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ESTUDO COMPARATIVO DA CONSTITUIÇÃO DE 1988 COM AS BASES

CONSTITUCIONAIS BRASll.EIRAS*

Cornélio Octávio Pinheiro Pimenta**

1. Introdução,· 2. Dos princfpios fundomentais; 3. Dos direitos


e garantias fundomentais: 4. Da organização do Estado; 5. Da
organização dos Poderes: 6. Da defesa do Estado e das insti-
tuições democr6ticas,· 7. Da tributação e do orçamento; 8. Da
ordem econ8mica e financeira: 9. Da ordem social: 10. Das
disposições constitucionais gerais e trtl1l.SMrias: 11. Con-
clusões finais.

1. Introdução

O nosso objetivo neste estudo, ao compararmos as Constituições do Brasil entre


si e, em especial, a promulgada em 5.10.88 com as anteriores é procurar identifi-
car as principais alterações de conteódo que foram ocorrendo nos textos constitu-
cionais ao longo da História do Brasil, buscando extrair conclusões acerca de
quais teriam sido as principais inovações, relativamente ao sistema de Governo,
aos direitos e garantias, ao relacionamento e a distribuição de poderes entre a
União, os estados e os municípios e entre os Poderes Executivo, Legislativo e Ju-
diciário, à ordem econômica e financeira e à ordem social, à educação, cultura,
comunicação social, ciência e tecnologia, ao meio ambiente, à defesa do Estado,
da sociedade civil e das instituições democráticas, às emendas constitucionais e às
disposições gerais e transitórias.
O trabalho compara não apenas os textos originais mas incorpora, em sua análi-
se, todas as emendas constitucionais que foram surgindo desde a Constituição do
Império, de 25.3.1824. O presente estudo permitirá também acompanhar-se desde
a Independência do Brasil e, através da análise dos textos constitucionais, grande
parte de nossa evolução política, social, econômica, educacional e cultural pelo
menos no que tange aos seus principais aspectos.
Esperamos que o presente trabalbo possa ser ótil a todos que se interessam por
temas constitucionais.

2. Dos princlpios fundamentais

A mais recente Constituição brasileira, resultante de uma Assembléia Nacional


Constituinte e promulgada ~m 5.10.88 inicia com o TCtulo I denominado Dos
princípios fundamentais.
Já a Constituição imediatamente anterior, de 17.10.69, inicia com o Título I de-
nominado Da organização nacional e o divide em oito capítulos relativos a Dispo-
sições preliminares, da União, dos estados e municípios, do Distrito Federal e dos
territórios, do sistema tributário, do Poder Legislativo, do Poder Executivo e do
Poder Judiciário.

• O presente estudo, pela sua cxteoslio, iJ1l sendo publicado pela RCP em sucessivos ndmcros. O autor pre-
tmde, ao final doa trabalhos, editA-lo sob a forma de livro a fim de poder oferecer diwlgaçlo maia ampla.
··Pesquisador no InstilUto de DiIeito Pdblico e Ci&ncia Polftica da }<'undaçIo Ge1Ulio Vargas.

R. C. poL, Rio de Janeiro, 32(3)67-93, maio/juL 1989


Ao deslocar para os Títulos m e N, a que denominou respectivamente Da or-
ganização do Estado e Da organização dos Poderes, todos os dispositivos referen-
tes aos três Poderes, à União, estados, municípios, Distrito Federal e territórios e,
ao incluir no Título 11 os direitos e garantias fundamentais, a Constituição atual,
claramente, inverteu a ordem tradicional, constante de todas as Constituições bra-
sileiras desde a de 1824 até a de 1969, que era a de iniciar as Cartas Magnas
dispondo-se sobre a Organização Federal (ou sobre o Império do Brasil, na de
1824, ou sobre a Organização Nacional, na de 1937 e na de 1969). É interessante
verificar-se que, embora considerada, à época, a mais democnttica de todas as
Constituições brasileiras, a de 18.9.46 nem sequer procurou separar do Cap(tuIo I,
que trata das Disposições Preliminares, os dispositivos relativos à União cuja
competência é logo estabelecida a partir do 3rt. 52. Nesta exacerbação do Poder
Executivo e dentro dele do Governo Federal, segue a Constituição de 1946 a
mesma filosofia centralizadora e de pouca consideração aos princípios federativos
constantes das Constituições de 1934 e 1937.
Neste aspecto, a Constituição de 1969, apesar de ter surgido na vigência do re-
gime militar iniciado em 1924 e de ter inclusive restabelecido a denominação de
Organização Nacional ao Título I, como coI1&tava na Carta Ditatorial de 1937,
dispôs melhor ao separar do Capítulo I, que trata das Disposições Preliminares, a
cOmpetência da União, dos estados e municípios e do Distrito Federal e dos ter-
ritórios, que preferiu tratar nos Capítulos 11, li e IV respectivamente.
A nova Constituição, de 1988, pela primeira vez no Brasil coloca à frente dos
dispositivos relativos à União, aos estados e municípios bem como à frente dos
Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, os referentes aos direitos do cidadão.
Já no 3rt. 12 do Título I declara que a República Federativa constitui-se em Es-
tado Democrático de Direito e tem como fundamentos a soberania, a cidadania, a
dignidade da pessoa humana, os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa e
o pluralismo político. E logo após a enumeração dos princípios fundamentais no
Título I, dá início, no Título 11, aos direitos e garantias fundamentais. E, antes de
tratar da organização do Estado, no Título m, ainda aborda o direito à nacionali-
dade (Capítulo li), os direitos políticos (Capítulo N) e os partidos (Capítulo V).
Nota-se, pois, a nítida preocupação com a garantia da pessoa, o que se entende
como reação a 21 anos de regime autoritário, com a conseqüente tutela do cidadão
pelo Estado sob o domínio dos militares.
É interessante verificar-se que em determinados períodos da história brasileira o
art. 12 das Constituições reflete as preocupações então dominantes. Logo após a
Independência do Brasil, a Constituição de 1824, em seu art. 12 , faz questão de
enunciar que o Império era uma associação política de todos os cidadãos brasilei-
ros e que eles formavam uma Nação ulivre e independente que não admite com
qualquer outra laço algum de união ou federação que se oponha a sua lnde-
pendlncia (grifo nosso).
É flagrante a preocupação com Portugal, do qual acabava de se libertar...
A Constituição do Estado Novo, de 1937, em seu art. 12 , enfatiza que o poder
político ditatorial seria exercido em nome do povo e uno interesse do seu bem-es-
tar, da sua honra, da sua independ~ncia e da sua prosperidade".
Nesta a preocupação era cooptar o apoio popular para o golpe de Estado.
A Constituição vigente tem um Preâmbulo que se pode considerar em contraste
com o da Constituição de 1967 (mantido pela Emenda Constitucional de 1969)
que apenas diz: .00 Congresso Nacional, invocando a proteção de Deus, decreta e
promulga a seguinte Constituição da República Federativa do Brasil."

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ReaImente, o Preâmbulo da Carta de 1988 explicita os objetivos supremos a
que visou a Assembléia Nacional Constituinte, ou seja, instituir um Estado de~
crático que assegure à Nação "o exercício dos direitos sociais e individuais, a li-
~, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça" e
"comprometida, na ordem interna e internacional com a solução pacífica das con-
trovérsias". Embora bem IIÍais curto, na verdade de uma só frase, o Preâmbulo da
Constituição de 1934 também buscava organizar um regime democrático que asse-
gurasse a liberdade e o bem-estar (a que acrescenta as palavras social e econômi-
co) além da justiça e da unidade da Nação. O Preâmbulo da Carta de 1937, como
necessitava justificar o golpe de Estado, é longo e fala em grave perturbação de or-
dem, extremação de conflitos ideológicos, iminência de guerra civil, infiltração
comunista, decomposição das instituições civis e políticas e ao final, promete as-
segurar ao povo "as condições necessárias à sua segurança, ao seu bem-estar e à
sua prosperidade".
A Constituição de 1946 tem um Preâmbulo curto e dispõe que os representantes
do povo brasileiro se reuniriam, sob a proteção de Deus, em Assembléia Consti-
tuinte para organizar um regime democrático.
O J>reâmbulo da Constituição de 1891 é quase igual ao de 1946. Ela e a de
1937 são, porém, as ónicas Cartas Magnas a não invocarem a "graça de Deus"
(1946, 1967, 1969, 1988).
O Preâmbulo da Carta do Império, de 1824, mostra claramente que a Consti-
tuição era fruto e graça da vontade do Imperador Dom Pedro I. É ele quem jura "o
sobredito Projecto para o observarmos e fazermos observar como Constituição,
que d'ora em diante fica sendo deste Império".
Entre os direitos e garantias fundamentais, expostos no Capítulo m, que trata
da nacionalidade, a nova Constituição de 1988, em seu art. 13, declara que a lín-
gua portuguesa é o idioma oficial do Brasil. Nenhuma das Constituições brasilei-
ras até então se preocupou com tal declaração. As de 1946 e 1967 se limitaram a
dispor na parte relativa à educação, que o ensino primário somente seria .mnistra-
do na língua nacional sem porém explicitar qual seria esta língua. A Constituição
vigente, além de explicitá-la no art. 13, em seu art. 231 reconhece, aos índios,
suas línguas e no § 22 do art. 210, asseçura-lhes a utilização delas no ensino fun-
damental. A nova Constituição, em seu art. 4 2 , contém inovações em relação às
demais Constituições que o Brasil já teve.
Assim, a Constituição de 1969, no que tange às relações internacionais, limita-
va-se a dispor sobre os conflitos que deverão ser resolvidos por negociação direta,
arbitragem e outros meios pacíficos e a vedar a guerra de conquista (art. 7 2 ).
A do Império colocou nas mãos do imperador poder para "fazer tratados de
aliança ofensiva e defensiva" (art. 102, item vm) e a de 1937 nas do ditador
competência para declarar guerra, independentemente de autorização do Poder
Legislativo "em caso de invasão ou agressão estrangeira" (art. 74, alCnea g além
de dispor que "na vigência do estado de guerra deixará de vigorar a Constituição
nas partes indicadas pelo presidente da República" (art. 171). Ambas refletem a
insegurança, à época, da Nação. D. Pedro I, ao se rebelar contra Portugal e decla-
rar a Independência do Brasil, um ano e meio antes da Constituição de 1824, bem
como Getdlio Vargas, ao inserir no Prêambulo da Carta de 1937 que a Nação, fa-
ce à "extremação de conflitos ideológicos", estaria colocada "sob a funesta
iminência da guerra civil" nada mais fazem do que refletir, nas Cartas de 1824 e
de 1937, o quadro de insegurança que ocorria, então, no País.
Já as Constituições de 1891, 1934 e 1946 dispõem, à respeito das relações in-

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ternacionais, de forma parecida com a de 1969 ou seja, defesa do arbitramento
como forma de dirimir conflitos e vedação à guerra de conquista.
Mas, afinal, quais as inovações da Constituição de 1988 nesta área? Até agora
a política exterior do Brasil era traçada com forte dose de liberdade pelo presiden-
te da República, coadjuvado pelo Ministério das Relações Exteriores. Ao explici-
tar os princípios que deverão reger nossas relações internacionais, a atual Carta
Magna traça limites precisos à ação do presidente da República, a quem compete
celebrar tratados, convenções e atos internacionais, mas sujeitos a referendo do
Congresso Nacional (item VIII, art. 84), ao qual, com exclusividade, compete "re-
solver defmitivamente sobre tratados, acordos ou atos internacionais que acarre-
tem encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio nacional (item I, art. 49).
Ambos os Poderes terão, porém, que obedecer aO disposto no art. 4 2 da Consti-
tuição de 1988, que estabelece os seguintes princípios:
I. independência nacional;
ll. prevalência dos direitos humanos;
m. autodeterminação dos povos;
IV. não-intervenção;
V. igualdade entre os estados;
VI. defesa da paz;
Vll. solução pacífica dos conflitos;
VllI. repúdio ao terrorismo e ao racismo;
IX. cooperação entre os povos para o progresso da humanidade;
X. concessão de asilo pol!tico.
E, finli1:mente, no parágrafo único do art. 4 2 , determina que o Brasil bus9ue a
integração econômica, política, social e cultural dos povos da América Latina, vi-
sando à formação de uma comunidade latino-americana de Nações.
São preocupações do mundo contemporâneo que os Constituintes souberam
bem captar. Temas como direitos humanos, racismo, terrorismo e corrida arma-
mentista estão presentes no cenário internacional e a Carta vigente não quis deixar
a defesa do primeiro e a condenação dos demais ao talante exclusivo da eventual
ocupante da presidência da República.

3. Dos direitos e garantias fundamentais


3.1 Dos direitos e deveres individuais e coletivos
Vejamos, agora, como as Constituições brasileiras dispuseram a respeito dos di-
reitos e garantias fundamentais.
A do Império, de 1824, trata do assunto em seu Título VIII e sob a denomi-
nação de "garantias dos direitos civis e políticos dos cidadãos brasileiros".
É interessante observar que - a exemplo do item m do art. 15 da nova Consti-
tuição de 1988, a qual determina que "ninguém será submetido a tortura nem a
tratamento desumano ou degradante" - o item XIX do art. 179 da Carta de 1824
determinava a abolição dos "açoites, da tortura, da marca de ferro quente e de to-
das as demais penas cruéis".
As disposições da Constituição em vigor denotam reação às torturas ocorridas
durante a ditadura militar implantada em 1964 e as da Carta do Império teriam
buscado banir práticas cruéis do tempo da Colônia (na verdade somente a partir de
13.5.1888, com a abolição da escràvatura DO Brasil, tais práticas deixaram de ser
aplicadas aos negros escravos). As demais Constituições silenciam a respeito das
torturas, sendo as de 1937, 1967 e 1969 por razões óbvias.

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A Carta de 1988 ainda considera, de uma forma inovadora e nos termos do item
XLIll do art. 15, crimes inafiançáveis e insusceptíveis de graça ou anistia, além da
prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e
os definidos como crimes hediondos. Outro ponto que merece comentários está
contido na redação dos itens XLll e XLIV do mencionado art. 15 da nova Consti-
tuição. São absolutamente inovadoras as disposições que consideram crime ina-
fiançável e imprescritível não só a prática do racismo como a ação de grupos ar-
mados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático.
Vejamos, agora, como as diversas Constituições trataram a questão dos privilé-
gios. Na carta do Império não se cogitava de contê-los e a dnica disposição a res-
peito está contida no item V do art. 179, o qual reza que .oninguém pode ser per-
seguido por motivo de Religião, uma vez que respeite a do Estado e não ofenda a
moral póblica". Tal dispositivo, porém, não garantia a quem professasse religião
não oficial tratamento igual aos adeptos da religião do Império, a Católica Apost6-
lica Romana conforme dispunha o art. 52.
A Constituiçlo de 1891~ 80 romper com a ordem lDOIWquica, amplia 08 direitos
e garantias individuais e ataca de frente os "privilégios de nascimento, desconhc>
ce foros de nobreza e extingue as ordens bonorfiicas existentes e todas as suas
prerrogativas e regalias, bem como os tftúlos nobilWquicos e de conselho" (§ 2 2
do art. 72)•. Prossegue 80 criar o Estado laico quando dispõe, no § 7!:! do art. 72,
que ""nenhum culto ou Igreja gozará de subvençio oficial nem terá reJaçio de de-
pendência ou aliança com o governo da UniJo ou dos estados".
A Carta de 1934 é rica em direitos e garantias e no seu art. 113, alínea I, p~
clama que todos são iguais perante a lei e que não haverá privilégios nem dis-
tinções por motivo de nascimento, sexo, raça, profissões próprias ou dos pais,
classe social, riqueza, crenças religiosas ou idéias políticas.
Avança em sua alínea 4 ao dispor que .opor motivo de convicções filosóficas,
políticas ou religiosas, ninguém será privado de qualquer dos seus direitos".
Nota-se a vontade dos constituintes em combater os vícios da Repóblica Velha
que, apesar de haver extinguido os foros de nobreza e os títulos nobiliárquicos,
encerrando, no País, o ciclo dos barões, viscondes, condes, marqueses e duques e
dos príncipes e imperadores, não conseguiu eliminar, de fato, os privilégios de
sangue e as ordens honoríficas então traduzidas nas poderosas famílias tradicio-
nais (aristocracia republicana) e nos coronéis da Guarda Nacional.
Na verdade, nenhuma Constituição consegue eliminar por inteiro privilégios e
distinções pois o wishful thinldng das normas ideais costuma esbarrar na dura rea-
lidade da vida e especialmente conflita com um dos alicerces da ciência política, o
poder com todas as desigualdades que ele acarreta.
De qualquer forma, a Constituição de 1934 foi bastante liberal para sua época e
buscou combater os privilégios mais gritantes.
Não evitou, porém, o acirramento dos ânimos e a radicalização política que
culminou com o golpe de Estado de 1937 e a implantação do Estado Novo, s0-
mente abreviado no tempo pelo fim da Segunda Grande Guerra com a vitória das
forças democráticas.
A Carta Ditatorial de 10.11.37, embora mantivesse um capítulo intitulado Dos
direitos e garantias individuais, fez completo silêncio acerca dos privilégios e dis-
tinções por motivos de nascimento, sexo, raça, etc. Acresce dizer que embora ela,
em seu art. 122, assegurasse aos brasileiros "o direito à liberdade, à segurança in-
dividual e à propriedade" tais direitos, pela própria natureza do re~, somente
existiam para os que dele não discordassem ou discordando se calassem.

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A Constituição de 1946, por estranho que possa parecer, não reincorporou ao
texto constitucional as disposições liberais do art. 113, alCnea 1. da Carta de 1934.
Fica, assiln, a impressão de que os constituintes de 1946 optaram pelo silêncio a
respeito dos privilégios e distinções mantendo, neste aspecto, a Constituição ante-
rior a de 1937.
~ bem verdade que a alínea 4. do art. 113 da Carta de 1934 foi reproduzida
com pequenas alterações de forma, no § 8 2 do art: 141 da Constituição de 1946,
que trata das convicções religiosas, filosóficas e políticas e que o § 52 do mesmo
artigo não tolera "preconceitos de raça ou de classe". Ficaram, porém, sem con-
denação pela Lei Magna de 1946, os privilégios e distinções por motivo de nasci-
mento, sexo, profissões e riqueza que constavam expressamente da Constituição
de 1934.
Qual teria sido a causa dessa atitude?
Difícil penetrar no íntimo dos constituintes de 1946, mas não se deve perder de
vista que a maioria do Congresso Nacional representava a aristocracia rural e vá-
rios eram oriundos da alta burocracia administrativa do Governo Vargas e alguns
tinham sido interventores nos estados e municípios. Pragmaticamente rejeitaram
em 1946 a Carta Ditatorial de 1937, mas alguni resquício desta permaneceu espe-
cialmente quando atendia aos seus interesses.
A Constituição de 1967, bem como a de 1969, voltam a condenar os privilégios
decorrentes de sexo e trabalho constantes da Carta de 1934 mas, e significativa-
mente, não incluíram, como nesta, a condenação aos oriundos do nascimento ou
riqueza.
A Carta vigente preferiu, ao invés de enumerar, combater distinções "de qual-
quer natureza" (art. 52 - caput) e, indo além, determina que a lei punirá qualquer
discriminação (art. 52, XLI).
Prosseguindo no exame do Capítulo I do Título 11 da Constituição vigente, que
trata Dos direitos e deveres individuais e coletivos, verificamos o caráter absolu-
tamente inovador do item XXII, art. 52. Realmente, conceder ao cidadão comum o
direito de acesso às referências e informações registradas por entidades públicas a
seu respeito e dando-lhe o poder de exigir a retificação dos dados, mediante o uso
do instrumento jurídico cognominado habeas data para assegurar tais direitos, não
encontra paralelo em nenhuma das constituições brasileiras, possivelmente porque
o recente desenvolvimento da tecnologia da informática permitiu ao Poder Público
annazenar considerável quantidade de dados relativos aos cidadãos.
Relativamente a crimes e penas, vejamos o que dispõem as Constituições a res-
peito. Quanto à perda de bens ela só surge a partir da Carta de 1946, que remetia
à lei sua regulamentação e, visando evitar interpretação restritiva, dispunha que se
estendia ao "emprego em entidade autárquica".
A Constituição de 1967 manteve a regulamentação através de lei, mas trata
apenas do enriquecimento ilícito no exercício de função pública.
A Emenda Constitucional n 2 1, de 1969, preferiu abandonar a expressão
"função pública" e falar do enriquecimento ilícito no exercício "do cargo, função
ou emprego na Administração Pública, direta ou indireta". Em nova redação ao §
11 do art. 153, a Emenda Constitucional n 2 11, de 1978, retoma a Carta de 1967
que, no § 11 do art. 150, e como já vimos, fala apenas em enriquecimento illcito
"no exercício de função pública".
Verifica-se que tanto a Constituição de 1946 como a Emenda Constitucional de
1969 objetivaram impedir que o exercício de função pública fosse considerado
restrito à administração pública direta. A de 1946 estendia seus efeitos apenas às

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autarquias porque, na época, pmticamente se desconheciam as sociedades de
economia mista, as emplesas públicas e as fundaç<ks instituídas pelo Poder Pú--
blico. A de 1969 foi bem mais ampla ao falar em cargo, função ou emprego e na
administração pública direta ou indireta. Estranhamente, em 1978, a Emenda
Constitucional n2 11, ao falar apenas em "função pública", deu margem aos cor-
ruptos de tentarem escapar à perda de bens quando no exercício de empregos na
administração pública indireta e através de artimanhas jurídicas construídas a par-
tir da tese de que função pública seria apenas aquela exercida em cargos da admi-
nistração pública direta.
Analisadas as Cartas Constitucionais anteriores, vejamos agora o que dispõe a
respeito o art. 52, item XLVI, alCnea b, combinado com o art. 37, § 4 2, da Carta
em- vigor. Fala em perda de bens de um modo geral no Capítulo I, Título n, que
trata dos direitos e deveres individuais e coletivos e sem descer a detalhes (remete
para a lei) e, no âmbito da administração pública - Capítulo VII, Título m - prevê
a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao Erário dos servidores que prati-
carem atos de improbidade administrativa, além da suspensão de seus direitos
polCticos e da perda da função pública.
Embora a nova Constituição fale apenas em "perda da função pública", no § 4 2
do art. 37; a exegese do caput do artigo permite entender-se que a função pública
é exercida não SÓ na administração pública direta mas também na indireta e na
fundacional. Esta interpretação deriva do fato de que a administração pública dire-
ta, indireta e fundacional obedecerá, nos termos do art. 37, aos princCpios de lega-
lidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e a todos os dispositivos constan-
tes dos incisos, que vão de I a XXI e a todos os parágrafos, que vão do 12 ao 6 2 •
E a perda da função pública encontra-se, como já visto acima, no § 4 2 •
Prosseguindo no exame do Capítulo I, do Título n, da nova Constituição ano-
tamos o surgimento, à nível constitucional e pela primeira vez no Brasil, da "pres-
tação social alternativa" à prisão (art. 52, item XLVI, alCnea d). Relativamente aos
direitos dos presos, antes da Carta atual, apenas a Constituição do Império, de
1824, no item XXI do art. 179, preocupara-se com o preso ao dispor que "as ca-
deias serão seguras, limpas e bem arejadas, havendo diversas casas p;ml separação
dQS réus, conf0!JDe suas circunstâncias e natureza dos seus crimes".
A Carta vigente amplia substancialmente tais direitos ao assegurar aos presos o
respeito à sua integridade física e moral, a imediata comunicação ao juiz e à famí-
lia da prisão de qualquer pessoa e a obrigatoriedade de informar ao preso de seus
direitos. Além disto, o preso tem direito à identificação dos responsáveis por sua
prisão ou por seu interrogatório policial (art. 52, itens XLIX, LXII, LXill e
LXIV).
Relativamente ao item XLVII do referido art. 52, é curioso observar-se que a
Carta de 1988 ressuscitou a condenação aos "trabalhos forçados", que só aparece
na Constituição de -1891, ao abolir a pena degalés (art. 72, § 22 ). O fez prova-
velmente em decorrência dos recentes noticiários, nos meios de comunicação, da
existência, ainda nos dias atuais, de trabalhadores rurais em regime de semi-escra-
vidão em alguns pontos do interior do País de difícil acesso.
Ainda com referência ao mesmo item condena as penas de morte (salvo em
tempo de guerra), de caráter perpétuo, de banimento e as cruéis. A Carta de 1824
silencia a respeito delas. A de 1891 condena a pena de morte (exceto em tempo de
guerra) e a de banimento judicial, mas nada fala acerca da prisão perpétua. A de
1934 é igual a Carta atual, exceto quanto aos trabalhos forçados, em relação aos
quais silencia (art. 113, item 29).

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A de 1937, qe triste mem6ria, só assegura que "não haverá penas corp6reas
perpétuas" (art. 122, item 13).
A pena de morte, em relação à qual a Constituição de 1824 silencia, mas que as
de 1891 e 1934 condenam, ressalvadas as disposições da legislação militar em
tempo de guerra, ressurge na de 1937 atingindo quem atentasse "contra a unidade
de Nação", a "mudança da ordem política ou social" ou buscasse "subverter por
meios violentos a ordem política e social" (art. 122, item 13, alíneas b, c, d, e).
São dispositivos que refletem a insegurança do Estado Novo que se instalara apre-
ensivo com a "infiltração comunista" e a "extremação dos conflitos ideológicos"
que colocariam a Nação "sob a funesta iminência da guerra civil", conforme
consta do Preâmbulo da Carta Ditatorial.
E na alCnea f do citado item 13 do art. 122 surge, pela primeira e única vez a
nível constitucional, a pensa de morte em caso de "homicCdio cometido por moti-
vo fútil e com extremos de perversidade".
A Carta de 1946 e a de 1967 repetem as disposições da Constituição de 1934,
mas a Emenda Constitucional n!? 1 de 1969, em seu art. 153, § 11, além da tradi-
cional ressalva da pena de morte nos casos de guerra externa, aceita-a também nos
de guerra "psicológica adversa ou revolucionária ou subversiva nos termos que a
lei determinar".
Mais uma vez, como em 1937 e no recesso do Congresso Nacional, o Poder
Executivo, agora nas mãos de uma Junta Militar, sente-se ameaçado por forças
subversivas e, com outras palavras, praticamente ressuscita o famigerado item 13
do art. 122 da Carta Polaca (com exceção da alínea f que punia com pena de morte
o homicídio por motivo fútil e com extremos de perversidade). Na verdade am-
plia-o pois, além da pena de morte, como na de 1937, a Emenda Constitucional n!?
1 de 1969 admite também a prisão perpétua, o banimento e o confisco nos casos já
acima explicitados (acabou revogado pela nova redação dada pela Emenda Consti-
tucional n!? 11, de 1978).
Examinemos, agora, como evoluiu o instituto da prisão civil em nossas Consti-
tuições.
A Carta do Império, embora a ela não se refira diretamente, contém, no item X
do art. 179, dispositivos que podem ser considerados o embrião do instituto. Diz
ela que pode ocorrer prisão sem culpa formada nos casos "que não são puramente
criminais e em que a lei determina todavia, a prisão de alguma pessoa por deso-
bedecer aos mandados da justiça, ou não cumprir alguma obrigação dentro de de-
terminado prazo".
Já a Constituição da Primeira República nada contém a respeito da prisão civil
a qual, no entanto, surge - apra ser condenada em todas as suas formas - através
do item 30 do art. 113 da Carta de 1934, que assim dispõe:
"Não haverá prisão por dívidas, multas ou custas."
A Carta de 1937 silencia a respeito do tema e a de 1946 é a primeira Consti-
tuição a empregar a expressão "prisão civil" (art. 141, § 32) e a abrir exceções:
nos casos do depositário infiel e do inadimplemento de obrigação alimentar.
As Constituições de 1967 e de 1969 (art. 150, §17 e art. 153, também § 17) re-
petem os dispositivos da Carta de 1946, bem como a atual, de 1988.
Relativamente aos direitos do consumidor, eles só aparecem, à nível constituci-
nal, na Carta Magna recentemente promulgada. O item xxxn do art. 5!? determi-
na que o Estado promova a defesa do consumidor, o art. 150, §5!?, esclarece que a
lei determinará medidas para que os consumidores sejam esclarecidos acerca dos
impostos que incidam sobre mercadorias e serviços e o art. 48, do Ato das Dispo-

74 R.C.P.3/89
sições Constitueionais Transitórias, dispõe que o Congresso Nacional, dentro de
120 dias da promulgação da Constituição, elaborará código de defesa do cosumi-
dor.
Nenhuma das constituições anteriores se preocupou com o tema e certamente a
crescente industrialização do País e o ingresso na era da chamada sociedade de
consumo passou a exigir proteção especial à imensa massa cónsumidora, nem
sempre respeitada na quantidade, qualidade, composição e preço dos produtos.
Vejamos, agora, a evolução da ação popular nas Constituições brasileiras. Até
a vigência da Carta de 1988 só se conhecia o direito de qualquer cidadão de pr0-
por "ação popular que vise a anular atos lesivos ao patrimônio de entidades pábli-
cas" (§ 31 do art. 153 da Emenda Constitucional n 2 1 de 1969 e § 31 do art. 150
da Carta de 1967). Ou, no dizer da Constituição de 1946, de "pleitear a anulação
ou a declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio da União, dos estados,
dos municípios, das entidades autárquicas e das sociedades de economia mista".
Quanto às demais Constituições anteriores, somente a de 1934 dispunha sobre o
assunto em seu art. 113, item 38, e da mesma forma que a de 1946. Não incluiu,
potém, as autarquias e sociedades de economia mista por serem, à época, pratica-
mente inexistentes, especialmente as dltimas.
A Constituição vigente amplia o instituto ao dispor que a ação popular visa a
anular não só os atos lesivos ao patrimônio páblico mas também à moralidade ad-
ministrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural (art. 52, LXXIII).
Na verdade, e conforme lição do Ministro do Supremo Tribunal Federal, Seabra
F~des, -em _me&Hedonda organizada em 25.11.88 pelo Instituto de Di-
reito Páblico e Ciência Política da Fundação Getulio Vargas, a Constituição de
5.10.88 revolucionou, 00 art. 52, inciso LXXllI, a ação popular, já que agora ela é
capaz de anular qualquer ato lesivo à moralidade administrativa e abre, assim, o
exame do mérito dos atos administrativos ao Poder Judiciário até então limitado,
constitucionalmente, apenas à apreciação de seus aspectos legais. Segundo o mi-
nistro revelou, nenhuma outra Constituição, em toda a Terra, concede ao Poder
Judiciário poderes para apreciação do mérito - embora restrita à moralidade do
ato.
Outra inovação da Carta vigente ocorre ao admitir ação privada nos crimes de
ação páblica "se esta não for intentada no prazo legal" (art. 52, item LIX).
Prosseguindo no exame do Capítulo I do Título 11 da Carta vigente, veriflCa-
mos que os itens LXIX e LXX do art. 52, embora tratando de um instrumento
jurídico - o mandado de segurança - incorporado aos textos constitucionais desde
a Carta de 1934 (art. 113, item 33) (exceto a de 1937) traz duas novidades: ele
passa a ser admissível também contra atos de agente de pessoa jurídica no exercí-
cio de atribuições do Poder Público e pode ser impetrado por partido político ou
por organização siJidical, entidade de classe ou associação legalmente constituída
e em funcionamento há pelo meoos um ano em defesa do interesse de seus mem-
bros ou associados. Surge, assim, no direito constitucional brasileiro, a figura do
mandado de segurança coletivo.
O direito de resposta tem sido assegurado pelas Constituições, sem exceção,
desde a de 1934. Swpreendentemente, a Carta de 1937 foi mais longe ao assegu-
rar "a todo cidadão o direito de fazer inserir gratuitamente, nos jornais que o in-
famarem ou injuriarem, resposta, defesa ou retificação" (art. 122, item 15, alínea
c).
Já a atual Constituição, em seu art. 52, item V, assegura aos ofendidos o direito

Constituição de 1988 75
de resposta proporcional ao agravo sofrido, sem prejuízo da indenização por dano
material, moral ou à imagem.
A instituição do Júri remonta à Carta do Império que, no art. 151, a ele se refe-
re indiretamente, ao dispor que o Poder judicial "será composto de juízes e jura-
dos" e, no art. 152, determina que "os jurados pronunciarão sobre o facto e os
juízes aplicarão a lei".
Ele foi mantido nas Constituições de 1891 e de 1934, mas não figura na de
1937, voltando a surgir na de 1946 com as seguintes novidades:
- o número de seus membros será sempre ímpar;
- garantia de sigilo nas votações;
- plenitude da defesa do réu;'
- soberania de seus veredictos;
- competência obrigatória nos crimes dolosos contra a vida.
A Carta de 1967, em seu art. 150, § 18, mantém a "instituição e a soberania do
jdri que terá competência no julgamento dos crimes dolosos contra a vida".
É curioso observar-se que a Emenda Constitucional n2 1, de 1969, promulgada
pela Junta Militar então no Poder, houve por bem retirar a expressão soberania
constante da Carta de 1967 embora esta tenha sido promulgadapelo Congresso
Nacional já na vigência do regime militar iniciado em 31.3.64. (art. 153, § 18).
O art. 52, item xxxvm, da atual Carta retoma a redação do art. 141, §28 da
Constituição de 1946, mas não se preocupa em assegurar seja sempre ímpar o n'l1-
mero de seus membros o que permitirá a lei dar ao juiz o voto de Minerva.
O § 32 do art. 153 da Carta de 1969 dispõe que "será concedida assistência ju-
diciária aos necessitados, na forma da lei". Terá sido sempre assim? O foi nas
Cartas de 1967 e de 1946. A de 1937 silencia a respeito e a de 1934, além de ter
sido a pioneira, foi a mais expUcita ao dispor, no art. 113, item 32, que a União e
os estados assegurariam inclusive a isenção de emolumentos, custas, taxas e selos.
E a vigente Constituição, o que dispõe a respeito?
No item LXXIV do art. 52 assegura a assistência jurídica integral e gratuita aos
que comprovarem insuficiência de recursos e se preocupa com a situação funcio-
nal dos defensores pt1blicos, ao assegurar que seus vencimentos sejam iguais aos
cargos de atribuições semelhantes existentes em qualquer um dos três poderes (art.
39, § 12 ).
E quanto à extradição de brasileiros e estrangeiros, a Carta em vigor, no art. 52,
itens U e LU, mantém a tradição, oriunda da Carta de 1934, de não conceder a ex-
tradição do estrangeiro por crime poUtico ou de opinião nem, em caso algum, a de
brasileiro. As Constituições de 1946, 1967 e 1969 dispõem da mesma forma mas a
de 1937 silencia quanto a extradição de estrangeiros apesar de manter a proibição
de se extraditar brasileiros.
E quanto a estes estende a atual Constituição a proibição de extradição ao natu-
ralizado, exceto se'a naturalização for posterior a crime comum que porventura te-
nha cometido, ou a comprovado envolvimento em tráfico ilCcito de entorpecentes e
drogas arms (art. 52, item U). O direito de asilo, inexistente nos textos constitu-
cionais anteriores, surge no inciso X do art. 4 2 da Carta de 1988. As Constituições
de 1934 e de 1946 (as demais silenciam a respeito do assunto) concediam à União
- no dizer da primeira - ou ao Governo Federal - como preferiu a segunda - o
poder de expulsar do território nacioóal o estrangeiro "perigoso à ordem pública
ou nocivo aos interesses do paCs" (art. 113, item 15, Carta de 1934) ou "nocivo a
ordem pública salvo se o seu cÔnjuge for brasileiro e se tiver filho brasileiro de-
pendente da economia paterna" (art. 143, Carta de 1946).

76 R.C.P.3/89
A Carta vigeilte limita-se a dar à União a competência privativa de legislar s0-
bre a emigração e imigração, entrada, extradição e expulsão de estrangeiros (art.
22, item XV), exceto quanto à extradição, onde impõe certas normas, como já vi-
mos.
Dentre os direitos previstos no capítulo em exame surge, pela primeira vez à
nível constitucional, o de não ser submetido a identificação criminal - salvo nas
bipóteses legais - o cidadão que houver sido, por alguma razão, identificado ape-
n~ civilmente (art. 52, item LVIII).
Relativamente ao disposto no item XUV do art. 52, medida inovadora e salutar
ao considerar crime inafiançável e imprescritível a ação de grupos armados, civis
ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado democrático, cabe-nos,
porém, registrar que, por não se tratar de um direito ou dever, melhor ficaria se
contido no Título V, que trata da defesa do Estado e das instituições democráticas.
Nos itens LXXVI e LXXvn do art. 52 a Carta de 1988 concede, respectiva-
mente, gratuidade - para os reconhecidamente pobres - relativamente ao registro
civil de nascimento e à certidão de óbito e, para todos, as ações de habeas-corpus
e habeas-data e, na forma de lei, aos atos necessários ao exercício da cidadania.
-São dispositivos inéditos na vida constitucional brasileira e visam a impedir que a
carência de recursos fmaoceiros invalide, para os mais pobres, a plena função dos
direitos e garantias assegurados pela nova ordem constitucional.
A respeito da aplicabilid3de dos direitos e garantias individuais e coletivos é
conveniente ressaltar que a Assembléia Nacional Constituinte, ao elaborar a vi-
gente Constituição, não se limitou a enumerá-los.
No art. 52, § 12 , e de forma inovadora, esclarece que "as normas definidoras
dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata".
E, visando assegurar a aplicabilidade das normas relativas aos direitos e liber-
dades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e
à cidadania, cria, no item LXXI do mesmo artigo, o mandado de injunção que será
concedido sempre que a falta daquelas normas tomar inviável o exercício de tais
direitos e prerrogativas.
Em nenhuma das Constituições anteriores à de 1988 encontramos dispositivos
semelhantes, razão pela qual muitos dos direitos e garantias individuais e coleti-
vos, embora delas constassem, não tinham efetiva aplicabilidade. Trata-se, assim,
de um considerável avanço social embora, como veremos ao tratar do Poder Judi-
ciário, a simples declaração de inconstitucionalidade, por omissão de medida para
tomar efetiva uma norma constitucional, não assegure, automaticamente, a viabili-
zação do direito ou garantia em questão.

3.2 Dos Direitos Sociais

Somente a partir da Constituição de 16.7.34 surgem, no Brasil, artigos que, a


nível constitucional, versam sobre os direitos sociais. Aparecem dentro do Título
IV, que trata da ordem econômica e social. Já a Carta de 1937, embora continuas-
se contendo quase todos os dispositivos da Constituição de 1934 sobre os direitos
sociais, preferiu dar ao Capítulo a denominação Da ordem econÔmica As Consti-
tuições de 1946, 1967 e 1969 trataram do tema em um Capítulo ou Título intitula":
do Da ordem econÔmica e social.
A Carta de 1988 dispõe, porém, de uma forma original. Além de separar a or-
dem econÔmica da ordem social, ainda dispõe sobre os direitos sociais no Capítulo
n do Título n, que trata dos direitos e garantias fundamentais.

Constituição de 1988 77
Diga-se, de PilSsagem, que a Carta de 1937 é a única que, no art. 139, conside-
ra a greve e o lock-out recursos anti-sociais nocivos ao trabalho e ao capital e im-
compatíveis com os superiores interesses da produção nacional.
A respeito dos direitos sociais observa-se que na Constituição vigente, art. 6 2 ,
eles são def"midos como a educação, a saúde, o trabalho, o lazer, a segurança, a
previdência social, a proteção à maternidade e à infância e a assistência aos de-
samparados. Apesar disto o Capítulo fi do Título fi só trata dos direitos dos traba-
lhadores remetendo os demais para o Título VIII a que denomina Da ordem social
e no qual cuida, também, de outros assuntos como da ciência e tecnologia, da co-
municação social e do meio ambiente, os quais mereciam um título à parte.
As Constituições de 1824 e 1891 não cuidam dos direitos dos trabalhadores, os
quais s6 surgiriam na de 1934, que lhes dedica os arts. 120 a 123, inclusive. Neles
trata da plÜralidade e da autonomia sindical, da legislação trabalhista, do salário
núnimo e da Justiça do Trabalho.
A proteção não se estendia, porém, ao trabalhador rural uma vez que "o traba-
lho agrícola será objeto de regulamentação especial", conforme dispunha § 4 2 do
art. 121.
A Carta de 1937 dedica-lhes os arts. 136 a 139, inclusive. Embora dispondo de
forma parecida com a de 1934, o caráter ditatorial do regime transparece não só na
proibição de greves, como já falamos, como na tutela dos sindicatos os quais, pelo
art. 138, só poderiam exercer a representação legal de seus pares se "regularmente
reconhecidos pelo Estado". Eram atrelados ao Ministério do Trabalho, surgindo a
conhecida figura do "pelego".
A Constituição de 1946, em termos gerais, dispõe de forma semelhante à Carta
de 1934, ampliando moderadamente alguns direitos dos trabalhadores. Assim, o
salário do trabalho noturno seria obrigatoriamente superior ao do diurno e surge a
participação obrigatória e direta do trabalhador nos lucros. A respeito desta última
disposição verifica-se, assim, que ela existe, em textos constitucionais, por mais
de 40 anos. As Constituições de 1967 e 1969 mantiveram o dispositivo e até o
ampliaram ao dispor que, além da participação nos lucros, os trabalhadores excep-
cionalmente teriam· participação na gestão, conforme art. 158, inciso V e art. 165,
inciso V, respectivamente. A Constituição de 1988, no inciso XI do art. 72, repete
os dispositivos das Cartas de 1967 e 1969.
Apesar de existência tão longa, a participação nos lucros, no Brasil, é rara.
Certamente por tais razões a Carta atual, no art. 52, inciso LXXI, combinado
com o art. 103. § 2 2 , cuidou da aplicabilidade dos direitos e garantias constantes
do texto constitucional. O artigo dispõe que, em tais casos, o Supremo Tribunal
Federal recomendaria ao Poder competente a adoção de providências necessárias
que dessem efetiva aplicabilidade ao dispositivo constitucional.
A Carta de 1946 ainda dispõe que o trabalho noturno é vedado a menores de 18
anos (a de 1934 só vedava a menores de 16 anos). Fala na higiene e segurança do
trabalho e na estabilidade "na empresa ou na exploração rural" e na "assistência
aos desempregados" (art. 157).
Quanto aos sindicatos, ao invés de exigir que sejam "regularmente reconheci-
dos pelo Estado", como na Carta de 1937, prefere, no art. 159, considerá-los li-
vres, porém "sendo reguladas por lei a forma de sua constituição, a sua represen-
tação legal nas convenções coletivas de trabalho e o exercício de funções delega-
das pelo poder público".
A Constituição de 1967, de uma forma geral, mantém os dispositivos da Carta
de 1946.

78 R.C.P.3/89
A principal alteração refere-se à estabilidade a qual, embora 'mantida, pode ser
substituída, opcionalmente, pelo "fundo de garantia equivalente" (art. 158, inciso
XIII). Além disto, reduziu de 14 para 12 anos a proibição de trabalho a menores e,
ao invés de falar em "assistência aos desempregados", como no inciso XV do art.
157 da Constituição de 1946, já prevê o "seguro--desemprego" no inciso XVI do
art. 158.
O salário-família surge no texto conStitucional com a Carta de 1967. A proi-
bição de diferença de salário para um mesmo trabalho por motivo de idade, sexo,
nacionalidade ou estado civil, constante das Constituições de 1934 e 1946, é alte-
rado. Não mais se fala em "mesmo trabalho" mas genericamente em proibição de
diferença de salários e também de critério de admissões por motivo de sexo, cor e
estado civil (art. 158, inciso 111). No § 2 2 do art. 159 dispõe-se que o voto nas
eleições sindicais é obrigatório.
Relativamente à Constituição de 1969, em vigor, ela repete os dispositivos da
Carta de 1967 e a única alteração digna de registro encontra-se na Emenda Consti-
tucional n2 12, de 1978, a qual assegura aos deficientes a melhoria de sua con-
dição social e econômica, mediante normas que enumera. (por incrível que pareça
a referida Emenda não determinou o acréscimo de algum artigo ou parágrafo à
Constituição vigente, pelo que seu artigo dnico fica solto, à margem do texto
constitucional.)
Achamo-nos, agora, em condições de examinar o Capítulo n do Título n, da
Carta de 1988 buscando, especialmente, verificar quais as principais alterações em
relação à Constituição anterior, de 1969, e apontar suas inovações mais relevan-
tes.
A proibição de diferença de salários e de critério de admissões por motivo de
sexo, cor e estado civil, constante da Carta de 1969, se amplia. A proibição alcan-
çará, também, na redação do art. 72, inciso XXX e XXI, a diferença de exercício e
de funções e o motivo da idade e alcança, no tocante a salário e critérios' de ad-
missão, o portador de deficiência.
No que tange à proibição de diferentes critérios de admissão por motivo de ida-
de trata-se de dispositivo inédito e que, a nosso ver, impedirá que pessoas c0mpe-
tentes possam ser discriminadas e impedidas de obter um emprego para o qual se
acham perfeitamente preparadas, simplesmente porque já ultrapassaram determi-
nada idade-limite que, arbitrariamente, tenha sido fixada por algum empregador.
Se o cargo exige aptidão física não se poderá pressupor que o idoso não a possua
impedindo-o de prestar o teste. Se não conseguir ser aprovado no teste, então dei-
xará de ser admitido por inaptidão física para o exercício do cargo, mas não por
ter ultrapassado determinada idade.
O inciso XIII do mesmo artigo concede aos trabalhadores uma antiga e perma-
nente reivindicação: a redução da jornada de trabalho. Não obtiveram as 40 horas
pleiteadas, mas de 48 horas desceram para 44 horas semanais "facultada a com-
pensação de horários e a redução da jornada, mediante acordo ou convenção cole-
tiva de trabalho".
O inciso XN do mesmo art. 7 2 ; também inédito à nível constitucional, e que
foi intensamente combatido pelo setor industrial durante as votações da Assem-
bléia Nacional Constituinte, reduz a jornada do trabalho realizado em turnos inin-
terruptos de revezamento, "salvo negociação coletiva" , para seis horas diárias.
O inciso XXXIll não aceita o trabalho de menores com mais de 12 e menos de
14 anos, como permite o inciso X do art. 165 da Carta de 1969. Ele retoma à
proibição de trabalho a menores de 14 anos que constava da Constituição de 1946.

Constitui.çiJo de 1988 79
o inciso XVm mantém a licença à gestante sem prejuízo do emprego e do salá-
rio, mas vai além ao fixá-la em 120 dias.
O inciso XIX cria a licença-paternidade unos termos fixados em lei", dispositi-
vo até então inexistente no direito brasileiro.
O inciso XXV também é inédito em texto constitucional. Ele garante assistên-
cia gratuita em creches e pré-escolas aos filhos e dependentes de empregados des-
de o nascimento e até seis anos de idade.
Pela nova Constituição cai a tradição da fixação das percentagens de emprega-
dos brasileiros nos serviços públicos dados em concessão e nos estabelecimentos
de determinados ramos comerciais e industriais. Ela silencia a respeito do assunto.
Iremos, agora, examinar a questão da estabilidade no empnigo. A primeira Car-
ta a cuidar do tema foi a de 1934 a qual, no art. 121, § 12 , alCnea g, dispunha que
o trabalhador dispensado sem justa causa seria indenizado. Como seria esta inde-
nização ficava para a lei. A de 1937, no art. 137, alíneaJ, fala em indenização
··proporcional aos anos de serviço". A de 1946, no item xn do art. 157, institui a
estabilidade e indenização ao trabalhador despedido "nos casos e nas condições
que a lei estatuir". As de 1967 e 1969 conservaram a estabilidade concedida pela
de 1946 ··com indenização ao trabalhador despedido" mas criaram uma alternati-
va: a opção pelo fundo de garantia equivalente.
E a Carta vigente, como dispõe?
No inciso I do art. 7 2 considera direito do trabalhador a relação de emprego
protegida contra despedida arbitrária ou sem justa causa, nos termos de lei com-
plementar que preverá indenização compensativa, dentre outros direitos.
O fundo de garantia do tempo de serviço não é mais opção como nas Consti-
tuições de 1967 e 1969. Ele figura no inciso m do mesmo artigo como direito à
parte.
Quando examinarmos, do final deste trabalho, o Ato das disposições constitu-
cionais transit6rias, veremos que neste ponto como em vários outros da atual
Constituição, os constituintes houveram por bem adotar normas provis6rias até
que sejam promulgadas as leis, complementares em alguns casos e ordinárias em
outros, que dêem solução deÍmitiva às medidas constantes das disposições consti-
tucionais permanentes.
Dispositivo constitucionalmente inédito encontra-se no inciso XXIX do art. 7 2 •
Até a nova Constituição, os direitos trabalhistas prescreviam em dois anos e o
assunto era tratado na Consolidação das Leis do Trabalho. Agora a prescrição é
de cinco anos para o trabalhador urbano até o limite de dois anos após a extinção
do contrato.
E a alCnea b do citado artigo dispõe que a ação para o trabalhador rural obter
créditos resultantes das relações de trabalho tem o prazo prescricional de "até dois
anos após a extinção do contrato" o que dá a entender, com relação a ele, a não
ocorrência de prescrição relativamente aos direitos surgidos durante a vigência
contratual.
Alertados para a omissão, os constituintes, no art. 233 do Título IX que trata
das disposições constitucionais gerais, esclarecem que "o empregador rural com-
provará, de cinco em cinco anos, perante a Justiça do Trabalho, o cumprimento
das suas obrigações trabalhistas para com o empregado rural, na presença deste e
de seu representante sindical". S6 assim o empregador estaria isento de qualquer
ônus decorrente daquelas obrigações no período respectivo, o que equivale dizer a
não ocorrência de qualquer prazo prescricional caso tal comprovação não seja efe-
tuada e homologada pela Justiça Trabalhista.

80 R.C.P.3/89
Relativamente aos trabalhadores rurais, somente a Constituição de 16.7.34, no
§ 4 2 do art. 121 a eles se referia, ao dispor que "o trabalho agrícola será objeto de
regulamentàção especial em que se atenderá, quanto possível, ao disposto neste
artigo".
As demais Constituições silenciaram a respeito, com exceção da Carta vigente a
qual, pelo acima visto, expressamente estende toda a legislação trabalhista aos
mesmos.
Continuando o exame dos direitos dos trabalhadores à nível constitucional, ob-
servamos que a recém-promulgada Carta de 1988 é rica em inovação no tópico em
questão.
No inciso XVI surge, igualmente pela primeira vez nas Constituições brasilei-
ras, o direito à remuneração do serviço extraordinário (conhecido por "horas-ex-
tras") superior, no mínimo, em 50% à do normal. Antes da Carta vigente o assun-
to era tratado a nível de Consolidação das Leis do Trabalho, que remunerava a ho-
ra<xtra em 20% acima da hora normal de trabalho.
Outra inovação surge no inciso xvn do art. 7 2 em exame. Com a nova Consti-
tuição, de 1988, os trabalhadores terão, agora, direito ao gozo de férias com pelo
menos um terço a mais do que o salário normal.
É interessante comentar que tanto no caso das horas-extras como no das férias,
os constituintes acrescentaram as expressões "no mínimo" e "pelo menos", nos
respectivos incisos, o que, de futuro, permitirá, através de lei ordinária, aumentar
o valor das mesmas.
Prosseguindo no exame dos direitos dos trabalhadores verificamos que o avi-
so-prévio sai da área da CLT para adquirir status constitucional. E vem alterado.
Já não é, em todos os casos de dispensa sem justa causa, apenas de 30 dias.
O inciso XXI, art. 7 2 , esclarece que ele é, no mínimo de 30 dias, mas propor-
cional ao tempo de serviço, nos termos da lei.
Relativamente à categoria dos trabalhadores domésticos, constitui novidade sua
inclusão em texto constitucional. O parágrafo único do art. 7 2 assegura-lhes salá-
rio mínimo, irredutibilidade salarial, 13 2 salário, repouso semanal remunerado,
gozo de férias acrescidas de um terço do salário, licença à gestante, licença-pater-
nidade, aviso-prévio proporcional ao tempo de serviço e aposentadoria.
Relativamente à questão dos sindicatos, podemos estudar sua evolução em nos-
so direito constitucional desde a Carta do Império de 1824. O inciso XXV de seu
art. 179 aboliu as corporações de ofícios, seus juízes, escrivães e mestres. Era o
lento caminhar para a liberdade do trabalho. A Constituição de 1934, art. 120, re-
conhece os sindicatos e as associações profissionais e lhes assegura a pluralidade
e a completa autonomia. E, na alínea j do § 12 do art. 121, reconhece as con-
venções coletivas de trabalho.
O golpe de Estado de 1937 traz, consigo, a Carta de 10.11.37 a qual, em seu
art. 138, cria restrições à liberdade e autonomia sindical ao dispor que somente o
sindicato regularmente reconhecido pelo Estado tem o direito de representação le-
gal, de defender-lhes os direitos perante o Estado e de estipular contratos coleti-
vos de trabalho, além de outras restrições. Oficializa, assim, a figura do dirigente
sindical atrelado aos interesses do Estado Novo, conhecido por "pelego".
A Constituição de 1946, no art. 159, suaviza as restrições mas, ao dispor que a
associação profissional ou sindical será regulada por lei, dá margem a certa de-
pendência em relação ao Estado.
As Cartas de 1967 e 1969 praticamente repetem os dispositivos da de 1946 em
seus arts. 159 e 166, respectivamente. A novidade corre por conta da obrigatorie-

Constituição de 1988 81
dade do voto nas eleições sindicais certamente face ao receio-pr6prio de regim.es
ditatoriais - de que uma "minoria atuante" dominasse a vida sindical.
A nova Constituição, de 05.10.88, dedica aos sindicatos o art. 8 9 •
Por ele a lei já não poderá exigir autorização do Estado para a fundação de sin-
dicatos e veda ao Poder Público a interferência e a intervenção na organização
sindical (inciso I).
Embora livre a fundação de sindicatos, veda-se a criação de mais de uma orga-
nização sindical, em qualquer grau, representativa de categoria profissional ou
econÔmica, na mesma base territorial que não será inferior à área de um município
(inciso 11).
As novidades, nesta área, em relação às Constituições anteriores, são muitas.
Agora ao sindicato cabe não s6 a defesa da categoria mas também dos direitos in-
dividuais de seus associados, em questões judiciais ou administrativas (inciso ill).
No inciso IV, dá-se à Assembléia Geral o poder de fixar contribuições, des-
contá-las em folha "para custeio do sistema confederativo da representação sindi-
cal respectiva e independentemente da contribuição prevista em lei".
Desaparece a obrigatoriedade de voto, além de que "mnguém será obrigado a
filiar-se ou a manter-se filiado a sindicato" (inciso V).
Merece. registro, entre outras disposições, a de vedar a dispensa do empregado
sindicalizado a partir do registro da candidatura a cargo de direção ou represen-
tação sindical. Eleito (ainda que suplente) não poderá também ser dispensado a
não ser ap6s um ano do término de seu mandato - salvo se cometer falta grave nos
termos da lei (inciso VIll).
E, fmalmente, as disposições do art. 8 9 aplicam-se aos sindicatos rurais e as
colônias de pescadores "atendidas as condições que a lei estabelecer" .
E, relativamente ao direito de greve, quando surgiu no nosso direito constitu-
cional e como tem evoluído? É o que analisaremos.
Antes do direito de greve surgir em textos constitucionais aparece, ao inverso,
sua condenação. O art. 139 da Carta ditatorial de 1937 diz que ""a greve e o loc/c,.
out são declarados recursos anti-sociais, nocivos ao trabalho e ao capItal e lOCOm-
patíveis com os superiores interesses da produção nacional".
Em um regime autoritário, com o Congresso fechado e ainda sem a tradição da
luta dos trabalhadores por melhores salários e condições de trabalho, conseqüên-
cia da ainda baixa industrialização brasileira, a condenação era possível.
É preciso atentar para o fato de que a Constituição de 1934 é omissa em relação
ao direito de greve mas já reconhecia, em seu art. 120, os sindicatos e as asso-
ciações profissionais além de assegurar a pluralidade sindical e a completa auto-
nomia dos sindicatos, como, aliás, já vimos anteriormente.
Com a queda da ditadura Vargas e a promulgação da Constituição democrática
de 18.10.46, é reconhecido, no art. 158, pela primeira vez em texto constitucional
no Brasil, o direito de greve "cujo exercício a lei regulará".
Com o golpe militar de 1964 o direito de greve se mantém mas, de acordo com
o inciso XXI do art. 158, combinado com o § 7 9 do art. 157 da Constituição de
24.l.67 "não será permitida a greve nos serviços pdblicos e atividades essenciais
definidas em lei".
A Carta de 1969 mantém, em seus arts. 162 e 165, inciso XX (ou XXI com a
Emenda Constitucional n 9 18, de 1981), o disposto na Lei Maior de 1967.
A Constituição vigente, de 1988, em seu art. 9 9 , assegura o direito de greve
mas dispõe, em seu § 19 , que a lei defInirá os serviços ou atividades essenciais e
disporá sobre o atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade. E, no §

82 R.C.P.3/89
22 , esclarece que os abusos cometidos sujeitam os responsáveis às penas da lei.
Ela é menos restritiva que as Constituições de 1967 e 1969, as quais proibiam a
greve nos serviços públicos mas mantém, em defesa da comunidade, a restrição ao
referido direito no que tange às atividades essenciais e coíbe os abusos porventura
cometidos.
Além da participação dos trabalhadores, em caráter excepcional, na gestão das
empresas e confonne for definido em lei, a atual Constituição avança, em relação
às cartas de 1967 e 1969, ao dispor, nos arts. 10 e 11, que são asseguradas não só
a participação dos trabalhadores nos colegiados dos 6rgãos públicos em que seus
interesses profissionais ou previdenciários sejam objeto de discussão e deliberação
como, nas empresas de mais de 200 empregados, a eleição' de um representante
deles com a finalidade exclusiva de promover-lhes o entendimento direto com os
empregadores.
Ao encerrarmos o exame dos direitos e deveres individuais, coletivos e sociais
dos Capítulos I e 11 da Constituição vigente, os quais foram inclusive comparados
com seus congêneres das Cartas anteriores, cumpre-nos registrar que, embora a
Lei Maior de 1988 inove ao falar de deveres, são muito poucos os explicitados
nos referidos capítulos.
Assim, por exemplo, fala-se no dever dos que querem reunir-se de o fazerem
pacificamente, sem armas, e de previamente avisarem à autoridade competente
(inciso XVI do art. 7 2 ). Poder-se-ia ainda apontar indiretamente como dever o de
não abusar do direito de greve (art. 92, § 2 2 ).
Cremos que é muito pouco. Como fator educativo teria sido útil que a nova
Constituição, ao lado dos direitos que tão bem soube explicitar e garantir, houves-
se dedicado mais atenção aos deveres dos cidadãos.

3.3 Do Direito à Nacionalidade

A Constituição de 1988 dedica o Capítulo f i do Título 11 às questões relativas


à nacionalidade.
Apresenta algumas inovações quando comparado com os das constituições an-
teriores. As principais são as seguintes:
a) A Carta Imperial, de 1824, em seu art. 6 2 , inciso 11, considerava cidadão
brasileiro os filhos de pai brasileiro e "os ilegítimos de mãe brasileira", lJascidos
em país estrangeiro, desde que viessem a estabelecer domicOio no Império. A
Constituição Republicana, de 1891, repete o artigo supracitado, apenas trocando a
palavra Império por República.
Verifica-se que ambas não reconheciam como brasileiros os filhos ilegítimos de
pai brasileiro com mãe estrangeira, nascidos fora do Brasil.
A Lei Maior de 1934 eliminou a referência a filhos ilegítimos, mas só reconhe-
ce os filhos de brasileiro ou brasileira, nascidos em país estrangeiro, se, ao atingi-
rem a maioridade, optarem pela nacionalidade brasileira.
A Carta Magna de 1937 repete os dispositivos da de 1934, mas a de 1946 colo-
ca uma restrição: atingida a maioridade s6 conservarão a nacionalidade brasileira
se por ela optarem "dentro em quatro anos" (art. 129, inciso 11).
A Constituição de 1967 tem, comparada com a de 1946, uma pequena diferen-
ça: os nascidos no estrangeiro, de pai ou mãe brasileiros, s6 serão .considerados
brasileiros se vierem a residir no Brasil antes de atingirem a maioridade. Mantém a
necessidade de opção dentro de quatro anos após a maioridade (art. 140, inciso I,

Constituição de 1988 83
alínea c). A Etnenda Constitucional n2 1, de 17.10.69, que deu nova redação à
Carta de 1967, em seu art. 145, inciso I, alínea c, mantém o dispositivo.
Já a atual Constituição, de 1988, se mantém a necessidade de virem a residir no
Brasil antes da maioridade, permite, por outro lado, que uma vez alcançada esta,
possam optar em qualquer tempo pela nacionalidade brasileira;
b) Relativamente aos brasileiros naturalizados, a Carta Imperial divide-os em
duas categorias: a dos portugueses que já residiam no Brasil na época da procla-
mação da Independência e que poderiam optar pela nacionalidade brasileira até
"tacitamente pela continuação de sua residência" (art. 6 2 , inciso IV); e a dos de-
mais estrangeiros naturalizados "qualquer que seja a sua Religião". Quanto à car-
ta de naturalização, a lei determinará as "qualidades precisas" para se obtê-las
(art. 6 2 , inciso V).
A Constituição Republicana, de 1891, tratava do assunto nos incisos 4 2 ,52 e 6 2
do art. 69.
Os estrangeiros que em 15.11.1889 achavam-se no Brasil foram considerados
brasileiros desde que "não declararem, dentro em seis meses depois de entrar em
vigor a Constituição, o ânimo de conservar a nacionalidade de origem".
Os estrangeiros casados com brasileiras ou que tiverem filhos brasileiros e des-
de que PQssuam bens im6veis no Brasil e nele residam serão considerados ci-
dadãos brasileiros "salvo se manifestarem a intenção de não mudar de nacionali-
dade."
As outras formas de naturalização foram, pelo inciso 6 2 , deixadas para a lei or-
dinária.
A Carta Magna de 1934 não cuida dos brasileiros naturalizados, remetendo to-
das as hip6teses para a lei (art. 106, alínea d).
A Constituição de 1937 caminha no mesmo sentido da sua congênere anterior
(art. 115, alínea d).
Já a Carta democrática de 1946, em seu art. 129, inciso IV, embora também
remeta o assunto para a lei ordinária, abre uma exceção para os portugueses de-
terminando que deles, para serem reconhecidos brasileiros, se exigiria apenas a re-
sidência no Brasil por um ano inintenupto, idoneidade moral e sanidade física.
As Constituições de 1967 e 1969, em seus respectivos arts. 140, inciso lI, alí-
nea b, itens 1, 2 e 3 e art. 145, inciso lI, alínea b, itens I, II e m, introduzem ino-
vação a respeito dos brasileiros naturalizados.
A partir delas introduziram-se no texto constitucional disposições relativas aos
estrangeiros que pretendam naturalizar-se brasileiros. Os que hajam sido admitidos
no Brasil durante os primeiros cinco anos de vida e nele se radicaram deverão ma-
nifestar-se pela nacionalidade brasileira até dois anos ap6s atingirem a maioridade.
Os que, embora admitidos no Brasil com mais de cinco anos de vida, ingressarem
antes da maioridade e fIzerem curso superior em estabelecimento nacional, p0-
derão adquirir a nacionalidade brasileira, desde que a requeiram até um ano depois
da formatura. Quanto aos portugueses, repete os dispositivos já analisados e cons-
tantes da Constituição de 1946.
Anote-se, porém, que a Carta de 1969, em suas disposições gerais, art. 199, foi
a primeira a conceder aos portugueses os mesmos direitos dos brasileiros natos
(exceto quanto a certos cargos privativos destes) e desde que haja reciprocidade
em favor de brasileiros.
Vejamos, agora, o que a respeito dos brasileiros naturalizados dispõe a Carta
Magna vigente.
Quanto aos portugueses segue a mesma linha das Constituições de 1946, 1967

84 R.C.P.3/89
e 1969 (art. 12, inciso 11, alfuea a). Mantém, inclusive, a reciprocidade de que fala
a Carta de 1969.
Relativamente aos demais estrangeiros, de qualquer nacionalidade e residentes
no Brasil, a nova Constituição. também inova ao conceder-lhes a nacionalidade
brasileira, desde que a requeiram, com a única condição de aqui residirem há mais
de 30 anos ininterruptos e sem condenação penal (art. 12, inciso 11, alfuea b).
E, no § 2!? do referido art. 12, impede que a lej estabeleça distinção entre brasi-
leiros natos e naturalizados, salvo quanto aos cargos privativos dos primeiros que
enumera no § 3!?
A respeito das restrições aos naturalizados quanto ao exercício de determinados
cargos, é curioso verificar que á Carta Imperial de 1824 permitia que senadores
fossem estrangeiros naturalizados, conforme exegese do art. 45, inciso I, combi-
nado com o art. 6!?, inciso V. Quanto aos deputados, nem mesmo a naturalização
exigia, ao menos no texto constitucional.
A Constituição Republicana, de 1891, já impõe restrições. Em seu art. 26, § 2!?,
exige que o deputado tenha mais de quatro anos de cidadão brasileiro e o senador
mais de seis. Abre exceção, porém, para os estrangeiros que residiam no Brasil em
15 de novembro de 1889 e optaram pela nacionalidade brasileira.
A Carta Constitucional de 1934 inicia a tradição de se reservarem determinados
cargos a brasileiros natos. O art. 24 reserva o de deputado, o § 5!? do art. 52 o de
presidente da República, o parágrafo único do art. 59, o de ministro de Estado, o
art. 74 o de ministro da Corte Suprema, o art. 80 o de juiz federal, o art. 89 o de
senador, o art. 95, § I!?, o de procurador-geral da República.
A Constituição de 1937 só se refere, relativamente aos cargos privativos de
brasileiros natos, nos arts. 51 e 52, aos membros do Conselho Federal - uma
espécie de Senado que não chegou a funcionar, assim como a Câmara de Deputa-
dos, durante todo o período ditatorial que se estendeu até 1945 -, no art. 81 ao
presidente da República, no parágrafo único do art. 88 aos ministros de Estado e,
no àrt. 98 aos ministros do Supremo Tribunal Federal e no art. 99 ao procurador-
geral da República. Verifica-se, assim, que não fez referências aos deputados e
nem aos juízes federais, como o fizera a Carta de 1934.
A Carta Magna de 1946, comparada com a de 1934, só diverge no sentido de
que não inclui os juízes federais dentre aos cargos privativos de brasileiros natos
e, em seu art. 103, inclui os ministros do Tribunal Federal de Recursos.
A Constituição de 1967, comparada com a anterior, de 1946, amplia o universo
dos cargos privativos dos brasileiros natos. Além de manter todos os constantes da
Carta de 1946, ainda acrescenta os seguintes: ministros do Superior Tribunal Mili-
tar (art. 121), ministros do Tribunal Superior do Trabalho (art. 133, § I!?, alínea
a), ministros do Tribunal de Contas da União (art. 73, § 3!?), oficiais das Forças
Armadas (§ 8!? do art. 94).
É interessante observar que a Carta de 1967, ainda promulgada pelo Congresso
Nacional, mas já sob forte influência dos militares no poder desde a deposição de
João Goulart e a eclosão do golpe de Estado de 31.3.64, ampliou moderadamente
os cargos privativos de brasileiros natos.
Já a Constituição de 1969, resultante da Emenda Constitucional n!? 1, de
17.10.69, outorgada pelos ministros da Marinha, do Exército e da Aeronáutica, em
seu art. 145, parágrafo único, amplia-os consideravelmente. Além de manter todos
os cargos constantes da Carta Constitucional de 1967, ainda acrescenta mais os
seguintes:
- ministros do Tribunal Superior Eleitoral;

Constituição de 1988 85
- governador do. Distrito Federal;
- governadores e vice-governadores de estados, de territ6rios e seus substitutos;
- embaixadores;
- diplomatas.
São indícios da influência da então dominante doutrina de segurança nacional a
olhar, desconfiada, para os brasileiros naturalizados.
A Constituição de 1988, que restabelece o Estado Democrático de Direito, no §
3 2 do art. 12 reduz substancialmente o universo dos cargos privativos de brasilei-
ros natos. Agora são apenas os seguintes:
- presidente e vice-presidente da República;
- presidente da Câmara dos Deputados:
- presidente do Senado Federal;
- ministro do Supremo Tribunal Federal;
- da carreira diplomática;
- de oficial das Forças Armadas.
A comentar a exclusão dos deputados, senadores, ministros de Estado e procu-
rador-geral da República que, desde a Carta de 1934, vêm constando de todas as
Constituições mas que, a partir da vigente, são cargos que podem ser exercidos
por brasileiros naturalizados.
Passaremos agora, antes de analisarmos os direitos e partidos políticos, a expor
a evolução constitucional dos símbolos nacionais e da perda da nacionalidade do
brasileiro que aceitasse emprego ou outras vantagens de governo estrangeiro.
A Carta Imperial, de 1824, dispunha, em seu art. 7 2 , inciso 11, que perderiam os
direitos de cidadão brasileiro os que, sem licença do imperador, aceitassem em-
prego, pensão ou condecoração de qualquer governo estrangeiro. Quanto aos sím-
bolos nacionais nada consigna.
A Constituição Republicana, de 1891, também silencia relativamente aos sím-
bolos da Nação, mas repete os dispositivos da Carta de 1824 quanto à perda da
nacionalidade, apenas suprimindo a aceitação de condecoração e, como é 6bvio,
substituindo o imperador pelo Poder Executivo Federal (art. 71, § 2 2 , alínea b).
A Carta Magna de 1934, no art. 174 de suas Disposições Gerais, foi a primeira
a considerar que os símbolos nacionais deveriam figurar no texto constitucional.
Diz, verbis: "A bandeira, o hino, o escudo e as armas nacionais devem ser usados
em todo o territ6rio do país nos termos que a lei determinar."
E, no art. 107, alínea b, prossegue na tradição constitucional oriunda da Carta
Imperial ao decretar a perda da nacionalidade do brasileiro que aceitasse pensão,
emprego ou comissão (substitui a condecoração constante do texto de 1824) sem
licença do presidente da República (substitui a expressão Poder Executivo Federal
do texto de 1891). Restringe a aceitação à pensão, emprego ou comissão remune-
rados.
A Constituição de 1937 deslocou a questão dos símbolos nacionais para o Títu-
lo 12 , que trata Da Organização Nacional, art. 2 2 , e enfatiza, bem ao seu estilo,
que são de uso "obrigat6rio" e que "não haverá outras bandeiras, hinos, escudos
e armas".
E, no art. 116, alínea b, repete as disposições oriundas da Carta Imperial, ape-
nas restringindo a perda de nacionalidade a aceitação de comissão ou emprego
remunerado, suprimindo a pensão.
A Lei Maior de 1946, no que tange aos símbolos nacionais, retoma o tema para
as Disposições Gerais, art. 195 e fala em bandeira, hino, o selo (ao invés de escu-
do da Carta de 1937) e <1,. ,- ,~

86 R.C.P.3/89
Introduz uma inovação: os símbolos nacionais são os "vigorantes na data da
promulgação desta Constituição".
Ao assim disporem, os constituintes de 1946 opuseram barreiras à aprovação de
uma lei ordinária que mudasse o hino ou alterasse a bandeira, por exemplo.
Quanto à perda de nacionalidade, no art. 130, inciso n, restabelece a pensão
constante das Cartas de 1824, 1891 e 1934 e mantém o emprego e a comissão,
mas suprime o adjetivo remunerado introduzido pela Constituição de 1934.
As Cartas Constitucionais de 1967 e 1969, a exemplo da de 1937, tratam dos
símbolos da Nação no Título I, intitulado Da organização nacional (art. 12 , § 22 ),
e só mencionam' a bandeira e o hino, prevendo, ainda, que outros poderiam ser es-
tabelecidos por lei. Repetem o dispositivo da Constituição de 1946 determinando
que a bandeira e o hino seriam os vigorantes na data da promulgação da Consti-
tuição (como a de 1946 inclui, também, o selo e as armas,verifica-se que as Cartas
de 1967 e 1969 passaram a permitir alterações neles, via lei ordinária, é até mes-
mo, por não citá-los, desconsiderá-los como símbolos nacionais).
Quanto à perda da nacionalidade, ambas as Constituições, ora em exame, nos
arts. 141 e 146, no mesmo inciso n, repetem as disposições da Carta Magna de
1946.

3.4 Dos Direitos Políticos

No que tange aos direitos polCticos iremos inicialmente comparar os dispositi-


vos da Constituição de 1988 com os constantes da Constituição anterior, de 1969,
incluídas as alterações introduzidas pelas Emendas Constitucionais de n 2 s lln8,
19/81,22/82,25/85 e 26/85.
Verificamos, assim, que a nova Constituição mantém como eleitor o analfabeto
que conquistou o direito de votar com a Emenda Constitucional n2 25/85, que su-
primiu a alínea a do § 3 2 do art. 147 da Carta de 1969 (agora, porém, em caráter
facultativo, conforme art. 14, inciso n, alínea a. Também o alistamento eleitoral e
o voto são facultativos para os maiores de 70 anos e para os maiores de 16 e roe-
nores de 18 anos, sendo que estes, pela primeira vez, conquistam o direito do vo-
to). Além disto a Carta vigente não reproduz o § 22 do art. 147 da Carta de 1969,
o qual permitia fossem eleitores apenas os militares oficiais, aspirantes a oficiais,
guardas-marinha, subtenentes ou suboficiais, sargentos ou alunos das escolas mili-
tares de ensino superior para formação de oficiais. Agora todos os militares são
alistáveis, exceto os conscritos durante o período do serviço militar obrigatório.
O art. 14, § 8 2 , da Constituição em vigor, reproduz o disposto no § 12 do art.
150 da Constituição de 1969. Não reproduz, porém, o § 22 do mesmo artigo, que
dispensa o militar de ativa, candidato a posto eletivo de filiação polCtico-partidá-
ria, o que se entende por se tratar de uma medida casuística pertinente apenas aos
tempos do Ato Institucional n 2 5, tanto que não figurava na Carta de 1967. Além
desta supressão, o novo texto constitucional amplia de cinco para 10 anos o tempo
de serviço necessário para que o militar se afaste da atividade, caso se candidate a
cargo eletivo.
Quanto às inelegibilidades, o vice-presidente da República, o vice-governador
e o vice-prefeito, pela alínea a do § 12 do art. 151 da Carta de 1969, eram consi-
derados irreelegíveis desde que, a qualquer tempo, houvessem ocupado o cargo no
período imediatamente anterior.
Agora, conforme § 52 do art. 14, s6 serão inelegíveis os vices ou quem houver
sucedido ou substituído o presidente da Reptfulica, os governadores de estado e

Constituição de 1988 R7
do Distrito Federal e os prefeitos, apenas nos seis meses anteriores ao pleito co-
mo, aliás, constava da al(nea b do § 19 do art. 151 da Carta de 1969.
Além disto, continuam sendo inelegíveis para os mesmos cargos, no período
subseqüente, o presidente da República, os governadores de estado e do Distrito
Federal e os prefeitos. Outra alteração ocorre no que tange aos ministros de Esta-
do e aos secretários de Estado. Pela Emenda Constitucional n 9 19, de 1981, incor-
porada à Emenda Constitucional n 9 1 de 1969, art. 151, § 19 , alínea c, os minis-
tros, fossem ou não membros do Poder Legislativo, tinham o prazo de seis meses
para se afastarem do cargo antes das eleições. Aos secretários de Estado foi dado
um tratamento diferente dos ministros de Estado. Enquanto eS,tes, como já vimos,
se desincompatibilizam sempre em seis meses aqueles, se forem titulares de man-
dato parlamentar e candidatos à reeleição, CT fazem também em seis meses, mas se
não o forem, terão que se afastar do cargo até nove meses antes do pleito, em
companhia do presidente, diretor e superintendente de 6rgãos da administração
pública direta ou indireta, inclusive de fundação e sociedade de economia mista.
Ocorre que a Emenda Constitucional n 9 26, de 27.11.85, deu nova redação a alí-
nea c do § 19 do art. 151 da Carta vigente. Agora, ministros e secretários de Esta-
do voltam a ter o mesmo tratamento. Se forem titulares de mandato eletivo, desin-
compatibilizam-se em seis meses e, se não o forem, o fazem em nove meses ou em
quatro meses, se candidatos a cargo municipal. O mesmo ocorre com o presiden-
te, diretor e superintendente, inclusive de fundações e sociedades de economia
mista.
Já a Carta Constitucional recém-promulgada não se preocupou com tais inele-
gibilidades, preferindo remetê-Ias à lei complementar (art. 14, § 9 9 ).
Preocupa-se, porém, com o abuso do poder econômico, ao dispor, no § 10, que
o mandato eletivo poderá ser impugnado por ação, ante a Justiça Eleitoral, instruí-
da com provas do referido abuso, corrupção ou fraude (§ 10, art. 14).
A Constituição de 1969, no § 3 9 do art. 149, cuida da perda ou suspensão dos
direitos políticos e enuncia que lei complementar disporia sobre o assunto.
A Carta vigente, porém, no art. 15, veda a cassação de direitos políticos em
reação às inúmeras cassações anteriormente ocorridas a partir do Ato Institucional
n9 1, de 9.4.64, o qual, no art. 10, concedia, aos "comandantes-em-chefe" que o
editaram, o poder de suspender os direitos políticos pelo prazo de 10 anos e de
cassar mandatos legislativos federais, estaduais e municipais, excluída a apre-
ciação judicial: O Ato Institucional n 9 5, de 13.12.68, no art. 4 9 , revigora o Ato
Institucional n 9 1 no que se relaciona com a suspensão dos direitos políticos e cas-
sação de mandatos eletivos, os quais haviam cessado com a promulgação da Cons-
tituição de 24.1.67 (com a ressalva, constante do art. 173, que aprovou e excluiu
de apreciação judicial todos os atos anteriormente praticados pelo denominado
Comando Supremo da Revolução de 31.3.64).
Como era de se esperar, a Carta de 1969, no art. 181, repetiu a ressalva da de
1967 acima mencionada.
Além disto, no art. 32, dispunha que deputados e senadores não seriam inviolá-
veis no exercício do mandato por suas opiniões, palavras e votos nos casos de
injúria, difamação ou calúnia ou nos previstos na Lei de Segurança Nacional. A
Emenda Constitucional n 9 11, de 1978, deu nova redação ao referido art. 32, reti-
rando os casos de injúria, difamação ou calúnia e substituindo a expressão nos ca-
sos "previstos na Lei de Segurança Nacional" por no caso de "crime contra a se-
gurança nacional" (que, pela posterior Emenda Constitucional n 9 22, de 1982,
passou a ser "crime co;':,:, f,~Jn:-a". Os crimes contra a segurança nacional conti-

88 R.C.P.3/89
nuaram a existir,. porém o processo dependeria da licença da respectiva Câmara e
decisão final do Supremo Tribunal Federal - art. 32, § 52. Relativamente a este
parágrafo, convém lembrar que ele foi introduzido pela Emenda Constitucional n2
11, de 1978, e por ela o processo por crimes dos parlamentares contra a segurança
nacional independeria de licença do Congresso).
A Carta de 1969, além do já exposto, dispunha em seu art. 35 que, entre outras
causas, perderia o mandato o deputado ou senador cujo procedimento fosse decla-
rado incompatível com o decoro parlamentar ou "atentatório das instituições vi-
gentes" (inciso fi), que perdesse ou tivesse suspenso os direitos políticos (inciso
N), confonne dispusesse a respeito lei complementar (§ 3 2 , art. 149) e que prati-
casse atos de infidelidade partidária (inciso V). Até simplesmente por "atitudes",
e não apenas pelo voto, se deputados ou senadores se opusessem "às diretrizes le-
gitimamente estabelecidas pelos órgãos de direção partidária ou deixassem o par-
tido sob cuja legenda houvessem sido eleitos" perderiam o mandato.
Retomando à Constituição atual, de 5.10.88, que em seu art. 15 veda as cas-
sações de direitos políticos, a novidade corre por conta do inciso V, o qual permi-
te a suspensão destes direitos por improbidade administrativa.
E o art. 16, com o objetivo de evitar os casuísmos eleitorais, tão comuns no
passado, determina que a lei modificadora do processo eleitoral só entrará em vi-
gor um ano após a sua promulgação.
Antes de encerrarmos o exame dos direitos políticos, iremos tecer alguns breves
comentários acerca das disposições contidas nas constituições anteriores à de
1969.
A Carta Imperial, no art. 26, já dispunha que "os membros de cada uma das
Câmaras são invioláveis pelas opiniões que proferirem no exercício de suas
funções" e, no art. 27, que "nenhum senador ou deputado, durante a sua depu-
tação, poderá ser preso por autoridade alguma, salvo por ordem da sua respectiva
Câmara, menos em flagrante delito de pena capital".
Quanto às eleições os "cidadãos ativos", em Assembléias Paroquiais, elegiam
os eleitores de Província e a estes cabia eleger os deputados e senadores, além dos
representantes dos Conselhos de Província (art. 90).
O art. 92 era profundamente discriminatório, apesar do inciso XVI do art. 179
determinar que ficam abolidos todos os privilégios não ligados aos cargos. Assim,
não podiam votar, entre outros, "os criados de servir, em cuja classe não entram
os guarda-livros, e primeiros caixeiros das casas de comércio, os criados da casa
hnperial, que não forem de galão branco e os administradores das fazendas rurais
e fábricas" (inciso ill). Também excluídos de votar "os que não tiverem de renda
líquida anual 100.000 réis por bens de raiz, indústria, comércio ou empregos" (in-
ciso V). E os que não obtivessem de renda líquida anual 400.000 réis não podiam
ser nomeados deputados (art. 95, inciso I) bem como os que não professassem a
religião do Estado (art. 95, inciso ill).
Fiquemos, porém, apenas nesses exemplos, sem a preocupação de exaurirmos o
assunto.
Passemos, agora, à Carta Consti.tucional de 1891. Ela, face à proclamação da
República em 1889, trouxe inovações importantes no que se refere aos direitos
políticos.
Introduziu-se o sufrágio direto na eleição dos deputados (art. 28) e dos senado-
res (art. 30).
O presidente e o vice-presidente da República são eleitos também por sufrágio
direto e pela maioria absoluta de votos (art. 47). E, de acordo com o § 2 2 do mes-

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mo artigo, se I1enhum dos votados alcançasse maioria absoluta, caberia ao Con-
gresso eleger, por maioria dos votos presentes, um dentre os que tivessem alcan-
çado as duas votações mais elevadas na eleição direta. Em caso de empate seria
considerado o mais velho. O § 4 2 dá início à introdução nos textos constitucionais
da inelegibilidade de parentes, ao dispor que seriam inelegíveis para os cargos de
presidente e vice-presidente os consangüíneos e afins nos primeiro e segundo graus
dos que se achavam em exercício no momento da eleição ou que tenham deixado
os cargos até seis meses antes.
É interessante observar que, quanto aos eleitores, não podiam-se alistar, dentre
outros, os mendigos e os analfabetos (art. 70, § 12 ).
Eliminaram-se, porém, as discriminações da época do Império relativas aOli
criados, aos administradores das fazendas rurais e fábricas bem como os que não
possuíssem determinada renda líquida anual ou que não professassem a reÍigião do
Estado (mesmo porque a Carta Republicana, em seu art. 72, inciso VII, determi-
nava que nenhum culto ou igreja gozaria de subvenção oficial nem teria relações
de dependência ou aliança com o Governo da União ou dos estados).
A Constituição de 1934 mantém, dentre outros, como inalistáveis os mendigos
e os analfabetos (art. 108). No art. 109 institui o voto obrigat6rio para os homens
e para as mulheres que exercessem função pública remunerada.
Quanto às inelegibilidades, amplia-as consideravelmente pelo art. 112, esten-
dendo-as aos estados e municípios. Dentre outros e apenas a título de ilustração
citaremos, como inelegíveis, os ministros de Estado, os chefes do Ministério Pú-
blico, os membros do Poder Judiciário, os ministros do Tribunal de Contas e os
chefes e subchefes do Estado Maior do Exército e da Armada. Nos estados, dentre
outros, os secretários de estado e os chefes de polícia e, nos municípios, citaremos
as autoridades policiais e os funcionários do fisco._
Quanto a eleições o art. 52, § 12 , vai além da Carta R.epublicana de 1891.
A eleição presidencial não seria apenas pelo sufrágio direto, mas também pelo
sufrágio universal e secreto. Ao eliminar a maioria absoluta de votos, constante da
Constituição de 1891, incidiu em erro, no nosso entender. E, no art. 23, ao criar,
ao lado dos deputados eleitos mediante sufrágio universal igual e direto, os repre-
sentantes eleitos pelas organizações profissionais, deu, neste aspecto, um caráter
corporativista, incompatível com o Estado democrático.
Relativamente a Carta Ditatorial de 1937, como é de sua índole, eliminou o su-
frágio universal, direto e secreto. Os presidente da República seria escolhido por
um Colégio Eleitoral composto de eleitores designados pelas Câmaras Municipais,
Conselho de Economia Nacional, Câmara dos Deputados e Conselho Federal (art.
82). O curioso é que o candidato escolhido pelo referido Conselho s6 seria consi-
derado eleito se o presidente da República não indicasse candidato pr6prio. Se in-
dicasse, a eleição seria direta ou por sufrágio universal entre os dois candidatos,
s6 que nada disto veio a ocorrer governando Vargas, com base no art. 178, até sua
queda em 1945.
A Câmara dos Deputados seria eleita por sufrágio indireto sendo eleitores os
vereadores das Câmaras Municipais e, em cada município, 10 cidadãos eleitos por
sufrágio direto (art. 47).
O Conselho Federal (espécie de Senado) teria 10 membros nomeados pelo pre-
sidente da República, e cada estado elegeria um representante através de suas As-
sembléias Legislativas, sendo que o governador poderia vetar o nome escolhido
pela Assembléia e o veto s6 cairia por dois terços de votos da totalidade de seus
membros (art. 50).

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Como, porém, na data de decretação da Carta de 10.11.37, foram dissolvidos a
Câmara dos Deputados, o Senado Federal, as Assembléias Legislativas dos esta-
dos e as Câmaras Municipais (art. 178), tais dispositivos permaneceram letra mor-
ta. A Constituição não foi submetida ao plebiscito nacional, como previa o art.
187, e as eleições do Parlamento Nacion~ que seriam marcadas pelo presidente
da República para depois de realizado o referido plebiscito, jamais ocorreram.
Passemos, agora, ao exame da Constituição de 1946. Ela se parece, neste pon-
to, com a de 1934, mas suprime a figura congressual dos representantes eleitos pe-
las organizações profiSSionais. Mantém a ausência da maioria absoluta para a
eleição do presidente da República.
Os mendigos já podem se alistar, mas os analfabetos continuam privados de
seus direitos poICticos (art. 132, inciso I).
Os militares, de um modo geral, em 1824 não podiam votar, em 1891 já p0-
diam, exceto as praças de pré (excetuados, porém, os alunos das escolas militares
de ensino superior). Em 1934, a Constituição excluía as praças de pré (além dos
referidos alunos, excetuava, também, os sargentos e os aspirantes a oficial) e, em
1937, retomou-se as disposições da Carta Imperial ao se proibir que os militares
em serviço ativo se alistassem eleitores (art. 117, alínea b). Embora inalistáveis,
os oficiais eram elegíveis (art. 121).
Em 1946, art. 132, parágrafo único, retomou-se aos dispositivos da Carta de
1934, excluindo-se do direito de se alistarem eleitores as praças de pré, excetuan-
do-se, além dos mencionados na referida Carta, mais os suboficiais e os subtenen-
teso
O art. 133, da Carta de 1946, retoma à obrigatoriedade de voto da de 1934,
ampliando-se a todas as mulheres e não apenas as que exercessem função pública
remunerada (permite exceções a serem previstas em lei). A Carta de 1937, embora
não fale em obrigatoriedade de voto, não chegou a presenciar nenhuma espécie de
eleição.
As inelegibilidades (art. 139) para presidente e vice-presidente da República,
governador, prefeito, deputado, senadores e as dos parentes são expressas de uma
forma igual à constante da Carta Magna de 1934.
Quanto à Constituição de 1967, não iremos nela nos deter. As suas disposições
tiveram duração muito curta, face à decretação do Ato Institucional n~ 5 de 1968
que, embora a declarasse mantida, pelo art. 1~, a modificou tão substancialmente
que na verdade a revogou, no que se relaciona aos direitos poICticos ora em exa-
me.
Achamo-nos, pois e agora, em condições de analisarmos os textos constitucio-
nais, no que se relaciona com os partidos políticos.

3.5 Dos Partidos PolCticos

Somente a partir da Constituição de 24.1.67, os partidos políticos mereceram


um capítulo específico nas Cartas Magnas do Brasil. Até então eram regulamenta-
dos apenas através das Leis Orgânicas.
O regime militar, iniciado em 1964, começou extinguindo os partidos polCticos
existentes à data da publicação do Ato Institucional n~ 2, de 27.10.65 e dispondo
que "para a organização de novos partidos são mantidas as exigências da Lei D~
4.740 de 15.7.65 e suas modificações" (art. 18).
O Capítulo m da Carta de 1967 trata dos partidos políticos em um único artigo,
o de n~ 149. A preocupação maior era dificultar a existência de vários partidos de

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oposição. Daí, no item VII, a exigência de 10% do eleitorado que haja votado na
última eleição e distribuídos em dois terços dos Estados, com o mínimo de 7% em
cada um deles e ainda 10% de deputados em pelo menos um terço dos estados e
10% de senadores, para a existência de um partido político. E no item VII proi-
bia-se a coligação partidária.
A Emenda Constitucional n!? 1, de 1969, manteve o Capítulo II - Dos partidos
políticos - da Carta de 1967, mas lhe fez diversas alterações. Entre elas abrandou
um pouco as exigências para o funcionamento de um partido político, ao dispor
que seriam de 5% do eleitorado - e não mais 10% - distribuídos em sete estados
(passou a nove pela Emenda Constitucional n!? 11, de 1978) e não mais em dois
terços e com o mínimo de 7% em cada um deles (reduzido a 3% pela Emenda
Constitucional n!? 11 de 1978).
Se a intenção foi proporcionar condições para o surgimento de um terceiro par-
tido, tal não veio a ocorrer, apesar das tentativas de organização do Partido De-
mocrático Republicano - PDR - por parte de Pedro Aleixo, ex-Vice-Presidente da
Repdblica, mpedido de tomar posse da Presidência com o falecimento do General
Costa e Silva.
A Carta de 1969 criou o instituto da fidelidade partidária (parágrafo dnico, que
passou a 5!? pela Emenda Constitucional n!? l1n8 do art. 152). Perderia o mandato
o senador, deputado federal e estadual e vereadores que "por atitudes ou pelo vo-
to se opuser às diretrizes legitimamente estabelecidas pelos órgãos de direção par-
tidária ou deixar o partido sob cuja legenda foi eleito" (a Emenda Constitucional
n'2 11, de 1978, acrescentou a seguinte ressalva: "salvo se para participar, como
fundador, da constituição de novo partido"). Na ocasião tentou-se, com a brecha
da nova redação, criar-se o Partido Popular, ainda mais que o art. 2!? da mencio-
nada Emenda permitiu a filiação de senador, deputado federal e estadual e verea-
dor "a partido já constituído, dentro do prazo de um ano a contar da vigência des-
ta Emenda".
Por motivos conhecidos, o Partido Popular acabou por não ter vida longa, man-
tendo-se o bipartidarismo compulsório, constituído pela Aliança Renovadora Na-
cional (Arena) e pelo Movimento Democrático Brasileiro (MDB).
O referido art. 152 da Carta de 1969 vigorou, sem novas alterações, até o ad-
vento da Emenda Constitucional n!? 25 de 15.5.85 promulgada pelo Congresso já
no atual Governo Civil do Presidente José Sarney. Ela reformulou por completo o
art. 152 e seus pontos principais foram os seguintes:
a) liberou e facilitou a criação de partidos políticos ao reduzir as exigências de
apoio a 3o/é do eleitorado distribuídos em apenas cinco estados e com o mínimo de
2% do eleitorado em cada um deles;
b) extinguiu por completo o instituto da fidelidade partidária.
E a nova Constituição,de 1988, o que dispõe a respeito dos Partidos Políticos?
Dedica-lhes o Capítulo V do Título lI, que contém um artigo (17), com quatro
parágrafos.
Em relação à redação que a Emenda Constitucional de 1985 deu ao art. 152 da
Carta de 1969, ele contém as seguintes inovações:
a) inclui no texto constitucional a obrigatoriedade dos partidos políticos de presta-
rem contas à Justiça Eleitoral (inciso III);
b) determina que os seus estatutos devem estabelecer nonnas de fideudade e dis-
ciplina (§ I!?);
c) concede aos partidos o direito a recursos do fundo partidário e acesso gratuito
ao rádio e à televisão, na forma da lei;

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d) deixa para ~ lei as regras de funcionamento parlamentar dos partidos políticos
(inciso N). Como esta lei ainda não foi elaborada não sabemos, ainda, como fi-
cará o direito à representação partidária no Congresso Nacional.
A redação anterior, da Emenda Constitucional n 2 25 de 1985, como já falamos,
criava restrições ao mencionado direito. A Constituição vigente, ao remeter o as-
sunto para a lei ordinária, facilitará sua eventual revisão por não necessitar, nos
termos do § 2 2 do art. 60, que trata das emendas à Constituição, de três quintos
dos votos dos congressistas, mas apenas da maioria simples, para ser alterada.
Examinadas as disposições constitucionais relativas aos partidos políticos e an-
tes de ingressarmos na análise comparativa, referente à organização do Estado, pa-
rece-nos oportuno tecermos, de uma forma bastante sintética, algumas breves con-
siderações acerca das principais inovações trazidas pela recém-promulgada Cons-
tituição de 5.10.88 no que se refere aos princípios, direitos e garantias fundamen-
tais constantes dos Títulos I e 11.
~ digna de menção a inversão dos Títulos vindo à frente da organização do Es-
tado e dos Poderes, e de todos os demais Títulos constantes da Constituição de
1988, os que tratam dos princípios fundamentais e dos direitos e garantias funda-
mentais. São a sociedade e o cidadão à frente do Estado e de seus Poderes Execu-
tivo, Legislativo e Judiciário.
Igualmente digno de citação a condenação à prática da tortura, ao tráfico ilícito
de entorpecentes e drogas e ao terrorismo.
A criação do Iulbeas-data e do mandado de injunção, a ação popular que vise a
anular ato lesivo ao patrimônio público e à moralidade administrativa e ao meio
ambiente são, também, merecedoras de figurarem dentre as inovações mais rele-
vantes.
Relativamente aos direitos sociais, cite-se a relação de emprego protegida con-
tra a despedida arbitrária e a proibição de diferença de critério de admissão do
portador de deficiência, bem como por motivo de idade, sexo, cor e estado civil.
Quanto aos partidos políticos, o acesso gratuito ao rádio e à televisão de todos
eles é disposição merecedora de destaque.

(Continua no pr6ximo número desta revista.)

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