Alexandre Almeida - Curso de Intrumentista de Orquestra – Análise Musical IV
Prof. Emanuel Frazão – Ano letivo 2019/2020
RESUMO DO PROGRAMA ANALYSIS FOR COMPOSERS #14 - ON
DISSONANCE DE ALAN BELKIN
A harmonia clássica inclui várias fórmulas de dissonância padrão. A música do
século XX apresentou-nos a emancipação da dissonância, mas esta é uma ideia problemática. Originalmente, a dissonância era uma forma de criar pequenos momentos de tensão numa frase, tornando-a mais apelativa; a dissonância ajudava a melodia a “respirar”. Devido à dificuldade de um cantor atacar uma nota dissonante sem preparação, o uso de dissonâncias na música vocal tinha alguns contrangimentos. Assim, o cantor mantia a nota consnoante enquanto as outras vozes mudavam de harmonia, criando assim uma dissonância: o retardo. Uma dissonância preparada por graus conjuntos também é relativamente fácil para um cantor executar. Este aspeto é importante devido ao efeito criado pela dissonância ser criado em parte por 2 motivos: os intervalos que a compõem e a quantidade de surpresa que cria no seu contexto. Intervalos maiores criam uma sensação de acentuação na nota de chegada, potenciando a combinação destes com a dissonância para um melhor efeito. O tratamento da dissonância tornou-se mais livre com o aparecimento da música intrumental, já que os instrumentos têm posições definidas para cada nota, tornando-se mais fácil atingir certas notas mesmo numa harmonia complexa. A appoggiatura é o exemplo clássico de uma forma intrumental da dissonância que acabou por ser introduzida na música vocal. Durante o século XIX a dissonância foi utilizada mais frequentemente, por exemplo em Wagner. Quando os historiadores se referem à emancipação da dissonância, possivelmente estão a referir-se ao uso da mesma com cada vez menos restrições, acompanhando o aumento do caráter virtuoso da música instrumental. O problema é que, ainda que as restrições vocais já não fossem necessárias na música instrumental, a alternância entre consonância e dissonância permite pequenos momentos de repouso em que a música respira. Este é um fenómeno musical que ultrapassa qualquer estilo individual. Ainda que seja possível a criação de tensão e distensão utilizando outros aspetos musicais como o uso de dinâmicas e diferentes orquestrações, a questão é se é possível o uso da dissonância sem recorrer às fórmulas clássicas mas ainda assim mantendo o potencial da mesma para variar a variar o conteúdo musical. A resposta é sim, e compositores como Shostakovich demonstram isso mesmo. O último andamento das sinfonias 13 e 15 são um exemplo disso mesmo, onde passagens bastante dissonantes são eventualmente resolvidas em corais mais consonantes. Em cada uma destas sinfonias, os corais consistem num único acorde consonante criando uma certa sensação de paz após o “conflito” criado pelas dissonâncias. Ainda que Shostakovich escreva várias vezes passagens completa e agressivamente dissonantes, existe mais variedade no grau de dissonância, tornando a música mais interessante e acessível ao invés de um constante nível elevado de dissonância. Momentos intensos são seguidos de momentos mais calmos: este contraste proporciona um maior poder expressivo à música, possibilitando um maior alívio a ambas as situações. Para a obtenção deste efeito é necessária a utilização de uma escala de dissonância, através da exploração de vários graus de dissonância em diferentes momentos. A 2ª menor, num sistema de afinação temperado, predomina como a dissonância que causa mais efeito. No entanto, existem outros fatores que contribuem para o grau de uma dissonância, tais como a distribuição das notas pelo acorde. Geralmente, quanto maior for a separação entre as duas notas dissonantes, menor é o grau da dissonância. Como se pode observar na figura 1, à medida que se vão afastando as vozes do acorde, vai-se perdendo um pouco do efeito da dissonância. Nos exemplos 5-7, explora-se a distribuição das notas do acorde por um registo mais amplo, provando novamente a diminuição do efeito dissonante. Esta diminuição poderia também ser causada utilizando diferentes orquestrações, já que os diferentes timbres das variadas famílias de instrumentos atenuam o efeito da dissonância.
Figura 1 - Diferentes graus de dissonância de um acorde
Os compositores podem usar estas noções de graus de dissonância e diferentes
voicings para criar variedade na textura musical. O último acorde é a representação do limite da dissonância, o ponto em que o acrescento de uma nota dissonante não intensifica o grau da mesma. Cabe ao compositor utilizar os graus de dissonância para criar vários efeitos expressivos, não a tornando omnipresente: é esta a verdadeira emancipação da dissonância.