O Surgimento da Filosofia: Para vermos o surgimento da Filosofia no
Ocidente, temos de, antes, vermos a relação do mito com a sociedade humana. A palavra mito tem origem no grego antigo mythis, que significa “palavra”, “narrativa”, “por assim dizer”, e a sua origem de palavra e significado dá o tom exato do valor do mito para os povos. Restringimo-nos aos exemplos dos mitos gregos, mas que podem e devem ser os seus aspectos, valores e influências sociais igualmente verdades em outros mitos de outros povos de outros lugares e não somente na Grécia. O mito é a compreensão intuitiva da realidade, é o primeiro meio que o ser humano utiliza para dar (mesmo que sem o rigor da lógica e da argumentação, bem como também da apresentação de provas) sentido e é entendido como verdade para esta pessoa e para o povo que dela compõe. Porém, vale lembrar, não é de qualquer intuição que se valha o mito nem de qualquer compreensão de realidade que o faça, esta precisa ser necessariamente atrelada às emoções e na afetividade, e aquela precisa de, ao mito, haver também o mistério. O mistério é sempre um enigma, palavra de origem latina aínigma, que significa “obscuridade de sentido”, cuja a fundamentação está no divino, na relação do homem com Deus, e na fé, tornando-se, portanto, impossível seu esclarecimento científico. Neste sentido, os mitos gregos surgiram por volta de 2000 a 1900 a.C., quando ainda não havia escrita acessível, e sua difusão ocorreu, como em todos os outros mitos de então, por vias orais, passadas de geração à geração, com a peculiaridade de serem recitados em formas de poemas ditados de cor, nas praças comuns aos gregos, que na época chamavam-se helenos (o país era ainda Hélade). Sua origem é atribuída a Homero, mas isto é impossível de se afirmar categoricamente, pois a criação dos mitos, mesmo os atribuídos a ele, são de origem coletiva, e o período de existência do autor é impreciso, variando de séc. IX ou VIII a.C., bem como é contestada sua própria existência de fato. Mas Ilíada e Odisseia, conjunto de extensos poemas atribuídos a Homero, tratava-se da história mitológica do país heleno, e funcionava como uma forma pedagógica de passar as mensagens politeístas para seu povo, enraizando isto à sua cultura. Para fins de situação no tempo: PERIODIZAÇÃO DA HISTÓRIA DA GRÉCIA ANTIGA Civilização Micênica: Sécs. XX ao XII a.C., época das histórias homéricas de Ulisses, Tróias, Aquiles, etc. encontradas em Ilíada e Odisseia. Tempos Homéricos: Sécs. XII ao VIII a.C., transição para um mundo essencialmente rural, com enriquecimento de senhores detentores de terras e surgimento de aristocracias políticas, além de ocorrer o recrudescimento do sistema escravagista. Civilização Arcaica: Sécs. VIII ao VI a.C., período de formação de cidades- estados, desenvolvimento comercial, expansão geográfica dos gregos, Surgimento da escrita, período de Hesíodo e surgimento dos primeiros filósofos. Período Clássico: Sécs. V ao IV a.C., auge da civilização grega: democracia ateniense, desenvolvimento das artes, literatura e filosofia; Época de Sócrates, Sofistas, Platão e Aristóteles. Período Helenístico: Sécs. III ao II a.C., declínio político, domínio macedônico e conquista da Grécia por Roma; Culturalmente, influência de filosofias orientais, como o estoicismo e epicurismo.
A Filosofia começa a se desenvolver a partir do surgimento da escrita,
possibilitando exercer razão e reflexão sobre aquilo que o locutor passa adiante. Durante o período Arcaico, o poeta Hesíodo (séc. VIII ao VII) faz uso da escrita para elaborar mais os mitos homéricos, porém com a preocupação acerca do surgimento do kósmos (em grego, “belo”, “ordem” e “mundo”). Com interesse nos mitos, sua filosofia teogonista (o surgimento do mundo vem de Deus, no caso grego, dos deuses) deu início às primeiras preocupações filosóficas, enquanto ciência, na história: a própria origem do mundo. Mas a Filosofia, de fato, nasce com o rompimento do mito como único meio de se observar e entender o mundo e sua natureza, e isso ocorre no fim do século VII e início do século VI a.C., com os primeiros filósofos, posteriormente conhecidos como pré-socráticos. Algumas evoluções sociais permitiram o surgimento da Filosofia na Grécia, acontecimentos que favoreceram o distanciamento dos deuses como base única para compreensão das coisas: A já citada invenção da escrita: No período micênico, já havia a existência da escrita na Grécia, porém era ela restrita aos escribas que exerciam funções administrativas de interesse palaciano, não se estendendo além disso. Com a invasão dórica (séc. XII a.C.) essa escrita desaparece e só ressurge, por influência dos fenícios, no séc. IX ou VIII a.C. Quando esta ressurge, sua função é diferente e é estendida à mais pessoas e os escritos gregos eram publicados em praças públicas, onde debatia-se, criticava-se e, mais importante, retirava-se a sacralidade da escrita. Invenção da moeda: Inventada na Lídia, atual Turquia, a moeda surge na Grécia por volta do séc. VII a.C., substituindo os objetos pré-monetários da aristocracia, que eram carregados de sentidos religiosos e valores hierárquicos, por objetos da nova classe em ascensão: os comerciantes. Isto deu-se por razão da expansão comercial no período arcaico, quando Grécia estende-se territorialmente à Magna Grécia (atual Itália e Sicília) e à Jônia (hoje litoral da Turquia), desenvolvendo, assim, o comércio marítimo. A fé sobre a valoração de um objeto, como a moeda, passa a ser nos humanos e não mais na espiritualidade; a moeda, portanto, possuía o valor que os humanos de uma mesma sociedade acreditavam que valia. A lei escrita: Antes sujeita à interpretação divina e vontades de reis, a lei codificada instaurou a extensão da justiça sobre os cidadãos atenienses, dessacralizando a norma jurídica e tornando-a mais humana e acessível de compreensão. E o principal: suscetível à modificações, críticas e novas concepções de leis.
Portanto, por tudo já mencionado, reforça-se o consenso de Filosofia como
rompimento do sagrado em diversos âmbitos sociais, não à toa ocorreu seu surgimento no lugar onde mais se houve essa separação: Grécia.
Filosofia Grega
Os primeiros filósofos, corroborando com o supracitado, são de Magna
Grécia, lugar de maior liberdade econômica nos territórios gregos, e aventuraram-se intelectualmente a descobrir o princípio de todas as coisas, na origem, então, de tudo que existe na natureza. As conclusões acerca desta problemática são as mais variadas, sendo algumas delas: Tales de Mileto: O arché (princípio) de tudo é a água. Pitágoras: O arché é o equilíbrio proporcionado pelos números. Anaximandro: A origem seria um material ilimitado e indeterminado chamado, em grego, ápeiron, que constitui todas as coisas. Parmênides x Heráclito: constituíram teorias conflitantes, enquanto Parmênides acreditava que a origem estava no que era estático, imutável, este era para ele o ser real, Heráclito, por sua vez, desenvolveu a teoria de que a origem está no oposto: naquilo que era mutável, naquilo que fluía.
Para situar-se no contexto temporal da Filosofia grega e nos seus interesses:
PERIODIZAÇÃO E ÁREAS DE INTERESSES DA FILOSOFIA GREGA
Período Pré-Socrático: Como já dito, os filósofos desta época preocuparam-se
com a origem não-mítica do Cosmos, e seu período foi do séc. VII ao séc. VI a.C. Período Socrático ou Clássico: Séc. V ao IV a.C., deram ênfase às questões de ordem antropológicas e estruturação do pensamento. Deste período fazem parte Sócrates, Platão, Aristóteles e os Sofistas. Período Pós-Socrático: Séc. III e II a.C., sobressaiu o interesse filosófico pela física e pela ética. Alta influência de filosofias orientais, como estoicismo (Zenão de Cítio), hedonismo (Epicuro) e ceticismo (Pirro de Élida).