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O conceito de commons na cibercultura*

Sergio Amadeu da Silveira


Mestre e doutor em Ciência Política (USP)
Professor titular do Programa de Pós-graduação
da Faculdade Cásper Líbero
E-mail: sergioamadeu@uol.com.br

O termo inglês commons tem sido


crescentemente empregado no
cenário das redes informacionais e nos am-
bientes da cibercultura. André Lemos, ao
Resumo: Este artigo trata da evolução do conceito de commons
na cibercultura. Analisa as idéias de Yochai Benkler e de Lawrence
discutir como diversas práticas cibercultu-
Lessig e as compara com as abordagens de Hardt e Antonio Negri, rais modificam a comunicação e a sociedade,
bem como com as proposições do coletivo Critical Art Ensemble. declarou que o “princípio que rege a ciber-
Explora, a partir da abordagem de Howard Rheingold, o potencial
emergente dos commons e finaliza inserindo-os em uma ecossiste- cultura é a re-mixagem” (Lemos, 2006:52).
ma digital baseada no relacionamento e não mais na predominân- O remix, a colagem, a recombinação de con-
cia da propriedade, como defende John Perry Barlow.
Palavras-chave: cibercultura, commons, cultura digital, práticas
teúdos e formas são expressões da idéia de
colaborativas, propriedade intelectual. commons, ou seja, a cultura das redes é um
terreno típico dos commons.
El concepto de commons en la cibercultura
Resumen: Este artículo trata de la evolución del concepto de
Commons pode ser traduzido como co-
commons en la cibercultura. Analiza las ideas de Yochai Benkler mum, produção ou espaço comum. Seu sig-
y de Lawrence Lessig y las compara con los abordajes de Hardt nificado também comporta a noção de pú-
y Antonio Negri, bien como con las proposiciones del colectivo
Critical Art Ensemble. Explota, a partir del abordaje de Howard blico em oposição ao que é privado. Seu uso
Rheingold, el potencial emergente de los commons y finaliza in- evoca ainda a idéia de algo que é feito por
siriéndose en un ecosistema digital basado en la relación y no
más en la predominancia de la propiedad, como defiende John
todos ou por coletivos e comunidades. Os
Perry Barlow. commons pretendem expressar recursos que
Palabras clave: cibercultura, commons, cultura digital, são comuns. Bens públicos são commons.
prácticas colaborativas, propiedad intelectual.
Garret Hardin, em 1968, escreveu o ensaio
The concept of commons in cyberculture intitulado “The tragedy of the commons”. Nele
Abstract: This article addresses the evolution of the concept defendeu que o acesso irrestrito às áreas co-
of the commons in cyberculture. It analyzes the ideas of Yochai
Benkler and Lawrence Lessig, comparing them with those of muns pode levar à super-exploração de seus
Michael Hardt and Antonio Negri, as well as with those of the recursos finitos. Um exemplo muito utiliza-
Critical Art Ensemble. Based on the arguments of Howard
Rheingold, the article explores the emergent potential of the
commons and positions them within a digital ecosystem based
on relationships and not on the predominance of property, as *
Trabalho apresentado ao NP Tecnologias da Informação e da
defended by John Perry Barlow. Comunicação, durante o XXX Congresso Brasileiro de Ciên-
Key words: cyberculture, commons, digital culture, collaborati- cias da Comunicação (Intercom). Santos, 29 de agosto a 2 de
ve practices, intellectual property. setembro de 2007.

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do é o das famílias que exploravam pastos Don Tapscott e Anthony D. Williams es-
comuns com suas ovelhas. Como o número creveram Wikinomics: how mass colaboration
de ovelhas não parava de crescer, e não ha- changes everything, lançado em dezembro
via também nenhuma coordenação sobre os de 2006. Os autores definiram o termo wi-
recursos comuns, as ovelhas acabavam exau- kinomics como uma composição das idéias
rindo completamente essas terras. de abertura ou transparência, colaboração
entre pares, compartilhamento e ação global.
Eles trataram do resultado econômico dos
processos massivos de colaboração. O que
Para Benkler, a rede
são esses processos senão manifestações do
mundial de desenvolvimento dos commons? Apesar de os
computadores fez processos colaborativos já existirem há muito
emergir a produção tempo no cenário dos negócios e das empre-
social ou colaborativa sas, o fenômeno atual é diferente. A diferença
entre pares, que conta está no fato de a atual colaboração massiva
articular agentes individuais livres, que coo-
com indivíduos livres
peram e reúnem-se para resolver problemas
que são do seu interesse. Não colaboram por
obrigação, nem estão submetidos a institui-
A idéia de commons como bem comum ções ou companhias.
material, ao emergir, traz necessariamente a Tapscott e Williams observaram que,
discussão sobre a escassez e sobre o compor- no passado, existia alguém ou uma grande
tamento individual baseado no homem ego- companhia controlando os fluxos vitais do
ísta, tão bem desenhado por Adam Smith na processo de colaboração. Sem constatar o
Riqueza das nações (Smith, 1996:74). O de- desaparecimento das hierarquias, os autores
bate necessariamente passa pela questão da percebem mudanças profundas na natureza
eficiência da propriedade privada em relação da tecnologia, da demografia e da economia
à propriedade coletiva. Já a idéia de commons que estão possibilitando o surgimento de
como recurso ou bem imaterial, simbólico, modelos de produção baseados na comuni-
faz surgir um novo contexto, desvinculado dade, na colaboração e na auto-organização,
dos limites físicos da matéria. Conduz o de- com resultados melhores que nos modelos
bate para o cenário da abundância e para o fundados na hierarquia e no controle.
campo fundamentalmente comunicacional. Neste texto, buscarei discutir algumas das
A prática dos commons no contexto infor- mais importantes visões sobre a emergência, a
macional tem adquirido mais relevância que definição e a evolução dos commons nesse ce-
as práticas privadas. A construção da rede nário de hipercomunicação, de convergência
das redes, a internet, a criação do padrão de mídias, de expansão da digitalização e inte-
http e da web, o movimento do software li- ratividade, enfim, na sociedade informacional.
vre, a Wikipedia, a música techno, a blogos-
fera, o Youtube, o Slashdot, o Rau-tu, os sites Conceito de commons em Benkler
Overmundo e Domínio público, o Creative
Commons, o seti@home da Nasa, o BitTor- Um dos principais pensadores dos com-
rent, o Barcamp e as ações P2P em geral, têm mons é o professor titular da Escola de Di-
marcado a formação da comunicação e da reito de Yale, Yochai Benkler. No texto A eco-
cultura digitais. Com a influência decisiva nomia política dos commons, publicado em
das redes de comunicação e das tecnologias 2003, Benkler definiu o termo como “um
de informação nos demais segmentos da tipo particular de arranjo institucional que
vida social, os commons entraram na pauta governa o uso e a disposição de recursos. Sua
do temário cultural, econômico e político. principal característica, que os define de for-

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ma distinta da propriedade, é que nenhuma drives and social signals, rather than either
pessoa tem o controle exclusivo do uso e da market prices or managerial commands
disposição de qualquer recurso particular. (Benkler, 2002: 3).1
Pelo contrário, os recursos governados pela Benkler não parte da perspectiva da di-
comunidade podem ser utilizados e dispos- visão da sociedade em classes sociais. Suas
tos por qualquer um entre um dado número categorias são as mesmas usadas pelos eco-
de pessoas” (Benkler, 2007:12). nomistas institucionalistas. A evolução de
Benkler considera que os commons po- sua argumentação não requer a denúncia
dem ser vistos a partir de dois parâmetros: do mecanismo do mercado e de seus pro-
primeiro, o seu grau de abertura e, segundo, cessos de exclusão integradora. Suas cate-
a existência ou não de regulação. Os commons gorias são firmas, sinais de mercado, in-
podem estar abertos a todos, como os ocea- divíduos consumidores que perseguem os
nos e o ar, ou podem ser restritos a um grupo sinais da flutuação dos preços no cenário
ou coletividade. Também podem ser regula- de confronto dos interesses distintos da
dos ou não-regulados. Para Benkler, o tipo de oferta e da demanda. Para o pensador nor-
commons regulado mais bem-sucedido são as te-americano, a liberdade de participação
vias públicas. A existência de regras, de nor- nas redes e a livre iniciativa, diante de um
mas, de padrões de conduta de motoristas e leque extremamente variado de interesses,
pedestres e exigência de licenciamento dos levam os indivíduos a organizarem proje-
veículos e condutores não impedem o uso co- tos colaborativos em que seus participan-
mum e público das ruas e rodovias. tes não são firmas, nem indivíduos que
A construção teórica de Benkler sobre os perseguem sinais de mercado, mas sujeitos
commons não vem de nenhuma fonte marxista. que criam importantes produções colabo-
Seu pensamento sobre o comum e o coletivo rativas de grande alcance social.
fundamenta-se no ideário liberal, ou seja, na Na busca da compreensão maior do fenô-
defesa da liberdade como princípio primeiro meno dos commons, Benkler foi aprofundan-
da sociedade. Em um texto chamado Coase’s do os estudos, seguindo a expansão da sua
Penguin, or Linux and the nature of the firm, de presença nas redes informacionais. Em 2006,
2002, o autor já relacionava a liberdade no am- publicou o livro The wealth of networks: how
biente de redes digitais com o surgimento de social production transforms markets and fre-
um novo modo de produção social: edom. Logo na abertura do primeiro capítu-
For decades our understanding of econo- lo, ele deixa evidente o traçado de suas idéias
mic production has been that individuals e os seus objetivos teóricos:
order their productive activities in one of
two ways: either as employees in firms,
following the directions of managers, or 1
Tradução do autor: “Durante décadas a nossa compreensão de
as individuals in markets, following price como os indivíduos organizam suas atividades produtivas tem
signals. (...) In the past three or four years, sido realizada em uma de duas formas: quer como empregados
em empresas, seguindo as instruções dos gerentes, ou, como in-
public attention has focused on a fifteen- divíduos nos mercados, acompanhando os sinais dos preços. (...)
year-old social-economic phenomenon in Nos últimos três ou quatro anos, a atenção do público tem se
the software development world. (...) I su- concentrado em um recente fenômeno econômico-social de de-
ggest that we are seeing is the broad and senvolvimento mundial de software que ocorre há quinze anos.
deep emergence of a new, third mode of (...) Sugiro que estamos assistindo a emergência de um novo,
amplo e profundo terceiro modo de produção no ambiente das
production in the digitally networked en- redes digitais. Eu chamo este novo modo de “produção coletiva e
vironment. I call this mode “commons-ba- comum entre pares” [esta expressão não tem tradução literal em
sed peer-production”, to distinguish it from português, por isso sugiro seu uso em inglês “commons-based
the property- and contract-based models peer-production”], para distingui-la dos modelos de empresas
of firms and markets. Its central characte- e mercados baseados em contratos e em propriedade. Sua ca-
racterística central é que grupos de indivíduos colaboram com
ristic is that groups of individuals succes- sucesso em projetos de grande escala seguindo um conjunto de
sfully collaborate on large-scale projects diversas motivações e sinais sociais, ao invés dos preços do mer-
following a diverse cluster of motivational cado ou dos comandos gerenciais”.

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Information, knowledge and culture are dade. Nesse ambiente digital, Benkler vê um
central to human freedom and human de- ecossistema e uma ecologia institucional que
velopment. How they are produced and ex- é fruto de uma batalha entre a liberdade de
changed in our society critically affects the
way we see the state of the world as it is and criação e os grandes grupos que controlaram
might be; who decides these questions; and até então a produção da cultura e os prin-
how we, as societies and polities, come to cipais meios de comunicação. Para Benkler,
understand what can and ought to be done. a rede mundial de computadores permitiu
For more than 150 years, modern complex emergir a produção social ou colaborativa
democracies have depended in large mea- entre pares, que conta com indivíduos livres.
sure on an industrial information economy
for these basic functions. In the past decade A liberdade é a base da colaboração. Se, na
and a half, we have begun to see a radical sociedade industrial, a liberdade serviu prin-
change in the organization of informa- cipalmente para a ampliação dos mercados,
tion production. Enabled by technological na era da internet a liberdade está servindo
change, we are beginning to see a series of para a expansão dos commons,e do seu su-
economic, social, and cultural adaptations cesso dependerá o futuro da criatividade e da
that make possible a radical transforma-
tion of how we make the information en-
própria liberdade humana.
vironment we occupy as autonomous indi- Um dos pontos mais instigantes na visão
viduals, citizens, and members of cultural de Benkler é a ligação entre o meio digital
and social groups. It seems passe today to e enredado de comunicação, a liberdade e
speak of “the internet revolution”. In some a concepção de homem que supera a idéia
academic circles, it is positively naıve. But do homo-economicus, completamente volta-
it should not be. The hange brought about
by the networked information environ-
do à racionalidade do mercado. No mundo
ment is deep. It is structural. It goes to the das redes, a liberdade, ao invés de ampliar
very foundations of how liberal markets a propriedade privada, está colaborando
and liberal democracies have coevolved for para ampliar o não-proprietário. Ao invés
almost two centuries (Benkler, 2006:1).2 de aumentar simplesmente a competição,
está consolidando a colaboração e a solida-
O que chama de “revolução da internet”
riedade. Assim, os commons não surgem do
é o que permitiu a construção de uma rede
autoritarismo ultra-regulatório, do Estado
de troca de informações digitais, descentra-
agigantado para coordenar o crescimento
da, sem os controles rígidos dos meios de co-
dos espaços e esferas comuns. Nascem exa-
municação de massa, baseada na interativi-
tamente do contrário: da auto-organização.
Emergem de processos bottom-up.
2
Tradução do autor: “Informação, conhecimento e cultura são
centrais para a liberdade e o desenvolvimento humano. A for- Conceito de commons em Lessig
ma como são produzidos e trocados em nossa sociedade afeta
criticamente nossa visão do mundo como ele é e como poderia Lawrence Lessig foi o idealizador do mo-
ser; quem decide essas questões; e como nós, como sociedades
e governos, vimos a entender o que pode e o que deve ser feito. vimento chamado Creative Commons. Ele
Durante mais de 150 anos, democracias modernas complexas também é professor de Direito. É interessan-
têm dependido em grande medida de uma economia industrial
da informação para estas funções básicas. Nos últimos 15 anos,
te notar que o conceito de commons tem sido
nós começamos a ver uma mudança radical na organização da muito mais trabalhado por pensadores do
produção de informação. Habilitados pela mudança tecnológica, Direito que da Cultura e da Comunicação.
estamos começando a ver uma série de adaptações econômicas,
sociais e culturais que tornam possível uma transformação radi- Isso ocorreu, talvez, porque esses pensado-
cal na forma como construímos o ambiente informacional que res estavam mais ligados ao que começou a
ocupamos como indivíduos autônomos, cidadãos e membros de
grupos culturais e sociais. Parece ultrapassado hoje em dia falar
ocorrer nos tribunais, a saber, a criminaliza-
da “Revolução da Internet”. Em alguns círculos acadêmicos, isto é ção dos produtores da cibercultura, das prá-
verdadeiramente ingênuo. Mas não deveria ser. A mudança trazi- ticas de colaboração, e as tentativas de res-
da pelo ambiente da rede de informações é profunda. É estrutural.
Ela vai até as bases de como mercados e democracias liberais têm trição da liberdade de compartilhar arquivos
co-evoluído por quase dois séculos”. digitais. Lessig, um dos principais pensado-

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res dos commons, também funda suas idéias a partir da troca de arquivos. Mas também
na matriz liberal, principalmente a partir a sociedade não tem alterado sua visão legal
dos princípios constitucionais que marcam sobre as novas práticas comunicacionais vi-
a evolução do Direito nos Estados Unidos. vidas nas redes P2P e no ambiente de com-
Muitos de seus argumentos são inspirados partilhamento. Ao contrário, Lessig vê surgir
nos federalistas. graves perigos para a cibercultura:
Lessig não quer atacar o copyright ou a
propriedade privada, muito menos o capita-
lismo. O jurista está preocupado com a de-
fesa da liberdade e da criatividade artística e
No mundo das redes,
cultural. Ele acredita que o domínio público a liberdade, ao invés
foi e é um espaço essencial e indispensável de ampliar a
para a criação cultural. Foi a intenção de propriedade privada,
defender o domínio público diante do alar- está colaborando
gamento e enrijecimento das legislações de para ampliar o
propriedade de idéias que o levou a idealizar
um modelo mais flexível de licenciamento
não-proprietário
de obras artísticas e bens culturais, chamado
Creative Commons. “O projeto complemen-
ta o copyright ao invés de competir com ele.
O mercado livre e a cultura livre dependem
Seu objetivo não é derrotar os direitos do au- de competitividade vibrante. Ainda assim,
tor, e, sim, facilitar para autores e criadores o efeito da lei atualmente é paralisar este
o exercício de seus direitos, de forma mais tipo de competitividade, produzindo uma
flexível e barata” (Lessig, 278: 256). cultura excessivamente regulada – assim
Com o crescimento da digitalização e como o efeito de controle excessivo no
mercado é produzir um mercado excessi-
da internet, cresceram também as possi- vamente regulado.
bilidades de compartilhar bens culturais
e informações como em nenhum outro A construção de uma cultura da permissão,
período da história. Era possível criar um ao invés de uma cultura livre, é o primeiro
caminho pelo qual as mudanças que des-
domínio público global que acompanhasse
crevi irão enterrar a inovação. Uma cultura
o ciberespaço. O ciberespaço passou a ser da permissão significa uma cultura de ad-
visto como o local ideal para os commons. vogados, na qual a habilidade de criar re-
Esse sucesso das redes informacionais ge- quer um telefonema ao seu advogado. (...)
rou na indústria cultural de bens analó- Os custos de transação enraizados em uma
gicos uma reação brutal e desmedida. Sua cultura da permissão são altos o suficiente
reação foi expandir os limites do copyright para sepultar uma grande variedade criati-
va (Lessig, 2005:198).
no tempo e nas modalidades. Nos Estados
Unidos, um conto ou uma música passou Nessa passagem, Lessig expõe com nitidez
a ter seus direitos reservados por 95 anos seu fundamento liberal e sua preocupação
após a morte do autor. O objetivo da in- com a excessiva regulação, que poderá sufo-
dústria fonográfica, editorial e cinemato- car a criatividade. A competição é a variável
gráfica é conter os commons, impedir que independente de Lessig. Para ela existir efeti-
obras caiam em domínio público. Com vamente, é preciso um mercado e uma cultura
isso, querem manter os fluxos de renda ob- livres. O avanço da comunicação em rede, ao
tidos na era industrial, do broadcasting e propiciar o que chamou de “propagação efi-
das produções analógicas. caz de conteúdo”, é denunciado pela indústria
Tal reação não tem conseguido paralisar cultural como um erro, como uma grande fa-
o avanço da cultura digital, da criatividade lha nas comunicações. Então, a indústria de
recombinante, da desobediência civil na rede conteúdo – os cavaleiros do copyright – ten-

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tará reduzir a eficiência comunicacional da rem uma cultura da permissão. A cibercultura


internet. Essa redução não ocorrerá, segundo depende dos commons para se desenvolver.
Lessig, para aumentar a criatividade, a ino-
vação e a produção de conhecimento, mas A construção do comum em Hardt e
simplesmente para manter um velho estilo de Negri
negócios, altamente lucrativo.
Ataques à rede se multiplicam e visam Pensadores oriundos do ambiente da es-
conter a liberdade dos fluxos e a eficiência de querda marxista, o norte-americano Micha-
seu funcionamento. O objetivo é ampliar a el Hardt e o italiano Antonio Negri também
privatização da cultura diante da expansão trabalham com o conceito de commons, ou
dos commons. Lessig, além de lançar fortes melhor, de common. Apesar do ponto de par-
argumentos liberais, propõe uma postura tida inicialmente distante do liberalismo de
política de equilíbrio, pois ataca os extremos Benkler e Lessig, é possível encontrar várias
e o que chama de exagero: intersecções e linhas de argumentação seme-
lhantes em seus trabalhos. Todavia, é preci-
so iniciar a análise da proposição de Hardt e
Negri com um alerta:
Lessig defende a
ampliação dos O comum que compartilhamos, na realida-
de, é menos descoberto que produzido. (Re-
commons como uma lutamos em utilizar a expressão no plural, os
reconstrução do domínio comuns [the commons], porque ela remete
público, como espaço a espaços de partilha pré-capitalista que fo-
ram destruídos pelo advento da proprieda-
vital para a criatividade de privada. Apesar de um tanto estranho, o
e a inovação comum [the common] ressalta o conteúdo
filosófico do termo e deixa claro que não se
trata de uma volta ao passado, mas um novo
desenvolvimento.) Nossa comunicação, co-
laboração e cooperação não se baseiam
Copyright pode ser propriedade, mas, como
apenas no comum, elas também produzem
toda propriedade, também é uma forma de
o comum, numa espiral expansiva de rela-
regulamentação. É uma regulamentação
ções. Esta produção do comum tende a ser
que beneficia a alguns e causa danos a ou-
central a todas as formas de produção social,
tros. Quando feita corretamente, beneficia
por mais acentuado que seja o seu caráter
criadores e causa danos a parasitas. Quan-
local, constituindo na realidade a caracterís-
do feita erroneamente, é uma norma da
tica básica das novas formas dominantes de
qual poderosos se utilizam para derrotar a
trabalho hoje (Hardt e Negri, 2005:14).
concorrência. (...)

A super-regulação barra a criatividade. O common, aqui, será o comum, mas o


Asfixia a inovação. Dá aos dinossauros po- comum não é um dado, é uma construção.
der de veto sobre o futuro. Desperdiça a Com uma linguagem de matriz dialética,
extraordinária oportunidade do desenvol- Hardt e Negri querem superar qualquer
vimento de uma criatividade democrática acusação de romantismo ou de volta ao
que a tecnologia digital possibilita (Lessig,
passado. Sua proposição baseia-se na ob-
2005:200 e 205).
servação das transformações que estariam
Lessig defende a ampliação dos commons levando o mundo do trabalho a passar por
como uma reconstrução do domínio público, importantes rupturas em suas categorias
como espaço vital, sem o qual não teremos fundamentais, com o capitalismo estaria se
material para a criatividade e a inovação. O transformando em capitalismo cognitivo.
conflito-chave nesse cenário é entre os defen- Como apontou a professora de Economia da
sores de uma cultura livre versus os que que- Universidade de Paris, Antonella Corsani, o

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que vivenciamos foi a passagem do fordis- reapropriado pelas singularidades que coo-
mo para o pós-fordismo. Isso representou peram na produção social biopolítica; é um
“a passagem de uma lógica da reprodução interesse público que não está nas mãos da
burocracia, mas é gerido democraticamente
para uma lógica da inovação, de um regime pela multidão. Não se trata simplesmente
de repetição para um regime de invenção” de uma questão jurídica em outras palavras,
(Corsani, 2003:15). mas coincide com atividade econômica ou
Para Hardt e Negri, o comum está baseado biopolítica que analisamos anteriormente,
na comunicação entre singularidades expressas como no caso da partilha criada por exter-
nos processos colaborativos de produção. Os nalidades positivas ou pelas novas redes de
informação, e, de maneira mais geral, por
autores querem superar o conceito de comum todas as formas cooperativas e comunicati-
que guarda relações com as noções de comu- vas de trabalho. Em suma, o comum assina-
nidade ou de público. “Enquanto o individual la uma nova forma de soberania, uma sobe-
se dissolve na unidade da comunidade, as sin- rania democrática (ou, mais precisamente,
gularidades não se vêem tolhidas, expressan- uma forma de organização social que des-
loca a soberania), na qual as singularidades
do-as livremente no comum” (Hardt e Negri,
sociais controlam através de sua própria
2005:266). Além de se distanciarem do ideal atividade biopolítica aqueles bens e servi-
romântico comunitário, querem simultanea- ços que permitem a reprodução da própria
mente denunciar com sua construção lógica multidão. Esta haveria de construir uma
as idéias dos neoliberais, que defendem a de- passagem da res-publica para a res-commu-
pendência social das determinações do merca- nis (Hardt e Negri, 2006:268).
do. Hardt e Negri construíram um conceito de
Assim, os autores afirmam que o comum
comum estritamente vinculado à idéia de uma
que defendem é muito menos descoberto que
produção realizada pela multidão.
produzido. Sua análise, claramente proposi-
A tarefa de Hardt e Negri é reconstruir o
tiva, aponta para a montagem de uma espiral
conceito de comum e defender que ele pode
expansiva de relações para a construção de
ser reconstruído pelos novos sujeitos históri-
uma superação do capitalismo.
cos, a multidão. O que vem a ser a multidão?
A noção de multidão baseada na produção Commons, propriedade, plágio e autoria
do comum afigura-se para alguns como
um novo sujeito de soberania, uma iden- De certo modo, o conceito de commons
tidade organizada semelhante aos velhos pode conviver com a propriedade de idéias,
corpos sociais modernos, como o povo, a
classe operária e a nação. Para outros, pelo
como argumenta Lessig. Todavia, nem todos
contrário, nossa noção de multidão, com- os ativistas e pensadores da cibercultura con-
posta que é de singularidades, parece pura cordam com a instituição da propriedade so-
anarquia (Hardt e Negri, 2006:271). bre bens imateriais. Outros consideram que
é necessário separar a idéia de propriedade
A multidão de que tratam nossos autores sobre bens culturais da idéia de autoria. A
é de difícil definição. Mas pode ser entendida primeira seria um absurdo e a segunda, viá-
como formada por aqueles que constroem vel, como reconhecimento de um fato ocor-
o comum em processos virtuais, não menos rido no cotidiano em que alguém criou ou
reais, completamente plurais, que precedem recriou algo sobre uma base de conhecimen-
à individuação e que se realizam no seu pro- to comum. Uma hipótese importante foi
cesso de construção. Não é o povo nem as apresentada, há muito tempo, pelo professor
massas. Parecem nômades em um percurso George P. Landow:
agregador de pessoas autônomas.
As concepções de autoria guardam uma
O interesse comum, em outras palavras, estreita relação com a forma de tecnologia
é um interesse geral que não se torna abs- da informação que prevalece em um mo-
trato no controle do Estado, sendo antes mento dado, e, quando esta muda ou re-

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parte o seu domínio com outra, também por uma ideologia que tem pouco lugar
se modificam, para o bem ou para o mal, na tecnocultura. Deixemos que as noções
as interpretações culturais de autoria (Lan- românticas de originalidade, genialidade e
dow, 1995:243). autoria permaneçam, mas como elementos
para produção cultural sem nenhum pri-
Seguindo o argumento que retira a pro- vilégio especial acima de outros elementos
priedade das idéias de uma condição quase igualmente úteis. Está na hora de aberta e
natural ou da pretensão de ser manifestação ousadamente usarmos a metodologia da
recombinação para melhor enfrentarmos
fundadora da cultura humana, o coletivo a tecnologia do nosso tempo. (Critical Art
Critical Art Ensemble, formado por cinco Ensemble, 2001:98).
artistas que exploram as relações entre arte,
teoria crítica e política radical, defende que Por mais propositivos e radicais que sejam
as concepções de propriedade de idéias que as análises do Critical Art Ensemble, podemos
permanecem em nossa sociedade são cria- notar que seus argumentos distanciam-se da
ções históricas dos períodos iluminista e ro- perspectiva do movimento Creative Com-
mântico. Guardam relações diretas com os mons (Lessig) sem serem necessariamente
processos excludentes que compõem a histó- antagônicos a ele, uma vez que não se pro-
ria da formação do sistema capitalista: põem a combater a originalidade como possi-
bilidade criativa. Outro elemento importante
[Os direitos autorais] originalmente fo- nesse contexto é a defesa da prática recombi-
ram criados não a fim de proteger os es-
critores, mas para reduzir a competição nante como ideologia da tecnocultura. André
entre as editoras. Na Inglaterra do século Lemos, nesse sentido, escreveu que, “na crise
XVII, quando o direito autoral apareceu da criação pós-moderna (a arte morreu!), só
pela primeira vez, o objetivo era reservar às é possível apropriações sob o signo da recria-
próprias editoras, para sempre, os direitos ção. Não há mais autor, original e obra, apenas
exclusivos de imprimir certos livros. A jus- processos abertos, coletivos e livres” (Lemos,
tificativa, é claro, era de que, quando usada
em uma obra literária, a linguagem teria a 2006:53). Os argumentos guardam extrema
personalidade do autor imposta sobre ela, proximidade com a descrição que Pierre Lévy
marcando-a dessa maneira como proprie- faz da cibercultura:
dade privada. Sob o abrigo dessa mitologia,
o direito autoral floresceu no capitalismo A obra da cibercultura atinge uma certa for-
tardio, estabelecendo os precedentes legais ma de universalidade por presenca ubiqui-
para a privatização de qualquer item cultu- tária na rede, por conexão com outras obras
ral, fosse ele uma imagem, uma palavra ou e co-presença, por abertura material, e não
um som (Critical Art Ensemble, 2001:98). mais necessariamente pela significação vá-
lida ou conservada em todas as partes. Ora,
O coletivo aponta uma relação direta en- essa forma de universalidade por contato
tre crescimento da propriedade privada so- caminha ao lado de uma tendência à desto-
talização. De fato, o fiador da totalização da
bre a cultura e a redução das possibilidades obra, ou seja, do fechamento do seu sentido,
de recombinação, de copiar pedaços para é o autor. Mesmo se o significado da obra
criar novas apresentações, enfim de mixar e se pretende aberto ou múltiplo, devemos
re-mixar. Tais práticas, que trabalham com ainda assim pressupor um autor se quiser-
o fundamento de que a cultura e o conheci- mos interpretar intenções, decodificar um
mento são commons, foram combatidas nos projeto, uma expressão social ou mesmo
um inconsciente. O autor é a condição de
processos de industrialização da cultura, de possibilidade de qualquer horizonte de sen-
marginalização da metodologia do plágio e tido estável. Mas tornou-se banal dizer que
de suas possibilidades de ressignificação. a cibercultura coloca muito em questão a
importância e a função do signatário. O en-
O presente requer que repensemos e rea- genheiro de mundos não assina uma obra
presentemos a concepção de plágio. Sua acabada, mas um ambiente por essência
função tem sido há muito desvalorizada inacabado, cabendo aos exploradores cons-

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truir não apenas o sentido variável, múlti- e Negri. Uma multidão que se constrói no
plo, inesperado, mas também a ordem de processo mesmo de construção do comum,
leitura a as formas sensíveis. Além disso, a uma constituição de si. Ou, como explica o
metamorfose contínua das obras adjacentes
e do meio virtual que sustenta e penetra a visionário Rheingold, utilizando argumen-
obra contribui para destruir um eventual tos da teoria da emergência, uma epidemia
autor de suas prerrogativas de fiador de sen- colaborativa em que participantes vão en-
tido (Lévy, 1999:138). volvendo não-participantes e que, quanto
mais cresce, mais inteligente se torna. Os
commons são cada vez mais percebidos não
Processos emergentes e auto-organizados apenas como espaços para a inteligência co-
Um dos principais analistas da rede e da letiva, mas como terreno para a constituição
cibercultura é o autor de smart mobs, Howard de sistemas emergentes:
Rheingold. Tendo sido um dos pioneiros no
uso da expressão “comunidades virtuais” –
para qualificar os processos que estavam ocor- Os commons, mais
rendo quando milhares de pessoas passavam que espaços para a
a criar novos vínculos e sociabilidades a partir inteligência coletiva,
das redes informacionais –, Rheingold, mais são percebidos como
recentemente, percebeu que a convergência
digital, a crescente mobilidade e a expansão da
terreno para a
conectividade wireless estavam gerando um constituição de
novo fenômeno de “epidemias repentinas de sistemas emergentes
cooperação”, que ele denominou de mobili-
zações ou multidões inteligentes (smart mobs,
em inglês, traduzido para o espanhol como Que características comuns têm esses sis-
multitudes inteligentes): temas? (...) São sistemas bottom-up, e não,
top-down. Pegam seus conhecimentos a
Las multitudes inteligentes son uma pro- partir de baixo. Em uma linguagem mais
priedad emergente impredecible, pero al técnica, são complexos sistemas adaptati-
menos parcialmente descriptible, que aflo- vos que mostram comportamento emer-
ra a medida que aumenta el número de gente. Neles, os agentes que residem em
usuarios de teléfonos móviles, el número uma escala começam a produzir comporta-
de chips que se intercomunicam, el núme- mentos que residem em uma escala acima
ro de ordenadores que saben dónde están deles: formigas criam colônias; cidadãos
situados, el número de tecnologías que se criam comunidades; um software simples
incorporan al atuendo, el número de perso- de reconhecimento de padrões aprende a
nas que utilizan estos nuevos medios para recomendar novos livros. O movimento
inventar nuevas formas de sexo, comercio, das regras de nível baixo para a sofisticação
entretenimiento, comunión y, como siem- do nível mais alto é o que chamamos de
pre, conflicto (Rheingold, 2004:208).3 emergência (Johnson, 2003:14).

Aqui seria possível aproximar as “multi- Os commons, entendidos como possibi-


tudes” de Rheingold da “multidão” de Hardt lidades de criação de práticas colaborativas
em espaços de mobilização comuns, têm na
3
Tradução do autor: “As multidões inteligentes são uma pro- internet um meio de expansão. Rheingold
priedade emergente imprevisível, mas, pelo menos parcial- alertou a todos para a necessidade de obser-
mente descritível, que surge a medida que aumenta o número
de usuários de telefones móveis, o número de chips que se in-
var a ampliação do ciberespaço com a inclu-
tercomunicam, o número de computadores que sabem onde são dos móveis, celulares, laptops e palms.
estão situados, o número de tecnologias que são incorporados Eles dão mobilidade no mundo presencial e
no vestuário, o número de pessoas que utilizam estes novos
meios de inventar novas formas de sexo, comércio, entreteni- permitirão o acesso mais variado ao ciberes-
mento, comunhão e, como sempre, de conflitos”. paço. Assim, aumentam as portas e os cami-

Sergio Amadeu da Silveira - O conceito de commons na cibercultura


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nhos do presencial para o ciberespaço e deste tes, podemos afirmar que, no ciberespaço, a
para os espaços da matéria. Mas do mesmo quantidade tende se transformar em quali-
modo ampliam o potencial dos commons: dade. Isso acontece com o desenvolvimento
de software livre. Quanto maior a comuni-
Internet, las autopistas, las calles, los par-
dade de colaboradores, melhor tem sido a
ques, los descubrimientos científicos, las
obras de dominio público y el espectro qualidade dos códigos.
electromagnético generan más valor para
más personas si se mantienen como bienes Versão beta de uma conclusão (sempre
comunes y se autogestionan para impedir
la tragedia que se dividen como propriedad
incompleta)
privada y se gestionam desde uma autori-
Os commons se espalham pelo planeta a
dad hobbesiana (Rheingold, 2004:182).4
partir dos coletivos recombinantes, pelas co-
munidades de software livre, pelo movimen-
to do open spectrum, pelos coletivos de com-
As pessoas serão partilhamento de redes sem fio abertas, pela
valoradas pelo que produção do open journalism, pelas descon-
fazem, pelo seu mérito ferências, pela proliferação de wikis e de tra-
e comportamento, e balhos colaborativos em rede, pela crescente
produção licenciada em creative commons,
cada vez menos pela
pela expansão dos ativistas da cibercultura
propriedade material ou que estão também construindo uma econo-
direitos de copyright mia do relacionamento.
John Perry Barlow percebeu que o rela-
cionamento superará a propriedade. Escre-
A influência do ideário da autonomia dos veu um texto curto e contundente, deno-
sujeitos é reforçada no discurso de Rheingold minado “Economia de idéias”. A leitura dos
pela forte influência das teorias dos sistemas argumentos indica que a economia do rela-
auto-organizados, a denominada teoria da cionamento é também uma economia das
emergência. Mas, ao contrário de reforçar a reputações. As pessoas serão valoradas pelo
perspectiva individualista, ela reforça a pers- que fazem, pelo seu mérito e comportamen-
pectiva do comum, da inteligência coletiva, to, e cada vez menos pela propriedade ma-
das práticas colaborativas. terial ou direitos de copyright que detêm. A
O professor de Ética e Sociologia da Uni- reputação é um elemento-chave na cultura
versidad Complutense de Madrid, Javier das redes digitais.
Bustamante, ao discutir a ecologia digital da Hackers não se declaram hackers, sua re-
cibercultura, notou que “caracteriza a la ci- putação é que os tornam respeitados como
bercultura una supremacía de lo cuantitativo tais. Boa parte dessa reputação é construída
frente a lo cualitativo”5. Se vincularmos essa pela distribuição de códigos de qualidade
constatação ao fenômeno que Rheingold ou na colaboração para o desenvolvimento
captou nas “multitudes inteligentes” ou que de projetos compartilhados de programas
Johnson encontrou nos sistemas emergen- de computadores. Foi essa cultura hacker e
sua ética, fundada na liberdade e no com-
partilhamento, que estiveram no nascimen-
4
Tradução do autor: “Internet, estradas, ruas, parques, des- to da internet e nos seus principais desen-
cobertas científicas, as obras de domínio público e o espectro
electromagnético, geram mais valor para mais pessoas se se
volvimentos. Por isso, até o momento, os
mantém como bens comuns [commons] e são auto-geridas commons se confundem com a rede. E isso
para evitar a tragédia que se divide como propriedade privada é o que torna tão difícil e anacrônica cada
e é gerenciada a partir de uma autoridade hobbesiana”.
5
Tradução do autor: “caracteriza a cibercultura uma suprema- tentativa para privatizá-la e impor sobre ela
cia do quantitativo frente ao qualitativo”. controles autoritários.

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