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Voltairine de Cleyre

Anarquismo

1901

Nota do Tradutor

De Cleyre foi uma brilhante poetisa do século XIX – “a mais dadivosa e brilhante anarquista já nascida nos
Estados Unidos”, de acordo com Emma Goldman –, e seus textos refletem esse brilho. O seu estilo, além de refletir as
idiossincrasias de uma estadunidense traumatizada pela escola católica para se auto-educar, traz um rebuscado jogo de
palavras para alternar entre hesitação e paixão na sua apresentação de conceitos anárquicos. Esta tradução buscou
preservar os jogos de palavras onde possível, mas diversas traições de tradução foram necessárias para garantir a
legibilidade do texto para um leitor moderno. Foram mantidos grifos e capitalizações peculiares e inconstantes da
autora.

Neste ensaio, publicado pela primeira vez na Free Society (13 de outubro de 1901), Voltairine de Cleyre
apresenta sua visão universalista do anarquismo, que ela resume em uma declaração poderosa: “Anarquismo significa
liberdade para a alma assim como para o corpo – em todas as aspirações, todo crescimento”.

A contribuição original para o anarquismo emergente deste texto consiste em sua aceitação de todo e qualquer
tipo de ideias e práticas anarquistas (Anarquismo Individualista, Anarquismo Mutualista, Anarquismo Comunista e
Anarquismo Socialista), desde que fosse, em todos os casos, a opção livremente selecionada de seus advogados. E essa
aceitação sincera das diferenças é do que trata principalmente a liberdade (isto é, a anarquia), praticada de forma
consistente.

Existem dois espíritos ao longo do mundo: – o espírito da Cautela, o espírito da Ousadia,


o espírito da Quiescência, o espírito da Inquietação; o espírito da Imobilidade, o espírito da
Mudança; o espírito de “segure firme o que você tem”, o espírito de “deixe ir e voe para o que
você não tem”; o espírito do construtor lento e constante, cuidadoso com seus trabalhos,
relutante em deixar partir qualquer uma de suas criações, desejoso de manter e incapaz de
discriminar entre o que vale a pena manter e o que é melhor deixar de lado, e o espírito do
destruidor inspirador, fértil em fantasias criativas, volátil, descuidado em sua luxúria de esforço,
inclinado a deixar de lado o bom junto com o mau.

A sociedade é um equilíbrio trêmulo, eternamente alvo de novas pancadas, entre esses


dois. Aqueles que olham para o Homem, como a maioria dos anarquistas, como um elo da
cadeia da evolução, veem nessas duas tendências sociais a soma das tendências de homens
individuais, que, em comum com as tendências de toda a vida orgânica, são o resultado da ação
e contração da herança e adaptação. Herança, tendendo continuamente a repetir o que foi,
muito, muito tempo depois de superado; adaptação continuamente tendendo a quebrar formas.
As mesmas tendências sob outros nomes também são observadas no mundo inorgânico, e
qualquer pessoa possuída pela moderna mania do Monismo científico pode facilmente seguir a
linha até o ponto de fuga do conhecimento humano.

De fato, houve uma forte tendência a fazer isso entre uma parte dos anarquistas mais
instruídos, que primeiro foram trabalhadores, depois anarquistas por causa de seu ódio
instintivo ao chefe, e apenas mais tarde se tornaram estudantes e, varridos por uma ciência mal
digerida, imediatamente conceberam que era necessário ajustar seu anarquismo às revelações do
microscópio; caso contrário, a teoria também poderia ser abandonada. Lembro-me, com
considerável entretenimento, de uma discussão acalorada, há cinco ou seis anos, em que
médicos e doutores de embriões procuravam justificativa do anarquismo no desenvolvimento da
ameba, enquanto um engenheiro novato a procurava em quantidades matemáticas.

Eu mesma certa vez afirmei com firmeza que ninguém poderia ser anarquista e acreditar
em Deus ao mesmo tempo. Outros afirmam com firmeza que não se pode aceitar a filosofia
espiritualista e ser anarquista.

Atualmente, defendo C. L. James, o mais instruído dos anarquistas americanos, que o


sistema metafísico de alguém tem muito pouco a ver com o assunto. A cadeia de raciocínio que
antes me pareceu tão conclusiva, a saber, que o anarquismo ser uma negação de autoridade
sobre o indivíduo não poderia coexistir com uma crença em um Governante Supremo do
Universo, é contradita no caso de Léo Tolstoi, que chega à conclusão de que ninguém tem o
direito de governar outro exatamente por causa de sua crença em Deus, justamente porque ele
acredita que todos são igualmente filhos de um único pai e, portanto, nenhum tem o direito de
governar o outro. Falo dele porque ele é um personagem familiar e notável, mas sempre houve
casos em que a mesma ideia foi desenvolvida pela integralidade de sectos de fiéis, especialmente
nos estágios iniciais (e perseguidos) de seu desenvolvimento.

Não me parece mais necessário, portanto, que alguém baseie seu anarquismo em
qualquer concepção particular do mundo; é uma teoria das relações devidas ao homem e surge
como uma solução oferecida aos problemas sociais decorrentes da existência dessas duas
tendências das quais falei. Não importa de onde venham essas tendências, todos as reconhecem
como existentes; e por mais interessante que seja a especulação, por mais fascinante que seja se
perder novamente, de volta ao turbilhão de tempestades moleculares em que a figura do homem
é vista meramente como um agrupamento mais denso e feroz, um centro de tempestades mais
vívido, movendo-se entre outros, colidindo com outros, mas de nenhuma forma separado,
nenhuma forma isento da mesma necessidade que atua sobre todos os outros centros de força –
não é de modo algum necessário para entender a si mesmo no anarquismo.

São suficientes um bom e atento olho e um cérebro razoavelmente refletido, para


qualquer um, letrado ou iletrado, reconhecer a conveniência dos objetivos anarquistas. Isso não
quer dizer que o aumento do conhecimento não confirme e amplie a aplicação desse conceito
fundamental; (a beleza da verdade é que, a cada nova descoberta de fatos, encontramos o quanto
ela é muito mais ampla e profunda do que a princípio pensávamos). Mas isso significa que, antes
de tudo, o anarquismo está preocupado com as condições presentes e com as pessoas muito
simples e comuns; e não é de forma alguma uma proposta complexa ou difícil.
O anarquismo, sozinho, além de qualquer reforma econômica proposta, é apenas a
resposta mais recente de muitas que o passado já nos deu, àquele espírito ousado, fugidio,
volátil e mutável que nunca está contente. A sociedade da qual fazemos parte nos coloca certas
opressões – opressões que surgiram das próprias mudanças realizadas por esse mesmo espírito,
combinadas com as linhas duras e rápidas dos velhos hábitos adquiridos e corrigidos antes que
as mudanças fossem pensadas. O maquinário, que como nossos companheiros socialistas
enfatizam continuamente, provocou uma revolução na indústria, é a criação do Espírito da
Ousadia; ele lutou contra costumes arcaicos, privilégios e covardia a cada passo, como a história
de qualquer invenção mostraria se fosse rastreada para trás em todas as suas transformações. E
qual é o resultado disso? Que um sistema de trabalho, inteiramente apropriado para a produção
manual e capaz de não gerar grandes opressões enquanto a indústria permaneceu naquele
estado, foi esticado, forçado a ajustar-se à produção em massa, até chegarmos ao ponto de
ruptura; mais uma vez, o espírito da Ousadia deve afirmar-se – reivindicar novas liberdades,
uma vez que as antigas são tornadas nulas pelos métodos atuais de produção.

Para falar em detalhes: nos velhos tempos do Mestre e do Homem – não tão velhos, a
ponto de muitos dos trabalhadores mais velhos conseguem lembrar das condições –, a oficina
era um lugar bastante tranquilo onde empregador e empregado trabalhavam juntos, não
conheciam sentimentos de classe, aproximavam-se fora do expediente, de regra não eram
obrigados a se apressar e, quando eram, confiavam no princípio do interesse comum e da
amizade (não no poder do dono de um escravo) para obter assistência ao longo do tempo. O
lucro proporcional no trabalho de cada homem pode até ter sido em geral mais alto, mas a
quantidade total possível de ser apropriada por um empregador era relativamente tão pequena
que nenhuma agregação tremenda de riqueza poderia surgir. Ser empregador não dava a
ninguém poder sobre as indas e vindas de outros, nem sobre sua fala enquanto trabalhava, nem
para forçá-lo além da resistência quando no limite, nem para submetê-lo a multas e tributos de
coisas indesejadas, como água gelada, escarradeiras sujas, xícaras de chá estragado e similares;
nem às indecências não mencionáveis da grande fábrica. A individualidade do trabalhador era
uma quantidade claramente reconhecida: sua vida era sua; ele não podia ser trancado e levado à
morte, como um cavalo de bonde, para o bem do público em geral e a importância primordial da
Sociedade.

Com a aplicação da energia a vapor e o desenvolvimento de Maquinário, surgiram esses


grandes grupos de trabalhadores, essa subdivisão de trabalho, que tornou o empregador um
homem à parte, tendo interesses hostis aos de seus empregados, vivendo em outro círculo
separado, não conhecendo nada deles, a não ser como tantas unidades de poder, a serem
reconhecidas como ele faz com suas máquinas, na maioria das vezes as desprezando-os, na
melhor das hipóteses, considerando-as dependentes a quem ele é obrigado – em alguns aspectos
– a cuidar, como um o homem humano cuida de um cavalo velho que ele não pode usar. Essa é a
sua relação com seus funcionários; enquanto para o público em geral ele se torna simplesmente
uma imensa lula com tentáculos alcançando todos os lugares – cada minúscula ventosa
sugadora de lucro não produzindo grandes efeitos, mas agregando um corpo de riqueza que faz
qualquer declaração de igualdade ou liberdade entre ele e o trabalhador algo ridículo.

Chegou a hora, portanto, em que o espírito da Ousadia chama alto por todas as fábricas e
oficinas para uma mudança nas relações de mestre e homem. Deve haver algum arranjo possível
que preserve os benefícios da nova produção e, ao mesmo tempo, restaure a dignidade
individual do trabalhador, – devolva a ousada independência do velho mestre de ofício, com as
liberdades adicionais, acumulando para ele as vantagens especiais dos desenvolvimentos
materiais da sociedade.

Esta é a mensagem particular do anarquismo para o trabalhador. Não é um sistema


econômico; não vem com planos detalhados de como vocês, os trabalhadores, devem conduzir a
indústria; nem métodos sistematizados de troca; nem organizações em papel cuidadosas da
“administração das coisas”. Simplesmente apela ao espírito de individualidade para que se
levante de sua humilhação e se mantenha em primeiro lugar, independentemente de que
reorganização econômica venha por aí. Sejam homens antes de tudo, não presos à escravidão
pelas coisas que fazem; deixe seu evangelho ser: “Coisas para homens, não homens para coisas”.
O socialismo, economicamente considerado, é uma proposta positiva para essa reorganização. É
uma tentativa, no seu cerne, de captar aqueles grandes ganhos materiais novos que foram a
criação especial dos últimos quarenta ou cinquenta anos. Ela não tem tanto em vista a
recuperação e afirmação adicional da personalidade do trabalhador, como tem uma distribuição
justa de produtos.

Agora é perfeitamente aparente que a Anarquia, tendo a ver quase inteiramente com as
relações dos homens em seus pensamentos e sentimentos, e não com a organização positiva da
produção e distribuição, um anarquista precisa complementar seu anarquismo com algumas
proposições econômicas, o que pode habilitá-lo a colocar em forma prática para si e para os
outros essa possibilidade de ânimo independente. Esse será o teste dele na escolha de qualquer
proposição desse tipo – a medida em que a individualidade está garantida. Não é suficiente para
ele garantir uma facilidade confortável, uma rotina agradável e bem-ordenada; jogo livre para o
espírito de mudança – essa é sua primeira demanda.

Todo anarquista tem isso em comum com todos os outros anarquistas, que o sistema
econômico deve ser subserviente para esse fim; nenhum sistema se recomenda a ele pela mera
beleza e suavidade de seu trabalho; ciumento das invasões da máquina, ele olha com feroz
suspeita uma aritmética com homens por unidades, uma sociedade correndo em encaixes e
trilhos, com a precisão tão bonita para alguém em quem o amor pela ordem é primeiro, mas que
apenas o faz fungar – “Atchim! Cheira a óleo de máquina”.

Existem, portanto, várias escolas econômicas entre anarquistas; Existem Anarquistas


Individualistas, Anarquistas Mutualistas, Anarquistas Comunistas e Anarquistas Socialistas. No
passado, essas várias escolas se denunciaram amargamente e se recusaram mutuamente a se
reconhecer como anarquistas. Os de mente estreita em ambos os lados ainda o fazem; verdade,
eles não consideram isso uma atitude tacanha, mas simplesmente uma compreensão firme e
sólida da verdade, que não permite tolerância ao erro. Essa tem sido a atitude do intolerante em
todas as épocas, e o anarquismo não mais do que qualquer outra nova doutrina escapou de seus
fanáticos. Cada um desses adeptos fanáticos do coletivismo ou do individualismo acredita que
nenhum anarquismo é possível sem esse sistema econômico específico como garantia, e é claro
que é completamente justificado do seu próprio ponto de vista. Com a extensão do que o
camarada Brown chama de Novo Espírito, no entanto, essa velha estreiteza está cedendo à ideia
mais ampla, mais gentil e muito mais razoável, de que todas essas ideias econômicas podem ser
experimentadas, e não há nada de anti-anárquico em nada disso até que o elemento de coerção
entre e obrigue as pessoas relutantes a permanecerem em uma comunidade cujos arranjos
econômicos não concordam. (Quando digo “não concordam”, não quero dizer que eles tenham
um mero desgosto, ou que pensem que podem alterar [a comunidade] para algum outro arranjo
preferível, mas com o qual, no entanto, eles facilmente tolerem, assim como duas pessoas que
vivem na mesma casa e têm gostos diferentes na decoração, se submetem a alguma cor da
cortina de janela ou à bibelôs que eles não gostam muito, mas que, mesmo assim, ele
alegremente tolera pela satisfação de estar com seu amigo. Quero dizer diferenças sérias que, na
opinião deles, ameaçam suas liberdades essenciais. Faço essa explicação sobre as ninharias,
porque as objeções levantadas à doutrina de que os homens podem viver livremente na
sociedade quase sempre degeneram em trivialidades, como “o que você faria se duas mulheres
quisessem o mesmo chapéu?” etc. Não defendemos a abolição do senso comum, e toda pessoa
sensata está disposta a renunciar às suas preferências às vezes, desde que não seja obrigada a
todo custo.)

Por isso, digo que cada grupo de pessoas que age socialmente em liberdade pode
escolher qualquer um dos sistemas propostos e ser tão conscienciosamente anárquico quanto
aqueles que selecionam outro. Se esse ponto de vista for aceito, nos livraremos daquelas
excomunhões ultrajantes que pertencem adequadamente à Igreja de Roma e que não têm outro
propósito senão levar-nos ao desprezo merecido por pessoas de fora.

Além disso, tendo aceito-o a partir de um processo puramente teórico de raciocínio, creio
que se tem uma atitude mental de perceber certos fatores que explicam essas diferenças nos
sistemas propostos, e que até exigem tais diferenças, enquanto a produção esteja em seu estado
atual.

Vou agora me debruçar brevemente sobre essas várias proposições e explicar, à medida
que for avançando, quais são os fatores materiais aos quais acabei de aludir. Tomando o último
primeiro, a saber, o anarquismo socialista, – seu programa econômico é o mesmo do socialismo
político, em sua totalidade; – Quero dizer, antes que o trabalho da política prática tenha
fragmentado o socialismo em uma mera lista de melhorias governamentais. Tais anarquistas
socialistas sustentam que o Estado, o Governo Centralizado, foi e sempre será o representante
comercial da classe detentora de propriedades; que é uma expressão puramente de uma
determinada condição material e, com a passagem dessa condição, o Estado também deve
passar; que o socialismo, significando a tomada completa de todas as formas de propriedade das
mãos dos homens como posse indivisível do Homem, traz como resultado lógico e inevitável a
dissolução do Estado. Eles acreditam que com todo indivíduo tendo uma reivindicação igual
sobre a produção social e com o incentivo para tomar e ocultar afastado, os crimes (que são em
quase todos os casos a resposta instintiva a uma negação antecedente dessa reivindicação de
participação) desaparecem e, com eles a última desculpa para a existência do Estado. Como
regra geral, eles não esperam nenhuma transformação no aspecto material da sociedade, como
fazem alguns de nós. Um londrino me disse certa vez que acreditava que Londres continuaria
crescendo, o fluxo e o refluxo das nações continuariam a derramar por suas ruas serpentinas,
seus cem mil ônibus continuariam a circular da mesma maneira, e todo esse tráfego tremendo
que fascina e horroriza continuaria rolando como uma grande inundação para cima e para baixo,
para cima e para baixo, como a varredura do mar – após a realização do anarquismo, como
acontece agora. O nome daquele londrino era John Turner; ele disse, na mesma ocasião, que
acreditava profundamente na economia do socialismo.
Agora, esse ramo do partido anarquista saiu do antigo partido socialista e originalmente
representava a ala revolucionária desse partido, em oposição àqueles que adotaram a noção de
usar a política. E acredito que a razão material que justifica a aceitação desse esquema
econômico em particular é a seguinte (é claro que se aplica a todos os socialistas europeus), de
que o desenvolvimento social da Europa é algo da história de longa data; que quase desde
tempos imemoriais houve uma luta de classes reconhecida; que nenhum trabalhador vivo, nem
seu pai, nem seu avô, nem seu bisavô viram a terra da Europa passar, em vastos blocos, de uma
herança pública não reclamada para as mãos de um indivíduo comum como ele, sem um título
ou qualquer marca de distinção sobre si mesmo, como nós na América vimos. A terra e o
proprietário da terra sempre foram para ele quantidades inacessíveis – uma fonte reconhecida
de opressão, classe e posse de classe.

Novamente, o desenvolvimento industrial no distrito e na cidade – vindo como um meio


de escapar da opressão feudal, mas trazendo consigo suas próprias opressões, também com uma
longa história de guerra por trás, serviu para vincular o senso de vassalagem de classe às
pessoas comuns dos distritos manufatureiros; de forma que, cegos, estúpidos e dominados pela
Igreja como, sem dúvida, são, exista um sentimento vago, monótono, mas certamente existente,
de que devem procurar ajuda em associações mútuas e considerar com desconfiança ou
indiferença qualquer proposição que se proponha a apoiá-los ajudando os empregadores. Além
disso, o socialismo tem sido um sonho sempre recorrente ao longo da longa história de revolta
na Europa; Anarquistas, como outros, nascem dentro disso. Somente depois de cruzarem os
mares e entrarem em contato com outras condições, respirarem a atmosfera de outros
pensamentos, é que eles também poderão ver outras possibilidades.

Se eu me atrever, a essa altura, a uma crítica a essa posição do anarquista socialista, diria
que a grande falha nessa concepção de Estado é supor que seja de origem simples; o Estado não
é meramente a ferramenta das classes governantes; tem suas raízes no desenvolvimento
religioso da natureza humana; e não desmoronará meramente pela abolição de classes e
propriedades. Ainda existem outros trabalhos a serem feitos. Quanto ao programa econômico,
criticarei isso, juntamente com todas as outras proposições, quando sumarizar minha posição.

O anarquismo comunista é uma modificação, melhor dizendo uma evolução, do


anarquismo socialista. Muitos anarquistas comunistas, acredito, esperam grandes mudanças na
distribuição das pessoas na superfície da Terra através da realização do anarquismo. A maioria
deles concorda que a abertura da terra, juntamente com o uso livre de ferramentas, levaria ao
desmembramento dessas vastas comunidades chamadas cidades, e à formação de grupos ou
comunas menores, que serão mantidos juntos apenas pelo livre reconhecimento de interesses
comuns.

Enquanto o socialismo espera uma extensão adicional do triunfo moderno do Comércio –


que trouxe os produtos de toda a terra à sua porta – o comunismo livre considera tal febre de
exportação e importação como um desenvolvimento prejudicial, e espera um desenvolvimento
mais autossuficiente dos recursos domésticos, eliminando a massa de supervisão necessária para
a condução sistemática desse intercâmbio mundial. Ele apela ao simples senso comum dos
trabalhadores, propondo que aqueles que agora se consideram dependentes impotentes da
capacidade do chefe de lhes dar um emprego, constituam-se grupos independentes de
produção, peguem os materiais, façam o trabalho (eles já fazem o trabalho agora), depositem os
produtos nos armazéns, pegando o que eles querem para si mesmos e deixando que outros
assumam o equilíbrio. Para fazer isso, nenhum governo, empregador ou sistema monetário é
necessário. Só é necessário ter uma consideração decente por si mesmo e pela pessoa dos
colegas. Não é provável, na verdade é de se esperar com devoção que não, que grandes
agregações de homens como as que hoje se reúnem diariamente em moinhos e fábricas se
reúnam por desejo mútuo. (Uma fábrica é uma estufa para tudo o que é cruel na natureza
humana, e em grande parte apenas por causa de sua aglomeração.)

A noção de que os homens não podem trabalhar juntos, a menos que tenham um
contramestre para tomar uma porcentagem de seu produto, é contrária ao bom senso e ao fato
observado. Como regra, os chefes simplesmente pioram a confusão quando tentam se misturar
com os rosnados de um trabalhador, como todo mecânico já viu na prática; e quanto ao esforço
social, por que os homens trabalhavam em comum enquanto ainda eram macacos; se você não
acredita, vá assistir os macacos. Eles também não renunciam à sua liberdade individual.

Em resumo, os verdadeiros operários farão seus próprios regulamentos, decidirão


quando, onde e como as coisas devem ser feitas. Não é necessário que o planificador de uma
sociedade anarquista comunista diga de que maneira indústrias separadas devem ser
conduzidas, nem elas tem essa intenção. Ele simplesmente evoca o espírito da Ousadia e
Execução nos trabalhadores mais simples – diz a eles: “São vocês que sabem como minar, como
cavar, como cortar; você saberá como organizar seu trabalho sem um ditador; não podemos lhes
ordenar, mas temos plena fé de que vocês encontrarão o caminho. Vocês nunca serão homens
livres até adquirirem a mesma autoconfiança”.

Quanto ao problema da troca exata de equivalentes que tanto aflige os reformadores de


outras escolas, para ele isso não existe. Se existe o suficiente, quem se importa? As fontes de
riqueza permanecem indivisíveis para sempre; quem se importa se alguém tem um pouco mais
ou menos, se todos têm o suficiente? Quem se importa se algo é desperdiçado? Deixe
desperdiçar. A maçã apodrecida fertiliza o solo, assim como se tivesse confortado a economia
animal antes. E, de fato, você que se preocupa tanto com o sistema, a ordem e o ajuste da
produção ao consumo, gasta mais energia humana em fazer sua conta do que vale o cálculo
precioso. Portanto, o dinheiro com todo o seu séquito de complicações e truques é abolido.

Comunas pequenas, independentes, autônomas e que cooperam livremente – esse é o


ideal econômico aceito pela maioria dos anarquistas do Velho Mundo atualmente.

Quanto ao fator material que desenvolveu esse ideal entre os europeus, é a lembrança e
até alguns vestígios ainda remanescentes da aldeia medieval comunal – aqueles oásis no grande
Saara da degradação humana apresentado na história da Idade Média, quando a Igreja Católica
ficou triunfante sobre o Homem no pó. Tal é o ideal que se ilumina com o ouro morto de um sol
que se pôs, que brilha através das páginas de Morris e Kropotkin. Nós, na América, nunca
conhecemos a aldeia comunal. A civilização branca atingiu nossas costas em uma ampla maré e
varreu o país de forma ampla; entre nós nunca foi visto crescer de forma independente a
pequena comunidade a partir de um estado de barbárie, fora das indústrias primárias e
mantendo-se dentro de si mesma. Não houve mudança gradual do modo de vida do povo
nativo para o nosso; houve uma extinção e um transplante completo da última forma de
civilização europeia. A ideia da pequena comuna, portanto, chega instintivamente aos
anarquistas da Europa – principalmente os continentais; com eles é apenas o desenvolvimento
consciente de um instinto submerso. Para os americanos é uma importação.

Acredito que a maioria dos anarquistas comunistas evita a tolice dos socialistas em
considerar o Estado como filho de condições materiais puramente, embora eles enfatizem muito
o fato de ser a ferramenta da Propriedade e sustentem que, de uma forma ou de outra, o Estado
existirá enquanto houver qualquer propriedade.

Passo para os individualistas extremos – aqueles que se apegam à tradição da economia


política e são firmes na ideia de que o sistema de empregadores e empregados, de compra e
venda, de bancos e de todas as outras instituições essenciais do Comercialismo, centrado na
propriedade privada, são em si boas e são tornadas cruéis apenas pela interferência do Estado.
Suas principais proposições econômicas são: terras a serem mantidas por indivíduos ou
empresas por um período e em lotes que eles usem apenas; a redistribuição ocorrerá quantas
vezes os membros da comunidade concordarem; o que constitui uso a ser decidido em cada
comunidade, presumivelmente na assembleia que reúne o distrito; casos disputados a serem
resolvidos por um assim chamado júri livre, a ser escolhido por sorteio de todo o grupo;
membros que não coincidam com as decisões do grupo se dirigem a terras periféricas não
ocupadas, sem permissão ou impedimento de ninguém.

Dinheiro para representar todas as mercadorias básicas, a ser emitidos por quem quiser;
naturalmente, os indivíduos depositariam seus títulos em bancos e aceitariam notas bancárias
em troca; tais notas bancárias representando o trabalho gasto na produção e sendo emitido em
quantidade suficiente (não há limite para que alguém inicie o negócio, sempre que os juros
começaram a aumentar, mais bancos seriam organizados e, portanto, a taxa percentual seria
constantemente controlada pela concorrência), as trocas ocorreriam livremente, as mercadorias
circulariam, os negócios de todos os tipos seriam estimulados e, com o privilégio do governo
retirado das invenções, as indústrias surgiam a cada passo, os chefes caçariam homens em vez
de homens caçarem patrões, os salários subiriam para a medida total da produção individual e
permaneceriam para sempre lá. Propriedade, propriedade real, finalmente existiria, o que não
existe atualmente, porque ninguém tem o que produz.

O charme deste programa é que ele não propõe mudanças radicais em nosso séquito
diário; não nos deixa perplexos como proposições mais revolucionárias. Seus remédios são auto-
atuantes; eles não dependem de esforços conscientes dos indivíduos para estabelecer justiça e
construir harmonia; a competição em liberdade é a grande válvula automática que abre ou fecha
à medida que as demandas aumentam ou diminuem, e tudo o que é necessário é deixar o que é
suficiente em paz e não tentar ajudá-lo.

É certo que nove em cada dez americanos que nunca ouviram falar de nenhum desses
programas ouvirão com muito mais interesse e aprovação esse do que aos outros. A razão
material que explica essa atitude mental é muito evidente. Neste país, fora da questão dos
negros, nunca tivemos a divisão histórica de classes; estamos apenas fazendo essa história agora;
nunca sentimos a necessidade do espírito associativo de operário com operário, porque em
nossa sociedade foi o indivíduo que fez as coisas; o trabalhador do dia de hoje era o empregador
do dia de amanhã; vastas oportunidades abertas a ele no território não-explorado, ele colocou as
ferramentas nos ombros e desenvolveu a si mesmo com as próprias mãos. Mesmo agora, cada
vez mais feroz, a luta está aumentando, cada vez mais o trabalhador está sendo encurralado, a
linha de divisão entre classes e classes está sendo constantemente quebrada, e o primeiro lema
do americano é “o Senhor ajuda quem ajuda a si mesmo”. Consequentemente, esse programa
econômico, cuja nota-chave é “deixe quieto”, apela fortemente às simpatias e hábitos de vida
tradicionais de um povo que viu um patrimônio quase ilimitado ser levantado, como um
jogador levanta suas apostas, por homens que jogavam com ele na escola ou trabalharam com
ele em uma loja um ano ou dez anos antes.

Esse ramo específico do movimento anarquista não aceita a posição comunista de que o
governo surge da propriedade; pelo contrário, responsabilizam o governo pela negação da
propriedade real (a saber: ao produtor a posse exclusiva do que ele produziu). Eles enfatizam
mais sua origem metafísica na natureza humana do Medo, que cria autoridade. O ataque deles é
direcionado centralmente à ideia de Autoridade; assim, os erros materiais parecem fluir do erro
espiritual (se é que posso arriscar a palavra sem medo de má interpretação), que é precisamente
o contrário da visão socialista.

A verdade não está “entre os dois”, mas em uma síntese das duas opiniões.

O Anarquismo Mutualista é uma modificação do programa de Individualismo, dando


mais ênfase à organização, cooperação e federação livre dos trabalhadores. Para eles, o sindicato
é o núcleo do grupo cooperativo livre, que evitará a necessidade de um empregador, emitirá
certificados de tempo trabalhado para seus membros, se encarregará do produto acabado,
trocará com diferentes grupos comerciais por vantagens mútuas através da federação central,
habilitará que seus membros utilizem seu crédito e também similarmente irá segurá-los contra
perdas. A posição mutualista sobre a questão da terra é idêntica à dos individualistas, assim
como sua compreensão do Estado.

O fator material que explica as diferenças que existem entre individualistas e mutualistas
é, creio, o fato de que o primeiro se originou no cérebro daqueles que, sejam trabalhadores ou
homens de negócios, viviam do chamado esforço independente. Josiah Warren, embora pobre,
vivia de maneira individualista e fazia sua experiência social de vida livre em pequenos
assentamentos rurais, muito distantes das grandes indústrias organizadas. Tucker também,
embora seja um homem da cidade, nunca teve uma associação pessoal com essas indústrias. Eles
nunca conheceram diretamente as opressões da grande fábrica, nem se misturaram às
associações de trabalhadores. Os Mutualistas, consequentemente, inclinavam-se para um
Comunismo maior. Dyer D. Lum passou a maior parte de sua vida na construção de sindicatos
de trabalhadores, sendo ele próprio um trabalhador manual, um encadernador de livros.

Apresentei agora o esqueleto aproximado de quatro esquemas econômicos diferentes,


entretidos pelos anarquistas. Lembre-se de que o ponto de concordância em tudo é: sem coerção.
Aqueles que favorecem um método não têm intenção de forçá-lo sobre aqueles que favorecem
outro, desde que seja exercida tolerância igual em relação a si mesmos.

Lembre-se, também, que nenhum desses esquemas é proposto por si só, mas porque
através dele, seus projetores acreditam, a liberdade pode ser mais bem garantida. Todo
anarquista, como anarquista, estaria perfeitamente disposto a renunciar diretamente ao seu
próprio esquema, se visse que outro funcionava melhor.
Para mim, acredito que tudo isso e muito mais poderia ser experimentado com vantagem
em diferentes localidades; eu veria os instintos e hábitos das pessoas se expressarem em livre
escolha em todas as comunidades; e tenho certeza de que ambientes distintos exigiriam
adaptações distintas.

Pessoalmente, embora reconheça que a liberdade seria amplamente estendida em


qualquer uma dessas economias, confesso francamente que nenhuma delas me satisfaz.

O socialismo e o comunismo exigem um grau de esforço e administração conjuntos que


gerariam mais regulamentação do que é totalmente consistente com o anarquismo ideal; O
individualismo e o mutualismo, apoiados na propriedade, envolvem um desenvolvimento do
policial particular que não é de todo compatível com minhas noções de liberdade.

Meu ideal seria uma condição na qual todos os recursos naturais fossem eternamente
livres para todos, e o trabalhador individualmente capaz de produzir para si próprio o suficiente
para todas as suas necessidades vitais, se assim o desejasse, para que ele não precise governar
seu trabalho ou não trabalho pelos tempos e estações dos seus companheiros. Eu acho que pode
chegar a hora; mas será apenas através do desenvolvimento dos modos de produção e do gosto
das pessoas. Enquanto isso, todos gritamos com uma só voz pela liberdade de tentar.

Esses são todos os objetivos do anarquismo? Eles são apenas o começo. Eles são um
esboço do que é exigido ao produtor de material. Se, como trabalhador, você não pensa além de
como se libertar da horrível escravidão do capitalismo, então essa é a medida do anarquismo
para você. Mas você mesmo coloca o limite lá, se for colocado. Imensuravelmente mais
profundo, incomensuravelmente mais alto, mergulha e eleva a alma que saiu de seu invólucro
de costume e covardia, e se atreveu a reivindicar seu Eu.

Ah, ficar uma vez de pé e sem hesitar na beira do abismo


sombrio das paixões e desejos, uma vez para finalmente dirigir um
olhar firme e corajoso em direção ao vulcânico Eu, uma vez, e
nessa única vez, e eternamente nessa única vez, abandonar o
comando que nos leva a fugir e nos esconder do conhecimento
desse abismo, – negá-lo e desafiar o abismo a chiar e fervilhar
como quiser, e nos fazer contorcer e tremer com sua força!

Uma vez e para sempre entender que não somos um


aglomerado de pequenas razões bem reguladas, reunidas na sala
principal de nosso cérebro para receber sermões, ordenadas
segundo máximas anotadas em cadernos, movidas e bloqueadas
por silogismos, mas uma profundeza sem fundo de todo tipo de
sensações estranhas, um mar revolto de sentimentos varrido por
tempestades de ódios e fúrias inexplicáveis, contorções invisíveis
de frustração, refluxos de maldade, tremores de amor que nos
levam à loucura e não podem ser controlados, expressões de fome
e gemidos e soluços que martelam nosso ouvido interno até dobrá-
lo para escutar, como se toda tristeza do mar e todo lamento das
grandes florestas de pinheiros do norte tivessem se encontrado
para chorar em conjunto naquele silêncio que somente você
consegue ouvir.
Olhar para isso, conhecer a escuridão, a meia-noite, as épocas
mortas em nós, sentir a selva e a besta vindas do interior, – e
também o pântano e o lodo, e o deserto desolado do desespero do
coração – ver, conhecer, sentir ao extremo, – e então olhar para o
seu próximo, sentado do outro lado do bonde, tão decoroso, tão
arrumado, tão bem penteado e escovado e lubrificado, e perguntar
pelo que está por trás desse exterior ordinário, – pensar na caverna
em seu interior que possui, em algum lugar de suas profundezas,
uma estreita galeria que se conecta à nossa – imaginar a dor que
possivelmente o faz tremer até a ponta dos dedos enquanto ele
veste esse plácido semblante, passado a ferro como sua camisa –
pensar em como ele também se arrepia consigo mesmo e se
contorce e foge da lava de seu coração, sofrendo em sua prisão
domiciliar sem ousar ver a si mesmo – recuar respeitosamente dos
portões do Eu das criaturas mais honestas e das menos
promissoras, até mesmo dos criminosos mais depravados, pois
sabemos da insignificância e do criminoso que há em nós – poupar
a todos da condenação (e ainda mais do julgamento e do
veredicto) pois sabemos do que é feita a humanidade e não
tememos nada já que temos tudo isso em nós mesmos – é isso que o
anarquismo pode significar para você. Significa isso para mim.
E então, virar as nuvens, as estrelas, o céu e deixar que os sonhos se precipitem sobre si –
não mais impressionado por poderes externos de qualquer ordem – sem reconhecer nada
superior a si mesmo – pintando, pintando quadros sem fim, criando sinfonias inéditas que
cantam sons de sonho apenas para você, estendendo simpatia aos brutos mudos como irmãos
iguais, beijando as flores como se fazia quando uma criança, deixando-se libertar, ir livremente
além dos limites do que o medo e o costume chamam de “possível” – isso também pode
significar anarquismo para você, se você se atreve a se aplicar. E se você fizer um dia, – se estiver
sentado em sua bancada de trabalho, você vir uma visão de glória superior, uma imagem
daquele tempo de ouro em que não haverá prisões na terra, nem fome, nem falta de moradia,
nem acusação, nem julgamento e corações abertos como folhas impressas, e sincero como
destemor, se você olhar para o seu vizinho de rosto baixo, que sua, fede e amaldiçoa sua labuta –
lembre-se de que, como você não conhece a profundidade dele, nem a altura dele. Ele também
poderia sonhar se o jugo dos costumes, da lei e do dogma fosse retirado dele. Mesmo agora você
não sabe que crisálida cega, amarrada e imóvel está trabalhando lá para preparar sua coisa
alada.

Anarquismo significa liberdade para a alma e para o corpo – em toda aspiração, todo
crescimento.

Algumas palavras quanto aos métodos. No passado, os anarquistas também se excluíam


por esses motivos; os revolucionários chamaram desdenhosamente os homens da paz de
“Quaker1”; “Comunistas selvagens”, anatemizaram os quakers em retorno.

Isso também está passando. Eu digo o seguinte: todos os métodos são de capacidade e
decisão individuais.

Há Tolstoi, – cristão, não-resistente, artista. Seu método é pintar quadros da sociedade


como ela é, mostrar a brutalidade da força e a inutilidade dela; pregar o fim do governo através
do repúdio de toda força militar. Bom! Eu aceito em sua totalidade. Isso se encaixa em seu
caráter, isso se encaixa em sua capacidade. Vamos ficar contentes que ele trabalha assim.

Há John Most – velho, cansado do trabalho, com o peso de anos de prisão sobre ele –,
ainda assim feroz, mais feroz e tão amargo em suas denúncias da classe dominante que exigiria
a energia de uma dúzia de homens mais jovens para proferir – descendo a últimas colinas da
vida, despertando a consciência das injúrias entre seus companheiros. Bom! Essa consciência
deve ser despertada. Que por muito tempo essa língua ardente ainda fale.

Benjamin Tucker – frio, autônomo, crítico – envia suas flechas duras e duras entre
inimigos e amigos com imparcialidade gelada, acertando rápido e cortante, – e sempre pronto
para atingir um traidor. Tendo a resistência passiva como a mais eficaz, pronta para alterá-la
sempre que julgar sábio. Isso combina com ele; em seu campo, ele está sozinho, inestimável.

E há Peter Kropotkin apelando para os jovens, e olhando com doce, caloroso e ansioso
olhar para todos os esforços, e saudando com entusiasmo de uma criança os levantes dos
trabalhadores e acreditando na revolução com toda a sua alma. À ele também agradecemos.
1 Quaker significa “tremedor”, e é uma denominação pejorativa para o movimento protestante antianglicano e ultra-
pacifista Sociedade Religiosa dos Amigos;
E há George Brown pregando expropriação pacífica através dos sindicatos federados dos
trabalhadores; e isso é bom. É o seu melhor lugar; ele está em casa lá; ele pode realizar mais em
seu próprio campo escolhido.

E ali na sua cela funerária na Itália, dorme o homem [Gaetano Bresci], cujo método era
matar um rei, e chocar as nações em uma consciência repentina da vacuidade de sua lei e ordem.
Ele também, ele e seu ato, sem reservas, aceito, e me curvo em silencioso reconhecimento da
força do homem.

Pois existem alguns cuja natureza é pensar e pleitear, e ceder e, ainda assim, retornar ao
endereço, e assim avançar na mente de seus semelhantes; e há outros que são severos e imóveis,
resolutos e implacáveis como o sonho do Deus de Judá; – e aqueles homens atacam – atacam
uma vez e terminam. Mas o golpe ressoa em todo o mundo. E, como em uma noite em que o céu
está pesado com a tempestade, um súbito raio branco brilha através dele, e todo objeto faísca
bruscamente – no fulgor do tiro da pistola de Bresci, o mundo inteiro por viu um momento a
figura trágica do povo italiano, faminto, atrofiado, aleijado, amontoado, degradado, assassinado;
e no mesmo momento em que seus dentes bateram de medo, eles vieram e pediram aos
anarquistas que se explicassem. E centenas de milhares de pessoas leram mais nesses poucos
dias do que jamais haviam lido sobre a ideia antes.

Peça um método? Você pergunta a Primavera o método dela? O que é mais necessário, o
sol ou a chuva? Eles são contraditórios – sim; eles se destroem – sim, mas dessa destruição
resultam as flores.

Cada um escolhe o método que melhor expressa sua individualidade e não condena
nenhum outro homem porque, de outra forma, expressa seu próprio eu.

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