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Desenvolvimento local: o Programa Um Milhão de Cisternas (P1MC) em

Tupanatinga, PE
Local development: the Program One Million Tanks (P1MC) in Tupanatinga, PE
Developpement local: le Programme «Un Million de Citernes» (P1MC) à
Tupanatinga, PE
Desarrollo local: el Programa de Un Millón de Cisternas (P1MC) en Tupanatinga, PE
Dinando Antonio Soares Junior*
Maria do Rosário de Fátima Andrade Leitão*
Recebido em 24/05/2016; revisado e aprovado em 11/12/2016; aceito em 11/12/2016
DOI: http://dx.doi.org/10.20435/1984-042X-2017-v.18-n.1(06)

Resumo: O objetivo deste artigo é identificar ações relacionadas ao Desenvolvimento Local


na implantação do P1MC, na região do Semiárido de Pernambuco. Assim foram mapeadas
as instituições, atores sociais e as atividades do P1MC em Tupanatinga, Pernambuco, a partir
especialmente, dos critérios estabelecidos no aporte teórico sobre Desenvolvimento Local. Nos
resultados encontrados, percebe-se que o P1MC fomentou por meio da participação, a alguns
atores sociais, a ampliação do saber fazer, em que pese ao fato de que uma parte dos beneficiários
considerem de cunho político e assistencialista, as ações do Programa.
Palavras-chave: desenvolvimento local; P1MC; cisternas.
Abstract: The objective of this article is to identify actions related to local development in the
implementation of the P1MC, in the semi-arid region of Pernambuco. Thus the institutions were
mapped, social actors and activities in the P1MC in Tupanatinga, Pernambuco, from especially
the criteria established in the theoretical framework on Local Development. The results found,
realizes sure that the P1MC fomented through participation, some social actors, broaden knowing
how to do, weigh the fact of the beneficiaries consider the political nature and assistencialista, the
actions of the program.
Key words: local development; P1MC; tanks.
Résumé: Le but de cet article est d’identifier les actions liées au développement local à propos de la
mise en œuvre du P1MC dans la région semi-aride de l’état du Pernambuco. Ainsi, les institutions,
les acteurs sociaux et les activités du P1MC à Tupanatinga, Pernambuco, ont été cartographiés
à partir notamment des critères établis dans le cadre théorique du développement local. Selon
les résultats, il est clair que le P1MC a favorisé, par la participation de certains acteurs sociaux,
le développement du savoir-faire, en dépit du fait que certains des bénéficiaires considèrent les
actions du programme dotées d’une nature politique et d’assistanat.
Mots-clés: développement local ; P1MC ; citernes.
Resumen: El objetivo de este artículo es identificar las acciones relacionadas con el desarrollo lo-
cal en la implementación del P1MC, en la región semiárida de Pernambuco. Así se mapearon las
instituciones, actores sociales y actividades de P1MC en Tupanatinga, Pernambuco, especialmente
a partir de los criterios establecidos en el marco teórico sobre el Desarrollo Local. Los resultados
encontrados, dár-se cuenta de que el P1MC fomenta a través de la participación a que algunos
actores sociales, amplien el saber hacer, pese a que algunos de los beneficiarios consideraren de
naturaleza política y asistencialista, las acciones de dicho programa.
Palabras clave: desarrollo local; P1MC; cisternas.

1 INTRODUÇÃO Cisternas (P1MC), em Tupanatinga, loca-


lizado no semiárido de Pernambuco, uma
O artigo se propõe a identificar ações região que apresenta longas estiagens,
relacionadas ao Desenvolvimento Local na motivo pelo qual o município foi contem-
implantação do Programa Um Milhão de plado na implantação do Programa.

* Universidade Federal Rural de Pernambuco, Recife, Pernambuco, Brasil.

INTERAÇÕES, Campo Grande, MS, v. 18, n. 1, p. 75-87, jan./mar. 2017.


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O município está localizado a 3081 mobilização das instituições e dos atores


km de Recife, capital do estado de sociais na operacionalização do Programa,
Pernambuco, constitui-se um dos territó- são dados valorizados na pesquisa.
rios produtivos que faz parte da bacia lei- O Desenvolvimento Local consis-
teira que abastece as indústrias do estado. te em um conceito fundamental nesta
O Programa Um Milhão de Cisternas pesquisa porque inclui valores e ações
iniciou suas atividades em 2003, a partir presentes nestas que dialogam com o
da Articulação do Semiárido Brasileiro P1MC, por exemplo: mobilização social,
(ASA)2, que vem se propondo a fomentar valorização dos saberes populares, o cará-
ações de articulação e de convivência sus- ter endógeno, a exploração das potenciali-
tentável com o ecossistema do semiárido, dades locais e valorização da participação
através do fortalecimento da sociedade social. Na contramão desses valores, está
civil, da mobilização, envolvimento e o coronelismo, uma prática sociopolítica
capacitação das famílias, a partir de uma exercida no Nordeste brasileiro, a qual
proposta de educação processual, que se Carone (1971, p. 85-92) define em um
operacionaliza em participação, mobiliza- domínio de homens que centralizavam o
ções, reuniões, capacitações, engajamento, poder de tal forma que assumem para si
formação de agentes multiplicadores, das o controle do município, da lei, da justiça,
ações e habilidades propostas. da igreja etc. Uma herança dessa centrali-
O P1MC é uma política pública que zação de poder consiste na dependência
caminha na direção de solucionar ques- e submissão da sociedade o que redunda
tões cruciais do Semiárido nordestino, a em fraca mobilização e participação social.
carência de água, as consequências das A partir destas reflexões, indaga-
secas e do coronelismo3 nesse contexto mos: será que o Programa Um Milhão
socioeconômico e ambiental, por isso, a de Cisternas, na região do Semiárido,
está sendo implantado a partir dos pres-
supostos do Desenvolvimento Local?
1
Distância aferida pelo sistema de informações do Outras indagações complementaram a
Google maps, partindo do marco Zero de Recife,
questão norteadora: Quais as ações de-
PE, via BR 232, ao Centro de Tupanatinga, PE.
Disponível em: <http://www.google.com.br/ senvolvidas? Quais os atores sociais que
maps/>. Acesso em: 10 set. 2014. realizaram e participaram das ações? O
2
No site a ASA se define em uma rede que defen- que foi realizado nas ações? Onde foram
de, propaga e põe em prática o projeto político realizadas as ações?
da convivência com o Semiárido. Formada por No processo de definição do tema,
mais de três mil organizações da sociedade civil foi realizada uma pesquisa no banco de
de distintas naturezas – sindicatos rurais, associa-
ções de agricultores e agricultoras, cooperativas, teses da CAPES, cujos resultados de-
ONG´s, Oscip, etc. Conecta pessoas organizadas monstraram a relevância do tema. Nesse
em entidades que atuam em todo o Semiárido acervo, foram identificadas 3.210 disser-
defendendo os direitos dos povos e comunidades tações e teses sobre Desenvolvimento
da região. As entidades que integram a ASA estão Local; mapeadas sete dissertações sobre
organizadas em fóruns e redes, nos estados que
compõem o semiárido brasileiro. Disponível em: o Programa um Milhão de Cisternas,
<http://www.asabrasil.org.br/>. Acesso em: 15 sendo apenas um do P1MC realizada
jan. 2015. no estado de Pernambuco. Com esses
3
Para aprofundar o tema ver Carone (1971). A dados, constata-se a carência de pesqui-
denominação de coronel incluiu os chefes políticos sas sobre a implantação das Cisternas e
especialmente no sertão do Nordeste brasileiro, o Desenvolvimento Local relacionado à
Carone explica o domínio de homens que centra-
lizavam o poder de tal forma que assumiam para
Política Pública de Recursos Hídricos4
si o controle do município, da lei, da justiça, da
igreja etc. 4 A Lei 9.433, de 08 de Janeiro de 1997, art. 1º,

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direcionada às necessidades da população de Desenvolvimento Local, fundamenta-


que vive no semiárido. da nos seguintes autores: Buarque (1999)
Os dados da pesquisa qualitativa e e Tenório (2007).
exploratória foram coletados em docu- A pesquisa buscou responder aos
mentos e observações participantes em questionamentos acima citados, para
visitas ao município de Tupanatinga, nas isso foram identificadas as instituições
quais foram observadas algumas reuniões públicas e privadas que realizaram e
e capacitações do Programa. Sobre pesqui- participaram das formações e capa-
sa qualitativa, Oliveira (2002, p. 117) afir- citações do Programa e a relação das
ma que se pode descrever a complexidade associações ativas e pertencentes ao
de um problema, analisar a interação de município. Foi aprofundado o conhe-
certas variáveis, compreender e classificar cimento do cenário do P1MC no semi-
processos dinâmicos experimentados por árido de Pernambuco e do município
grupos sociais e interpretar as particula- de Tupanatinga. Acompanhou-se a im-
ridades dos comportamentos ou atitudes plantação das Cisternas pela Companhia
dos indivíduos. Quanto às pesquisas de Desenvolvimento dos Vales do São
exploratórias, Gil (2009, p. 27) destaca Francisco e do Parnaíba (CODEVASF), o
que são desenvolvidas com o objetivo de mapeamento da implantação de Cisternas
proporcionar uma visão geral sobre de- do Programa Água para todos até o final
terminado fato. O autor justifica a escolha de 2014. A formação de Agentes comu-
por esse tipo de pesquisa quando o tema nitários e, por fim, a implantação de
escolhido é pouco explorado, o que difí- Cisternas por etapa e gênero no município
culta a formulação de hipóteses precisas de Tupanatinga.
e operacionalizáveis. De acordo com a FEBRABAN (2003)
A realização da pesquisa incluiu três o Semiárido brasileiro é um dos maiores,
etapas. A primeira etapa foi dividida em mais populosos e também mais úmidos
dois momentos, A e B, descritos como: do mundo. A região estende-se por 868
A) Pesquisa documental nos arquivos do mil quilômetros quadrados, abrangen-
município de Tupanatinga, acervo em do o norte dos Estados de Minas Gerais
que foram identificados ofícios, atas de e Espírito Santo, os sertões da Bahia,
reuniões, a relação dos beneficiários das Sergipe, Alagoas, Pernambuco, Paraíba,
cisternas. Rio Grande do Norte, Ceará, Piauí e uma
B) Visita ao município de Tupanatinga, parte do sudeste do Maranhão. E vivem
realizadas durante o andamento da pes- nessa região mais de 18 milhões de pes-
quisa, totalizando 18 visitas para coletar soas, sendo 8 milhões na área rural. A
informações a respeito do Programa. precipitação pluviométrica é de 750 milí-
Na segunda Etapa da pesquisa, fez- metros anuais, em média. Em condições
-se a sistematização dos dados a partir da normais, chove mais de 1.000 milímetros.
elaboração de tabela e quadros. Na pior das secas, chove pelo menos 200
A terceira e última Etapa, consistiu milímetros, o suficiente para dar água de
na análise dos dados a partir do conceito qualidade a uma família de cinco pessoas
por um ano (FEBRABAN, 2003).
parágrafo III, define que em situação de escassez, o
uso prioritário dos recursos hídricos é o consumo 1.1 O Programa Um Milhão de Cisternas
humano e a dessedentação de animais. No mesmo
artigo, agora no parágrafo VI, essa Lei ratifica, ai- A ASA informa que um dos prin-
nda, como fundamento, que a gestão dos recursos
hídricos deve ser descentralizada e contar com a
cipais objetivos do P1MC consiste em
participação do Poder Público, dos usuários e das garantir água e alimentação de qualida-
comunidades (BRASIL, 1997). de e, consequentemente, a melhoria das

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condições de sobrevivência da população formação de diferentes atores que parti-


residente no semiárido. Mas, para se che- ciparam do Programa, entre eles: as famí-
gar à água e seus benefícios no P1MC, lias, as comissões municipais e pedreiros
a ASA propôs os seguintes caminhos a e pedreiras que construíam as cisternas.
serem percorridos: o cadastramento e a A proposta de formação incluiu a escolha
seleção de famílias, essa etapa envolve de metodologia participativa e reflexiva,
comunidades, famílias e organizações da com o objetivo de ampliar as reflexões
sociedade civil em um processo de mobi- das famílias rurais e dos grupos a respeito
lização social, que orienta toda a prática do direito à água e das possibilidades de
pedagógica do P1MC. convivência com o semiárido. Os discur-
A partir dos critérios pré-definidos sos oficiais sobre o Programa informam
na estrutura do programa são seleciona- que as decisões metodológicas para o
das as comunidades e famílias que estejam processo de sensibilização e motivação
inscritas no Cadastro Único (CadÚnico5) nas capacitações foram definidas a partir
para programas sociais. Entre os critérios dos conhecimentos e práticas endógenas,
estabelecidos estão: a mulher como chefe agregando novos conhecimentos, na pers-
de família; família de baixa renda; família pectiva da construção coletiva.
com crianças de 0 a 6 anos; famílias com Essas capacitações foram prece-
crianças e adolescentes frequentando a es- didas por um processo de mobilização
cola; adultos com idade igual ou superior de instituições públicas e privadas e da
a 65 anos; deficientes físicos e/ou mentais; sociedade civil em geral. As mobilizações
e a família residente na zona rural sem redundaram na formação das comissões
acesso à água encanada em quantidade municipais; essa prática, segundo o dis-
e qualidade suficientes para o consumo curso oficial, objetivava o aumento de par-
humano e para produção de alimentos e ticipação dos atores sociais e a interação
criação de animais. entre as comissões comunitárias e as famí-
Após o processo de seleção das lias provenientes da agricultura familiar.
famílias, a outra etapa consistiu em par- As capacitações também se constituíram
ticiparem do Curso de Gerenciamento de em espaços de novas mobilizações, ao
Recursos Hídricos (GRH), o qual abordou incluir outras organizações que ainda não
questões relacionadas ao semiárido, aos haviam participado do processo.
cuidados com a água e com a cisterna. Em consequência destas capacita-
Outras capacitações realizadas no ções surgiram agentes multiplicadores e
P1MC se constituíram em processos de por fim, a terceira etapa de capacitações
incluiu a construção das cisternas de
5
placas de 16 mil litros. Esses momentos
O Ministério do Desenvolvimento Social e
Combate à Fome (MDS) é responsável pela
formativos, segundo o discurso oficial,
coordenadoria do CadÚnico. O sistema é de se propuseram a difundir os conteúdos
uso obrigatório nas seleções de beneficiários de práticos sobre a construção das cisternas,
programas sociais promovidos pelo Governo Fe- também discutir os conteúdos centrais da
deral, como por exemplo o Programa Cisternas. proposta de convivência com o semiári-
O Cadastro Único (CadÚnico) é um sistema que
identifica e caracteriza as famílias de baixa renda,
do e da importância da implantação das
e obtém dados que mostram a realidade socioe- cisternas como elemento mobilizador das
conômica dessas famílias, trazendo informações famílias rurais. As capacitações de cons-
de todo o núcleo familiar, das características do trução de cisternas foram destinadas aos/
domicílio, das formas de acesso a serviços públi- às agricultores/as familiares com interesse
cos essenciais e, também, dados de cada um dos
componentes da família. Disponível em: <http://
em desenvolver uma nova atividade para
www.programadogoverno.org>. Acesso em: 15 complemento de renda. Após a formação
jan. 2015. construtiva das cisternas, o passo seguinte

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constituiu-se na capacitação sobre a no semiárido brasileiro, e, nesse perío-


implantação das cisternas de 16 mil litros. do, foram construídas no município de
A proposta construtiva dessas cister- Tupanatinga, no ano de 2004, 40 cisternas,
nas incluiu uma opção de baixo custo, a atendendo cerca de 200 pessoas.
partir da utilização de placas de cimento A partir de 2012, por meio do
pré-moldadas, construídas e implantadas Programa Água para Todos do Ministério
ao lado das casas, trabalho realizado por da Integração Social (MI), se deu continui-
pessoas da própria comunidade, capacita- dade as ações do P1MC com a empresa
das nos cursos de pedreiros/as oferecidos de Engenharia de Construção Civil Ltda
pelo P1MC. O processo construtivo fez (ENGECOL), que foi a responsável pela
parte da estratégia de mobilização das implantação das Cisternas de polietile-
famílias, cuja mão de obra se constituiu no em Tupanatinga, coordenada pela
em contrapartida, ou seja, possibilitou o CODEVASF; no período de 2012 a 2014
engajamento e colaboração da comunida- foram instaladas 1.413 Cisternas.
de nas ações do Programa, o que fortale- As Cisternas de Polietileno, diferen-
ceu a organização comunitária, por meio temente das de placas, são industrializa-
dos mutirões. Trata-se de uma tecnologia das. Apresentam o formato cilíndrico e
simples, adaptada à região semiárida. As estão prontas para a instalação no local.
cisternas apresentam um formato cilín- Possui a capacidade de armazenar até 16
drico, coberta e fica semienterrada. O seu mil litros de água, e sua instalação segue
funcionamento prevê a captação de água a mesma estrutura, são semienterradas,
da chuva aproveitando o telhado da casa, com instalação de tubulações que dire-
que escoa a água através de calhas. cionam a água que cai das calhas dos
O programa P1MC foi criado e ini- telhados das casas para a Cisterna7.
ciado pela ASA em 2003 e finalizado em
2012 pelo Ministério do Desenvolvimento 2 ALGUMAS REFLEXÕES TEÓRICAS
Social e combate à Fome (MDS), data na
qual ele foi substituido pelo Programa O Programa Um Milhão de Cisternas
Água para Todos 6 do Ministério da se constitui pela organização de seis compo-
Integração Social (MI) dando continuida- nentes: o Controle Social, a Capacitação, o
de às ações do P1MC. Fortalecimento Institucional, a Comunicação,
O P1MC, não conseguiu atender a Construção de Cisternas e a Mobilização,
a demanda total do programa que era este último permeia todos os demais.
a implantação de 1.000.000 de cisternas Segundo os documentos oficiais, a
mobilização social e os processos educa-
6
cionais proporcionados pelo P1MC vão
O Programa Água para Todos foi instituído pelo
Decreto n. 7.536 de 26 de julho de 2011. É uma ação
além do aspecto quantitativo que pode ser
do Governo Federal coordenada pelo Ministério traduzido no número de cisternas cons-
da Integração Nacional, por meio da Secretaria de truídas. Eles envolvem reflexões sobre a
Desenvolvimento Regional, que tem como parcei- vida comunitária, novas formas de partici-
ros diversas instituições federais, estaduais, mu- pação e organização popular, o estímulo à
nicipais além de organizações da sociedade civil.
Visa promover a universalização do acesso e uso
criatividade no acesso a políticas públicas.
da água em áreas rurais para consumo humano Para Buarque (1999, p. 29), os deba-
e para produção agrícola alimentar e nutricional tes e as reflexões que dominam o cenário
da família em situação de vulnerabilidade social, científico internacional sobre modelos e
promovendo a implantação de cisternas entre
outros sistemas simplificados de abastecimento
7
de água, para atender prioritariamente as popu- As cisternas de Polietileno apresentam uma
lações de baixa renda em comunidades difusas do durabilidade de 10 anos, já as de placas podem
semiárido brasileiro. durar de 20 anos a mais.

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alternativas de desenvolvimento enfren- [...] deve se dar por dentro de pro-


tam desafios e problemas econômicos, cessos participativos nos quais a
sociais e ambientais contemporâneos. E cidadania, de forma individual ou
o autor complementa que esses debates por meio de seus diferentes agen-
tes na sociedade civil, em diálogo
estão levando à formação de uma nova
com o poder público e o mercado,
concepção de desenvolvimento, conhe-
propõe soluções planejadas em
cida como Desenvolvimento sustentável prol do local/regional. A preo-
(BUARQUE, 1999, p. 29). A definição de cupação, portanto, deve ser mais
desenvolvimento sustentável proposta com o processo decisório do que
pela World Commission on Evironment na solução dos problemas locais,
and Development (WCED, 1987, p. 2-5) do “como” e não do “através”, da
é aquela que satisfaz as necessidades do participação [...].
presente, sem comprometer a capacidade Buarque (1999, p. 09) diz que o
de as gerações futuras satisfazerem as Desenvolvimento Local “é um processo
suas próprias necessidades. endógeno registrado em pequenas unida-
Esta é uma resposta aos problemas des territoriais e agrupamentos humanos
de desigualdades sociais, das necessi- capaz de promover o dinamismo econô-
dades de melhor qualidade de vida de mico e a melhoria da qualidade de vida
uma parcela significativa da população da população”. Para o autor, representa
mundial, podendo ser na área ambiental uma singular transformação nas bases
e/ou socioeconômica, gerada pelo estilo econômicas e na organização social em
de crescimento local, que tende a limitar nível local, resultante da mobilização das
as oportunidades de as gerações futuras energias da sociedade, explorando as suas
permanecerem em sua região. capacidades e potencialidades específicas.
Neste estudo, consideramos a im- E reforça que o Desenvolvimento Local é
plantação do Programa Um Milhão de consistente e sustentável, deve elevar as
Cisternas na perspectiva do Desenvolvi- oportunidades sociais e a viabilidade e
mento Local na região do Semiárido de competitividade da economia local, au-
Pernambuco. mentando a renda e as formas de riqueza,
Segundo De Jesus (2003, p. 72) o ao mesmo tempo em que assegura a con-
Desenvolvimento Local: servação dos recursos naturais.
Trata-se de um esforço localizado E para Buarque (1999, p. 9), mesmo
e concertado, isto é, são lideranças, com as imprecisões que ainda cercam o
instituições, empresas e habitantes conceito, todos os esforços recentes de
de um determinado lugar que se Desenvolvimento Local e municipal têm
articulam com vistas a encontrar incorporado, de alguma forma, os pos-
atividades que favoreçam mudan- tulados de sustentabilidade, procurando
ças nas condições de produção e assegurar a permanência e a continuida-
comercialização de bens e serviços, de, no médio e longo prazo, dos avanços
de forma a proporcionar melhores e melhorias na qualidade de vida, na
condições de vida aos cidadãos e
organização econômica e na conservação
cidadãs, partindo da valorização
do meio ambiente.
e ativação das potencialidades e
efetivos recursos locais.
3 O P1MC EM TUPANATINGA
A participação consiste em uma
das potencialidades dos processos de Nos arquivos do município, foram
Desenvolvimento Local para comunida- identificados os seguintes documentos
des, bairros, cidades etc. Segundo Tenório referentes ao Programa Água para todos:
(2007, p. 101) o Desenvolvimento Local: Ofício n. 08/2014; Ofício n. 045/2014; Lista

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de Presença de Comissões Comunitárias, Para o andamento da pesquisa, fo-


Ata de Reunião para apresentação do ram realizadas doze visitas8 no período
Programa; Ata de Capacitação; Ata de de janeiro a junho de 2014, e seis visitas,
Reunião com os Agentes de Saúde; Ata no período de fevereiro a abril de 2015, ao
de Reunião com a Equipe Técnica das município de Tupanatinga do estado de
Cisternas; Ata de Reunião com a Equipe Pernambuco, para se levantar informa-
Técnica da CODEVASF; Ata de Reunião ções a respeito do Programa.
com o comite Gestor para Elaboração Os dados expostos no quadro 1
do Cronograma de distribuição das mostram a participação de Instituições
Cisternas; Ata de Reunião com o comitê Públicas e Privadas e Organizações da
Gestor do Programa, Agentes de Saúde Sociedade Civil no processo de implantação
e membros da comunidade para apre- do P1MC no município de Tupanatinga.
sentação do SSAA (Sistema Simplificado Constata-se a participação de 12 Instituições
de Abestecimento de Água) e, por fim, a e Organizações da Sociedade Civil, com
Relação de Beneficiários para Cisternas um total de 27 participantes que se reuni-
Familiares. Assim, os documentos ti- ram para realizar as seguintes atividades:
nham informações das instituições que Apresentar o programa aos participantes,
participaram do processo de implantação capacitar os agentes das ações e formar
do Programa no município, da empresa multiplicadores das informações do pro-
que implantou as Cisternas, em quantas grama no município de Tupanatinga, com
etapas foram realizadas e o número de a intenção de mobilizar as instituições e
munícipes atendidos pelo Programa. sociedade civil do município.

Atividade(s) Quant. de Quant. de


Nº Instituições
Realizada(s) reuniões Participantes
1 CODEVASF 11 , 22 33, 44, 55 10 02
2 Secretaria de Agricultura de Tupanatinga 66 10 02
3 Secretaria de Educação de Tupanatinga 6 10 01
4 Secretaria de Ação Social de Tupanatinga 6 10 02
5 Secretaria de Saúde de Tupanatinga 6 10 02
6 Secretaria de Infraestrutura de Tupanatinga 6 10 02
Secretaria de Desenvolvimento Econômico
7 6 10 02
de Tupanatinga
Conselho Municipal de Desenvolvimento
8 6, 3 10 01
Rural Sustentável - CMDRS
9 ENGECOL 6, 3, 77 01 01
10 Associações do Município 88 01 09
11 Igreja Católica 8 10 01
12 Igreja Evangélica 8 10 02
Total 12 - 10 27
Quadro 1 – Atividades para Implantação do P1MC no município de Tupanatinga, PE
Legenda: 1 Apresentar o programa P1MC e Água para Todos; 2 Realizar reuniões e a formação de Agentes comunitários;
3
Identificar os locais para implantação do P1MC; 4 Capacitar Agentes locais; 5 Acompanhar a implantação do
programa; 6 Realizar reuniões e a formação de Agentes comunitários; 7 Implantar as cisternas; 8 Participar e Realizar
reunião para multiplicar as informações do P1MC e água para todos nas comunidades.
Fonte: Elaborado pelos autores com base em documentos do CMDRS de Tupanatinga, PE.

8
Dentre as reuniões realizadas para o processo de
implantação do programa estão as seguintes datas:
19 e 29/03, 11/04, 11/05, 10/07, 16/07, 10/09 de
2012, 07/05 de 2013, 19/03, 03/09 de 2014.

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82 Dinando Antonio Soares Junior; Maria do Rosário de Fátima Andrade Leitão

O quadro 2 explicita as atividades rios mínimos; Famílias com crianças de 0


desenvolvidas por cada instituição no pro- a 6 anos; Crianças e adolescentes frequen-
cesso de execução e implantação do P1MC tando a escola; Adultos com idade igual
no município de Tupanatinga. A escolha ou superior a 65 anos e as Famílias com
do público alvo a ser beneficiado foi funda- pessoa(as) que apresentarem deficiência(s)
mentada nos seguintes critérios: Famílias física(s) e/ou mental(ais). Nas famílias
cadastradas no CadÚnico; Mulheres chefes contempladas se identificam o preenchi-
de Famílias; Renda mensal de até três salá- mento da maioria dos critérios citados.

Seleção das famílias a serem


Instituições Objetivos
contempladas pelo P1MC
- Etapa que envolve comunida-
- Descentralizar e Democratizar a água.
des, famílias e organizações da
- Possibilitar a diminuição da incidência de doenças em virtude do
sociedade civil em um proces-
consumo de água contaminada e a diminuição da sobrecarga de
so de mobilização social, que
trabalho das mulheres nas atividades domésticas.
orienta toda a prática pedagó-
- Possibilitar avanços não só para as famílias, mas para as comuni-
gica do P1MC.
dades rurais como um todo, como o aumento da frequência escolar.
- As comunidades e famílias
- Estimular à organização comunitária.
são selecionadas a partir dos
- Capacitar os diversos atores que participam do Programa: famí-
critérios pré-definidos na es-
lias, comissões municipais e pedreiros e pedreiras.
trutura do programa e que
ASA - Ampliar as reflexões das famílias rurais e dos grupos a respeito
estejam inscritas no Cadastro
do direito à água e das possibilidades de convivência com o Semi-
Único para Programas Sociais
árido.
(CadÚnico).
- Reconhecer sua capacidade de luta e defesa de seus direitos, se-
- Depois de selecionadas as fa-
jam eles o acesso à água, a uma educação contextualizada e de qua-
mílias participam do Curso de
lidade, ao crédito, à preservação das sementes crioulas, ao direito
Gerenciamento de Recursos
de se comunicar, entre tantos outros.
Hídricos (GRH) que aborda
- Melhorar a vida das famílias que vivem na Região Semiárida do
questões como relacionadas ao
Brasil, garantindo o acesso à água de qualidade é o principal obje-
Semiárido e ao cuidado com a
tivo do Programa.
cisterna e a água.
- Mobilizar as políticas públicas locais para a implantação do
P1MC. - Orientar os gestores e agentes
CODEVASF - Formar grupos gestores locais. comunitários quanto a implan-
- Capacitar os agentes Locais. tação do P1MC
- Acompanhar a implantação do P1MC no município de Tupanatinga.
- Promover reuniões com as políticas públicas locais para a aquisi-
ção e implantação do P1MC em Tupanatinga.
- Identificar as famílias que po-
- Mobilizar a sociedade civil para as reuniões e capacitações do
dem ser atendidas pelo P1MC.
P1MC no município de Tupanatinga.
CMDRS - Acompanhar a implantação
- Organizar e registrar em documentos os eventos realizados pelo
das cisternas
P1MC no município de Tupanatinga.
- Acompanhar a implantação das cisternas no município de Tupa-
natinga.
- Apresentar à coordenação do programa as famílias que realmente
necessitam da Cisterna e acompanhar o processo de instalação
- Promover reuniões com as políticas públicas locais para a implan- - Identificar as famílias que po-
tação do programa em Tupanatinga. dem ser atendidas pelo P1MC.
CGM
- Mobilizar a sociedade civil para as reuniões e capacitações do - Acompanhar a implantação
programa no município. das cisternas
- Organizar e registrar em documentos os eventos realizados pelo
programa no município de Tupanatinga.
- Acompanhar e Implantar o P1MC no município de Tupanatinga. - Acompanhar a implantação
ENGECOL
- Identificar os locais da implantação das Cisternas em Tupanatinga. das cisternas.

Quadro 2 – Ações desenvolvidas pelas intituições envolvidas com a implantação do


P1MC
Fonte: Elaborado pelos autores com base nos Arquivos do município de Tupanatinga.

INTERAÇÕES, Campo Grande, MS, v. 18, n. 1, p. 75-87, jan./mar. 2017.


Desenvolvimento local: o Programa Um Milhão de Cisternas (P1MC) em Tupanatinga, PE 83

Ainda com base em documentos da Sociedade Civil que se envolveram


dos arquivos do município, o quadro 3 no processo de implantação do P1MC no
identifica as Associações e Organização município.

Quantidade Percentual
Nome da Comunidade/
Nº de Represen-
Instituição(ões) Associação Município
tantes
1 Associação Sítio Laranjo 1 2,5 % 6,4%
2 Associação Sítio Serra dos Dé 1 5% 3,2%
3 Associação Sítio Uburana 1 3,3% 4,8%
4 Associação Sítio Lopes 1 3,3% 4,8%
5 Associação Sítio Canela 3 12% 4%
6 Assentamento Cachoeira Grande 3 12% 4%
7 Associação Sítio Sapato 1 2% 8%
8 Associação dos Pequenos Produtores Rurais Sítio Gritos 2 6,6% 4,8%
9 Associação Sítio Gritos 1 3,3% 4,8%
Total 14 50% 44,8%
Quadro 3 – Instituições participantes da formação e capacitação da Comissão Comu-
nitária do Programa em Tupanatinga, datada em 03/09/2014
Fonte: Elaborado pelos Autores com base nos documentos do CMDRS de Tupanatinga.

A proposta de participação de repre- correspondendo a 3,3% da associação e


sentantes das Associações e Assentamento 4,8% do total de associações ativas no mu-
passam a dispor de informações como nicípio; a Associação Sítio Lopes com um
orientar os associados a realizarem seus representante, correspondendo a 3,3% da
cadastros no CadÚnico, ou seja, transfor- associação e 4,8% do total de associações
mam-se em agentes multiplicadores das ativas no município; a Associação Sítio
informações. Preenchimento do cadastro Canela com três representantes, corres-
se constituiu no primeiro passo para pondendo a 12% da associação e 4% do
estarem aptos a serem comtemplados total de associações ativas no município; o
pelo P1MC, a partir das informações ca- Assentamento Cachoeira Grande com três
dastradas se avaliavam as solicitações a representantes, correspondendo a 12% do
partir dos critérios de acessibilidade ao assentamento e 4% do total de associações
Programa. Dessa forma, as Associações ativas no município; a Associação Sítio
e Assentamento se integraram no pro- Sapato com um representante, corres-
cesso de mobilização e organização da pondendo a 2% da associação e 8% do
Sociedade Civil. total de associações ativas no município;
Vale ressaltar que, no que se refere a Associação dos Pequenos produtores
ao percentual de participação das asso- Rurais sítio gritos com dois representan-
ciações e assentamento, ela não foi ho- tes, correspondendo a 6,6% da associação
mogênea, conforme pode ser constatada e 4,8% do total de associações ativas no
nos seguintes dados: a Associação Sítio município; e, por fim, a Associação Sítio
Laranjo com um representante, corres- gritos com um representante, correspon-
pondendo a 2,5 % da associação e 6,4% dendo a 3,3% da associação e 4,8% do total
do total de associações ativas no municí- de associações ativas no município.
pio; a Associação Sítio Serra dos Dé com Com base em dados dos documen-
um representante, correspondendo a 5% tos do município, listamos as associa-
da associação e 3,2% do total de associa- ções que participaram da formação de
ções ativas no município; a Associação membros comunitários para a instalação
Sítio Uburana com um representante, das Cisternas, dentre as associações, os

INTERAÇÕES, Campo Grande, MS, v. 18, n. 1, p. 75-87, jan./mar. 2017.


84 Dinando Antonio Soares Junior; Maria do Rosário de Fátima Andrade Leitão

quantitativos de famílias contempladas: a contempladas; e a Associação Sítio Gritos


Associação Sítio Laranjo com 28 famílias com três famílias contempladas.
contempladas; a Associação Sítio Serra A tabela 1 sintetiza informações
dos Dé com 14 famílias contempladas; a sobre o processo de capacitação no qual
Associação Sítio Uburanas com oito fa- participaram onze representantes de nove
mílias contempladas; a Associação Sítio instituições, com quarenta e um multipli-
Lopes com seis famílias contempladas; a cadores do P1MC. No total foram 1.413
Associação Sítio Canela com 35 famílias famílias beneficiadas, os dados indicam
contempladas; a Assentamento Cachoeira que a maioria são mulheres por se cons-
Grande com 12 famílias contempladas; a tituir em um dos critérios estabelecidos
Associação Sítio Sapato com 18 famílias pelo Programa.

Tabela 1 – Instalação de Cisternas e Formação de Agentes comunitários


Formação de Quantidade e Percentual
Instituições / Etapas Nº de Cisternas Instala-
Membros de Beneficiários/as
Empresas realizadas das em Tupanatinga, PE
Comunitários Homens Mulheres
1ª 935
ENGECOL / 09
2ª 65 253 1.160
CODEVASF Associações
3ª 413
Total 1.413 17.90% 82.10%
Fonte: Elaborado pelos autores com base nos Arquivos do CMDRS.

Assim, os dados dos quadros 1, 2 e Algumas características do P1MC


3, e da tabela 1, embasados em documen- que dialogam com o Desenvolvimento
tos9 do lócus da pesquisa e de instituições Local se constituem:
públicas e/ou privadas consistiram na • No baixo investimento por posto de
sistematização de dados quantitativos trabalho que se caracterizou pela centra-
para subsidiar a análise qualitativa. lização das reuniões em alguns prédios
As reuniões e as capacitações do públicos e privados, para a capacitação
P1MC no município de Tupanatinga eram do profissional em técnicas de constru-
organizadas por instituições públicas e ção, e na realização de mutirões durante
privadas. Essas instituições conduziram a construção e implantação das Cister-
as reuniões e seus agendamentos num nas. O baixo capital investido por unida-
processo de mobilização, capacitação, de produzida foi possibilitado também
formação de agentes sociais e da partici- pelo aproveitamento da areia do próprio
pação da sociedade civil. Essas reuniões local, água de pequenos açudes e/ou
aconteciam em prédios Públicos perten- barreiros e na aquisição de cimento, tela
centes ao município. e ferro no comércio local.
As formações e as capacitações • No potencial de geração de empregos
do CGM, Agentes de Sáude e Equipes que foi constado na contratação, quan-
Técnicas ocorriam no centro do muni- do necessária, de pedreiros e pedreiras
cípio, já as capacitações das Famílias capacitados pelo Programa.
Agricultoras aconteciam nas associações • Na pequena escala de produção, por se
próximas às residências das famílias be- tratar de produção e consumo dentro do
neficiadas com as Cisternas do Programa. município, com o total de 40 Cisternas
de Placas, o mesmo não se pode afirmar
9
das 1413 Cisternas de Polietileno.
As cópias dos documentos pertencentes aos
arquivos do município de Tupanatinga estão ane- • No alto grau de adaptabilidade ao
xadas ao dossiê que originou este texto. ambiente sociocultural se deu pela

INTERAÇÕES, Campo Grande, MS, v. 18, n. 1, p. 75-87, jan./mar. 2017.


Desenvolvimento local: o Programa Um Milhão de Cisternas (P1MC) em Tupanatinga, PE 85

necessidade das famílias agricultoras Pode-se afirmar que o P1MC, ao


terem acesso a água, pelo envolvimento mobilizar e provocar a participação ativa
nas experiências do Programa a partir da de diversos segmentos sociais, provocou
cooperação e mobilização dos diferentes uma quebra de paradigma10, no qual há
agentes sociais. atuação do Estado na construção de po-
• Na economia no uso de recursos natu- líticas participativas. No levantamento
rais faz parte de toda concepção do Pro- dos dados catalogados em Tupanatinga,
grama, por utilizar as águas pluviais, de concordamos quando Oliveira (2007, p.
pequenos açudes e barreiros, garantindo 86) afirma que:
o armazenamento e o uso de recursos A construção participativa busca
renováveis. construir modelos nos quais a co-
Uma das premissas do Desenvol- munidade local possa se envolver
vimento Local é que seja endógeno o direta e coletivamente na solução
que significa atender às necessidades e do problema, embora com algu-
demandas da população local através ma forma de centralização que
da participação ativa da comunidade coordena esforços locais. A idéia
é que autorizando os cidadãos, em
envolvida. O Programa atende a essa
condições mais iguais, é um bem
característica endógena ao ser criado pela
intrínseco, e um meio de assegu-
ASA, que propôs o fomento de ações de rar uma distribuição mais justa
articulação e de convivência sustentá- das decisões, sendo também uma
vel com o ecossistema do Semiárido. A estratégia importante para alcan-
organização não governamental (ASA) çar soluções mais efetivas a pro-
que conecta as instituições e organiza- blemas coletivos. Assim, nutrindo
ções que atuam em todo o Semiárido uma maior igualdade de poder, se
brasileiro defendendo os direitos dos está construindo uma sociedade
povos e comunidades da região no que mais democrática, e uma demo-
cracia mais deliberativa.
se refere ao acesso à água e alimentação
de qualidade e, consequentemente, à
melhoria das condições de sobrevivência 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
da população residente no Semiárido. A
ASA em diálogo com MDS põe em prática Ao longo do texto aqui desenvolvi-
a proposta do P1MC. do, procurou-se identificar ações e valores
As características do Programa são do Desenvolvimento Local no processo de
endógenas, mas, no seu processo de ope- implantação do P1MC em Tupanatinga.
racionalização, o P1MC chega pronto ao O P1MC em seu processo de implantação,
município, sendo moldado à realidade em conjunto com o Programa Água para
local pela atuação dos diferentes atores Todos, articulou 12 instituições públicas e
sociais. Houve a necessidade da criação de privadas, 27 representantes da Sociedade
um entorno institucional em Tupanatinga Civil. Predominou a utilização de meto-
ao redor do P1MC, o que proporcionou dologias participativas na formação de
aproveitamento dos recursos e dos servi- agentes multiplicadores selecionados
ços locais, bem como da cooperação entre entre as diversas representações de dife-
os atores sociais. O fortalecimento da rede rentes segmentos sociais locais.
criada pelas diversas instituições que
10
participaram do P1MC em Tupanatinga é A quebra de paradigma refere-se ao rompimento
fruto de um território ativo, de um movi- com o modelo tradicional de se fazer política
pública, no qual os administradores públicos não
mento encabeçado pela ASA para criação construíam os projetos de atuação conjuntamente,
de um novo paradigma de convivência ou, simplesmente, nem consultavam o público
com o Semiárido. interessado (OLIVEIRA, 2007, p. 24).

INTERAÇÕES, Campo Grande, MS, v. 18, n. 1, p. 75-87, jan./mar. 2017.


86 Dinando Antonio Soares Junior; Maria do Rosário de Fátima Andrade Leitão

Outras atividades operacionais do Disponível em: <http://www.brasil.gov.


P1MC consistiram em reuniões de capa- br/infraestrutura/>. Acesso em: 10 jan. 2015.
citações e formação dos atores sociais, nas CONSELHO MUNICIPAL DE DESENVOL-
10 reuniões realizadas, congregou-se um VIMENTO RURAL SUSTENTÁVEL. Termo
total de 190 participantes, o que resultou de Conferência de Quantitativos de Cisternas
em articulação das instituições públicas Instaladas no município de Tupanatinga, PE, 19
e privadas com as famílias agricultoras. de março de 2014.
As reuniões, as explicitações dos critérios ______. Ofício n. 045/2014. Tupanatinga, PE,
possibilitaram algum grau de mobilização 10 de setembro de 2014.
e controle social, inerentes aos princí- DE JESUS, P. Desenvolvimento Local. In:
pios de participação e de certa autono- CATTANI, Antonio David (Org.). A outra
mia social presentes nas concepções de economia. Porto Alegre, RS: Veraz, 2003.
Desenvolvimento Local.
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As Cisternas resultam em produto
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final do P1MC, mas também em uma Cisternas. 2003. Disponível em: <http://
ferramenta de articulação de convivência www.febraban.org.br/arquivo/destaques/
com o Semiárido. Dialoga com os princí- destaque-fomezero_semiarido.asp>. Acesso
pios do Desenvolvimento Local ao se tra- em: 10 jan. 2014.
tar de uma produção em pequena escala,
GIL, Antônio Carlos. Métodos e técnicas de
com a mobilização das instituições do mu- pesquisa social. 6. ed. São Paulo: Atlas, 2009.
nicípio, com as capacitações das Famílias
Agricultoras e das Equipes Técnicas e com MINISTÉRIO DE DESENVOLVIMENTO
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INTERAÇÕES, Campo Grande, MS, v. 18, n. 1, p. 75-87, jan./mar. 2017.


Desenvolvimento local: o Programa Um Milhão de Cisternas (P1MC) em Tupanatinga, PE 87

Sobre os autores:
Dinando Antonio Soares Junior: Departamento de Educação, Ciências Agrárias, Mestrado.
Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE). E-mail: dinandosj@gmail.com
Maria do Rosário de Fátima Andrade Leitão: Professora Doutora Titular da Universidade
Federal Rural de Pernambuco (UFRPE). E-mail: rosário@dlch.ufrpe.br

INTERAÇÕES, Campo Grande, MS, v. 18, n. 1, p. 75-87, jan./mar. 2017.

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