cena. D sai em seguida
telefonando do seu celular.)

D – (para si) Não estou nada bem...


CADEIRAS

E sentada na cadeira da analista (à direita), virada em direção a quatro cadeiras vazias (à


esquerda).

Passam 40 segundos e entra o ladrão que desfaz calmamente a cena, levando as cadeiras e
E para fora. O ladrão sai.

LIXO

Fica apenas a lixeira. O celular (de A) toca de dentro da lixeira.

FIM

::

Esta peça fez parte da minha monografia de final de curso da graduação em Teoria do
teatro - UNIRIO, 2008 - acompanhada de um texto teórico e laboratórios práticos, com a
orientação de Flora Sussekind.

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