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[Relato de Parto Natural] Sophia nasceu de parto natural, sem nenhuma intervenção médica,

sem corte, anestesia, hormônio sintético, nada. Ela nasceu na Casa de Parto da Mansão do
Caminho, pelo SUS, um trabalho que elas fazem lá com muito amor e dedicação. Mas por
pouco ela não nasceu em casa, por pouco ela não nasceu nas escadas do prédio, por pouco ela
não nasceu dentro do táxi. Hahaha

Há 4 anos, na tarde de uma quarta-feira, eu já estava no meu limite do cansaço: sem dormir,
contração ritmada, contínua e prolongada, estava exausta. Falei para minha irmã e doula (que
também estava gestante): - Não aguento mais! Quero cesárea. Eu não aguento mais.

Então eu vi a importância de ter ali, além da irmã consanguínea, uma profissional formada e
treinada para agir nesse momento. Ela me lembrou de tudo o que já vínhamos conversando,
me lembrou do meu propósito em optar pelo parto natural, da importância que isso tinha para
mim e para minha filha, da confiança e do respeito pela natureza do meu corpo. Me
tranquilizou, disse que essa fase no trabalho de parto era comum, muitas mães desistem no
meio do caminho e que, se houvesse real necessidade, a cesárea seria feita. Enquanto
conversava, ela preparou uma limonada (a única fonte de energia que consegui ingerir em
todas essas horas), ofereceu massagens que rejeitei, perguntou se eu queria alguma música, e
eu recusei, agilizou o que pode. Ela estava ali. E a presença dela me dava segurança.

No início da noite eu estava lá, na recepção da Casa de Parto, sentindo dores fortes e
segurando minha onda. A enfermeira não quis fazer o exame de toque – que realmente é um
tanto invasivo – porque ela me viu muito calma aparentemente e minha barriga “mole”
(gordura, né!) Sei lá quais foram os critérios. Mas ela me mandou voltar para casa. Disse que
eu poderia levar mais alguns dias em TP. A casa de parto já estava lotada, era Lua Cheia, então
os partos ocorrem mais nesse período. Eu fiquei desesperada ao imaginar passar dias sentindo
aquela dor. Olhei para Samara, ela entendeu, chegou no meu ouvido e disse “insista para ela
fazer o toque”. Eu pedi novamente, a enfermeira – minha Xará – me deu a mesma explicação,
de que não havia necessidade de me machucar, pq ela tinha certeza de que eu não tinha a
dilatação completa.

Acabei voltando para casa. Exausta.

Chegando em casa tentei fazer o que a enfermeira disse: tomei banho, deitei na cama.

Tentei cochilar. Mas não pude. E a parte mais dolorosa foi acontecendo, na minha cama, eu
atingi a dilatação total, Sophia coroou. Eu gritava o pai dela “Ela vai nascer aqui!”. Ele não
sabia o que fazer. Samara foi firme “aqui não dá! Fique de 4 apoios. Contraia, ao invés de
expulsar. Segure essa menina aí.” Ela agilizou tudo, delegou funções ao pai de Sophia. O Táxi
veio, ela desceu comigo as escadas, a cada nova contração, a força da vida queria escorrer
pelas minhas pernas, mas eu segurava, num esforço quase supra-humano. Fui a viagem até a
casa de parto, na posição de 4 apoios, o motorista extremamente preocupado e super veloz,
eu batia a cabeça na porta (hahahaha hoje eu dou risada, mas fiquei com galo na cabeça e só
senti a dor no dia seguinte, óbvio)... Quando chegamos lá, eu já estava no limite, já fui fazendo
minha performance na recepção, fiquei de 4 apoios. Na mesma hora as enfermeiras vieram me
atender, me levaram para a sala de pré-parto e foi lá que Sophia nasceu. Eu não aguentava
mais segurar. Quando pude deitar na maca, relaxei e deixei o corpo fazer o seu trabalho. Ela
estava empelicada, a bolsa rompeu na sua saída. Foi lindo. Foi extasiante. Foi um alívio!

Passada aquela turbulência, um universo novo de grandes desafios e fortes emoções


começava para mim, personificado naquele ser tão pequenino e indefeso. Foi um estado de
transe que eu experimentei por dias, hormônios lá em cima. Mas quando a queda hormonal
bateu certo, a bad veio com força, a depressão, a solidão, o cansaço, o desespero... Mas esse
já é outro capítulo dessa história.

Hoje Sophia completa 4 anos e eu tbm (afinal, renasci de mim mesma). Tô longe de ser “o
modelo de mãe”, eu fico nervosa, eu grito, falo palavrão na frente dela, qnd estou com raiva.
Tenho melhorado sim, há dias de doçuras sem fim e há dias meio-amargos. E eu me sinto uma
mulher muito corajosa por ter enfrentado essa experiência. Não estou aqui deslegitimando as
escolhas por cesáreas eletivas de quem quer que seja, cada mulher sabe o que é melhor para
si. Mas eu me sinto honrando minha ancestralidade, meu sagrado feminino, quando lembro
que pari como as minhas ancestrais. Eu, uma mulher gorda (considerada de risco pela
medicina tradicional) pari lindamente, totalmente natural, sem causar auê! Me sinto
maravilhosa, quando lembro que amamentei por quase 3 anos seguidos, que compartilho a
cama até hoje, que conto história antes de dormir, que ensino canções, que danço com ela,
que descubro a minha forma de ser mãe fora dos moldes que vendem por aí. Eu amo a minha
filha. Mas hoje ela comeu o bolo de chocolate. E ta tudo bem também.

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