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“Essa história se passa em tempos imemoriais, quando este mundo ainda era

jovem. O pouco que sabemos deste período, conhecido como Era dos Hérois, encontra-
se em velhos pergaminhos escritos em idiomas há muito esquecidos, em tapeçarias
finamente bordadas e nos monumentos que resistem, contra a marcha do tempo, até os
dias de hoje.
As Sete Grandes Cidades-Estado resplandeciam em sua antiga glória, com
muralhas de ouro que se erguiam aos céus e campos de flores que se estendiam a se
perder a vista. Havia conflitos, claro, porém eles eram resolvidos apenas entre os
exércitos e seus heróicos generais. Em suas vilas, o povo cultivava campos férteis e
adorava os deuses primordiais em uma relação de respeito e reverência às forças da
natureza.
E então, em meio à noite negra, eles vieram. Exilados dos domínios para além
das geleiras do Topo do Mundo, os nortenhos marcharam em direção à estas terras em
busca de um novo lar para seu bárbaro estilo de vida, com suas máquinas de guerra
construídas com feitiçaria, vestidos em ferro frio e abençoados por seus próprios deuses.
E durante os Nove Anos da Conquista, não havia homem, mulher, velho ou
criança nestas vastas terras que não repetisse a mesma oração em suas camas antes de
dormir: ‘Que os deuses nos protejam da fúria dos homens do norte’.
Uma a uma, as cidades deste continente, que hoje chamamos de Drackar, caíram
sob a impiedosa marcha do exército liderado pelo general Ysgramor. Os guerreiros
ancestrais que aqui viviam atiravam flechas com brilhantes pontas de cobre contra as
hordas nortenhas que sequer arranhavam seus escudos de ferro negro e seus elmos de
bronze, adornados com glifos de proteção, eram esmagados por seus martelos de
batalha. Os camponeses chegavam a dizer que Karradum, o xamã que acompanhava as
tropas nortenhas, havia amaldiçoado aquelas terras com uma doença que queimava os
pulmões, fazendo com que os habitantes das vilas cuspissem sangue até a morte.
Ao fim do nono ano desde sua chegada, Ysgramor foi coroado imperador de
Drackar e, com mão de ferro, unificou as Sete Cidades em um império. Sentado em seu
trono em Wintergate, ele conferiu à seis de seus filhos a posse de cada um dos domínios
restantes para que, em seu nome, guardassem aquelas terras. Seu filho mais velho,
Dulmahin, permaneceu com o pai em Wintergate, cujo trono ele deveria herdar ao fim
do reinado de seu pai.
Mas o poder absoluto, nas mãos de um tirano, representa a maldade absoluta
sobre o povo. Os tributos pagos pelos camponeses subiam a cada ano e as revoltas eram
esmagadas com ferro e fogo pela Guarda Imperial. Qualquer um que ousasse levantar
sua voz contra os desmandos de Ysgramor tinha apenas a forca como destino.
O terreno para uma conspiração estava adubado e preparado para que uma
revolta fosse semeada e, mesmo nas mentes da prole do tirano, havia uma e apenas uma
convicção: Ysgramor precisava ser derrubado!
Reunidos em Wintergate, os sete filhos do imperador o capturaram durante a
noite. Dizem que nenhum deles teve a coragem de levar a cabo o assassinato do sangue
de seu sangue. Outras histórias, no entanto, dizem que Karradum havia abençoado o
imperador para que não pudesse ser ferido de morte. Portanto, trancaram Ysgramor em
um sarcófago de ferro e o enviaram para onde jamais poderia ser encontrado. Karradum
jamais foi localizado para responder por seus crimes e suspeita-se que buscou refúgio na
terra natal dos nortenhos, onde passou o resto de sua miserável vida.
Dulmahin, o primogênito, assumiu o trono de seu pai em Wintergate, com o
compromisso de conceder autonomia aos demais reinos dali em diante e manter a paz
perpétua no império.
Todas as estátuas do tirano deposto foram derrubadas, suas pinturas foram
queimadas em praças públicas e até mesmo os estandartes originais do império, trazidos
com seu exército do norte, foram trocados e esquecidos. Hoje, tudo que resta do
Imperador Ysgramor é seu nome em velhos livros de história e, confinado nas
profundezas da sala do tesouro imperial, seu elmo de batalha.
A família imperial guarda este único item em sua coleção mais privada como
uma lembrança perene do caminho que leva um governante à tirania e qual é seu
destino. Há, no entanto, quem diga que as tentativas de destruir o Elmo de Ysgramor
fracassaram miseravelmente.
A história do “Imperador Dragão”, como foi chamado durante os anos da
conquista, correu todo o mundo e, até os dias de hoje, é contada como uma lenda ao
redor de fogueiras para assustar crianças e adultos mais crédulos. Em Nimrod, do outro
lado do mar, no continente de Aiko, as Velhas Anciãs profetizaram:

‘Em seu túmulo escaldante


Em um caixão frio
Traído por seu sangue
O destruidor de mundos aguarda
Ai de nós! Ele está vindo!
Com ferro e fogo!
Escondam-se! Escondam-se!
Escondam-se, para que ele não lhe encontre!
Um rugido nas profundezas
Olhos escarlates na escuridão
Ai de nós
Ele pode nos ver...’

Mas isso tudo, é claro, não passa de uma lenda.”


Trecho retirado do primeiro tomo da obra “História
do Império”, escrita pelo Alto Septão Malach, no
ano de 1137 da Era dos Homens.

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