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FACULDADE DE EDUCAÇÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
MESTRADO EM EDUCAÇÃO
EDYLANE EITERER
NITERÓI - RJ
MARÇO DE 2013.
EDYLANE EITERER
NITERÓI - RJ
MARÇO DE 2013.
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Ficha Catalográfica elaborada pela Biblioteca Central do Gragoatá
CDD 370.981 3
EDYLANE EITERER
Banca Examinadora:
_____________________________________________
Prof. Dr. Jorge Nassim Vieira Najjar – Presidente – UFF
_____________________________________________
Profª. Drª. Vera Lúcia Doyle Louzada de Mattos Dodebei – UNIRIO
_____________________________________________
Prof. Dr. Everardo Paiva de Andrade – UFF
NITERÓI - RJ
MARÇO DE 2013.
4
Ao pequeno Heitor, meu filho, luz dos
meus olhos, que aprendeu muito cedo a
conviver com a saudade, com a distância
e a dividir sua mãe com os livros.
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AGRADECIMENTOS
6
Ao meu fiel escudeiro, companheiro de todas as horas, Roberto Dutra,
com quem divido todas as minhas alegrias, tristezas, os meus sorrisos e
sonhos, os meus projetos e meus cafés. Parceiro de tanto tempo, acompanhou
bem de perto essa caminhada, estando ao meu lado com uma dedicação
imensa. Se tive forças para chegar até aqui, boa parte do incentivo veio dele
que não me deixou desistir quando eu já ameaçava jogar a toalha, que sempre
aposta suas fichas em mim e tem sempre uma palavra guardada em um
abraço e um sorriso meio de lado que consegue me convencer e me acalmar.
Ao querido e muito especial professor Galba Di Mambro, responsável
pelo meu encantamento inicial com o Patrimônio Cultural e, posteriormente,
pelas descobertas de um amor pelo tema que jamais imaginei ter. Pelos mais
de quatro anos de companhia diária no Arquivo Histórico da UFJF, pelos
incentivos e puxões de orelha, pelas histórias, pela confiança e carinho e,
principalmente, por ter me ensinado que nossos valores estão acima de toda e
qualquer circunstância e que pelo nosso esforço, comprometimento, seriedade
e fidelidade aos princípios, chegamos exatamente onde sonhamos.
Às queridas Fernanda Ribeiro e Renata Bonini, presentes do Rio de
Janeiro para a minha vida, com quem dividi muitos momentos maravilhosos,
algumas lágrimas e que hoje tenho o privilégio de chamar de amigas. Sem
vocês o Rio de Janeiro não teria o mesmo sabor, as mesmas cores, os
mesmos sons. Obrigada por todos os conselhos, por todo o incentivo, por todo
o carinho.
Aos queridos amigos Lucas Álvares e Marcos Barreto, do Programa de
Pós-Graduação em Memória Social da UNIRIO, peças fundamentais no meu
amadurecimento acadêmico, que dividiram seus conhecimentos comigo e que
me proporcionaram discussões muito profícuas, resultando em artigos e
viagens para eventos.
À amada Semiramis, amiga que acompanhou mais ou menos de perto,
mais ou menos de longe toda a minha trajetória. Que passou noites em claro
comigo tentando ajudar na definição de um projeto, na escolha de um ou outro
autor ou simplesmente na escolha do nosso almoço de domingo!
Aos amigos geograficamente longe, mas presentes virtualmente todos
os dias e que acompanharam cada passo dessa caminhada: Gabriel Marinho,
Carolina Thoni, Zenilde Gonçalves, Sandra Gonzalez, Mário Brazil, Ubirajara
7
Sá, Fátima Gomes, Alessandra Ferreira, Celso Jr., o meu muito obrigada por
todo o incentivo e pelas poesias divididas. Vocês trazem mais alegrias para o
meu dia!
Aos importantíssimos amigos de Juiz de Fora, que se fizeram m uito
presentes nesse período, entre eles Isaías Souza, Fernanda Amaral, Daniela
Bisaggio, Claudiney Arruda, Kamila Freitas, Fernando Barreto e Raphael
Gonzaga.
Aos amigos que não citei, mas que não são menos importantes, o meu
muito obrigada pelos momentos, pela torcida e pelos sorrisos.
Aos companheiros de mestrado com quem dividi o orientador e todos
os meus projetos: Marcelo Mocarzel, Sheila Dassiê e Simone Torres, obrigada
pela companhia e por permitirem que eu aprendesse tanto com vocês! Que o
sucesso nos aguarde bem ali em frente em nossas vidas!
Se existe uma palavra que pode definir a relação que se estabeleceu
entre meu orientador e eu é LIBERDADE. Ao longo desses dois anos fui
completamente livre, tanto que cheguei a trocar de projeto por sete vezes! Com
alguns encontros desesperadores, em que eu queria abraçar o mundo e
sonhava “dar conta do recado”, ele pacientemente tentava me mostrar todos os
caminhos e descaminhos e me deixava ir, talvez pra ter o prazer de ver com
um projeto novo nas mãos a cada 20 dias. Algumas vezes achamos que seria
impossível eu chegar na qualificação. Algumas vezes eu quis desistir e ele não
deixou. Outras vezes eu quis chorar e ele deixou. Completamos agora dois
anos de caminhada e um projeto que foi desenhado tantas vezes ganhou vida,
corpo, alma e pode ser apresentado como resultado de um grande esforço. Ao
meu orientador, parceiro e agora amigo, Jorge Najjar, os meus mais sinceros
agradecimentos.
Aos professores Everardo Andrade (UFF) e Vera Dodebei (UNIRIO)
que gentilmente aceitaram os convites para participarem da qualificação e da
defesa desse trabalho, sendo muito generosos com suas contribuições
enriquecedoras.
“Não sabia que era impossível. Foi lá e fez.” Jean Cocteau
8
"A educação não faz você feliz. E tampouco
a liberdade. Não nos tornamos felizes
somente porque somos livres, se somos. Ou
por termos sido educados, se formos. Mas
porque a educação pode ser o meio pelo
qual percebemos que somos felizes. Ela
abre nossos olhos, nossos ouvidos. Nos
conta onde as maravilhas estão
secretamente nos esperando. Nos convence
de que só existe uma liberdade que
realmente importa: a da mente."
Filme “Íris”
9
RESUMO
10
ABSTRACT
Constantly dealing with Cultural Heritage in our day-to-day. This reality has not
escaped our classrooms, but not all education professionals have that
awareness or are prepared to work with the Cultural Heritage and with some
themes that connect directly to it as memory, identity and cultural diversity in
their school routine. Based on the reality of schools found that, in general,
schools submit papers and projects that deal directly with the Cultural Heritage,
but not all teachers recognize this trait in their activities. Show that the school is
itself a Cultural Heritage, discussion on diversity space, memory and identity
and that, at all times, relates to the practices of heritage education, albeit
informal, is our goal. We point out that the school is seen as a fruitful
environment for constructions of views and enrichment of men as citizens, and
is an ideal space to deal with the Cultural Heritage and the Heritage Education,
passing through the trajectory Heritage in Brazil and supporting us in the Letters
and Documents Equity in Brazilian legislation for Education and in their daily
practices in the city of Niterói, State of Rio de Janeiro.
11
LISTA DE ABREVIAÇÕES E SIGLAS
12
LISTA DE QUADROS
13
LISTA DE GRÁFICOS
14
LISTA DE ANEXOS
15
SUMÁRIO
1. Introdução ...................................................................................................................... 16
16
Referências Bibliográficas .............................................................................................. 146
17
1. Introdução
1
Os temas trans vers ais não compreendem grupos de novas disciplinas, mas novos objetivos
de abordagem dos temas dentro do conteúdo que é previsto para cada disciplina já existente.
Segundo os PCN foi a forma de organizar o trabalho didático que recebeu o nome de
trans versalidade, e esses temas correspondem a “questões important es, urgentes e present es
sob várias formas na vida cotidiana”. (BRASIL, 1997 a, p. 15)
18
e plural dos campos de conhecimento e de cultura, somos convidados a
participar mais ativamente das realidades locais de nossos alunos, o que
levanta discussões sobre suas realidades, seus patrimônios, suas identidades.
Vale ressaltar aqui que quando nos colocamos a proposta de trabalhos
transdisciplinares, pretendemos
Esses temas são colocados como desafios aos professores que a todo
tempo são chamados a lidar com eles. Compreendemos, como Piletti (2004),
que o currículo escolar abrange todas as experiências escolares e nesse caso,
ele é todo permeado por elementos que vão muito além dos livros didáticos e
das aulas expositivas marcadas pelos conteúdos fixos. Sua dinâmica, para ser
mais enriquecedora, depende tanto da formação do professor, quanto do meio
pelo qual ele desenvolve o seu trabalho, neste incluídos os projetos que
envolvem a comunidade escolar, extrapolando as quatro paredes que
compõem a sala de aula e trabalhando com as experiências trazidas pelos
alunos.
Já que aceitamos a escola como detentora de grande parte do papel
como formadora dos cidadãos, ela deve estar em consonância com as
demandas da sociedade. Para tal, é necessário que trate de questões que
sejam pertinentes à vida dos alunos, que sejam relativas às suas experiências,
envolvendo-os com as temáticas sociais e incorporando-as em seus currículos
(BRASIL, 1997 a, p.64).
19
É seguindo as diretrizes de discussões metodológicas e práticas
propostas pelos PCN para serem levadas até a sala de aula de modo mais
dinâmico e voltado às questões relacionadas com o aluno, com a comunidade
e suas práticas de memória e seu Patrimônio Cultural, que nos colocamos a
questionar como determinados conceitos são trabalhados dentro do cotidiano
escolar.
Reconhecemos os indivíduos como seres imersos em um meio cultural,
já que, como aponta Saviani,
20
Entendemos que quanto mais claros são esses termos para os
professores mais eles terão condições de desenvolver trabalhos que os
envolvam e os coloquem próximos de seus alunos, tal como o propugnado
pelos PCN e pelas Orientações Curriculares para a Educação da cidade de
Niterói, pois, como veremos adiante, nosso trabalho empírico de pesquisa foi
realizado na rede pública de ensino deste município.
Nosso questionamento estava pautado na vontade de compreender se
os professores trabalham cotidianamente com os conceitos já citados ou se
eles acreditam que só lidam com eles quando estão envolvidos em projetos
explícitos.
Nossa inquietação frente ao trato com as questões do Patrimônio foi
despertada a partir de leituras de experiências vividas com professores de
várias cidades da Zona da Mata Mineira 2, no qual o contato com os relatos das
práticas docentes nos levou a observar que todos, sem nenhuma exceção já
trabalhavam assuntos relativos à identidade, ao Patrimônio Cultural e à
diversidade com seus alunos, sem que tivessem necessariamente a
consciência de que o faziam. Embora a grande maioria se restringisse às aulas
expositivas em salas, alguns professores já lidavam até com projetos
extracurriculares que abordavam os temas.
No contexto mineiro, a necessidade daqueles professores em se
aperfeiçoar no tema devia-se, em certa medida, às novas ondas de valorização
do Patrimônio Cultural, que ganhou mais espaço nas mídias de comunicação e
mais incentivos governamentais. Devia-se também à consciência que tinham
de tratar-se de um campo no qual se delineia um espaço privilegiado para a
formulação de propostas de trabalho multidisciplinares, além de ser também
uma busca para seu próprio crescimento continuado na formação docente.
2
Esses docentes foram alunos do curso de Produção de Materiais Didáticos para a
Diversidade: Práticas de Memória e P atrimônio numa Perspectiva Int erdisciplinar (PMDD), em
nível de aperfeiçoamento, promovido pela Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG.
Nesse curso, os professores-alunos mostravam -se preocupados em se aperfeiçoar para melhor
tratar de temas como a identidade, a diversidade e, principalmente, o Patrimônio Cult ural com
os seus alunos. Destacamos que o curso PMDD é vinculado à Secretaria de Educação
Continuada, Alfabetização e Diversidade (SE CAD/ME C). É um curso de formaç ão continuada
de professores e profissionais da educação que tem como foco amenizar as dific uldades na
produção de materiais didáticos, envolvendo as temáticas relativas à diversidad e. Nosso
contato com o curso se deu at ravés da t utoria desenvolvida entre abril e dezembro de 2010, no
polo presencial de Juiz de Fora, na Zona da Mata Mineira.
21
Para aqueles professores, o Patrimônio Cultural deveria ser um tema
potencializado nas escolas, já que são propícios para o desenvolvimento de
pesquisas, promovem o conhecimento dos bens patrimoniais e auxiliam em
sua preservação e conservação. Reconheciam, nesta medida, sua importância
enquanto categoria fundamental para a educação e para o desenvolvimento
social de todos os envolvidos.
Ao observar a situação de cerca de quarenta cursistas mineiros,
suscitou-nos o desejo de compreender se tratava-se apenas de uma questão
regional, já que a maioria dos professores eram oriundos de cidades
potencialmente históricas, possuidoras de bens patrimoniais reconhecidos na
região, ou se o trabalho com os temas relacionados ao Patrimônio Cultural está
se tornando uma constante entre os docentes, independentemente da
localidade. Também estendemos nossos esforços no sentido de entender
como esses docentes estão se apropriando dos conceitos de identidade,
diversidade, memória, Patrimônio Cultural e Educação Patrimonial, como
desenvolvem esses temas no seu cotidiano escolar e como se comportam
diante do dilema de lidar com assuntos tão abrangentes, tendo em vista a
realidade intricada e a dinâmica que engendram os sistemas educacionais.
Foi baseado nessa observação que definimos nosso objeto de
pesquisa: o que buscamos aqui foi, sobretudo, observar e entender como os
professores estão se apropriando desses conceitos e como eles os trabalham
no cotidiano escolar.
Os documentos que foram usados para contextualização do nosso
cenário de pesquisa englobaram as Orientações Curriculares para a Rede
Municipal de Educação de Niterói: Educação Infantil, Ensino Fundamental e
Educação de Jovens, Adultos e Idosos 3, que se baseia nos Parâmetros
Curriculares Nacionais (PCN), nas matrizes da Prova Brasil e do Sistema
3
As Orientações Curriculares para a Rede Municipal de Educação de Niterói: Educação
Infantil, Ensino Fundamental e Educação de Jovens, Adultos e Idosos, se apresentam como
uma construção coletiva que envolveu as coordenações e equipes da Fundação Municipal de
Educação (FME ), a S ecretaria Municipal de Educação (SME) e representantes dos
professores, pedagogos e outros at ores das escolas municipais de Niterói. Foi apresentado em
janeiro de 2010 como norteador dos trabalhos escolares para os doc entes da rede.
22
Nacional de Avaliação da Educação Básica4 (SAEB), já que são os norteadores
dos trabalhos docentes da cidade de Niterói.
Observando a realidade das escolas de Niterói, nossos olhares se
estreitaram para as diversas práticas docentes, mas especialmente as que
tangem o ensino de História. Segundo Circe Bittencourt (1997), que discursa
sobre as novas propostas curriculares, a prática do ensino dessa disciplina tem
características um pouco mais reflexivas e podem servir de ponto de partida.
Concordando com esta autora, temos ainda Berutti e Marques afirmando que
uma das finalidades mais significativas do ensino e aprendizagem da História
é:
4
O Sistema Nacional de A valiaç ão da Educação Básica foi implantado em 1990 e é
coordenado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais – INEP –, conta com
o apoio e participação das secretarias estaduais e municipais de educação de todo o país. Os
levantamentos de dados são realizados a cada dois anos e envolvem alunos do 5º e 9º anos
do Ensino Fundamental e do 3º ano do Ensino Médio e abrange todas as disciplinas.
23
as escolas de Niterói trabalham com o Patrimônio Cultural e temas
estreitamente ligados a ele.
24
2. Uma Questão de Cultura: Entendendo o que é o
Trabalho com o Patrimônio Cultural
25
2.1. Em Busca do Reconhecimento: O Homem e suas
Escolhas
5
A ideia da patrimonialização está vinculada aos processos de ativação do Pat rimônio Cultural,
muito desenvolvido no pós II Guerra Mundial, quando se apresentava um desejo
conservacionista com relação aos bens pat rimoniais. Após a segunda metade do século XX,
através da patrimonialização passou -se a atribuir novos valores, significados, sentidos e usos a
objetos, modos de vidas, saberes, fazeres e conhecimentos sociais qu e buscavam dar uma
legitimidade patrimonial mais seletiva, porém como t entativas de se fazerem mais abrangent es
com a diversidade cultural, tema recorrente nas instituições int ernacionais que discutiam as
questões do Patrimônio Cultural. Os especialistas c ertificam o valor dos elementos culturais
dignos de serem patrimonializados e reconhecem como bem de tutela pública o que antes não
estava reconhecido como tal. Alois Riegl (1987) escrevia em 1902 que os valores geralmente
atribuídos ao patrimônio cultural são os seguintes: 1. O valor histórico radicaria na
rememoração que esse elemento faz de uma época, no estímulo da nossa memória sobre o
passado, um tempo distinto da nossa vida quotidiana, um país estrangeiro. A aparente
permanência da sua forma original, tal e como nasceu é uma leitura comumente reconstruída
com o pensamento, a palavra ou a imagem. 2. O valor estético ou art ístico tem também uma
outra pret ensão de valor objetivo; mas na procura de uma definição do “bonito”, muitas vez es
esta categoria está unida ao “útil”, à rent abilidade política e socioeconômica. 3. O valor de
antiguidade é, pelo contrário, uma pretensão de valor subjetivo, que salient a o prazer, o sabor
do antigo e da vivência. É este um valor do velho, do mais idoso. Por não necessita r de
especiais conhecimentos históricos, é este um valor mais democrático para o qual não
precisamos do conhecimento de especialistas. 4. O valor de atualidade ou contemporaneidade
salienta a utilidade dos elementos do Patrimônio Cultural, para servir as necessidades do
presente. Sabemos que esses elementos são insuficientes para se definir o que deve ou não
ser patrimonializado, mas eles são constantes em todas as discussões para se definir o objeto.
26
a natureza de alguém para torná -la conforme aos valores de sua sociedade”
(CHAUÍ, 2010, p. 105), tangia a moral, a ética e a política, chegando a tornar-
se sinônimo de civilização.
Considera-se que “culta era a pessoa moralmente virtuosa,
politicamente consciente e participante, intelectualmente desenvolvida pelo
conhecimento das ciências” (CHAUÍ, 2010, p. 106), ideia que cresceu a partir
do século XVIII e se estendeu até meados do século XX, como veremos
adiante.
O segundo significado é formulado ao longo do século XVIII e assinala
a separação da ideia de cultura e a de natureza, apresentando como
significado de cultura
27
BOURDIEU, 2008) e que, como nos aponta Laraia “o desenvolvimento do
conceito é de extrema utilidade para a compreensão do paradoxo da enorme
diversidade cultural da espécie humana” (LARAIA, 1988, p.07), logo dos bens
produzidos por eles e que compõem as suas identidades, muitas vezes
transformados em Patrimônios Culturais.
Admitimos que o homem quando produz a sua cultura, busca também
representá-la e o Patrimônio Cultural encaixa-se como essa representação
cultural, como uma referência, um marco.
Atentando para a nossa sociedade e os estudos relacionados à cultura,
percebemos que
6
“Esta palavra é usada frequentement e na linguagem comum para se referir a um
conhecimento mais ou menos limitado, habilidades e formas de sensibilidade que permitem a
certos indivíduos apreciar, compreender e / ou produzir um det erminado tipo de bens, que são
principalmente agrupados nas chamadas belas -artes e em algumas out ras atividades
intelectuais”. (Tradução livre da autora)
28
Dessa maneira é importante ressaltar que toda elaboração de
representações simbólicas das relações humanas com o meio em que vivemos
são criadas para que haja a produção do conhecimento, técnicas e sistemas
que, além de transformar a natureza de modo a contribuir para a nossa
vivência, está vinculada a uma necessidade de comunicação, usada para a
transmissão dos elementos escolhidos para promover a identificação dos
membros do grupo.
O que distinguiria os grupos sociais seria não só a sua capacidade de
produzir os códigos de cultura ou da “produção da crença” 7 que nos apresenta
Bourdieu (2008), mas também as capacidades de inteligibilidade desenvolvidas
pelos indivíduos, que seriam classificados como cultos (produtores) ou incultos
(receptores), de acordo com as suas capacidades de recepção das
informações contidas nos signos e representações simbólicas contidas na
sociedade.
Baseados nessa necessidade de se transmitir o que foi selecionado
como cultura a ser mantida pelo grupo como traço de sua identificação, de se
promover essa comunicação entre os grupos cultos e incultos, a dinâmica das
sociedades se organiza de modo dialético, fazendo com que haja uma
7
No texto “A P rodução da Crença: contribuição para uma economia dos bens simbólicos”,
publicado em 1977, Pierre Bourdieu apresenta elementos para se compreender o processo de
criação, circulação e cons agração dos bens culturais, desmistificando o caráter sagrado da
cultura e c olocando-a como resultado de um processo social entre os agentes dos campos
específicos envolvidos tanto em sua criaç ão quant o em sua circulação e promoção.
29
vista que admite uma série de definições, apontando as de Kluckhohn, que
define a cultura como:
Pela ótica sinalizada por Geertz, podemos admitir que a cultura não
pode ser apenas interpretada como essa relação de poder entre grupos tidos
como cultos e incultos, já que aceita tantas definições. Em contrapartida a essa
distinção mais fechada, surgem os olhares antropológicos de cultura, como o
apresentado pelo autor e corroborado por Batalla, no qual destacamos a noção
que a coloca a cultura como
Ora, entendemos à luz de Batalla (1992, 2006, 2010) que a cultura não
é senão uma experiência histórica acumulada que se forja no cotidiano, na
solução dos grandes e pequenos problemas com que a sociedade se enfrenta.
A cultura consta de práticas já experimentadas e de um sistema de
conhecimentos, ideias, símbolos e emoções que lhe dá coerência e significado.
Esse olhar faz com que a existência da pluralidade ou da diversidade de
culturas seja um terreno fértil de recursos para a sociedade.
8
“O conjunto de símbolos, valores, atitudes, habilidades, conhecimentos, significados, formas
de comunicação e de organização social, e bens materiais que tornam possível a vida de uma
determinada sociedade e a permit e transformar-se e reproduzir-se como tal, de uma geração
para as próximas.” (Traduç ão livre da autora)
30
O que percebemos é que não podemos falar de cultura como um
conceito fechado, mas em constante mutação, capaz de englobar em seu seio
uma variedade de concepções.
Frente a essa complexidade, selecionamos, para nortear nossos
trabalhos, a ideia de cultura apresentada por Chauí, que contempla e completa
os olhares já apresentados por Geertz e Batalla, assinalando que a cultura é
um elemento da história do homem, relacionada com suas práticas e vivências,
“com a afirmação de que os humanos são capazes de criar uma ordem de
existência, uma ordem simbólica” (CHAUÍ, 2010, p.112) e também com sua
memória e sua história, marcando cada grupo de uma maneira diferente. Esta
definição nos leva a afirmar que temos diante de nós múltiplas culturas, cada
uma referente a um grupo criador e criativo, produtor e receptor.
Admitindo que a cultura é essa criação que o homem faz para se
organizar no tempo e no espaço, os seus Patrimônios Culturais podem ser
considerados como marcos de orientação através de espaços, pessoas,
objetos, ideias, imagens, que pela escolha e ação do homem são permeadas
de sentimentos, de significados, de afetividade e emotividade que lhe conferem
o poder de estabelecer relações de pertencimento, já que
9
“Toda sociedade acumula uma riqueza de elementos culturais (bens mat eriais, ideias,
experiências, etc.), que são feitos seus ao longo de sua história (porque o criou ou porque o
adotou), alguns dos quais permanecerão em pleno vigor como rec ursos para praticar ou
reproduzir a sua vida social, enquant o outros perderam esse vigor original e tornaram -se parte
de sua história, ou perdida ou esquecida para sempre.” (Tradução livre da autora)
31
tangíveis), mas também pelo viés da memória e das práticas, dos costumes,
das tradições, dos patrimônios imateriais e intangíveis.
Através desses autores, podemos concluir, então, que trabalhar com o
Patrimônio Cultural é, sobretudo, trabalhar com as escolhas feitas de acordo
com a cultura de cada grupo, com os elementos por eles valorizados,
atribuídos de valores, de sentimento, de afinidades, é trabalhar com os jogos
de poder envolvidos nesse processo de escolha, o que nos sugere levantar
outros conceitos que estão intimamente relacionados a essas questões.
Lidar com o Patrimônio Cultural e a cultura é perceber que o homem
está o tempo todo em busca de um reconhecimento, tentando se afirmar
através de suas escolhas e perpetuando-as ao longo de sua história como
membro de um grupo, exaltando as suas identidades, que por serem múltiplas
acabam por direcionar os nossos olhares para a pluralidade, para a diversidade
e, já que estamos falando de escolhas que devem ser lembradas, é
fundamental que entendamos o debate sobre as memórias e também pelos
esquecimentos, já que, na História, o silêncio nos fala.
32
2.2. O que Compõe o Patrimônio Cultural?
33
Dessa forma, ainda hoje usamos o termo para essa mesma
designação, de herança transmitida, mas já incorporamos novos usos a ele,
bem como o caracterizamos com adjetivos que alteram o seu significado literal
em cada caso:
35
A partir desse marco, o uso do termo Patrimônio Cultural se expandiu
para a Europa e pelo mundo, até que em 1972 a UNESCO o consagra na
Convenção para a Proteção do Patrimônio Mundial, Cultural e Natural.
O Patrimônio Cultural tem um sentido voltado para a coletividade, o
público, e o patrimônio, por si só tem um sentido restrito, familiar, voltado para
o lado privado e particular, estando de acordo com Choay (2006).
Ressaltamos que o Patrimônio Cultural tem características que o torna
permanente em contraposição com a cultura que é dialética, está em constante
transformação (BATALLA, 1992; CHOAY, 2006; PELEGRINI, FUNARI, 2006).
Enquanto a cultura se desenha como um campo que pode ser apenas
estudado, teorizado e conceituado, não podendo ser patrimonializada, Choay
(2006; 2011) nos mostra que o patrimônio está ligado a uma forma mais
concreta, sendo a representação da cultura, por meio de sua percepção física,
ou visível no caso de patrimônios imateriais ou intangíveis, ou seja, que podem
ser visualizados como demarcadores dessa cultura ao longo do tempo e no
espaço.
Dessa forma, usamos a expressão patrimônio para fazer referências a
bens destinados aos usos dos grupos sociais, que vão ampliando-se pela
acumulação de artefatos, saberes e conhecimentos que incorporam cada vez
mais a diversidade.
O trato do Patrimônio Cultural é também um ato de fortalecer a
identidade, já que implica em deixar legados que perpetuem os elementos
culturais que a fortaleça ao longo do tempo para que se torne uma marca
significativa para os indivíduos que compõem o grupo social. É importante que
ela seja reconhecida em determinados elementos possuidores de um “valor
que não é medido por sua materialidade e, sim, por sua força simbólica”
(CHAUÍ, 2010, p.117).
Podemos concluir, então, que a concepção que temos hoje de
Patrimônio Cultural começou a ser pensada na Europa, com a formação dos
Estados Nacionais modernos e destacou-se após 1789 (OLIVEIRA, 2008;
FONSECA, 1997; LEMOS, 2004; FUNARI, 2009) com a Revolução Francesa,
quando fortalecer a identidade dos indivíduos componentes da nação fez-se
necessário. A partir de então, as nações que se formaram, especialmente nas
repúblicas, precisavam de elementos que as legitimassem e criassem uma
36
aura de tradição em torno delas, surgindo a ideia de Patrimônio Cultural
semelhante à que usamos atualmente:
37
dominantes, impondo-se limites, regras, mas de maneira a fazer com que
essas ações parecessem uma relação que sempre existiu.
Esse processo está vinculado a práticas que, tal como o disposto por
Pierre Bourdieu, apresentam formas de Violência Simbólica, que revela-se na
imposição “legítima” e encoberta do arbitrário cultural do grupo ou classe
dominante, de maneira a fazer com que o oprimido não perceba a sua
condição, considerando a sua posição como uma situação natural, aceitável e
quase inevitável. Esse exercício da Violência Simbólica é comum a várias
instituições de nossa sociedade, como a escola, que a exerce e reproduz, tal
como é apontado por Bourdieu e Passeron (2010).
Najjar nos coloca que essa naturalização faz com que as relações de
poder presentes na definição do que é o Patrimônio Cultural não fiquem
explicitadas para todos, apoiando-se na mesma ideia de Bourdieu, assinalando
ainda que “ao se naturali zar a ideia de Patrimônio Cultural, o mesmo processo
de violência simbólica ocorre” (NAJJAR, 2010, p143).
Esse ato que “faz parecer natural” é o que Bourdieu chama de habitus,
ou seja, a impossibilidade de separar os indivíduos do local que eles ocupam,
num ambiente já definido por questões simbólicas (BOURDIEU, 2009;
ENCREVÉ, 2005) ou o que se relaciona com capacidade das estruturas sociais
serem incorporadas pelos agentes por meio de disposições para sentir, pensar
e agir, sem anular o agente na sua verdade de operador prático de construções
de objeto (BOURDIEU, 2009).
A amarração dos elementos simbólicos é tão bem feita que os
indivíduos não se reconhecem como agentes que sofrem uma imposição. Eles
aceitam a sua condição com certa naturalidade porque essas formas de ser já
foram incorporadas.
Inicialmente, o Patrimônio Histórico era entendido como sendo o
conjunto de bens que eram concebidos como herança do povo, da nação, e
incluía bens imóveis e móveis, que compunham os acervos museais, mas
38
Como elemento que ajuda a formar essa identidade, temos clara a
ideia de que o patrimônio
10
Patrimônio Material é aquele cujos aspectos são mais concretos da vida humana, e que
fornecem informações sobre as pessoas. Cultura material é o mesmo que objet o ou artefato.
Patrimônio Imaterial é o conjunto de manifestações populares de um povo, transmitidos oral ou
gestualmente, recriados e modificados ao longo do tempo. Os locais dotados de expressivos
valores para a História, assim como as paisagens, também são represent ações do patrimônio
imaterial.
39
tradições, modos de saber fazer, lendas, cantos e festas apresentam a história
de um povo, englobando também os sítios arqueológicos.
Sobre o Patrimônio Ambiental, o IPHAN coloca que a inter-relação do
homem com seus pares e com o meio em que vive são importantes para a sua
constituição como ser e, portanto, coloca-se o meio natural no qual o homem
habita como um patrimônio que pode interferir diretamente em seu cotidiano.
Em toda nossa trajetória do desenvolvimento de política de
preservação, fomos diretamente influenciados pelo contexto internacional
através das Cartas Patrimoniais, inclusive para que houvesse uma ampliação
do conceito de patrimônio, pelas determinações da Conferência de Nara 11, em
1994.
Nessa carta reconheceram-se todos os grupos sociais como agentes
produtores de cultura, de história e de patrimônio, como fruto do processo de
globalização, uma vez que ter essas culturas reconhecidas é uma garantia de
uma inserção dessas comunidades no contexto nacional, e da nação no
contexto mundial, trazendo avanços políticos, econômicos e até sociais, com a
criação de possibilidades de trabalho, explorando as novas oportunidades que
surgem com o reconhecimento do patrimônio como oficial (Carta de Nara,
1994).
Ampliando-se essa visão, ampliou-se também o leque de bens a serem
entendidos como Patrimônio Cultural e no ano de 2000 com a lei nº
3551/200012, houve, oficialmente, a instituição de patrimônios culturais de
características imateriais ou intangíveis, relacionando -os diretamente à cultura,
possibilitando o registro 13 desses bens intangíveis.
11
A Conferência de Nara ocorreu em 06 de novembro de 1994, na cidade de Nara, Japão, e
trata da convenção do P atrimônio Mundial, levando em consideração a diversidade cultural e
de patrimônios, tocando em pont os como a identidade cultural, a memória coletiva e sobre a
intangibilidade e imaterialidade de alguns patrimônios. O Documento gerado na Conferência de
Nara pode ser acessado no endereç o:
http://portal.iphan.gov.br/portal/baix aFcdAnexo.do?id=264
12
O Decreto-lei nº 3551, de 04 de agosto de2000 está compilado no final deste t rabalho como
anexo para event uais consultas. Ele institui o Registro de B ens Culturais de Natureza Imaterial
que constituem Patrimônio Cultural brasileiro, cria o Programa Nacional do P atrimônio Imaterial
e dá outras providências.
13
O registro é, antes de tudo, uma forma de reconhecimento e busca a valorização desses
bens, sendo visto mesmo como um instrumento legal. Registram-se saberes e celebrações,
rituais e formas de expressão e os espaços onde essas práticas se desenvolvem (IP HA N,
2006, p. 22).
Na visão do IPHA N, o registro: [...] corresponde à identificação e à produção de conhecimento
sobre o bem cultural. Isso significa doc umentar, pelos meios técnicos mais adequados,
40
O termo “intangíveis” nos possibilita encaixar quase todos os
elementos da vida humana como patrimônios culturais: os modos de fazer
artefatos, as festas, os contos populares, os mitos, expressões religiosas, as
paisagens, desde que tenham uma forte relação com a cultura da sociedade.
Ressaltamos que muitos desses bens poderiam se perder das tradições, da
memória, porque não deixaram vestígios materiais, não sendo considerados
importantes/relevantes (FONSECA, 2009, p. 61). Daí percebemos claramente a
necessidade que tínhamos em ampliar o conceito: preservar nossas próprias
memórias.
Foi com o Decreto-lei 3551/2000 que houve a inclusão das ações das
“sociedades folcloristas, os movimentos negros e de defesa dos direitos dos
indígenas, as reivindicações de grupos descendentes” (FONSECA, 2009, p.
61) no rol do que era considerado oficialmente pelo IPHAN como Patrimônio
Cultural, portanto como elementos pertinentes à identidade nacional.
De maneira geral, as políticas públicas que se direcionam para o
Patrimônio Cultural no Brasil e que são mediadas pelo IPHAN, relacionam-se
intimamente com a questão da identidade nacional dentro dos projetos políticos
de cada governo que se sucedem no poder (PELEGRINI, FUNARI, 2006, p.
47), mas ainda que essas influências políticas sejam fortes, a partir dos anos
2000, a experiência patrimonial no país tem sido realizada em sua maneira
mais ampla.
Nessa medida, a implementação das políticas de preservação
patrimonial tem se importado muito mais com as questões da comunidade que
detém o bem, num processo democrático e relacionado com a identidade do
grupo – o que a comunidade quer preservar, o que ela entende como elemento
que a compõe e representa.
Seguindo essas discussões é preciso que pensemos o “Patrimônio
Cultural” como sendo narrativas, segundo Foucault, como uma “formação
discursiva” que nos permite enxergar os seus valores simbólicos que atuam na
construção da identidade cultural (FONSECA, 2003, p. 65), como uma “prática
social”, “que implica um processo de interpretação da cultura, como produção
41
simbólica, portadora de referências à identidade, à ação, à memória dos grupos
formadores” (FONSECA, 2009, p. 67).
Lidamos hoje com uma conceituação muito mais ampla de Patrimônio
Cultural, que foi uma conquista ao longo dos vários anos de discussão do tema
desde que a preocupação com ele se desenhou na antiguidade.
Conceber que para além do patrimônio edificado, a música, a língua, a
literatura, o artesanato e os ideais de luta de movimentos sociais pela
resistência de suas tradições e costumes são elementos constituintes da
cultura nacional e, por isso, são patrimônios é o que nos faz a cada dia
incorporar aos bens já institucionalizados um valor que o aproxime de nossas
identidades.
Do mesmo modo ao nos perceber como agentes produtores de cultura
atribuímos valores aos nossos feitos e nos reconhecemos nele, desejando
salvaguardá-los e mantê-los como um patrimônio, como salienta Canclini:
42
Quadro Esquemático sobre o Patrimônio Cultural14
Paradigma Século XX Século XXI
Terminologia Patrimônio Histórico e Artístico Patrimônio Cultural
Objetos e Instrumentos de Bens materiais (imóveis) Bens materiais Tombamento
Preservação Tombamento Bens imateriais Registro
Objetivo Fortalecer as identidades nacionais Promover a diversidade cultural
Excepcionalidade Referencialidade
Vetor de Preservação Autenticidade Pertencimento
Monumentalidade (Valorização por parte das comunidades)
Poder Público Federal Poder Público Municipal
Esfera de Atuação Sociedade Civil
Setor Privado
14
Quadro esquemático idealizado pela autora como parte componente desta dissertação de mestrado.
43
2.3. Antecedentes da Preservação do Patrimônio
Cultural no Brasil
44
p.15), de união de pessoas que desejavam a emancipação do país e seu pleno
desenvolvimento.
Segundo Jaime Pinsk, notamos que a História ensinada nas escolas
por muito tempo era a de um Brasil construído na cabeça dos ideólogos e não
da prática histórica dentro da qual vivem nossos alunos (PINSK, 1992, p17),
fato comprovado nos bens patrimoniais tombados até o ano de 1981, dentre os
quais não havia um bem que fizesse referência aos grupos negros, indígenas
ou de imigrantes.
Essa realidade era perceptível nas nossas escolas, pois como aponta
Pinsk, no Brasil,
45
02 de agosto de 1922, e diversas leis estaduais que se voltaram para a
questão preservacionista, colocando o Brasil na posição pioneira na trajetória
das políticas e discussões patrimoniais na América Latina.
Nesse momento, entendeu-se que os bens culturais eram responsáveis
pela formação da identidade e que poderia contribuir diretamente para o
desenvolvimento do sentimento de brasilidade, expandido, especialmente na
década de 1930, com a ascensão de Getúlio Vargas.
O governo de Vargas tinha um cunho desenvolvimentista e nacionalista
e logo aderiu a uma política cultural mais forte, apoiando os modernistas nas
campanhas de valorização e preservação dos bens culturais nacionais
(FONSECA, 2009). O apoio governamental é percebido com a criação do
Ministério da Educação e Saúde, em 1930, e o Departamento Nacional de
Propaganda, em 1934. Além de organizar o aparato estatal, havia a
necessidade de Vargas em se colocar como representante legítimo dos
interesses da nação, passando a ser o organizador jurídico e político da
sociedade.
As primeiras iniciativas referentes às políticas patrimoniais no governo
varguista se deram com base nas discussões sobre a preservação das cidades
históricas brasileiras. Os modernistas lançaram-se em caravanas pelo interior
do país, especialmente em Mi nas Gerais. O grupo composto por Mário de
Andrade, Rodrigo Melo Franco de Andrade e Lúcio Costa, entre outros, viram
nas cidades mineiras de Ouro Preto, Mariana, Congonhas, São João Del Rey,
Diamantina, Caraça e Sabará o que seria a representação maior da cultura
nacional: a arte barroca.
46
Outro personagem que se destacou na trajetória inicial das políticas
preservacionistas no país foi Gustavo Barroso, que atuou na criação do Museu
Histórico Nacional (FONSECA, 2009, p. 95). Ele fazia parte de uma frente mais
conservadora com relação a essas políticas, mas não chegava a concorrer com
o grupo modernista, até meados de 1934, quando os dois grupos almejaram a
chefia da Inspetoria dos Monumentos, que em 1937 se tornaria a Secretaria do
Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – SPHAN.
A Inspetoria se baseava no nacionalismo tradicional, fazia as
verificações e as identificações de monumentos importantes para a construção
e o fortalecimento da identidade brasileira, mas a convite do Ministro Gustavo
Capanema, o grupo modernista foi convidado a compor os seus quadros,
sendo responsável pela elaboração do anteprojeto que criaria o SPHAN,
atualmente IPHAN, função que foi direcionada para Mário de Andrade.
No anteprojeto, Mário de Andrade concebe a questão patrimonial de
uma maneira bem ampla:
15
O Livro do Tombo, que dá origem ao termo Tombamento, provém do Direito Português, no
qual a palavra tombar tem o sentido de registrar, inventariar, inscrever bens nos arquivos do
Reino. Tal inventário era inscrito em livro próprio que era guardado na Torre do Tombo, a torre
Albarrã, do castelo de São Jorge, em Lisboa (Portugal). Ali se guardavam, para além dos
referidos tombos de registro e demarc ação de bens e direitos, os doc umentos da Fazenda, os
capítulos das Cortes, os livros de c hancelaria, os registros de instituição de morgados e
capelas, os testamentos, os forais, as sentenças do juiz dos feitos da Coroa, as bulas papais,
os tratados internacionais, a correspondência régia e muitos outros documentos oficiais da
história do país, e muitos referentes à História do Brasil. Na atual designação oficial, o Instituto
dos Arquivos Nacionais / Torre do Tombo é uma instituição com uma longa história, maior do
que a da maioria dos próprios documentos que preserva.
47
meios de se salvaguardar bens culturais de natureza imaterial, o enfoque foi
dado para a preservação arquitetônica, como podemos ver em seu primeiro
capítulo, observando a forte influência francesa:
16
As Cart as de Atenas foram feitas em duas edições: 1931 e 1933. Em 1931, o document o dá
providências sobre a conservação de monumentos. Em 1933, a documentação trata das
arquiteturas que compõem as cidades e os problemas urbanísticos que existem nos grandes
centros urbanos.
17
O tombamento é um ato administrativo realizado pelo Poder Público com o objetivo de
preservar, por intermédio da aplicação de legislação específica, bens de valor históric o,
cultural, arquitetônico, ambiental e também de valor afetivo para a população,
impedindo que venham a ser destruídos ou descaracterizados. É uma das ações a ser tomada
para a preservação dos bens culturais, na medida em que impede legalmente a sua
destruição. No caso de bens culturais, preservar não é só a memória coletiva, mas todos os
esforços e rec ursos já investidos para sua construção. A pres ervação somente se torna visível
para todos quando um bem cultural se encontra em bom estado de conservação,
propiciando sua plena utilização. O nome tombamento advém da Torre do Tombo, o arquivo
público português, onde eram guardados e conservados documentos importantes.
No Brasil, ele foi criado com o Dec reto Lei nº25, de 30 de novembro de 1937, inspirado no
anteprojeto apresentado por Mário de Andrade, intelectual modernista muito engajado na
questão do Patrimônio Histórico nacional
48
a uma identidade cristã e branca, não deixando transparecer nossa diversidade
cultural e nossas raízes negras e indígenas.
Após décadas promovendo o tombamento apenas de bens de estilo
barroco, expandiu-se o olhar para o estilo neoclássico e moderno,
desvalorizando-se o estilo eclético e o neocolonial (OLIVEIRA, 2008, p.123).
Preservar esses bens era resgatar o passado e lançar -se ao futuro, uma vez
que o conhecimento do passado possibilitaria uma construção de um futuro
melhor, mais consciente e até politizado.
Coube aos intelectuais modernistas atuarem como mediadores
simbólicos dentro da política nacional de preservação dos bens, já que tiveram
que eleger e classificar como “universais”, em termos propriamente simbólicos,
bens que não representavam as identidades de todos os grupos sociais que
compõem a nação. Para legitimar os processos de seleção e proteção do
Patrimônio Cultural brasileiro, criou-se, nesse momento, um aparato legal
(FONSECA, 2009, p. 22), pelo viés do Decreto-Lei nº. 25/1937.
A atribuição do valor simbólico se justifica, segundo Bourdieu, na
medida em que se constituiu um campo intelectual e artístico que aos poucos
vai se afirmando enquanto grupo diferenciado, ganhando tanto uma visibilidade
que os coloca como superiores, quanto um status quo privilegiado a tal ponto
de eles mesmos poderem atribuir esses valores. É o que se desenha no
mercado das trocas simbólicas, no qual valorizam-se diversas formas de capital
entre elas o simbólico e o intelectual (BOURDIEU, 2009).
Após a gestão de Rodrigo Melo Franco de Andrade, quem assumiu
dando prosseguimento aos trabalhos, na mesma linha política foi Renato
Soeiro. Apenas em 1979, com a entrada de Aloísio Magalhães é que uma nova
visão de política preservacionista é implementada no país.
A política adotada se voltava para a valorização da diversidade cultural
brasileira, ressaltando as riquezas culturais do presente. Segundo a política de
Aloísio era necessário exaltar os elementos culturais brasileiros que
fomentaram a construção nacional e assinalou para discussões referentes às
naturezas imateriais desses bens.
Aloísio de Magalhães empreendeu medidas que marcaram a sua
preocupação em se mostrar esses bens culturais. Segundo ele
49
(...) arte e arquitetura popular; diferentes tipos de artesanato;
religiões populares; culturas étnicas; esportes; festas populares;
etc. Esses bens culturais são valorizados não por uma suposta
exemplaridade, mas como parte da vida cotidiana e como formas
de expressão de diferentes segmentos da sociedade brasileira. As
diferentes formas de cultura popular são vistas como a fonte
mesma de uma ‘autêntica’ identidade nacional (MAGALHÃES
apud GONÇALVES,1996, p. 56).
50
mas de práticas que levavam em conta os “usos diferenciados que eram feitos
dos mesmos bens” (FONSECA, 2009, p.45) pelos diferentes grupos sociais.
A democratização passava pela tentativa de se compreender como
esses grupos recebiam e entendiam o patrimônio ou, de acordo com Fonseca,
como se davam as apropriações do Patrimônio Cultural que decorrem da
própria diversidade dos grupos, da dificuldade de acesso, do consumo e dos
códigos de leitura dos bens patrimoniais.
Ao observarmos o Patrimônio Cultural brasileiro antes dos anos finais
do século XX, teremos a nítida impressão de que dávamos a condição de
nosso patrimônio apenas aos conjuntos urbanos edificados, além de alguns
imóveis isolados (FONSECA, 2003, p.57), já que, até a edição do Decreto nº.
3551/200018, os requisitos para integrar o universo de bens considerados pelo
Estado patrimônio histórico e artístico nacional ainda não eram tão amplos.
Devido ao fato de o grupo dos intelectuais modernistas estar à frente
do processo de eleição e efetivação do patrimônio histórico brasileiro e, depois
pelas ações do CNRN, estar nas mãos de grupos de intelectuais, a população
acabou por acreditar que as questões relacionadas ao Patrimônio Cultural
eram uma atividade própria da elite intelectual, atribuindo aos bens culturais um
valor simbólico 19 ligado apenas aos grupos dominantes, que pouco se
esforçavam para encerrar essa visão e beneficiando-se do seu capital cultural 20
(BOURDIEU, 2009, p12).
Nas últimas décadas do século XX e início do XXI, essa visão mais
voltada para patrimônios apenas materiais, começou a se transformar e as
comunidades despertaram para o fato de que seus saberes, costumes e
produtos de suas ações também eram “dignos” de serem entendidos como
18
O Decreto-Lei nº 25, de 30 de novembro de 1937, organiza a prot eção do patrimônio
histórico e art ístico nacional.
19
No momento em que atribuímos ao Patrimônio u m valor simbólico, admitimos que eles
possuem, também um poder simbólico, que para Pierre Bourdieu é o poder de construir o dado
pela enunciação, de faz er ver e fazer crer, de confirmar ou de trans formar a visão de mundo e,
deste modo, a ação sobre o mundo, portant o, o mundo; poder quase mágico que permite obter
o equivalente daquilo que é obtido pela força (física ou econômica), graças ao efeito específico
de mobilização, só se exerc e se for reconhecido, quer dizer, ignorado como arbitrário. Isto
significa que o poder simbólico não reside nos “sistemas simbólicos ” em forma de illocutionary
force mas que se define numa relação determinada – e por meio desta – entre os que ex ercem
o poder que lhes estão sujeitos, quer dizer, na própria estrutura do campo em que se produz e
reproduz a crenç a. (BOURDIE U, 2009, p. 14-15)
20
Para Pierre Bourdieu, Capital Cultural é o domínio de uma cultura tida como superior por um
indivíduo, possibilita a ele vantagens e recompensas, já consolidado nos grupos menos
esclarecidos a fim de manter o seu status quo na sociedade.
51
patrimônios culturais e segundo uma corrente internacional, novos olhares
foram lançados para a questão do Patrimônio Cultural.
Foi ao longo da década de 1970, que passamos a enxergar o
patrimônio em seu sentido mais amplo, denominando-o como “Patrimônio
Cultural”, que não só se preocupava com elementos de valor histórico para a
sociedade, mas também englobava elementos que tivessem relação profunda
com a cultura da sociedade, desprendendo-se das amarras de se tombar
apenas artefatos e, assumindo a ideia de que também são patrimônios os
saberes, os modos de fazer – artefatos ou festividades – que possuem valores
simbólicos e afetivos, sendo incorporados pela memória e se perpetuam no
cotidiano como tradições. Essa relação ficará mais clara ao estabelecermos a
relação entre patrimônio e identidade.
Seguindo as Cartas Patrimoniais, em 1981, surgem as “Diretrizes para
Operacionalização da Política Cultural do MEC – Ministério da Educação e
Cultura”, que englobava noções mais ampliadas de patrimônio, assinalando
que os bens de natureza imaterial eram tão relevantes para a construção da
identidade nacional quanto os de natureza material.
Em nossa trajetória política, a Constituição Federal de 1988, em seu
artigo 216, já assinalava para uma abertura maior na visão de patrimônio, já
que estabeleceu o que se entenderia, a partir de então, como Patrimônio
Cultural brasileiro:
21
A lei nº 3924, de 26 de julho de 1961, dispõe sobre os monumentos arqueológicos e pré -
históricos. A lei nº 8394, de 30 de dezembro de 1991, regulamentada pelo Decreto nº 3444, de
26 de agosto de 2002, dispõe sobre a preservaç ão, organização e proteção dos acervos
documentais privados dos presidentes da República;
52
Nesse momento já começou a se desenhar uma política diferenciada
com relação ao Patrimônio Cultural, assinalando para o entendimento de que
22
A Conferência de Nara ocorreu em 06 de novembro de 1994, na cidade de Nara, Japão, e
trata da convenção do P atrimônio Mundial, levando em consideração a diversidade cultural e
de patrimônios, tocando em pontos como a identidade cultural, a memória coletiva e sobre a
intangibilidade e imaterialidade de alguns patrimônios.
53
O termo “intangíveis” nos possibilita encaixar quase todos os
elementos da vida humana como patrimônios culturais: os modos de fazer
artefatos, as festas, os contos populares, os mitos, expressões religiosas, as
paisagens, desde que tenham uma forte relação com a cultura da sociedade.
Ressaltamos que muitos desses bens poderiam se perder das tradições, da
memória, porque não deixaram vestígios materiais, não sendo considerados
importantes/relevantes (FONSECA, 2009, p. 61). Daí percebemos claramente a
necessidade que tínhamos em ampliar o conceito: preservar nossas próprias
memórias.
Houve a inclusão das “sociedades folcloristas, os movimentos negros e
de defesa dos direitos dos indígenas, as reivindicações de grupos
descendentes” (FONSECA, 2009, p. 61) que até então não ganhavam o devido
destaque como membros formadores da cultura e da identidade nacionais.
De maneira geral as políticas públicas que se direcionam para o
Patrimônio Cultural no Brasil e que são mediadas pelo IPHAN, se relacionam
intimamente com a questão da identidade nacional dentro dos projetos políticos
de cada governo que se sucedem no poder (FUNARI, p. 47), mas ainda que
essas influências políticas sejam fortes, a partir dos anos 2000, a experiência
patrimonial no país tem sido realizada em sua maneira mais ampla.
O que vemos são ações sintonizadas com os diversos grupos que
compõem nosso Estado e que levam em conta conhecimentos antropológicos,
sociológicos, históricos, artísticos e arqueológicos. A implementação das
políticas de preservação patrimonial têm se importado muito mais com as
questões da comunidade que detém o bem, num processo democrático e
relacionado com a identidade do grupo – o que a comunidade quer preservar, o
que ela entende como elemento que a compõe e representa.
Ao observarmos a trajetória das políticas públicas relativas ao
Patrimônio Cultural no Brasil, vemos momentos de grandes avanços, outros de
retrocesso, mas, além disso, vemos um caminhar. Acompanhar a linha de
desenvolvimento de nossas políticas preservacionistas é, antes de tudo, notar
como o avanço no que tange a compreensão do conceito de Patrimônio se
deu. Encontramos hoje no mesmo caminho que grandes nações europeias –
fonte de nossas inspirações – no trato com os patrimônios, enquadrando-nos
no grupo dos detentores de patrimônio culturais da humanidade.
54
Desde nossa formação, recuando até o período de nossa colonização,
fomos marcados pelas desigualdades sociais que se refletiram em toda nossa
história política e social. A segregação urbana, a falta de inclusão social, as
marcas de um longo período de escravidão e de políticas econômicas que nos
deixaram economicamente dependentes, lançaram-nos grandes desafios a
serem superados, inclusive em nossas políticas patrimoniais.
Em aproximadamente 75 anos de políticas públicas tratando dos
nossos bens patrimoniais foi possível, a partir das últimas décadas, buscar um
reconhecimento de nossas raízes, fazer a valorização do outro, que
historicamente era desvalorizado, excluído. Procuramos estabelecer os laços
com aquilo que representa a nossa identidade e, por isso, a atuação dos
primeiros modernistas, que embora tivessem uma visão mais padronizada do
Patrimônio Cultural, nos ensinaram o caminho do reconhecimento, nos
apontando que era necessário nos descobrirmos, nos conhecermos para,
então, nos valorizar.
55
2.4. Identidade: As marcas de uma Sociedade
56
a existência da identidade, que é um exercício de escolhas, de construção de si
mesmo a partir de uma gama de possibilidades que se estendem diante de
cada indivíduo em sociedades tão plurais quanto as que conhecemos hoje.
57
Há aqui, como salienta Woodward (2011, p. 12) uma redescoberta do
passado que é parte do processo de construção da identidade. Elas são
fixadas a partir de nossas escolhas, pautadas em nossas atividades culturais e
em nossos exercícios de memória que nos permite, entre outras coisas,
distinguir quais serão os nossos princípios, os nossos valores e os traços que
marcarão o nosso grupo. Memória e identidade estão interligados, desse
cruzamento, múltiplas possibilidades poderão se abrir para uma produção de
um imaginário histórico-cultural (SANTOS, 2004, p. 59).
As identidades indicam uma invocação de uma origem da qual elas
continuam sendo fiéis, adaptando-se apenas em situações cuja manutenção do
grupo exige, estando, então, ligadas ao meio de como esses grupos usam os
recursos da história, da linguagem e da cultura para a produção não daquilo
que nós somos, mas daquilo no qual nos tornamos (HALL, 1997, p. 109).
Woodward nos dá elementos que nos permitem traçar características
básicas das identidades: concordando com Hall, a autora nos diz que a
identidade está ligada a um sistema de representações e que se encontra na
base da estruturação de grupos sociais, como um reforço das práticas de
memória que eles exercem, citando Rurtherford:
59
Entendemos que a identidade se constrói a partir do conhecimento dos
meios como os grupos sociais se organizaram no passado, como se
comportam diante das situações do presente , sendo fruto da cultura, moldada
por ela, mas também capaz de promover a ação inversa: a partir das
afirmações de identidade, alterar-se padrões culturais, já que o movimento
entre elas é dialógico.
Através das balizas construídas que construirão a identidade do
indivíduo é possível cada ente do grupo se reconhecer nele e possa nutrir um
sentimento de pertença. A construção da identidade é ao mesmo tempo um
exercício de memória, de olhar para o passado, e de afirmação que pode ser
materializado nos Patrimônios Culturais.
60
2.5. Memória: Relações entre o Passado e o Presente
61
Orrico (2002). Nessa crise, o desaparecimento de referências e a diluição das
identidades, processo naturalizado pela globalização de acordo com Hall
(1997), leva os homens a buscar as suas memórias como uma resposta às
identidades frágeis (CANDAU, 2011, p. 10) que eles temem perder por
completo.
A partir de então, podemos estabelecer que a relação memória e
esquecimento (amnésia), que no senso comum são colocados como termos
mutuamente excludentes, deve ser vista a partir de uma complementaridade
complexa, pois os mesmos processos sociais que formam um, formam outro
(POLLACK, 1989; HALBWACHS, 2004). Também Le Goff (2006, p. 422) nos
mostra que
62
nos marcaram, ela está em constante processo de constituição de nossa
identidade e de reavivamento dela, podendo, ainda, assumir um papel de
“geradora” da identidade, como aponta Candau:
63
como sendo os maiores professores da sociedade. Na relação do homem com
sua memória encontramos o patrimônio, especialmente os patrimônios
intangíveis, os saberes dos povos, as festas e tradições passadas oralmente
para o seu grupo social.
Retornando à ideia de que a memória está ligada ao esquecimento,
que pode ser provocado ou não, o homem pode se valer de suportes artificiais
que o faça ter essa memória sempre reavivada. É nesse momento que os
Patrimônios Culturais ganham espaço como lugares de memória que exigem
conservação, preservação, mas que cumprem o seu papel como elementos
resguardadores da memória.
Para Nora (1993), é o sentimento de não saber o que será no futuro
que faz com que o homem busque esses suportes artificiais de memória. O
autor define os lugares de memória como sendo mais do que a materialidade
das edificações:
64
representações são escolhidas por membros determinados que elegem os
elementos que, supostamente, dizem respeito a todos os indivíduos e são
imbricados de sentidos e valores remetidos à coletividade. Chamamos a
atenção para a importância dos valores atribuídos aos lugares de memória, já
que para confirmar ou recordar uma lembrança, não são necessários
testemunhos no sentido literal da palavra, ou seja, indivíduos presentes sob
uma forma material e sensível (HALBWACHS, 2006, p.31), apenas os
sentimentos que eles despertam.
Para que esses elementos de memória coletiva tenham efeito,
Halbwachs continua nos apresentando as condições necessárias:
65
a história é um discurso mutável e problemático – ostensivamente
a respeito de um aspecto do mundo, o passado –, produzido por
um grupo de trabalhadores cujas mentes são de nosso tempo (em
grande maioria, em nossa cultura, historiadores assalariados) e
que fazem seu trabalho em modalidades mutuamente
reconhecíveis que são posicionadas epistemológica, ideológica e
praticamente; e cujos produtos, uma vez em circulação, estão
sujeitos a uma série de usos e abusos logicamente infinitos mas
que, na realidade, correspondem a uma variedade de bases de
poder existentes em qualquer momento que for considerado, as
quais estruturam e distribuem os significados das histórias ao
longo de um espectro que vai do dominante ao marginal (JEKINS
apud CARDOSO; VAINFAS, 1997. p. 15).
66
documentos escritos, é preciso que depois no esqueçamos de tê-
lo feito” (ORWELL, 1983 apud ROSSI, 2010, p.34).
67
2.6. Pluralidade Cultural: A Diversidade em Foco
68
públicas se voltaram para a busca de pontos em comum capazes de formar a
identidade cultural.
Legisladores e intelectuais (BAUMAN) elencaram as representações
que foram definidas como os símbolos nacionais e procuraram meios de se
socializar esses elementos, de modo que os brasileiros se sentissem indivíduos
integrados à nação, sendo indissociáveis de seu país. Pouco se falava da
diversidade cultural nesse momento. Como a maioria das sociedades
contemporâneas, o Brasil baseou-se em documentos internacionais para
estruturar as suas políticas nacionais e promoveu uma sociedade fortemente
hierarquizada, ao mesmo tempo em que afirmava a igualdade de direitos civis
(TOURAINE, 1998, p.11).
A lógica para se construir uma identidade nacional é a de, mesmo em
meio a tanta diversidade, levantar traços específicos, singulares que agreguem
os indivíduos de modo que eles possam fazer parte de uma unidade, tarefa que
contou, na década de 1920, com o movimento antropofágico de Oswald de
Andrade que buscou mostrar a diversidade e a pluralidade cultural do país.
Nesse sentido, a UNESCO busca fomentar nas nações, atividades que
promovam o encontro desses pontos de entrosamento para que a identidade
nacional tenha um elo entre todos os indivíduos que pertençam à nação, mas
sem esquecer que cada indivíduo tem a sua cultura de grupo que precede essa
unidade nacional.
Ao levantarmos as discussões acerca da pluralidade cultural, estamos
levando em conta que ela carrega em si um acúmulo de experiências que os
homens tiveram e que se torna o seu maior legado, já que transmitem as
diferentes maneiras de existir socialmente desenvolvidas pelas sociedades. A
diversidade cultural trata das diferenças culturais que existem entre as
comunidades e está diretamente ligada ao processo associativo dos homens:
aqueles que possuem algo em comum tendem a se associar e a promover
seus costumes entre os seus, perpetuando-se, mantendo as suas diferenças
diante de outros grupos.
O termo diversidade nos remete à variedade e convivência de ideias,
costumes, elementos diferentes que fazem parte de um mesmo tema, de um
mesmo assunto.
69
A cultura já diz respeito a como o homem interage com a sua própria
organização social no espaço e no tempo, às suas instituições, regras, ao
arranjo que se dá aos elementos que são tidos como comuns ao grupo e que
devem ser transmitidos à identidade do grupo.
A UNESCO hoje aponta a diversidade cultural como uma grande
riqueza da humanidade, sendo vital para a sobrevivência e manutenção das
sociedades humanas.
Ao tomarmos o Brasil como ponto de análise cultural percebemos que
a sua pluralidade vem desde o momento de sua colonização e da
miscigenação de tantos grupos sociais, mas dois pontos em comum fomentam
a nossa unidade: nossa língua e nossa religião majoritária, o português e o
cristianismo, respectivamente
Por mais que nossa matriz cultural principal tenha sido lusitana, os
outros grupos étnicos nos marcam profundamente, com destaque para a
cultura indígena, a cultura africana e outros grupos europeus como os italianos,
alemães e japoneses que deixaram seus empréstimos culturais em nossa
língua, música, culinária, folclore, artesanato, festas populares.
Cada região brasileira recebeu mais ou menos influências desses
grupos, mas elas são sempre presentes, fazendo com que o desafio da
pluralidade cultural no Brasil seja a de respeitar esses diferentes grupos sociais
e culturas que compõem a nossa cultura através de incentivos para a
convivência dessas culturas, apontando -as como fator enriquecedor, fazendo
com que haja uma valorização da identidade cultural nacional e regional.
Dentro do grande tema da pluralidade cultural, podemos suscitar
discussões que sejam relevantes para entendê-la e para levantar meios de
uma convivência mais integrada com todos os elementos dessa diversidade
como o racismo, a questão indígena, a imigração, a diversidade religiosa. Por
70
se tratar de um tema tão rico, a pluralidade cultural é um dos temas
transversais proposto pelos PCN e que nas áreas de História e Geografia
podemos encontrar as bases para levantar, também, as discussões sobre o
Patrimônio Cultural e a própria Educação Patrimonial.
Vivemos em um mundo globalizado em que, de acordo com Hall (1997)
há um impulso por pulverizar as identidades, em uma tentativa de se ter uma
sociedade homogênea, mas os aspectos locais ganham cada vez mais força,
mantendo-se resistentes e vivos.
A questão de trabalhar com a pluralidade cultural e a diversidade está
em destacar a riqueza que ela representa, tornando o conhecimento como o
nosso maior bem e que esse legado deve ser usado para promover uma
melhoria na condição de vida das comunidades seguindo as determinações
das Cartas Patrimoniais24 no que tange o trato com os patrimônios e a sua
relação com a comunidade (CARTA DE VENEZA, 1964; NORMAS DE QUITO,
1967; RECOMENDAÇÃO DE PARIS, 1968; DECLARAÇÃO DE ESTOCOLMO,
1972; CARTA DE TURISMO CULTURAL, 1976) e a sua inclusão direta com a
educação formal e informal (COMPROMISSO DE BRASÍLIA 1970;
COMPROMISSO DE SALVADOR, 1970; RECOMENDAÇÃO DE SÃO
DOMINGOS, 1974; DECLARAÇÃO DE AMSTERDÃ, 1975; MANISFESTO DE
AMSTERDÃ, 1975) para que a própria comunidade tenha consciência de sua
importância no processo de produção, conservação, preservação e promoção
de seus patrimônios culturais, que são a representação de sua cultura.
Com relação à educação brasileira encontramos a questão da
diversidade e do pluralismo cultural presentes na Constituição Federal (1988),
na LDBEN (1996) e nos PCN (1997).
Para nós, ao nos reconhecermos e firmarmos nossa identidade através
de nossas práticas de memória, somos capazes de perceber a diversidade e a
pluralidade que nos cerca. Nesse momento, estamos prontos para nos
colocarmos como cidadãos críticos e atuantes, especialmente em espaços que
possibilitem discussões, estando aptos a exercer nossa cidadania. Esse
sentimento nos leva a compreender os processos que estão à nossa volta e,
quando são aliados a uma educação de qualidade, que inclua em seus temas a
24
Sobre as Cartas Patrimoniais observe os quadros das páginas 90 -95 deste trabalho.
71
Educação Patrimonial envolvida com a diversidade e a pluralidade cultural,
seremos capazes de nos enxergamos no nosso patrimônio.
72
3. Conhecer para Preservar: A Educação Patrimonial
como Alternativa Fundamental de Preservação
73
como “o país do futebol e do carnaval” do que com bens mais próximos aos
indivíduos em suas comunidades.
Estabelecer essa relação de (re)conhecimento é um dos objetivos da
Educação Patrimonial, que ganhou força diante de problemas que ameaçavam
a vida no planeta, espalhando -se por diversos países, como nos aponta
Pelegrini:
74
legislação já se preocupasse com o Patrimônio Histórico, voltado para
interesses do Estado, como veremos adiante, só nos finais da década de 1980
é que, de fato, as Cartas Patrimoniais tiverem parte de suas determinações
englobadas em nossa Carta Magna.
No que tange a Europa, desde 1931, com a Carta de Atenas, notava-se
um esforço para que os professores e educadores, de um modo geral,
levassem seus alunos a compreender a importância dos monumentos a fim de
que esses não fossem destruídos. Em 1975, com a Declaração de Amsterdã,
abriu-se a discussão para que a educação dos jovens fossem direcionadas de
modo a envolvê-los nas atividades de proteção dos patrimônios.
De fato, foi em 1987, com a Carta Internacional para a Salvaguarda
das Cidades Históricas que o campo da educação foi mais tocado no que tange
às suas relações com o patrimônio, pois o documento orientava a
implementação de projetos que visassem a informação e divulgação dos bens
desde a idade escolar.
Temos que a Educação Patrimonial é o resultado da ampliação dos
debates sobre o Patrimônio Cultural e os rumos que ele tomaria ao longo dos
anos, percebendo-se que para além das políticas públicas é necessário
envolver e sensibilizar a comunidade. O desafio da Educação Patrimonial
enquanto metodologia de trabalho é justamente fazer a ligação entre os
documentos oficiais, as políticas públicas, os pareceres especializados e a
comunidade, de modo eficiente.
Perceber que o processo de preservação deve se pautar tanto nas
técnicas científicas quanto nos conhecimentos que a comunidade que detém o
bem sugere um tom de troca, de colaboração, de mão dupla de concepção
educacional.
Efetivamente podemos definir a Educação Patrimonial como um
75
Cabe à Educação Patrimonial buscar meios de mostrar ao indivíduo
que ele é um elemento importante na formação, preservação e perpetuação do
bem em questão, em um processo que Horta (1999) denomina “alfabetização
cultural”.
Esse processo de alfabetização visa apontar elementos que
possibilitem entender e compreender a grande diversidade cultural existente no
mundo através da estimulação do autoconhecimento por exercícios
historiográficos que partem do objeto mais próximo, mais real, mais presente
no cotidiano para voltar às origens da comunidade e (re)descobrir os vários
grupos envolvidos na formação das tradições perpetuadas, das festas típicas,
dos costumes, da identidade local e seus elementos culturais mais marcados.
A Educação Patrimonial levanta a discussão sobre o “Patrimônio Vivo”
(HORTA, 1999), como fruto da dinâmica da cultura, lidando com os patrimônios
materiais e imateriais, salientando o entendimento de que a cultura é um
sistema que ao mesmo tempo atua no coletivo, mas fortalece o individual, já
que como Geertz (1978) aponta , ela é uma teia de significados construída pelo
próprio homem e para as suas gerações futuras.
Despertar a curiosidade do homem e , através dela, promover e
estimular o conhecimento, fazendo surgir novos olhares sobre o Patrimônio
Cultural é, portanto, uma das atividades da Educação Patrimonial agindo de
modo a
76
indivíduos nos trabalhos até a mostra dos resultados obtidos com as atividades
e pesquisas, construindo a investigação e servindo de pontapé inicial para
levantar conhecimentos primários que levarão a pesquisas maiores que se
entrelaçam nas diversas áreas, contribuindo, então para a transversalidade.
Não podemos deixar de destacar que a memória é um dos pontos
muito tocados pela Educação Patrimonial. Uma vez que todo trabalho se pauta
no trato de ações que orientam as vidas dos grupos sociais, logo, estamos
lidando diretamente com a questão da memória como agente capaz de induzir
– ou não – o estabelecimento dos Patrimônios Culturais ora através da
valorização de interesses de determinados grupos, ora através do
esquecimento de valores. Essa função da memória se dá através de forças
políticas necessárias, entre outras coisas, para a formação e manutenção dos
Estados Nacionais e para a formação das identidades e reforço das
características dos grupos sociais, cabendo à Educação Patrimo nial suscitar
esses debates.
Romper os tabus relacionados ao Patrimônio Cultural também é um
objetivo da Educação Patrimonial. Acentuar a diferença entre o Tombamento e
o Registro, ressaltar que os bens imóveis podem ter as suas funções sociais
alteradas ao longo de sua existência de acordo com as determinações das
Cartas Patrimoniais que sugerem que eles sejam incorporados ao cotidiano
das comunidades, além de se buscar meios para a sustentabilidade são
elementos fundamentais para que a sociedade entenda a importância e a
dinâmica dos Patrimônios e sua constituição.
Diante do exposto, não podemos deixar de destacar que a Educação
Patrimonial aparece como diretriz nas Cartas Patrimoniais desde 1931, com a
Carta de Atenas, e que figura nas documentações mais atuais, visando
adequar as situações locais às demandas sociais, econômicas e naturais que
se fazem necessárias ao longo dos anos.
Desde os primórdios de sua concepção, a Educação Patrimonial foi
pensada pelas instituições internacionais como uma linha de trabalho voltada
para toda a sociedade e envolvendo a educação em todos níveis (CARTA DE
ATENAS, 1931; DECLARAÇÃO DE AMSTERDÃ, 1975) de modo a promover a
sensibilização e a valorização dos bens patrimoniais no seio das comunidades,
tendo como meio de sua disseminação especialmente os espaços escolares.
77
Essa realidade não foi muito bem assimilada no Brasil, onde,
inicialmente, as metodologias aplicadas de maneira mais eficaz se
desenvolveram dentro dos espaços museais.
Em 1983, ao apresentar o 1º Seminário do Museu Imperial de
Petrópolis – MIP – (HORTA, 1999) fica claro que essa instituição, sob
orientação de trabalhos desenvolvidos na Inglaterra, faz uma adaptação das
práticas da Heritage Education para a aplicação nos museus brasileiros. O
trabalho apresentado pela equipe do MIP foi seguido por diversos outros
museus tendo como sua representante maior sua diretora Maria de Lourdes
Parreiras Horta, uma das maiores estudiosas de Educação Patrimonial no país.
Por mais que as diretrizes apontassem para que as discussões sobre o
Patrimônio chegassem às escolas, ou antes, partissem delas, e fizessem uma
ligação com a própria história local a fim de se colocar o processo de
valorização, aceitação, sensibilização e escolha dos bens como atividades
propriamente ditas da comunidade que deve se reconhecer nos bens, no
Brasil, ainda reservamos esses debates para os locais ditos de memória
(NORA, 1989), principalmente os museus, por mais que os temas tenham sido
abordados nas escolas como veremos adiante.
O esforço desse rompimento de paradigmas da relação da sociedade
com os Patrimônios Culturais e os ambientes reservados para eles também faz
parte das funções da Educação Patrimonial.
Dessa forma, concluímos que a Educação Patrimonial pode ocorrer de
maneira formal e informal e que “constitui uma prática educativa e social que
visa à organização de estudos e atividades pedagógicas interdisciplinares e
transdiciplinares” (PELEGRINI, 2009, p. 36) e cujos objetivos são, sobretudo,
“superar a excessiva fragmentação e linearidade dos currículos escolares” e
“adquirir uma visão mais compreensiva e crítica da realidade” (PELEGRINI,
2009, p.36), bem como a sua inserção e participação nessa realidade.
Essas características componentes da Educação Patrimonial faz com
que ela seja, então, entendida como uma estratégia fundamental para a
transmissão dos valores atribuídos aos bens culturais.
78
3.1. A Trajetória da Educação Patrimonial nas Cartas
Patrimoniais e suas Relações com as Constituições Federais e
os Planos de Salvaguarda no Brasil
79
Destacamos a questão da diversidade cultural e da necessidade de se
levantar o debate sobre o Patrimônio Cultural porque este trata de uma
representação cultural repleta de disputas e tensões políticas, sociais e
economias que precisam ser entendidas quando se discute a identidade
nacional e local.
Os Documentos Patrimoniais25 tratam da educação formal, nas redes
de ensino, como protagonista no que tange às discussões sobre o Patrimônio
Cultural, especialmente como agentes no processo preservacionista . Esse
caráter foi influenciador direto das políticas públicas brasileiras voltadas para a
Educação, sendo notado tanto na nossa Constituição Federal, de 1988, até em
programas elaborados diretamente para o trato com o Patrimônio Cultural.
Ao longo das Cartas vamos percebendo uma ampliação de seus
conceitos, que passaram a englobar aspectos naturais, arqueológicos e da
vivência humana. Os textos resultam sempre de um encontro técnico-científico
da área, o que lhes confere autoridade para referenciar conteúdos na
preservação. Elas refletem o momento teórico, o que se pensava a respeito do
patrimônio, no decorrer das épocas.
O primeiro ato normativo internacional que dispôs especificamente
sobre o Patrimônio Cultural e a importância da Educação para a sua
preservação foi escrito em 1931, conhecido como Carta de Atenas. Esse
documento assinala a importância da Educação no processo de compreensão
e valorização dos objetos culturais, vinculando-a como fundamental no
processo de preservação destes.
A pauta principal da Carta de Atenas era a “longevidade dos
monumentos históricos susceptíveis de ameaça externa” (SIM, s.d., p.01),
tratando exclusivamente de conservação preventiva e restauro dos bens
patrimoniais, o documento enfatiza o papel da educação nesse processo
quando recomenda que
25
Diana Farjalla Correia Lima (apud LIMA. COS TA, 2007, p.09) trata o conjunto dos
instrumentos normativos da UNESCO (Recomendações, Convenções e Declaraç ões), junto a
outros documentos que precederam a criação da ONU (Cartas e Compromissos), com a
designação de Documentos Patrimoniais, “cobrindo um período de atividades iniciado pelo
surgimento do primeiro documento, a Carta de Atenas de 1931” (LIMA; COS TA, 2007, p.09).
80
os educadores habituem a infância e a juventude a se absterem
de danificar os monumentos, quaisquer que eles sejam e lhes
façam aumentar o interesse, de uma maneira geral, pela proteção
dos testemunhos de toda civilização (CARTA DE ATENAS, 1931,
p. 04).
82
a autoridade competente deveria empreender uma ação educativa
para despertar e desenvolver o respeito e a estima ao passado,
especialmente através do ensino de História, e da participação de
estudantes em determinadas pesquisas (MINC, 2006, p.208).
83
onde cada Estado membro deveria agir de modo a estimular e
desenvolver entre seus cidadãos o interesse e o respeito pelo
Patrimônio Cultural de todas as nações. Tal ação deveria ser
empreendida pelos serviços educativos (RECOMENDAÇÃO DE
PARIS, 1964, p. 1).
26
Aqui atentamos para o que fala o antropólogo Luiz Gonzaga de Mello a respeito da cultura.
Para ele o uso popular do termo é quase sempre usado como menção à superioridade social
entre as classes urbanas (e também rurais), como meios de se reafirmar a hierarquia entre
elas. Lembra que “nas acepç ões técnicas do termo, jamais o antropólogo poderá diz er que
uma cult ura é superior a outra. O que se pode dizer é que determinada cultura dispõe de uma
tecnologia avançada ou determinada instituição sofisticada é desenvolvida. Isso em virtude de
cada cultura ser o melhor, o máximo legado deixado pelas gerações anteriores” (ME LLO, 2009,
p.46).
84
exclusivos de minorias eruditas para se tornarem mais abertas, de livre fruição
da maioria popular (NORMAS DE QUITO, 1967).
Ressaltamos que nos países da América Latina, como o Brasil que
estava imerso em uma ditadura militar, após 1964, a Educação Cívica mostrou-
se ineficiente no quesito a lidar com os Patrimônios Culturais, sendo, na
maioria das vezes, veículo de disseminação dos ideais autoritários do Estado
Militar.
Nesse mesmo ano de 1967, no Brasil, o Ministério da Educação
incorporou a responsabilidade do magistério no âmbito da cultura, do
patrimônio histórico, arqueológico, científico e artístico pelo decreto-lei nº.
200/1967 (PELEGRINI, 2009, p. 101).
O debate voltou para o cenário europeu em 1968, com a
Recomendação de Paris de Obras Públicas ou Privadas, que deliberava sobre
os meios de intervenções urbanas voltadas para a preservação do Patrimônio
Cultural. Esse documento propunha uma vinculação com a população,
deixando ao Estado a função de contribuir para fortalecer tais sentimentos
através de medidas adequadas (RECOMENDAÇÃO DE PARIS, 1968, p.02).
Mais uma vez a necessidade de se aproximar a comunidade das ações
relativas ao Patrimônio Cultural esteve presente, sinalizadas no texto original
através das “medidas adequadas” que podem ser entendidas como medidas
educacionais, especialmente se observarmos os documentos editados
anteriormente.
Foi indicado pela UNESCO aos Estados membros que se elaborassem
planejamentos e programas de educação e desenvolvimento do turismo e que
os órgãos responsáveis por esses setores fossem informados das
determinações.
A Recomendação de Paris de 1968, foi o documento que deixou mais
clara a responsabilidade dos Estados, seus ministérios e secretarias para a
educação e sua relação com o Patrimônio Cultural, deslocando a
responsabilidade de seu cuidado, preservação e promoção não só nas mãos
dos gestores, mas atribuindo aos educadores uma parcela importante dessa
tarefa.
O documento previa como um viés de preservação e salvamento dos
Patrimônios Culturais a criação e o desenvolvimento de programas
85
educacionais que deveriam ao mesmo tempo envolver as comunidades
promovendo o conhecimento e a valorização de seus bens patrimoniais, além
de tentar promover ações do campo do turismo.
No ano de 1970, no Brasil ainda sob a égide militar, acontece o 1º
Encontro dos Governadores de Estado, Secretários Estaduais da Área da
Cultura, Prefeitos de Municípios Interessados, Presidentes e Representantes
de Instituições Culturais, no qual surgiu o Compromisso de Brasília.
O documento versava especialmente sobre os cuidados relativos ao
Patrimônio Cultural brasileiro e previa a criação de cursos superiores voltados à
preservação dos bens culturais (CALDEIRA, 2010, p.98) e a sistematização
dos entes federados de modo descentralizado, que mais tarde daria margem
para o artigo 30 da Constituição de 1988 (SANTOS, 2001, p.44).
A partir desse documento foi pensado um programa educacional
abrangente que chegasse a todo o território nacional e no qual o culto ao
passado seria elemento básico da formação da consciência nacional
(COMPROMISSO DE BRASÍLIA, 1970, p. 02). Neste programa deveriam ser
incluídas disciplinas que levassem em conta o Patrimônio Cultural brasileiro e
deveria alcançar todos os níveis de ensino.
Como traço do governo ditatorial nacional, o programa educacional
brasileiro voltado para o Patrimônio Cultural teve o nacionalismo exacerbado e
aproveitou a disciplina de Educação Moral e Cívica, que de acordo com Menin:
86
preocupação estatal com a preservação patrimonial, já que o tema era
abordado, por mais que se apontem deficiências.
Em 1971, para reafirmar o Compromisso de Brasília, foi redigido o
Compromisso de Salvador, mais amplo, já que abrangia em suas discussões
temas referentes ao Patrimônio Histórico, Artístico, Natural e Arqueológico
nacional. O Compromisso de Salvador recomendava, entre outras demandas,
27
Armelin nos coloca que “enquanto o Patrimônio Natural é a gar antia de sobrevivência física
da humanidade, que necessita do ecossistema – água, ar e alimentos – para viver, o
Patrimônio Cultural é a garantia de sobrevivência social dos povos, porque é produto e
testemunho de sua vida” (A RMELIN, 2009, p. 48). S alient amos aqui a diferença entre a
Educação Ambiental e a Educaç ão Patrimonial, pois embora ambas tratem de cuidar da
preservação, conhecimento e promoção do que entendemos como Patrimônio Cultural, cada
uma tem a sua especificidade, o seu foco central, as suas metodologias de trabalho.
87
indispensável um trabalho de educação em questões ambientais
[...], dando atenção especial às populações menos privilegiadas, a
fim de criar as bases de uma opinião pública bem informada e de
uma conduta responsável dos indivíduos (DECLARAÇÃO DE
ESTOCOLMO, 1972, 03).
88
o patrimônio construído que não pode ser restrito a edifícios de
qualidade excepcional e área circunvizinha, deve ser estendido
aos núcleos urbanos e cidades de interesse histórico e cultural. A
conservação e a reabilitação dessas áreas passam a ser
consideradas objetivos fundamentais dentro do processo de
planejamento urbano e, para tal, recomenda-se expressamente
que tais ações não devem alterar de forma significativa a
composição do perfil social dos residentes locais (GERALDES,
2004, p. 07).
89
Em 1982, publicou-se a Declaração de Nairóbi, na qual se reconhecia a
urgência de se intensificar os esforços no sentido da preservação dos
patrimônios culturais e especialmente os naturais, influenciados pela rápida
degradação dos espaços naturais considerados patrimônios. Esse documento
conversava diretamente com a Carta de Estocolmo, não tratando apenas dos
bens naturais, mas pautando a sua preservação e conservação em questões
culturais e ligadas à educação.
Destacamos que em 1983, no Brasil, realizou-se o 1º Seminário no
Museu Imperial de Petrópolis que adaptava as ações da Heritage Education às
realidades das instituições museológicas nacionais, inserido o país nas
questões referentes à Educação Patrimonial em espaços não formais de
educação.
A Declaração do México, de 1985, resultou dos trabalhos do ICOMOS.
Nesse texto entendeu-se “a educação e a cultura, cujo significado e alcance
tem se ampliado consideravelmente, são essenciais para um verdadeiro
desenvolvimento do indivíduo e da sociedade” (DECLARAÇÃO DO MÉXICO,
1985, p. 01).
Ao observarmos o texto completo notamos que a educação é
relacionada ao desenvolvimento das nações, levando à melhoria da qualidade
de vida, dialogando com as Normas de Quito (1967), que previa, através da
educação, favorecer meios de se explorar os bens de modo a promover a sua
sustentabilidade e a melhoria da vida da comunidade. Esse documento
também se vincula à Declaração Universal dos Direitos do Homem quando
reforça a ideia de que educação e cultura são inalienáveis aos homens.
Em 1986, escreveu-se a Carta de Washington, que complementava o
texto da Carta de Veneza (1964), tratando das cidades históricas como
representação de diversas culturas, trazendo também a noção de bairros
históricos. Esse documento salientava que todos os espaços urbanos são
produtores de cultura, mas que as cidades históricas apresentavam algumas
especificidades.
Essa afirmação de que todos os espaços são efervescências se fazia
necessária porque a maioria dos cidadãos moradores de cidades não
tombadas não se via como moradores de regiões produtoras de cultura.
90
Com tantas documentações sobre o Patrimônio Cultural e a sua ligação
direta com a educação formal sendo debatidos no cenário internacional e
nacional, no Brasil, em 1988, entrou em vigor uma nova Constituição Federal,
destacada por ser mais democrática e fortemente influenciada por essas
políticas internacionais no que diz respeito ao Patrimônio Cultural e ao seu
cuidado.
Os artigos 215 e 216 são os mais marcados pelas influê ncias
internacionais e tratam diretamente do Patrimônio Cultural e da cultura. O
artigo 225 ainda apresenta elementos que tratam da Educação Ambiental,
também encaixada como uma metodologia de Educação Patrimonial, já que os
Patrimônios Ambientais e Naturais foram englobados ao longo dos anos no
debate de preservação, conservação e promoção.
O fato de termos sido influenciados pelas políticas internacionais não
quer dizer que a valorização que atribuímos às relações entre Patrimônio
Cultural e educação foi a mesma.
Notadamente, em nosso país a Educação Patrimonial, ao final dos
governos ditatoriais, com a extinção da disciplina de Moral e Cívica e a
reelaboração de novas diretrizes para a educação nacional, foi tratada muito
mais como assunto relevante para os espaços não escolares de formação do
que no seio das escolas. Vivemos uma depreciação e uma secundarização no
papel da Educação Patrimonial nos espaços formais de educação, deixando
para eles apenas diretrizes que assinalam para o seu enfoque através de
temas transversais nos PCN.
No Brasil, mesmo com a Carta de Fortaleza, em 1997, que indicava a
preservação como tema a ser abordado de maneira global, através da qual
assinalou-se a necessidade e relevância de um programa nacional para a
Educação Patrimonial, nossa realidade não mudou.
91
Nos centros históricos tombados pelo IPHAN foram desenvolvidas
dezenas de atividades extracurriculares e interdisciplinares que visavam ao
reconhecimento de referências culturais no âmbito regional e nacional
(PELEGRINI, 2009, p.101), mas foram atividades segmentadas e sem
continuidade, distanciadas do espaço escolar.
Nesses espaços reservado à memória, a população brasileira não
circulava tão livremente, pois ainda os caracterizava como espaços de cultura
para a elite, ou seja, os indivíduos ainda estavam inseridos em um ambiente
histórico em que acreditam que o contexto favorecia apenas a elite responsável
pelas primeiras escolhas dos bens patrimonializados ao longo de nossa
história.
Passados pouco mais de 80 anos de debates sobre a Educação
Patrimonial no mundo com organizações internacionais e cerca de 75 anos de
discussões sobre o Patrimônio Cultural no Brasil, percebemos que mesmo com
algum esforço por parte do governo estatal, sobretudo nos períodos em que o
país passava por ditaduras, não há vínculos fortes entre a educação informal e
a educação formal.
As medidas mais conhecidas no país com relação à Educação
Patrimonial se dão em espaços museais e outros não formais de educação,
sendo ainda um tema pouco abordado nas escolas e em seus planejamentos
políticos pedagógicos.
Essas observações nos levam a questionamentos sobre as aplicações
das determinações das Cartas Patrimoniais no Brasil: por que apesar de serem
tão claras, as relações estabelecidas entre educação formal e educação
patrimonial não são vinculadas nas nossas escolas? Por que não vemos a
escola como um espaço para discutir o Patrimônio Cultural? Ou ainda, será
que a escola é mesmo um lugar propício para se conhecer, debater e promover
o Patrimônio Cultural?
92
propiciar uma ‘formação mínima para o exercício da cidadania e
para o usufruto do patrimônio cultural da sociedade moderna’
(PELEGRINI, 2009, p. 102).
93
3.2. Escola é Lugar de Patrimônio?
28
Mário de Andrade assumiu, de 1934 a 1938, a direção do Departamento de Cultura da
Prefeitura de São Paulo no governo Armando Sales de Oliveira.
29
A proximidade com o movimento modernista deveu -se, entre outros motivos, ao fato de
Carlos Drummond de Andrade ser o chefe de gabinete do Ministro da Educação, Gustavo
Capanema. Outros intelectuais que participaram do SPHAN foram A fonso Arinos de Melo e
Franc o e Prudente de Moraes Neto como consultores jurídicos; Manuel B andeira, como
colaborador em várias publicaç ões; Gilberto Frey re, Sérgio Buarque de Holanda e muit os
outros de vários estados brasileiros. Colaboraram também especialistas estrangeiros como
Germain Bazin, Robert Smith e Hannah Levy (Fonseca, 2009, p.106).
94
que sejam feitos cursos de aperfeiçoamento e extensão por parte dos
professores e estudantes como meio de fornecer informações acerca do acervo
cultural para conscientização de preservação da memória histórica e interesse
pelo assunto.
Lemos (2004) afirma que existe uma falta de esclarecimento no que se
refere à preservação do Patrimônio. Para ele há uma “deseducação coletiva”
que só será modificada quando surgirem novos projetos educacionais voltados
para essa temática e cita o exemplo do México 30 que é um dos países da
América Latina que desenvolve uma educação de massa voltada para a
valorização do Patrimônio e da memória coletiva.
A preocupação com o Patrimônio Cultural e a sua inserção no sistema
educacional vem aumentando e se tornando tema de diversos congressos no
Brasil, nos quais foram aprovadas resoluções que demonstram essas
inquietações. Diversos autores enxergam na Educação Patrimonial o viés de
ligação e canal de direcionamento para as ações que conjuguem educação
formal e conhecimentos acerca dos patrimônios culturais.
Maria de Lourdes Horta (1999, p.08) coloca que “a Educação
Patrimonial provoca situações de aprendizado à medida que enfatiza uma
necessidade de repensar o passado para compreender o momento atual”.
Essas metodologias de trabalho em educação patrimonial são bastante
abrangentes, uma vez que lidam com projetos multidisciplinares e que,
segundo Monteiro, relacionam-se diretamente com:
30
Com a Declaração do México, em 1985, o país iniciou um processo de educação patrimonial
voltado para a população a fim de que essa se visse integrada aos Patrimônios Culturais
nacionais. Os programas mexicanos, na América Latina, merec em destaque.
95
crítico mais aguçado e de retomar as discussões sobre identidade, cultura,
memória e diversidade.
Para Circe Bittencourt, o que mais chama a atenção e abre
possibilidades para trabalhos enriquecedores no entrelaçamento de temas é
justamente a abrangência da noção de Patrimônio Cultural, cujo
96
a Educação Patrimonial na contemporaneidade vem adquirindo
proeminência e apontando possibilidades de inclusão do cidadão
e do desenvolvimento de economias locais por meio do turismo
cultural e do desenvolvimento sustentável, fortalecendo o
sentimento de pertencimento e de fraternidade entre os membros
de distintas comunidades (PELEGRINI, 2009, p.41),
mas essas atividades raramente têm sido desenvolvidas nas escolas de modo
efetivo ou, pelo menos, consciente por parte dos educadores.
Por mais que os PCN sugiram uma melhor compreensão da realidade
dos alunos, encarando-a como diversificada, múltipla, marcada por conflitos
diversos, tornando-a um emaranhado complexo (ZAMBONI, 1993), o tema
transversal da pluralidade cultural (BRASIL, 1997) integrado às disciplinas de
História e Geografia não dá conta de levar o debate a cabo por uma série de
fatores, entre eles a deficiência da formação dos professores, a falta de tempo
com o número de aulas dessas disciplinas reduzido em favorecimento às
disciplinas de Português e Matemática, por exemplo.
Como alternativa para essa debilidade no trato com os temas do
Patrimônio Cultural temos uma sugestão nos próprios PCN que além de indicar
97
como fazer essa formação através de proje tos, de debates, de aproximação
com as comunidades nas quais está inserida.
Livramo-nos dos modelos em que a educação era tratada como um
instrumento de controle sobre a população, quando, por exemplo, a disciplina
de Educação Moral e Cívica era orientada diretamente pelo Estado para se
formar as bases de nossa identidade com parâmetros autoritários.
Há um crescimento em atividades extracurriculares e extraclasse que
visam proporcionar atividades paralelas com a sala de aula, mas ao mesmo
tempo mais atrativas, desenvolvendo-se projetos e oficinas nas escolas.
Se a escola se reconhece então no papel de formar cidadãos, ela deve
levar em conta as questões do Patrimônio Cultural, já que ao trabalharmos com
a Educação Patrimonial estamos falando do lugar dela na formação de
cidadãos e do papel da escola nessa discussão que já foi apresentada tanto
nos documentos patrimoniais quanto nas legislações nacionais para a
educação.
Ao entendermos o processo educativo, em qualquer área de
ensino/aprendizagem, como tendo o objetivo de levar os alunos a utilizarem
suas capacidades intelectuais para a aquisição e o uso de conceitos e
habilidades, na prática, em sua vida diária e no próprio processo educacional e
que o uso leva à aquisição de novas habilidades e conceitos (HORTA, 2004, p.
03), colocamos a escola como um espaço aberto a discutir as questões do
Patrimônio Cultural, uma vez que ele tem um grande potencial pedagógico
(NORMAS DE QUITO, 1967; DECLARAÇÃO DE AMSTERDÃ, 1975;
MANIFESTO DE AMSTERDÃ, 1975; CARTA DE TURISMO CULTURAL, 1976)
a ser explorado.
Dessa forma, podemos lidar com a escola como um espaço para se
tratar de Patrimônio Cultural, principalmente porque ela própria carrega em sua
essência elementos patrimoniais quando trabalha com linguagens, com
memórias, com culturas diversas.
Por mais que para as nossas escolas não haja propostas para a
inserção do Patrimônio Cultural como objeto específico de estudos, cabe a ela
promover o seu conhecimento por se tratar de um ambiente rico em
diversidade e pluralidade cultural e, principalmente por assumir o seu papel de
formadora de cidadãos.
98
As escolas podem participar do processo de apropriação dos
Patrimônios Culturais seja por meio de projetos, exposições e atividades
organizadas por ela mesma ou por meio da aproximação com os espaços não
formais de educação como sugerido pelos PCN promovendo visitas a museus,
arquivos e bibliotecas (Brasil, 1997).
Para que essa ação tenha bons resultados, então, precisamos dar
valor aos professores enquanto agentes que são os mediadores e peças
fundamentais nesse processo de reconhecimento e preservação. Salientando,
mais uma vez, que eles também constroem e mantêm o Patrimônio Cultural
local e nacional, já que
99
Com uma visão mais ampla sobre as realidades locais, torna-se
possível a construção da mudança no modo em que concebemos o patrimônio,
livrando-o do estigma de que patrimônio se resume apenas nas velhas
edificações, uma vez que “é possível alterar a compreensão e o conhecimento
que se possui sobre o passado, a partir das questões pensadas no presente”
(ANDRADE, 2010, p.74) e nesse momento aliamos o uso das narrativas
referentes à história e à memória sobre o próprio patrimônio e suscitando a
importância dele no processo identitário da sociedade.
Quando trabalhamos com as noções de patrimônio, percebemos que o
homem sempre busca orientar-se através de espaços, pessoas, objetos, ideias,
imagens, tendo a necessidade de criar um sentimento de pertencimento e que
pode ser relembrado só na memória, ou perpetuado em seus patrimônios
materiais ou imateriais, ficando registrados para grupos posteriores.
Acreditamos que a escola é um espaço profícuo para se tratar de
Patrimônio Cultural porque uma sociedade que não respeita e nem valoriza o
seu patrimônio perde as suas referências e, assim, a sua identidade, afinal,
sempre que falamos em patrimônio nos referimos à história, memória e
identidade (OLIVEIRA, 2008, p.114) e, logo concebemos a diversidade como
peça desse mosaico.
Levantamos essas questões sobre o patrimônio, porque através dele
fica mais claro o nosso direito de ter resguardada a memória que é, acima de
outras questões, um instrumento de poder do cidadão, pois quando a
resguardamos estamos resgatando
[...] uma memória que nós gestamos, para além daquela que é
gestada em nós. Aqui não se trata de uma memória
institucionalizada – aquela dos saberes estratificados; e tampouco
de uma contramemória como tentativa de desconstrução de um
passado imposto, mas de uma memória do futuro, na medida em
que comporta uma possibilidade de criação.(GONDAR, 2003, p.
35)
100
a personalidade e a sociabilidade, levando a questão do Patrimônio Cultural
além das fronteiras da nação.
Dada a importância do Patrimônio Cultural é preciso que nos
esforcemos para reconhecer nossos vínculos com ele, para mantermos nossa
memória e história que ele nos relembra e assegura, já que se configuram em
nossa orientação e referência no tempo e no espaço em que nos inserimos
enquanto membros de uma sociedade.
É necessário que haja cada vez mais uma política de valorização do
patrimônio e da nossa relação direta com ele, seja ela trabalhada nas escolas
ou em outros espaços de educação não formais, para que os nossos alunos –
cidadãos em formação – se identifiquem com sua história, sua comunidade e
se percebam como agentes formadores e transformadores de sua própria
história, cultura e, portanto, criadores e guardiões dos nossos patrimônios
culturais, mas precisamos que os nossos professores estejam conscientes de
seu papel de mediadores.
Ora, uma vez que concebemos a escola como um espaço de
discussão é natural que a vejamos também como um espaço para o
desenvolvimento de projetos que façam a inserção de temas ligados ao
Patrimônio Cultural, especialmente porque ele pode ser integrado ao grande
tema da pluralidade cultural proposto pelos PCN, já que essa ação iria
101
3.3. A Escola como Espaço de Discussão de Educação
Patrimonial: Meios de Valorização Local
102
Levamos em consideração que, assim como o Patrimônio Cultural, a
educação e as legislações que a regem são resultados das ações dos homens
e que se modificam a cada cenário histórico, social e político que se estabelece
ao longo dos anos, obedecendo aos jogos de poder e tensões existentes entre
os grupos que disputam a hegemonia.
Estamos certos de que, na contemporaneidade, temas como a cultura
e o desenvolvimento são constantes nas escolas, porque para além de fazerem
parte das diretrizes curriculares, são fundamentais para a nossa sociedade.
Para que a educação se aproxime desses temas vem sendo recorrente a
interação entre as áreas de conhecimento dentro das escolas, salientando que
todo conhecimento se faz na troca, na relação entre as disciplinas e os vários
espaços sociais que os alunos frequentam.
Tratamos aqui de estabelecer uma relação entre a educação dentro e
fora da escola, colocando-a como resultado das ações produzidas tanto no
espaço escolar quanto nos espaços não escolares como a casa, a família, os
museus, os teatros, pois a “escola é uma, entre outras instituições, que busca
sistematizar e refletir sobre as nossas multifacetadas vivências. O saber
escolar é uma expressão da experiência social” (REZNIK, 2010, p.90).
Quando salientamos que vivemos na sociedade da informação,
precisamos estar cientes de que a educação de nossa sociedade deve basear-
se nas diversas habilidades comunicativas que temos nas mãos, para que
sejam mais atrativas e que possam instigar debates e reflexões nos indivíduos
que participam desse processo de formação educacional.
Explorar os vários meios de comunicabilidade que temos é uma
questão de adaptação dos trabalhos, de organização de atividades inter e
transdisciplinares e é um modo de tornar o ambiente escolar e o ato da
aprendizagem em uma atividade mais prazerosa, participativa e permanente
(PINSKY, PINSKY, 2010).
Extrapolar os muros da escola apresentando temas de debate que
fazem parte do cotidiano faz com que o processo de aprendizagem ocorra a
todo momento na vida do aluno (BEZERRA, 2010), dessa forma, a escola
torna-se um importante espaço de discussão a envolver professores e alunos,
famílias e comunidade. Cabe à escola buscar meios de não se prender à idei a
103
de repassar conhecimentos acadêmicos, mas de tornar sua atividade mais
comunicativa e aberta, convidativa e rica.
104
adaptações a cada região, inclusive com a adoção de temas especificamente
locais (BRASIL, 1997 b, p.65).
Ressaltamos que o trabalho com o patrimônio, a identidade a educação
patrimonial e a memória e a relação que esses temas apresentam com o
cotidiano dos professores e alunos, pode estabelecer uma aproximação da
teoria e da prática vivenciada com os alunos, especialmente pelo viés de se
trabalhar com a cultura popular através dos mitos e folclores regionais que
também leva à aproximação com a relação patrimônio-vida cotidiana, já que
105
Quadro Esquemático: A Educação Patrimonial nos Documentos Patrimoniais e no Brasil31
31
Quadro esquemático idealizado pela autora como parte componente desta dissertação de mestrado.
106
Ano Documento Organizadores Educação Patrimonial Observações
Alertava para a necessidade Instituiu a noção de bem cultural.
de se promover a educação
patrimonial e a promoção do
1964 Carta de Veneza UNESCO bens
Para que a preservação
tivesse algum sentido se
fazia necessário que o bem
tivesse alguma relação com
a comunidade que o detém
Educação formal, na qual o Proibição e impedimento de
Estado deveria estimular e exportação, importação e
1964 Recomendação de UNESCO desenvolver o interesse dos transferência de propriedade
Paris cidadãos ilícita de bens culturais
Uso dos bens patrimoniais
como recursos pedagógicos
Exploração dos bens culturais Adequação das determinações
1967 Normas de Quito OEA como meios de inserção da europeias às realidades latino-
comunidade nos processos americanas
de salvaguarda e proteção
Implementação da Educação
Cívica nos espaços formais
Documento que deixou mais Recomendações para obras
clara a responsabilidade dos públicas ou privadas e métodos
Estados, ministérios e de incorporação da sociedade
1968 Recomendação de UNESCO secretarias para a educação, nos assuntos referentes ao
Paris passando-a também aos Patrimônio Cultural
educadores
107
Ano Documento Organizadores Educação Patrimonial Observações
Criação de cursos superiores
na área de preservação do
Patrimônio Cultural
Culto do passado: elemento
principal da formação da
1970 Compromisso de Ministério da Educação e brasilidade Cuidados específicos para o
Brasília Cultura do Brasil Inclusão de temas ligados ao Patrimônio Cultural brasileiro
Patrimônio Cultural no
currículo de todos os níveis
do ensino formal
Aproveitamento da disciplina
de Educação Moral e Cívica
Inclusão no ensino de 2º grau
1971 Compromisso de Ministério da Educação e um curso complementar de Reafirmar as posturas do
Salvador Cultura do Brasil estudos brasileiros e Compromisso de Brasília
museologia
Educação profissionalizante
Educação como fator
1972 Declaração de ONU importante para a melhoria Documento pioneiro em Direto
Estocolmo da qualidade de vida da Internacional Ambiental
comunidade
Educação ambiental
indispensável
Educação Ambiental
Programa de proteção do Proteção do Patrimônio Mundial,
1972 Recomendação de UNESCO patrimônio através de ações Cultural e Natural;
Paris educativas Patrimonialização do Meio
Programas educativos com Ambiente
objetivo de fortalecer a
108
apreciação e o respeito aos
patrimônios culturais
Ano Documento Organizadores Educação Patrimonial Observações
A educação escolar deveria
incluir programas de estudo
sobre a importância do
Recomendação de OEA patrimônio monumental. Texto baseado na Carta de
1974 São Domingos e OEA, UNESCO e as demais Veneza (1964) e nas Normas de
Governo Dominicano organizações internacionais Quito
deveriam preparar material
didático para os programas
Preocupações diretamente
relacionadas com a
EDUCAÇÃO FORMAL
Educação escolar como fator
fundamental no
conhecimento dos Ano Europeu do Patrimônio
Patrimônios Culturais Arquitetônico;
1975 Declaração de Congresso Patrimônio As novas gerações são o Inserção e ampliação da
Amsterdã Arquitetônico Europeu futuro dos Patrimônios dimensão histórica e cultural no
Culturais, já que serão ambiente urbano
detentoras dele no futuro.
Abrir espaço para pesquisas e
incluir os seus resultados nos
programas de educação e
desenvolvimento cultural.
1975 Manifesto de Amsterdã Congresso Patrimônio Patrimônio arquitetônico com Reafirmação dos pontos
Arquitetônico Europeu valor pedagógico importante levantados na Declaração de
Amsterdã
109
Ano Documento Organizadores Educação Patrimonial Observações
O papel da educação é incutir nos
cidadãos os valores relativos à
importância de se preservar o
Patrimônio Cultural Salvaguarda dos conjuntos
1976 Recomendação UNESCO Valorização do trabalho de pesquisa históricos e sua função na vida
de Nairóbi Tratar o Patrimônio Cultural dede a contemporânea
pré-escola até a universidade
As ações educativas poderiam
contribuir para a elaboração de
estratégias de um turismo cultural Documento voltado para o turismo
sustentável e estratégias necessárias para a
Usa os bens patrimoniais como sua manutenção, mas sem
1976 Carta de Turismo ICOMOS recursos pedagógicos – saindo dos desgastar os Patrimônios
Cultural muros da escola Culturais
Educar a população através do
sistema educacional formal de
modo a promover o conhecimento e
o respeito
Necessidade de se intensificar os
esforços para a preservação do
A educação é entendida como método de Patrimônio Natural
1982 Declaração de ONU prevenção de agressões ao meio ambiente Reúne elementos da Carta de
Nairóbi através da conscientização, devendo Estocolmo (1972) e Nairóbi
ocorrer nos ambientes escolares e (1972) tratando de elementos do
difundida por meios diversos. Patrimônio Natural e também do
viés cultural.
110
Ano Documento Organizadores Educação Patrimonial Observações
A educação e a cultura deveriam ter Texto voltado para as Políticas
o seu conceito ampliado, já que são Culturais;
entendidas como essenciais para o Recobra elementos da
desenvolvimento do indivíduo e da Declaração Universal dos
1985 Declaração do ICOMOS sociedade Direitos do Homem (Educação e
México Educação como meio por excelência cultura são direito inalienáveis do
para se transmitir os valores homem)
culturais e nacionais
Educação como elemento de
incorporação da sociedade ao meio
das cidades históricas Trata da preservação das
1986 Carta de ICOMOS Salientar que todos os meios são cidades históricas;
Washington produtores de cultura Texto complementar à Carta de
Programas de informações gerais Veneza (1964)
sobre as cidades históricas que
comece desde a idade escolar
Assinalou-se a necessidade e
relevância de um programa
nacional para a Educação A preservação foi colocada como
1997 Carta de Fortaleza IPHAN Patrimonial tema a ser abordado de maneira
No Brasil, a Educação Patrimonial global
vem se tornando cada vez mais
familiar e frequente no trabalho dos
Museus
111
4. Educação Patrimonial e Escola: Análises da Realidade de
Niterói
112
Para que a pesquisa tomasse corpo nos guiamos inicialmente pela
questão: “o que é trabalhar com patrimônio cultural?”. A partir desse
questionamento começamos a desdobrar as nossas interrogações e chegamos
a uma seleção de questões-chave que nos nortearam ao longo do trabalho:
1) O que é o patrimônio cultural?
2) O que é identidade?
3) O que é memória?
4) O que é diversidade?
5) O que é Educação Patrimonial?
Como o que buscávamos era perceber como os professores trabalham
esses conceitos com seus alunos no cotidiano escolar, buscamos observar as
atividades dos docentes, independente da área de atuação deles. Partindo
para uma entrevista semiestruturada com os professores de História dessas
escolas.
Em um momento mais avançado da pesquisa, a finalidade era a de ir
além do que nos foi mostrado e falado pelos professores. Através dos vários
métodos e técnicas da análise de conteúdo, à luz de Laurence Bardin,
buscamos a “compreensão por meio das palavras, das imagens, dos textos e
dos discursos: descrever e interpretar opiniões, estereótipos, representações,
mecanismos de influência, evoluções individuais e sociais” (BARDIN, 2011,
p.11), já que por detrás de todo discurso geralmente simbólico e polissêmico
temos um sentido a ser desvendado (BARDIN, 2011, p.20).
Foi partindo da análise das falas dos professores e dos documentos
que regulam e orientam a educação na cidade de Niterói que observamos
como os conceitos que pegamos como eixos para essa pesquisa são
apreendidos e trabalhados pelos docentes. Percebemos até que ponto é
possível trabalhar as questões relativas ao patrimônio e os conceitos
relacionados a ele nas salas de aulas, sem que haja a necessidade de se criar
uma disciplina escolar específica ou um projeto para se debater esses temas.
O trabalho final foi o resultado da triangulação entre esses
instrumentos de pesquisa que nos deixou com uma margem maior para o
trabalho, já que nos possibilitou o uso de entrevistas, questionários, e ainda, a
observação do ambiente escolar. Essa triangulação metodológica
(GOLDENBERG, 2004) nos deu maior amplitude na descrição, e xplicação e
113
compreensão do tema abordado, enquanto fenômeno social, já que por se
tratar do modo de como são feitas as apropriações de conceitos não poderia
ser estudado de maneira isolada, revelando aqui nossa proximidade com as
Ciências Sociais.
Assinalamos que os dados estatísticos levantados, com os métodos da
análise documental, quando da elaboração de quadros categoriais (BARDIN,
2011, p.61), serviram apenas de suporte para as análises mais profundas de
conteúdo e para nortear melhor nossas inferências.
A pesquisa qualitativa foi útil para identificar conceitos e variáveis
relativas a situações que podem ser estudadas para perceber as sutilezas
(GOLDENBERG, 2004) presentes nos trabalhos docentes e nas vivências
escolares. Estes estão diretamente relacionados às questões
afetivas/emotivas, aos sentimentos de pertencimento e identidade.
Essas práticas foram importantes porque o que buscamos não era
apenas verificar se os entrevistados conheciam ou não o nosso tema do ponto
de vista acadêmico, mas também saber o modo de como eles lidam com as
questões diárias que colocam o Patrimônio Cultural, e os conceitos ligados a
ele, na ordem do dia, ainda que sem o conhecimento consciente dessas
ocorrências, nos dando elementos para compreender como se estabelecem as
relações com os esquecimentos (POLLACK, 1989), os silêncios, as omissões
que nos dizem tanto quanto as ocorrências encontradas na pesquisa.
Trabalhamos diretamente com as vivências, memórias, lembranças de
nossos entrevistados, já que elas estão diretamente vinculadas não só ao
passado, mas com a identidade e, assim (indiretamente), com a própria
perspectiva do futuro (ROSSI, 2010, p.24) e por conseguinte, às questões da
diversidade e do próprio patrimônio cultural, já que
114
Nossa pesquisa se deu com os professores de duas escolas
municipais de Niterói: Escola Municipal Francisco Torres , localizada à Rua
Professor Ismael Coutinho, 88, Centro e a Escola Municipal Santos Dumont,
localizada à Rua Manoel Correia, s/n., bairro de Fátima. As escolasestão em
áreas próximas e atende a um público semelhante.
O perfil de alunos das duas escolas é muito diversificado, mas a
maioria das crianças atendidas é da comunidade do Morro do Estado. Há ainda
um grupo de alunos de bairros próximos, cujos pais trabalham no centro e a
localização da escola facilita o acesso dos pais e alunos.
Foram analisados questionários apresentados a 20 professores de
todas as áreas de ensino, além da observação das atividades feitas pelas
escolas no segundo semestre letivo de 2012. Dos 20 questionários foram
retirados três professores de História das escolas, além de uma entrevista com
uma coordenadora e com uma diretora.
Os resultados colhidos foram tabulados em gráficos que serão
apresentados ao longo dessa sessão juntamente com os resultados obtidos em
todo o período de observação e entrevistas.
115
4.1. Os Parâmetros Curriculares Nacionais, as Orientações
Curriculares para a Rede Municipal de Educação de Niterói e o
Trabalho Docente com a Educação Patrimonial
116
coerentes (ALVES, 1998, p. 05). Segundo a autora de acordo com a estrutura
educacional brasileira não há grandes possibilidades de mudança, uma vez
que a grade curricular encontra-se limitada, não tendo uma abertura efetiva
para a inserção desses temas.
Para complementar a LDB, foram publicados os PCN que trouxeram
como inovação a interdisciplinaridade 32, com a inserção dos temas
transversais. Em pelo menos dois desses temas propostos pelos PCN
podemos inserir a temática do Patrimônio Cultural, que são o Meio Ambiente –
que suscitaria discussões sobre os patrimônios naturais – e a Pluralidade
Cultural, no qual demos enfoque neste trabalho.
O objetivo tanto da LDB quanto dos PCN é que se tenha um espaço
para que os alunos tomem conhecimento de assuntos relacionados com os
Patrimônio Culturais, mas salientamos que eles deixam essas determinações a
cargo dos órgãos locais: secretarias de educação estaduais e municipais que
devem promover a elaboração do currículo completo das escolas.
O ideal seria as parcerias com o IPHAN e com os órgãos de proteção
estaduais para a elaboração de cursos de formação, atividades pedagógicas,
materiais didáticos e meios diversos que capacitassem os professores para
lidar com as metodologias da Educação Patrimonial.
Em Niterói, as Orientações Curriculares da Rede Municipal de
Educação, se colocam em consonância com as propostas da LDBEN e dos
PCN e se propõe a “abraçar o multiculturalismo na sua visão de cidadania,
imbuídos na perspectiva de se respeitar a diversidade e de superar qualquer
tipo de preconceito ou discriminação em todos os eixos do currículo”
(ORIENTAÇÕES CURRICULARES, 2010, p. 3). Dessa maneira, busca-se que
as práticas docentes atendam ao cumprimento da função social dos temas
transversais que visam trabalhar com valores gerais e unificadores (BRASIL,
1997 a, p. 64).
Em seu texto final, o documento apresenta argumentos que o coloca
como um currículo multicultural (ORIENTAÇÕES CURRICULARES, 2010),
32
A Interdisciplinaridade nasceu como uma profunda crítica ao modelo de disciplinas
separadas, com tempos e temas próprios, avaliações espec íficas e até mesmo objetivos
pedagógicos que nem sempre coincidem. Piaget já havia demonstrado que esta separação
tinha algo de irracional. A interdisciplinaridade, segundo Piaget, pode ser explicada como a
atividade em que a c ooperação ent re várias disciplinas provoca intercâmbios reais, existin do
reciprocidade. (RICCI, 2010, p. 51)
117
trabalhando com conceitos apresentados por Homi Bhabha (2011) e Stuart
Hall, salientando que as culturas podem ser interpretadas como cada vez mais
mistas e diaspóricas (HALL, 2009). Esses conceitos se expandiram e, de
acordo com essas orientações curriculares podem ser trabalhados em três
dimensões diferenciadas no que diz respeito à diversidade cultural:
118
dos mesmos com os de outras regiões brasileiras, em um
contexto multicultural;
D – Posicionar-se de forma crítica e autônoma em relação às
questões sociais, políticas, econômicas, culturais e ambientais;
E – Compreender a construção do conhecimento como histórica e
culturalmente situada, diretamente ligada à prática da pesquisa e
à resolução de situações-problema, articulando os conteúdos
curriculares aos saberes e vivências do cotidiano;
F – Relacionar-se de forma crítica, criativa e positiva com as
tecnologias, utilizando-as como recursos para o avanço do
conhecimento, da pesquisa e de sua inserção no mundo
contemporâneo e plural;
G – Participar de atividades que estimulem atitudes éticas, de
cooperação, respeito e solidariedade para como o próximo;
H – Articular os conteúdos curriculares entre si, nos eixos
integradores e/ou entre os diferentes eixos. [grifo nosso]
(ORIENTAÇÕES CURRICULARES, 2010, p. 6).
119
Há ainda uma dificuldade de se efetivar os trabalhos com a Educação
Patrimonial por parte dos professores, ligada a interdisciplinaridade, uma vez
que toda a sua formação é voltada para a estrutura curricular fechada,
compartimentada, prezando a sua especialização, para além da deficiência nos
cursos superiores com relação à formação para o Patrimônio Cultural.
Muitos professores ainda hoje não conhecem a temática e não sabem
como deveriam lidar com ela na sala de aula e atribuem à sua falta de
atividades à deficiência de sua formação, como veremos mais adiante na fala
dos próprios professores.
O que vemos é que nos documentos oficiais que pautam a nossa
educação, a temática do Patrimônio Cultural é bem amparada, mas deixa a
cargo dos professores os meios de como ela será abordada ao longo do
período letivo.
120
4.2. Educação Patrimonial nas Escolas: Presença Constante,
mas Quase Despercebida
33
Optamos nessa pesquisa por não especificar em quais das escolas aconteceram os fatos
relatados, apenas indicando por “escola A” e “escola B”.
121
Fato que merece destaque é que nessa escola, por toda parte havia
registros de atividades que estavam voltadas para a Educação Patrimonial
como a visita ao MAC, a Semana sobre as influências da Áustria no Brasil e o
trabalho relativo à sustentabilidade e uso consciente da água.
A gestora nos afirmou não saber do que se tratava a expressão
Patrimônio Cultural, mas a todo tempo se referia à importância de se promover
visitas dos alunos aos museus e bibliotecas da cidade.
Na escola B, nossa entrevista se deu com a coordenadora pedagógica
que além de sua formação em Pedagogia, apresentava pós-graduação em
nível de especialização em Educação, mas em uma área que tratava do
Patrimônio Cultural.
Com relação aos professores, a maioria, como apontado no gráfico
abaixo (fig. 06), afirma ter conhecimentos sobre o Patrimônio Cultural,
entendendo-o como um ponto importante a ser trabalhado pela escola.
122
do ponto de que conhecem as legislações que pautam os seus trabalhos e que
atuaram na construção dessas políticas, aliado ao fato de conhecerem também
as temáticas relacionadas ao Patrimônio Cultural, por que, ao serem indagados
sobre a existência de projetos que trabalham a temática em suas escolas a
maioria afirma que não?
A resposta foi encontrada nas entreli nhas das respostas dadas pelos
professores às entrevistas. Para os professores das diversas áreas a resposta
negativa se dava pela dificuldade de enxergar o Patrimônio Cultural, por
exemplo, no projeto sobre a sustentabilidade e o uso da água.
Muitos professores, especialmente os que não são da área da História,
ainda são detentores da ideia de que apenas são considerados como
patrimônio aqueles objetos históricos e artísticos, ou monumentos e centros
históricos designados como representativos da memória de uma nação, que
instituições e agentes governamentais deveriam proteger e resguardar
(FUNARI, 2004; FONSECA, 2009).
Os professores não concebem, em alguns casos, como na escola A,
que o meio ambiente é sim, questão fundamental de Patrimônio Cultural, tendo
sido, inclusive, alvo de Cartas Patrimoniais específicas como a Declaração de
Estocolmo (1972). Para eles a questão ambiental e paisagística era importante,
mas dissociada do patrimônio.
Nas respostas colhidas, apenas os professores de História se
mostravam mais firmes ao afirmarem conhecer os conceitos que envolvem o
trabalho com o Patrimônio Cultural e, a maioria dos projetos desenvolvidos nas
escolas ou partiram deles ou contavam com eles entre as disciplinas
envolvidas.
No projeto que trabalhava o uso da água e a sustentabilidade os
professores levantaram a questão dos banhos demorados, em que os alunos
buscaram descobrir a origem do hábito de se tomar banho, apresentaram
trabalhos em forma de cartazes com imagens e sugestões para um melhor
aproveitamento da água, sem desperdícios. Nesse projeto envolveram-se os
professores de ciências, história, geografia e artes.
Não encontramos projetos que conseguiram abarcar todas as
disciplinas da escola colocando em prática a transdiciplinaridade, mas nas
duas escolas os trabalhos se dão na interdisciplinaridade.
123
A Escola B apresentou um trabalho que mais agregou disciplinas sobre
o centenário de Luiz Gonzaga. A partir desse tema os alunos desenvolveram
oficinas, levantaram discussões sobre a identidade local com fortes influências
nordestinas, trabalharam os ritmos representados pelo músico, analisaram as
letras das músicas, fizeram trabalhos para exposição e o resultado foi
apresentado para a comunidade em uma feira cultural.
Cabe lembrar que nessa escola a coordenadora possui uma formação
voltada para as práticas de valorização do Patrimônio e também o maior
número de professores afirma ndo que a escola tem projetos que lidam com o
tema mesmo que não seja um objetivo específico, uma prática objetiva.
É consenso entre a importância desse tipo de projeto, que envolve o
aluno, os professores e a comunidade, especialmente porque
124
Há, entre os professores um desejo de inserirem a temática, mas falta-
lhes a metodologia para exercerem as atividades. Ao serem inquiridos sobre o
desejo de participar de oficinas e projetos na própria escola que trabalhassem
diretamente com a Educação Patrimonial, a maioria se mostrou interessada,
assinalando a falta de preparo conceitual para lidar com o tema.
De fato, observando a trajetória da educação no nosso país veremos
que a inserção do Patrimônio Cultural na educação formal nunca foi efetivada
com o sucesso esperado, o que reflete em nossos licenciados: as licenciaturas
não preparam os professores nem para lidar com os temas referentes à
transdiciplinaridade, interdisciplinaridade, nem tão pouco para a Educação
Patrimonial e o trato com o Patrimônio Cultural.
Essa falta de preparo faz com que os professores que disseram já ter
feito ou participado de projetos nas escolas tenham receio de se aventurar no
tema, criando um projeto específico para o Patrimônio Cultural. Muitos deles
ainda preferem manter a escola descolada desse processo, tendo apenas uma
aula introdutória sobe um museu no qual será feita uma visita com a turma.
Para o grupo que esboçou interesse em trabalhar com a temática em
um projeto específico ou, pelo menos, dar mais enfoque ao tema em suas
aulas, destacamos que as sugestões dadas vão de encontro ao que já é
pensado para o patrimônio em termos de políticas públicas e ações
pedagógicas.
Seja lá qual for o tema do projeto, os professores entendem que eles
devem ser desenvolvidos com a participação da comunidade. Para além de um
meio de expandir os conhecimentos produzidos pelos trabalhos, acreditam que
uma aproximação com a escola traga benefícios para a comunidade.
De frente para esse cenário das escolas , partimos para responder as
questões centrais da pesquisa. A primeira delas era a de buscar entender
como os professores das escolas municipais percebem as noções de
Patrimônio Cultural, identidade, memória, diversidade e Educação Patrimonial.
Ora, que o Patrimônio Cultural é importante para a sociedade e a
perpetuação de suas tradições e costumes, sendo um traço cultural da
humanidade, seja lá qual for o grupo social, nenhum professor tem dúvida, por
mais que o seu entendimento sobre o que de fato compõe esse patrimônio seja
limitado devido à sua falta de formação específica.
125
Sobre a identidade e a memória todos os professores disseram tratar
em suas aulas de temas pertinentes, inclusive agregando acontecimentos do
cotidiano para tornar as aulas mais palpáveis para os alunos, provocando-os a
participarem, a dar suas opiniões e a construírem novas visões.
Com relação à diversidade, como esta já faz parte da escola, está
indiretamente atrelada a todas as atividades que são desenvolvidas pela escola
sejam nas aulas ou nos projetos.
A questão mais delicada está com a Educação Patrimonial, completa
desconhecida enquanto metodologia de trabalho para a maioria dos
professores, incluindo a direção. Espontaneamente os professores não se
reconhecem como agentes facilitadores e desenvolvedores das práticas
dessas metodologias e alguns afirmam que não as aplicaria em projetos.
Aqui temos uma contradição entre a fala e a ação dos professores. Nos
projetos citados, todos usaram metodologias típicas da Educação Patrimonial
quando têm como objetivo:
127
5. Considerações Finais
128
sobre ele. Para alguns professores e alunos a ideia principal é a de que o
Patrimônio refere-se às “coisas velhas”, “prédios antigos”, e “museus”,
atribuindo-lhe a concepção de que diz respeito apenas ao que se encerra no
passado.
O resultado, porém, não nos desanima. Ele aponta para experiências
bem sucedidas de experiências com o Patrimônio Cultural em projetos,
passeios, visitações e temas abordados ao longo das aulas.
Percebemos um direcionamento para a adoção de uma perspectiva
129
Quando assumimos a escola como um espaço de discussão atribuímos
a ela a função de repensar a nossa cultura, nossos costumes, questionar os
nossos referenciais e apontar novos problemas, novas abordagens, novas
respostas, inserindo a pesquisa e o trabalho transdisciplinar na ordem do dia
(DEMO, 1996).
Ressaltamos que a escola forma seus alunos para que eles sejam
cidadãos críticos e que possam exercer a sua cidadania plenamente, portanto,
práticas emancipatórias devem ser constantes. Através do conhecimento do
Patrimônio Cultural, podemos desenvolver essas habilidades nos alunos,
conforme já salientado pela legislação da educação brasileira e,
especificamente, no caso desta pesquisa, da cidade de Niterói.
Fazer a inserção da pesquisa no cotidiano escolar e extrapolando -se
as paredes da escola com trabalhos de história oral onde se valorizem as
memórias e suas influências na construção das identidades é, ao mesmo
tempo, incentivar o aluno a ser crítico e analítico, mas também de restabelecer
uma relação afetiva que pode existir entre o indivíduo e a educação, a escola, o
Patrimônio Cultural.
A participação da comunidade é fundamental, já que a identidade dos
alunos se dá formada nesse seio e entendê-lo é entender o próprio aluno, além
de ampliar a troca de conhecimentos entre escolas, pais, famílias e
comunidade como um todo. A inserção da comunidade (CARTA DE VENEZA,
1964) trará as suas próprias demandas para a escola e será possível trabalhar
o Patrimônio Cultural da perspectiva do seu grupo detentor. Pode-se partir
desse grupo para estender a discussão para o mais geral, mostrando todo o
processo no qual a dinâmica do Patrimônio Cultural está inserida e destacando
a importância do cuidado com ele.
Nesse sentindo é preciso atentar para as tantas Cartas Patrimoniais
que apontam que a Educação Patrimonial deve ser inserida nas escolas,
espaço de ensino formal, não necessariamente como disciplina buscando
parcerias com entidade locais para a valorização da própria região para atrair
um turismo sustentável, baseado na Carta de Turismo Cultural (1976).
Outro viés que desponta nas Cartas Patrimoniais e que pode ser
utilizado em larga escala pelas escolas é o uso dos Patrimônios Culturais como
meios didáticos (NORMAS DE QUITO, 1967).
130
Os bens do patrimônio cultural abrigariam o valor cognitivo
(conhecimento), o valor formal (estético), o valor afetivo
(subjetivo), o valor pragmático (uso). Nessa medida, ao se
identificar e apreciar um bem do patrimônio cultural – pelos
valores que lhe são atribuídos – percebe-se a complexidade de
sua constituição e a sua viva importância para a constituição
histórica da própria sociedade. (ANDRADE, 2010, p. 73)
131
o seu direito de cidadania, possibilitando diálogos e construções inovadoras
entre os indivíduos.
Foi possível perceber que há uma preocupação internacional com a
Educação Patrimonial desde a década de 1930 e que as diretrizes para o
trabalho com ela foram se adequando às necessidades e demandas ao longo
dos mais de 80 anos de políticas públicas internacionais tratando do Patrimônio
Cultural e que esses documentos patrimoniais influenciaram diretamente as
políticas públicas brasileiras.
Por mais que tenhamos andado na contramão desses documentos
reservando as práticas de Educação Patrimonial aos espaços não formais de
educação, ela está sempre presente nas escolas, ambientes permeados de
cultura e de patrimônio, mas nem sempre os professores têm a consciência
disso e nem sempre percebem que suas atividades rotineiras são, na verdade,
aplicações das metodologias da Educação Patrimonial.
Assinalamos para a deficiência na formação dos professores que
sentem a necessidade de se aperfeiçoarem na área, mas não os eximimos da
culpa, uma vez que há uma ampla ação do IPHAN e dos órgãos estaduais de
proteção do Patrimônio Cultural para fornecer materiais sobre o tema em seus
portais na internet e promoção de cursos de formação de curta duração para
esse público.
Enfim, a escola se mostrou um meio muito fértil para se debater o
Patrimônio Cultural e a Educação Patrimonial, presentes na maioria dos
projetos realizados pelas escolas, sendo as discussões sobre identidade e
memória muito fortes, uma vez que a própria escola é a diversidade.
Notamos nas falas dos professores que
Fato que pode ser atestado com uma exposição sobre o centenário de
Luiz Gonzaga, explorado em uma das escolas, na qual a coordenadora, com
formação na área de Patrimônio Cultural relata:
34
Fala de uma das professoras pesquisadas, cuja identidade e a escola for am mantidas em sigilo.
132
Aproveitamos o centenário de Luiz Gonzaga e trabalhamos as
raízes nordestinas. Aos poucos os alunos foram se identificando
com os costumes do nordeste e descobrira que alguns de seus
parentes chegaram no Rio de Janeiro em busca de oportunidades.
Para eles, redescobrir o nordeste através da música de Gonzaga
foi um motivo de empolgação, que os levou a ter orgulho de suas
raízes.
Foi um trabalho demorado, de duas semanas, mas que valeu a
pena. Os alunos pesquisaram sobre a cultura nordestina.
Pesquisaram sobre seus parentes, suas raízes. Ao final, tudo foi
organizado em uma exposição aberta aos pais que compareceram
em grande número.
Foi um despertar importante para os alunos e os pais deles que se
viram representados em nossa mostra de arte espalhada pela
escola35.
35
Fala de uma coordenadora do turno da manhã, responsável pela gerência do projeto sobre o
centenário de Luiz Gonzaga.
133
Passei a entender que o museu não é um lugar de silêncio e nem
chato. Lá a gente vê os objetos que já fizeram parte de nossa
história e pode perceber o quanto a vida mudou. É legal saber que
alguém se preocupou em guardar um pouco do passado pra gente
conhecer. É legal também sair da sala de aula. Os passeios são
muito divertidos. A gente aprende um monte de coisas que nem
sempre está no livro e que chama a atenção. Nos museus de arte
a gente ainda vê outros tipos de arte que nem conhecíamos 36.
36
Fala de um aluno do 8º ano, quando questionado sobre as aulas de campo desenvolvidas no Museu
Arte Contemporânea, em Niterói.
37
Ver página 120.
134
para o processo de ensino e aprendizagem tocam as metodologias da
Educação Patrimonial, caminhando para a construção de uma geração que tem
a oportunidade de conhecer melhor as inúmeras possibilidades de
conhecimento e de ação que a cultura proporciona.
Deixamos abertas lacunas que caminharão para novas observações e
construções sobre os rumos que a Educação Patrimonial tomará na educação
formal e não formal, dentro das políticas públicas e no dia a dia de professores
e alunos, ressaltando o visível crescimento que ela teve desde sua
implementação no Brasil.
135
Anexos
Anexo I
FACULDADE DE EDUCAÇÃO
MESTRADO EM EDUCAÇÃO
Edylane Eiterer
136
NITERÓI - RJ
MAIO DE 2012.
137
1. Introdução
38
Os temas transversais não compreendem grupos de novas disciplinas, mas novos objetivos
de abordagem dos temas dentro do conteúdo que é previsto para cada disciplina já existente.
Segundo os P CNs foi a forma de organizar o t rabalho didático que recebeu o nome de
trans versalidade, e esses temas correspondem a “questões important es, urgentes e present es
sob várias formas na vida cotidiana”. (BRASIL, 1997, p. 15 A)
138
sociais que constituem uma representação ampla e plural dos campos de
conhecimento e de cultura somos convidados a participar mais ativamente das
realidades locais de nossos alunos, o que levanta discussões sobre a suas
realidades, seus patrimônios, suas identidades.
Assim, cabe aos docentes, de acordo com os PCN, fazer escolhas
curriculares que correspondam à diversidade de realidades apresentadas por
seus alunos.
O professor, considerando a multiplicidade de conhecimentos em
jogo nas diferentes situações, pode tomar decisões a respeito de
suas intervenções e da maneira como tratará os temas, de forma
a propiciar aos alunos uma abordagem mais significativa e
contextualizada. (idem, p. 63).
Esses temas são colocados como desafios aos professores que a todo
tempo são chamados a lidar com eles. Compreendemos, como Piletti (2004),
que o currículo escolar abrange todas as experiências escolares e nesse caso,
ele é todo permeado por elementos que vão muito alé m dos livros didáticos,
das aulas expositivas. Sua dinâmica, para ser mais enriquecedora, depende
tanto da formação do professor, quanto do meio pelo qual ele desenvolve o seu
trabalho, neste incluídos os projetos que envolvem a comunidade escolar,
extrapolando as quatro paredes que compõem a sala de aula e trabalhando
com as experiências trazidas pelos alunos.
Já que a escola tem um grande papel na formação dos cidadãos, ela
deve estar em consonância com as demandas da sociedade. Para tal, é
necessário que trate de questões que sejam pertinentes à vida dos alunos, que
sejam relativas a suas experiências, envolvendo-os com as temáticas sociais e
incorporando-as em seus currículos (BRASIL, 1997 a, p.64).
É seguindo as diretrizes de discussões metodológicas e práticas
propostas pelos PCN para serem levadas até a sala de aula de modo mais
dinâmico e voltado para as questões relacionadas com o aluno, com a
comunidade e suas práticas de memória e seu patrimônio cultural, que nos
colocamos a questionar como determi nados conceitos são trabalhados dentro
do cotidiano escolar.
139
2. Justificativa
140
Para tal, é preciso que cada professor compreenda a importância e o
valor do patrimônio cultural para que possa desenvolver projetos sociais e
culturais na escola, entendendo que a história local não se opõe à história
nacional e que
141
referimos à história, memória e identidade (OLIVEIRA, 2008, p.114) e, logo
concebemos a diversidade como peça desse mosaico.
Levantamos essas questões sobre o patrimônio, porque através dele
fica mais claro o nosso direito de ter resguardada a memória que é, acima de
outras questões, um instrumento de poder do cidadão, pois quando a
resguardamos estamos resgatando
[...] uma memória que nós gestamos, para além daquela que é
gestada em nós. Aqui não se trata de uma memória
institucionalizada – aquela dos saberes estratificados; e tampouco
de uma contra-memória como tentativa de desconstrução de um
passado imposto, mas de uma memória do futuro, na medida em
que comporta uma possibilidade de criação.(GONDAR, 2003, p.
35)
142
3. Objetivos
Objetivo Geral
Objetivos Específicos
143
Anexo II
Carta de Apresentação do Projeto de Pesquisa entregue aos
professores
1. Questionário
Nesse momento você será convidado a responder algumas perguntas
sobre a sua formação, sua ação em sala de aula, seus projetos e seu
conhecimento a cerca dos temas que são adjacentes ao Patrimônio Cultural.
Esses dados serão tabulados e seu resultado será usado como base
estatística para compor o embasamento teórico de nosso trabalho.
Por se tratar de um universo relativamente grande, do qual tiraremos
um grupo focal posteriormente, é preciso que os professores se identifiquem.
39
Pesquisa de mestrado desenvolvida no Programa de Pós -Graduação em Educação da
Universidade Federal Fluminense
40
Edylane Eiterer é Historiadora (UFJF), pós-graduanda em Gestão do Patrimônio Cultural
(Instituto Granbery/PERMEAR), mestranda em Educação (UFF) e professora da rede particular
de Educação Fundamental do Ri o de Janeiro. edylaneeiterer@yahoo.com.br
144
Salientamos que a identificação será apenas para que os perfis selecionados
sejam retomados para a formação do grupo focal. Para os dados que serão
publicados na pesquisa as identidades dos pesquisados será omitida.
2. Entrevistas
Após traçar o perfil dos professores pesquisados selecionaremos um
grupo menor para que sejam feitas entrevistas. O material coletado poderá ter
algumas de suas partes publicadas, mas asseguramos o sigilo com os nomes
dos colaboradores.
As entrevistas versarão sobre os temas que cerceam a questão do
Patrimônio Cultural e a prática de ensino dos docentes em seu dia a dia.
145
Anexo III
Questionário
1. Identificação
Nome: _________________________________________________________
E-mail: _________________________________________________________
Escola: _________________________________________________________
2. Formação
Curso de Graduação: _____________________________________________
Nível:
Área: __________________________________________________________
3. Atuação Profissional
Atua na educação como professor há quantos anos? ____________________
______________________________________________________________
146
Conhece as diretrizes básicas norteadoras da educação de sua cidade
(Orientações Curriculares da Secretaria de Educação)? ( ) Sim ( ) Não
( ) Sim ( ) Não
( ) Sim ( ) Não
( ) Sim ( ) Não
147
Anexo IV
Itens que nortearam o roteiro da entrevista semiestruturada
148
ANEXO V
Gráficos levantados com a análise dos questionários
149
Gráfico relacionado ao conhecimento e/ou elaboração do Plano Político Pedagógico –
PPP – da escola e das Orientações Curriculares – OC – da Fundação Municipal de
Educação de Niterói
150
Gráfico sobre a satisfação dos docentes com a sua profissão
151
Gráfico sobre a inserção de temas relacionados ao cotidiano dos alunos e da
comunidade durante as aulas.
152
Gráfico sobre a experiência com o trabalho de Educação Patrimonial
153
Gráfico sobre a intenção de trabalhar de um projeto especificamente voltado para a
Educação Patrimonial.
154
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155
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159
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