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Organização Sete de Setembro de Cultura e Ensino – LTDA

Faculdade Sete de Setembro – FASETE


Curso de Licenciatura em Letras com Habilitação em Língua Portuguesa
e Respectivas Literaturas

Jandison Cleber Bezerra da Cruz

A IDENTIDADE JAGUNÇO NA OBRA “GRANDE SERTÃO: VEREDAS” DE JOÃO


GUIMARÃES ROSA

Paulo Afonso – BA

Agosto/2018
Jandison Cleber Bezerra da Cruz

A IDENTIDADE JAGUNÇO NA OBRA “GRANDE SERTÃO: VEREDAS” DE JOÃO


GUIMARÃES ROSA

Monografia apresentada ao curso de


Graduação em Letras com Habilitação em
Língua Portuguesa e Respectiva literatura
da Faculdade Sete de Setembro
(FASETE), como requisito parcial para
obtenção do título de Licenciado em
Letras.
Área de concentração: Literatura.
Disciplina TG II: Prof.ª. Ms. Cecília Maria
Bezerra de Oliveira.
Orientadora: Prof.ª. Dr.ª. Maria do Socorro
Pereira de Almeida

Paulo Afonso – BA

Agosto/2018
Jandison Cleber Bezerra da Cruz

A IDENTIDADE DO JAGUNÇO NA OBRA “GRANDE SERTÃO: VEREDAS”

DE JOÃO GUIMARÃES ROSA

Monografia apresentada ao Curso de


Graduação em Letras da Faculdade Sete
de Setembro (FASETE), como requisito
parcial para obtenção do grau de
Licenciado em Letras
Área de concentração: Literatura.

Aprovado em: ___/___/________

Banca Examinadora
Prof. _______________________________________________ Orientador
Prof. _______________________________________________ Avaliador
Prof. _______________________________________________ Avaliador

Paulo Afonso – BA

Agosto/2018
Dedico este trabalho a...
AGRADECIMENTOS

Agradeço primeiramente a Deus, por ...


Nem Sempre Sou Igual no que Digo e Escrevo

Nem sempre sou igual no que digo e escrevo.


Mudo, mas não mudo muito.
A cor das flores não é a mesma ao sol
De que quando uma nuvem passa
Ou quando entra a noite
E as flores são cor da sombra.
Mas quem olha bem vê que são as mesmas flores.
Por isso quando pareço não concordar comigo,
Reparem bem para mim:
Se estava virado para a direita,
Voltei-me agora para a esquerda,
Mas sou sempre eu,
assente sobre os mesmos pés —
O mesmo sempre, graças ao céu e à terra
E aos meus olhos e ouvidos atentos
E à minha clara simplicidade de alma...

Heterónimo de Fernando Pessoa


Alberto Caeiro, in "O Guardador de Rebanhos - Poema XXIX"
CRUZ, Jandison Cleber Bezerra. A Identidade do Jagunço na Obra “Grande
Sertão: Veredas” de João Guimarães Rosa. 2018. (quantidade de páginas).
Monografia (Licenciatura em Letras) – Faculdade Sete de Setembro – FASETE.
Paulo Afonso, BA.

RESUMO

O resumo na língua vernácula é um elemento obrigatório no trabalho de conclusão de curso


(TCC). É uma síntese dos aspectos de maior relevância do trabalho (objetivos, resultados e
conclusões), redigido em parágrafo único, sem deslocamento da primeira linha, em espaço
simples, fonte 12. Faz-se importante lembrar que o resumo não pode ultrapassar 500 palavras,
não tem citação de autor e deve ser redigido seguido de palavras-chave.

PALAVRAS-CHAVE: Literatura. Guimarães Rosa. Grande Sertão: Veredas.


Identidade. Jagunço.
ABSTRACT

Versão do resumo para o idioma de divulgação internacional (inglês: abstract, Espanhol:


Resumen, Francês: Resume) também deve ser seguido das palavras representativas do
conteúdo do trabalho, as palavras-chave. Salienta-se que a tradução da língua vernácula para o
idioma internacional deve seguir toda estrutura técnica e metodológica do primeiro.
Preferencialmente escrever em inglês.

KEYWORDS: Literature. Guimarães Rosa. Grande Sertão: Veredas. Identity.


Jagunço.
SUMÁRIO

Sumário
1. INTRODUÇÃO.....................................................................................................10

2. O QUE É IDENTIDADE?.....................................................................................14

2.1 Construção Identitária.......................................................................................17

2.2 As Múltiplas Faces Identitárias do Sertão.........................................................23

3. QUEM É O SUJEITO JAGUNÇO?......................................................................23

3.1 Jagunço – Natureza – Sociedade.....................................................................23

4. MODERNISMO: CARACTERÍSTICAS................................................................23

4.1 O Herói e o Anti-Herói.......................................................................................23

4.2 A modernidade de João Guimarães Rosa: Vida e Obra..................................23

5. A CONSTRUÇÃO IDENTITÁRIA DO JAGUNÇO NA OBRA “GRANDE


SERTÃO: VEREDAS” DE JOÃO GUIMARÃES ROSA............................................26

5.1 A formação da construção da Identidade Jagunço – Natureza........................26

5.2 A formação da construção da Identidade Jagunço – Sociedade.....................26

5.3 A formação da construção da Identidade Jagunço – Herói e Anti-Herói..........26

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS.................................................................................26

REFERÊNCIAS...........................................................................................................26
1. INTRODUÇÃO

A literatura brasileira utiliza-se de muitas perspectivas para representar a identidade


nacional e/ou cultural do povo brasileiro, buscando definir o retrato do Brasil. Muitos
escritores de fato, conceituaram e demonstraram através de suas narrativas, o
Sertão, um dos principais temas do movimento modernista no Brasil. Um desses
escritores é Guimarães Rosa, revelando marcas importantes do homem sertanejo ao
caracteriza-lo intrinsecamente ligado à natureza. Ambiente este, repleto de crenças
e de forte representação. É em meio a toda essa problemática histórica, cultural e
política que surge a imagem do jagunço, permitindo-nos compreender através da
obra “Grande Sertão: Veredas”, a formação de sua identidade que será tema e
objeto de estudo da pesquisa.

A principal razão de se estudar Guimarães Rosa e analisar uma de suas obras,


deve-se ao fato da admiração pessoal que tenho pelo autor, conhecedor de muitas
línguas, mas que escolheu evidenciar em sua obra as influências e falares regionais
do povo sertanejo, resultando numa linguagem única, propriamente do sujeito
jagunço. Isso possibilita identificar e compreender como se dá o processo de
construção de identidade, iniciando-se pelo estudo da língua e posteriormente por
qualidades que o caracterizam. Além disso, pretendo desconstruir a idéia de um
jagunço anti-herói, a margem da sociedade e demonstrar através de relatos da
própria narrativa, a perspectiva que de fato também o caracteriza, através da honra,
força e bravura, a imagem de herói do Sertão, envolvido em tramas de lei e crime,
mas a todo momento, sujeito de uma realidade dura, por muitas vezes imutável, mas
que vale a pena seguir, buscando uma vida melhor.

Objetivo Geral

Analisar como se dá o processo de construção de identidade do jagunço na obra


“Grande Sertão: Veredas” de João Guimarães Rosa.

Objetivos Específicos

 Conceituar Identidade.
 Caracterizar o modernismo e a obra de João Guimarães Rosa.
 Caracterizar a figura do jagunço.
 Identificar as características do jagunço na obra “Grande Sertão: Veredas”.

Metodologia da Pesquisa

O homem sempre se preocupou com o conhecimento da própria realidade, aspectos


como morte e vida e principalmente com o papel de cada um dentro da sociedade
em que vive. Através desta pesquisa, buscaremos identificar todo o processo de
formação da construção identitária do jagunço, afim de compreender e demonstrar a
refinada construção do retrato brasileiro dentro do Sertão. Para isso, faz-se
necessário seguir uma metodologia de pesquisa, buscando compreender quais são
as etapas necessárias para se conduzir um trabalho de grande relevância crítica e
como utilizá-las de forma consciente e produtiva. “Segundo Minayo (2002, p.16),
‘‘entendemos por metodologia o caminho do pensamento e a prática exercida na
abordagem da realidade”. Esta pesquisa, portanto, seguirá uma metodologia
apropriada, incluindo simultaneamente o método científico e a técnica apropriada.

Quanto a pesquisa, é explicativa, pois irei analisar a identidade do jagunço na obra


“Grande Sertão: Veredas” buscando compreender como se dá a construção
identitária deste sujeito á margem da sociedade sertaneja e explicar sua relevância
politica, histórica e social na construção da sociedade brasileira. Segundo Antônio
Joaquim Severino:

A pesquisa explicativa é aquela que além de registrar e analisar o


fenômenos estudados, busca identificar suas causas, seja através da
aplicação do método experimental/matemático, seja através de
interpretação possibilitada pelos métodos qualitativos. [grifo do autor] (2007,
p. 123).

Desse modo, pode-se dizer que a pesquisa explicativa é aquele que buscar explicar
os fenômenos, dados, com base sobre um método, tentando aprofunda-se sobre o
assunto pesquisado, procurando explicar da melhor forma possivel como
determinado fato acontece ou não. Segundo Gil:

Pesquisas explicativas - são pesquisas que têm como preocupação central


identificar os fatores que determinam ou que contribuem para a ocorrência
dos fenômenos. Este é o tipo de pesquisa que mais aprofunda o
conhecimento da realidade, porque explica a razão, o porquê das coisas.
Por isso mesmo é o tipo mais complexo e delicado, já que o risco de
cometer riscos aumenta consideravelmente. (1987, p.46)

Desta maneira, percebemos que mesmo dispendendo muito tempo em pesquisa e


estudo, por se tratar de um estudo científico, ainda poderão ocorrer erros, fato este
que buscaremos evitar, dispondo para isso maior dedicação e foco na obra.

Quanto aos procedimentos da pesquisa científica, elas podem ser classificadas em:
Bibliográfica, pesquisa de campo, estudo de caso, documental, análise de discurso,
etc. Dito isso, utilizarei da pesquisa bibliográfica (uma vez que toda pesquisa
científica é bibliográfica) e análise de discurso a fim de conceituar e caracterizar a
identidade do jagunço na obra “Grande Sertão: Veredas” de João Guimarães Rosa,
como também, caracterizar o modernismo no Brasil tentando compreender como de
fato, este processo de construção identitária acontece. “Segundo Severino, uma
pesquisa bibliográfica é aquela que se realiza a partir do registro disponível,
decorrente de pesquisas anteriores em documentos impressos, como livros, artigos,
teses etc.” (2007, p. 122).

Para José Carlos Koche em Fundamentos de Metodologia Científica: teoria da


ciência e iniciação à pesquisa:

A pesquisa bibliográfica é a que se desenvolve tentando explicar um


problema utilizando o conhecimento disponível a partir das teorias
publicadas em livros ou obras congêneres. Na pesquisa bibliográfica o
investigador irá levantar o conhecimento disponível na área, identificando as
teorias produzidas, analisando-as e avaliando sua contribuição para auxiliar
a compreender ou explicar o problema objeto da investigação. O objetivo da
pesquisa bibliográfica, portanto, é o de conhecer e analisar as principais
contribuições teóricas existentes sobre um determinado tema ou problema,
tornando-se um instrumento indispensável para qualquer tipo de pesquisa.
(2009, p.122)

O que determina minha pesquisa sendo bibliográfica, uma vez que utilizarei de uma
obra literária modernista do Brasil, publicada em 1956. Dito isto, utilizarei tambem da
análise de discurso, um componente fundamental aos procedimentos metodológicos
desta pesquisa. Como disse Foucault (1986, p. 08): “o discurso não é simplesmente
aquilo que traduz as lutas ou os sistemas de dominação, mas aquilo por que, pelo
que se luta, o poder do qual nos queremos apoderar”.
O discurso é produzido por inúmeros saberes e está intimamente ligado aos mais
diversos meios de comunicação, quer seja oral ou escrito. Em A Arqueologia do
saber, encontramos a ideia de discurso sendo parte da construção da realidade e
fruto de diversos saberes. Segundo Foucault (1986):

(...) gostaria de mostrar que o discurso não é uma estreita superfície de


contato, ou de confronto, entre uma realidade e uma língua, intrincamento
entre um léxico e uma experiência; gostaria de mostrar, por meio de
exemplos precisos, que, analisando os próprios discursos, vemos se
desfazerem os laços aparentemente tão fortes entre as palavras e as
coisas, e destacar-se um conjunto de regras, próprias da prática discursiva.
(...) não mais tratar os discursos como conjunto de signos (elementos
significantes que remetem a conteúdos ou a representações), mas como
práticas que formam sistematicamente os objetos de que falam. Certamente
os discursos são feitos de signos; mas o que fazem é mais que utilizar
esses signos para designar coisas. É esse mais que os torna irredutíveis à
língua e ao ato da fala. É esse .mais. que é preciso fazer aparecer e que é
preciso descrever. ( p.56)

A língua é pratica, assim como as interações que ocorrem na sociedade. Seguindo a


mesma linha de pensamento deste mesmo autor, podemos dizer que tudo é prática.
E que tudo está inserido nas relações de poder-poder e poder-saber, interagindo-se
mutuamente.

Quanto à abordagem, esta pesquisa é qualitativa, pois se propõe identificar e


analisar através da Obra “Grande Sertão: Veredas”, dados que não podem ser
expressos numericamente, portanto, considerando a parte subjetiva na perspectiva
de construção identitária do jagunço. Uma análise qualitativa para Gil (2002, p.44):

(...) é menos formal do que a análise quantitativa, pois nesta última seus
passos podem ser definidos de maneira relativamente simples. A análise
qualitativa depende de muitos fatores, tais como a natureza dos dados
coletados, a extensão da amostra, os instrumentos de pesquisa e os
pressupostos teóricos que nortearam a investigação. Pode-se, no entanto,
definir esse processo como uma sequência de atividades, que envolve a
redução dos dados, a categorização desses dados, sua interpretação e a
redação do relatório.

Entende-se por fim, que esta pesquisa irá buscar seguir uma sequencia logica,
reunindo dados que serão utilizados para identificar e demonstrar de fato, como o
processo de construção da identidade do Jagunço se faz possível à partir da analise
da obra.
Apresentação dos Capítulos

Dados os objetivos dessa pesquisa, fez-se necessário dividir este trabalho em


quatro capítulos. O primeiro trata-se de um estudo do conceito de Identidade através
da filosofia, da sociologia e dos estudos históricos e culturais...

O segundo capítulo trata do sujeito Jagunço, ...

O terceiro capítulo apresenta a vida e obra de João Guimarães Rosa,

O último capítulo apresenta os resultados da pesquisa, observando a construção de


Identidade do Jagunço evidenciando a relação entre homem e natureza na obra...

O QUE É IDENTIDADE?

O homem é um conjunto de identidades distintas e sua constituição vem desde o


primeiro elemento que é o nome. Quando pensamos no termo Identidade,
lembramos especificamente do documento, que contém um número único de
identificação como também nome completo, filiação, foto e demais dados que o
representam e o identificam.

Um sujeito político inserido na sociedade é representado através dos próprios


documentos que demonstram quem ele é como: Registro Geral (RG), Cadastro de
Pessoa Física (CPF), Título de Eleitor, dentre outros que juntos formalizam sua
identidade. Ela é algo único para cada ser humano. Segundo o Minidicionário da
Língua Portuguesa, Identidade é: “ s. f. 1 Qualidade de idêntico; 2 conjunto de traços
que distinguem um indivíduo dos demais”. (AURÉLIO, 2005, p. 379).

Tendo como base a segunda afirmação, as principais características que


diferenciam um indivíduo de outro podem variar desde o corte de cabelo, as roupas
que usa e os objetos que tem preferência, como também suas escolhas,
comportamentos, variação linguística e até mesmo a interpretação dos fatos sociais
e políticos que presencia. Desse modo, cada indivíduo é formado particularmente de
um conjunto de características, portanto, por um conjunto de identidades.

Seguindo o conceito de formação identitária de Hall(1998) pode-se dizer que há três


formas distintas de identidade, sendo elas frutos de períodos históricos diferentes
(com formas de pensar surgindo a partir do reflexo político daquele momento). São
elas: o sujeito do iluminismo, o sujeito sociológico e o sujeito pós-moderno.

O sujeito do iluminismo era tido como um sujeito dotado de razão e racionalidade.


Encontrava-se em constante busca por conhecimento e crescimento individual. O Eu
era mais importante que o Todo.

O sujeito sociológico, por sua vez, partia do pressuposto de que o homem não era
tão incrivelmente autônomo como se imaginava, e que fazia-se necessário conviver
e compartilhar em comunidade para que então, pudesse construir sua identidade em
diálogos constantes com outros indivíduos. Ele ainda possuía uma identidade, no
entanto, esta era construída e modificada de acordo com o meio social em que se
vivia. O Todo sendo mais importante que o Eu, foi uma das bases da sociedade
moderna.

O sujeito pós-moderno que não possui uma formatação base, mas sim, está inserido
em um processo continuo e envolve mais do que apenas um tipo de sujeito, mas
partes de todos eles ao mesmo tempo, em constante mudança. Hall argumenta que:

O sujeito, previamente vivido como tendo uma identidade unificada e


estável, está se tornando fragmentado; composto não de uma única, mas de
varias identidades, algumas vezes contraditórias e não resolvidas.
Correspondentemente, as identidades, que compunham as paisagens
sociais “lá fora” e que asseguravam nossa conformidade subjetiva com as
“necessidades” objetivas da cultura, estão entrando em colapso, como
resultado de mudanças estruturas e institucionais. O próprio processo de
identificação, através do qual nós projetamos em nossas identidades
culturais, tornou-se mais provisório, variável e problemático. (1998, p.12).

Dessa forma, pode-se dizer que através de nossas escolhas estamos construindo
continuamente uma identidade, baseada nas necessidades pessoais e sociais que
nos deparamos diariamente. Em sociedade, cada sujeito interage com outro,
compartilhando e assimilando características em todos os momentos de sua vida.
Bauman (2005) afirma que em nossa contemporaneidade, na modernidade liquida
em que vivemos, “As ‘identidades’ flutuam no ar, algumas de nossa própria escolha,
mas outras infladas e lançadas pelas pessoas em nossa volta, e é preciso estar em
alerta constante para defender as primeiras em relação às ultimas.”(p. 19), indicando
que devemos sempre buscar o que consideramos melhor e/ou ideal para nossa vida,
buscando assimilar o que julgamos correto e rejeitar o comportamento tido como
inapropriado.

Essas escolhas, na sociedade pós-moderna, remetem-nos à construção de estilos


de vida distintos. Segundo Giddens (2002):

(...) nas condições da alta modernidade, não só seguimos estilos de vida,


mas num importante sentido somos obrigados a fazê-lo – não temos
escolha senão escolher. Um estilo de vida pode ser definido como um
conjunto mais ou menos integrado de práticas que um indivíduo abraça, não
só porque essas práticas preenchem necessidades utilitárias, mas porque
forma material a uma narrativa particular da auto-identidade. (GIDDENS,
2002, p.79).

Nossos estilos de vida seguem normalmente uma rotina que por vezes é modificada.
Da mesma forma, percebemos mudanças em nosso comportamento em
determinadas circunstâncias, o que acarreta por fim, em mudanças na nossa
identidade.

Bauman(1998) por sua vez, diz que a identidade durante a modernidade era vivida
como projeto de vida e deveria ser seguida a todo momento, vagarosamente. Sobre
a construção de Identidade, Bauman diz:

A construção requeria uma clara percepção da forma final, o cálculo


cuidadoso dos passos que levariam a ela, o planejamento a longo prazo e a
visão através de consequências de cada movimento, Havia, assim, um
vinculo firme e irrevogável entre a ordem social como projeto e a vida
individual como projeto, sendo a última impensável sem a primeira. (1998, p.
31)

Com base no discurso de Bauman, Giddens e Hall, a sociedade pós-moderna


encontra-se em constante transformação, favorecendo a construção da Identidade
que se refaz e modifica-se constantemente.

Assim como Castells (1999), que define a identidade como um processo de


construção de significado com base em um atributo cultural, ou ainda um conjunto
de atributos culturais inter-relacionados. Ainda, seguindo o conceito sociológico, toda
e qualquer identidade é construída, mas esta construção identitária sempre ocorre
em um contexto marcado por relações de poder.

2.1 Construção Identitária

Na modernidade, a individualidade tem sido vivida de forma muito peculiar, fazendo


surgir uma nova forma de individualismo em que o sujeito muda constantemente em
relação a sua identidade. Este processo de construção contínua, sempre esteve
presente na vida de cada sujeito, mas os processos de desconstrução e
reconstrução identitária eram totalmente diferentes. Antes, era preciso seguir um
padrão social preestabelecido, normas sociais e hábitos que ditavam sua
personalidade, forma de vestir-se e o que deveria ou não fazer. O sujeito do
iluminismo e o sujeito sociológico eram o típico homem da época. No entanto, estes
fatores na pós-modernidade estão presentes em larga escala, com construções
totalmente distintas em indivíduos de uma mesma sociedade. A individualidade e
todo o processo de construção de identidades têm aspectos positivos, pois não mais
faz uso dos modelos estáveis do passado, abrindo possibilidades para novas
transformações que resultam na construção de novos sujeitos.

Todo indivíduo passa por momentos em sua vida, que o modificam. A cada
segundo, influenciamos e somos influenciados socialmente, modificando assim
nossa personalidade, formas distintas de interpretar os fatos ao nosso redor e nosso
posicionamento individual. Estes acontecimentos contínuos dentro de uma
sociedade pode ser considerado um fato social, pois envolve o individuo e a relação
dele com a sociedade.

Para Durkheim (1978) o que constitui fatos sociais são coisas, e essas coisas são
tudo aquilo que faz parte da sociedade, desde a formação de um núcleo familiar até
a formação de um estado, ou seja, são todas as ações coletivas que envolvem o
homem e sua relação social. Podemos citar como exemplo as leis que estabelecem
as regras jurídicas e morais de uma sociedade, a religião, a educação, a cultura e os
costumes, que também são considerados fatos sociais.

Assim, à medida que os indivíduos de uma sociedade incorporam seus valores


morais e suas regras legais, estarão subordinados a estas regras sociais e morais,
repassadas inicialmente, através da educação familiar e, posteriormente, pela
escola, religião, política, cultura etc. Para Durkheim (1978), os fatos sociais podem
ser definidos por três princípios básicos: a exterioridade, a coercitividade e a
generalidade.
O primeiro princípio mostra que os fatos sociais atuam independentemente do
indivíduo, ou seja, já existiam antes de seu nascimento e atuam sobre ele, não
sendo necessário que por sua vontade faça uso dela conscientemente.
O segundo princípio diz que que a coercitividade acontece através da força que os
fatos sociais exercem sobre cada individuo na sociedade, obrigando-o a se
conformar com as regras, normas e valores sociais, sob pena de constrangimento.
Durkheim (1978), afirma que:

“Desde os primeiros anos de vida, as crianças são forçadas a comer,


beber, dormir em horas regulares; são constrangidas a terem hábitos
higiênicos, a serem calmas e obedientes; mais tarde, obrigamo-las a
aprender a pensar nos demais, a respeitar usos e conveniências e forçamo-
las ao trabalho, etc., etc”(p.5).

Um bom exemplo disso é a própria língua, que por lei, ninguém é obrigado a falr,
mas necessita aprender e usá-la para se adequar socialmente. Para Ferdinand de
Saussure( ver fonte), nós não somos autores do que falamos e dos significados que
expressamos através da fala. Falar uma língua não é somente expressar nossos
pensamentos interiores, mas também ativar todo um acervo de significados
inseridos em nossos sistemas culturais. Assim, não temos controle algum sobre os
significados que produzimos.
O terceiro e ultimo princípio defendido por Durkheim, é a generalidade. Através dela,
os fatos são coletivos e atingem toda a sociedade sobre a qual atuam. Desse modo,
independente da vontade, a sociedade acaba definindo o comportamento dos
indivíduo a partir de um modelo geral. Desse modo:
“É fato social toda maneira de agir fixa ou não, suscetível de exercer sobre
o indivíduo uma coerção exterior; ou então ainda, que é geral na extensão
de uma determinada sociedade, apresentando uma existência própria,
independente das manifestações individuais que possa ter”.
(DURKHEIM,1978b,p. 11)

Podemos entender então que os fatos sociais atuam externamente ao indivíduo,


mas transformam-no e constituem parte de sua identidade passando a existir
através de suas ações e de suas ideias. Estes fatos são cruciais no processo de
construção identitária e atuam sobre o individuo ao mesmo tempo em que a
identidade individual é construída.

Seguindo o conceito de Castells (1999) e durkheim(1978), de que a construção


identitária sempre ocorre em um contexto marcado por relações de poder e também
que os fatos sociais são introduzidos por instituições da sociedade no intuito de
fortalecer a dominação em relação aos atores sociais, chegamos a conclusão que os
conceitos que as instituições constroem para descrever e explicar a natureza das
suas funções e o consequente uso legitimo de suas ações são as mesma que
estruturam e descrevem o acesso dos indivíduos aos meios e as formas de
participação social.

Castells deriva três formas e origens de construção de identidade: Identidade


legitimadora, Identidade de resistência e Identidade de projeto, conforme definições
do autor:

[...]Identidade legitimadora: introduzida pelas instituições da sociedade no


intuito de expandir e racionalizar sua dominação em relação aos atores
sociais “;

Identidade de resistência: criado por atores que se encontram em


posições/condições desvalorizadas e/ou estigmatizadas pela lógica da
dominação.

Identidade de projeto: quando os atores, utilizando- se de qualquer tipo de


material cultural ao seu alcance, constroem uma nova identidade capaz de
redefinir sua posição na sociedade[...](1999, p. 24).

Uma identidade legitimadora, segundo Castells, da origem a um conjunto de


organizações e instituições, bem como uma série de atores sociais estruturados e
organizados que reproduzem a identidade que racionaliza as fontes de dominação
estrutural, mesmo que em parte, conflitantes. Esta definição de identidade
legitimadora, se faz uma importante ferramenta para a análise deste projeto, visto
que estamos analisando o processo de construção identitária do sujeito jagunço, em
uma sociedade institucionalizada.

A saber, o ambiente em que Grande sertão: Veredas retrata, caracteriza-se por uma
politica de campanhas institucionais dos governos que associam o sertão à
personificação da identidade do jagunço como pertencido exclusivamente ao
nordeste. O que foi institucionalizado ficou representado na idéia de que as políticas
públicas para a região sertaneja foram planejadas para o “homem pobre” do
nordeste. E este “homem pobre” é o objeto central do discurso da dominação
política.

Utilizando-se como base, o conceito de pós-modernidade atrelada a pensamentos


sociológicos, cria-se em um processo continuo a ideia do sujeito jagunço como
sendo atrasado e subdesenvolvido, levando os fatos pre estabelecidos do ambiente
arcaico sertanejo e a evolução da grandes cidades. Esta é uma forma clara e
precisa da legitimação do poder social sobre os sujeitos sociais.

A identidade de resistência por sua vez, apresenta-se como a principal formadora


de comunidades. Ela dá origem a formas de resistência coletiva que diante das
opressões sofridas, convertem aquilo que lhe causa dor e angustia, em brado de luta
e determinação. Para Castells(1999), o fundamentalismo religioso, comunidades
territoriais e ate mesmo o orgulho de denegrir-se a si mesmo invertendo os termos
do discurso opressivo, são todos termos que caracterizam a construção identitária
pela resistência. Um exemplo característico disso é o preconceito ainda presente em
nossa sociedade quando há refencia aos habitantes do nordeste brasileiro, levando
tais sujeitos a usarem o termo nordestino como símbolo de orgulho e luta como o
mote de um poema que diz: “...Quanto mais sou nordestino, mais tenho orgulho de
ser.’’(Bráulio Bessa, in " Quanto mais sou nordestino, mais tenho orgulho de ser-
Poema"). Esta prática em síntese, reverte o julgamento de valores e o converte, para
reforçar a resistência.

O terceiro processo de construção identitaria defendido por Castells, a identidade de


projeto, atua quando utilizando-se de qualquer material disponível, determinado
grupo constrói uma nova identidade capaz de redefinir parâmetros sociais
preestabelecidos, buscando posteriormente transformar toda a estrutura social.

A identidade de projeto, produz não indivíduos, mas sim sujeitos. Para


Castells(1999), sujeitos não são indivíduos, mas atores sociais em que os indivíduos
sociais atingem valor que busca compreender a significação dos fenômenos em sua
totalidade e experiência vivida.

Segundo Alain Touraine(apud CASTELLS, 1999, p. 26):

“ Chamo de sujeito o desejo de ser um individuo, de criar uma historia pessoal, de


atribuir significado a todo o conjunto de experiências da vida individual...

A transformação de indivíduos em sujeitos resulta da combinação necessária de


duas afirmações: a dos indivíduos conra as comunidades, e a dos indivíduos contra
o mercado.” (apud CASTELLS, 1999, p. 26)

Nesse caso, podemos entender que a construção identitaria através da identidade


de projeto, consiste em um projeto de vida muito diferente da presente, tendo por
base alguma fonte opressora, que leva a construção de uma nova auto identidade
que necessite ser inserida na sociedade. Guiddens (2002) afirma que “ a auto
identidade não é um traço distinto apresentado pelo indivíduo. Trata-se do próprio
ser conforme apreendido reflexivamente pela pessoa em relação a sua biografia”.
Devido a isto, o surgimento de identidades de projeto podem e irão ocorrer em
diferentes fases históricas, dependendo da sociedade em questão.

CONSTRUÇÃO IDENTITÁRIA RELIGIOSA

O sujeito do iluminismo, como afirma Hall(2002), tem o entendimento de si como um


individuo dotado de capacidades de razão, centrado, dotado de consciência e ação.
Além disso, tido como possuidor de criação de si mesmo e possuidor de
conhecimento racional e histórico. Essa crença por um tempo, fez com que a
importância da religião e das praticas místicas fossem gradativamente deixadas de
lado, contribuindo para ascensão do homem social.

Por muito tempo, foi uma característica social, encontrar consolo e refugio na
religião. O medo da morte, a crença na ressureição, a salvação da alma sendo
possível através da necessidade de Deus e da fé inabalável nele, foi um dos pilares
da manutenção da vida de muitos sujeitos. Mas esta característica, segundo
Castells, vem lentamente sendo colocada de lado no mundo globalizado.

O ateísmo por muito tempo, viu-se com uma perspectiva permanente com o avanço
da humanidade a era cientifica. Esse processo histórico-social contribui por afetar a
consciência do cidadão que a cada dia, modifica-se em um mundo liquido,
afastando-se da religião.

No pós modernismo, há uma crescente diversidade de instituições que buscam


orientar cada sujeito no caminho religioso, sendo cada uma delas com uma
diversificação de ofertas de concepções de vida, com constituições diferentes que
por sua vez buscam satisfazer as necessidades dos sujeitos.

Para Berger(1985), o ser humano enquanto produto e produtor de cultura, está


cercado por uma grande teia de possíveis significados sociais, afirmando:

‘’ O ser humano necessita dar sentido às suas experiências de vida. É à


partir da exteriorização dessas experiências que ele constrói um mundo,
que será experienciado como objetivado, sendo, posteriormente
interiorizados pelos seus semelhantes”.(p. 139)

É nessa relação que a religião esta presente como formadora de identidade e de


busca de estrutura de sentido.

A religião no processo histórico, sempre esteve presente como orientadora de


sentido e de ordem de valor para viver bem dentro de uma sociedade. Cada
indivíduo que a compõem, carrega em si, experiências vividas e valores que
constituem a sociedade em que vive. Esses valores constituem o sentido que
contribuem para a formação de sua identidade, através do fundamentalismo
religioso. Castells(1999) define este conjunto de características como:
“(...) a construção da identidade coletiva segundo a identificação do
comportamento individual e das instituições da sociedade com as normas
oriundas da lei de Deus, interpretadas por uma autoridade definida que atua
como intermediaria entre Deus e a humanidade”. (p. 29).

Dessa forma, toda construção de identidade através da religião tem como base, um
conjunto de parâmetros a serem seguidos a depender da formatação social em que
esteja inserido.

RACA, CLASSE E IDENTIDADE

IDENTIDADE Mundo-Natureza

2.3 As Múltiplas Faces Identitárias do Sertão

2. QUEM É O SUJEITO JAGUNÇO?

2.1 Jagunço – Natureza – Sociedade

3. MODERNISMO: CARACTERÍSTICAS
3.1 O Herói e o Anti-Herói

3.2 A modernidade de João Guimarães Rosa: Vida e Obra

Terceiro ocupante da Cadeira 2, eleito em 6 de agosto de 1963, na sucessão de


João Neves da Fontoura e recebido pelo Acadêmico Afonso Arinos de Melo Franco
em 16 de novembro de 1967.

Guimarães Rosa (João G. R.), contista, novelista, romancista e diplomata, nasceu


em Cordisburgo, MG, em 27 de junho de 1908, e faleceu no Rio de Janeiro, RJ, em
19 de novembro de 1967.

Foram seus pais Florduardo Pinto Rosa e Francisca Guimarães Rosa. Aos 10 anos
passou a residir e estudar em Belo Horizonte Em 1930, formou-se pela Faculdade
de Medicina da Universidade de Minas Gerais. Tornou-se capitão médico, por
concurso, da Força Pública do Estado de Minas Gerais. Sua estreia literária deu-se,
em 1929, com a publicação, na revista O Cruzeiro, do conto "O mistério de
Highmore Hall", que não faz parte de nenhum de seus livros. Em 36, a coletânea de
versos Magma, obra inédita, recebe o Prêmio Academia Brasileira de Letras, com
elogios do poeta Guilherme de Almeida.

Diplomata por concurso que realizara em 1934, foi cônsul em Hamburgo (1938-42);
secretário de embaixada em Bogotá (1942-44); chefe de gabinete do ministro João
Neves da Fontoura (1946); primeiro-secretário e conselheiro de embaixada em Paris
(1948-51); secretário da Delegação do Brasil à Conferência da Paz, em Paris (1948);
representante do Brasil na Sessão Extraordinária da Conferência da UNESCO, em
Paris (1948); delegado do Brasil à IV Sessão da Conferência Geral da UNESCO, em
Paris (1949). Em 1951, voltou ao Brasil, sendo nomeado novamente chefe de
gabinete do ministro João Neves da Fontoura; depois chefe da Divisão de
Orçamento (1953) e promovido a ministro de primeira classe. Em 1962, assumiu a
chefia do Serviço de Demarcação de Fronteiras.
A publicação do livro de contos Sagarana, em 1946, garantiu-lhe um privilegiado
lugar de destaque no panorama da literatura brasileira, pela linguagem inovadora,
pela singular estrutura narrativa e a riqueza de simbologia dos seus contos. Com
ele, o regionalismo estava novamente em pauta, mas com um novo significado e
assumindo a característica de experiência estética universal.

Em 1952, Guimarães Rosa fez uma longa excursão a Mato Grosso e escreveu o
conto "Com o vaqueiro Mariano", que integra, hoje, o livro póstumo Estas estórias
(1969), sob o título "Entremeio: Com o vaqueiro Mariano". A importância capital
dessa excursão foi colocar o Autor em contato com os cenários, os personagens e
as histórias que ele iria recriar em Grande sertão: Veredas. É o único romance
escrito por Guimarães Rosa e um dos mais importantes textos da literatura
brasileira. Publicado em 1956, mesmo ano da publicação do ciclo novelesco Corpo
de baile, Grande sertão: Veredas já foi traduzido para muitas línguas. Por ser uma
narrativa onde a experiência de vida e a experiência de texto se fundem numa obra
fascinante, sua leitura e interpretação constituem um constante desafio para os
leitores.

Nessas duas obras, e nas subsequentes, Guimarães Rosa fez uso do material de
origem regional para uma interpretação mítica da realidade, através de símbolos e
mitos de validade universal, a experiência humana meditada e recriada mediante
uma revolução formal e estilística. Nessa tarefa de experimentação e recriação da
linguagem, usou de todos os recursos, desde a invenção de vocábulos, por vários
processos, até arcaísmos e palavras populares, invenções semânticas e sintáticas,
de tudo resultando uma linguagem que não se acomoda à realidade, mas que se
torna um instrumento de captação da mesma, ou de sua recriação, segundo as
necessidades do "mundo" do escritor.

Além do prêmio da Academia Brasileira de Letras conferido a Magma, Guimarães


Rosa recebeu o Prêmio Filipe d'Oliveira pelo livro Sagarana (1946); Grande sertão:
Veredas recebeu o Prêmio Machado de Assis, do Instituto Nacional do Livro, o
Prêmio Carmen Dolores Barbosa (1956) e o Prêmio Paula Brito (1957); Primeiras
estórias recebeu o Prêmio do PEN Clube do Brasil (1963).
Obras:
Sagarana, contos (1946);
Com o vaqueiro Mariano, conto (1952);
Corpo de baile, ciclo novelesco, 2 vols. (1956);
Manuelzão e Miguilim (1964);
No Urubuquaquá, no Pinhém (1965);
Noites do sertão (1965);
Grande sertão: Veredas, romance (1956);
Primeiras estórias, contos (1962);
Campo geral (1964);
Tutameia (Terceiras estórias), contos (1967);
Estas estórias, contos (1969);
Ave, palavra, diversos (1970);
além de obras em colaboração: O mistério dos MMM (1962) e Os sete pecados
capitais (1964).

4. A CONSTRUÇÃO IDENTITÁRIA DO JAGUNÇO NA OBRA “GRANDE


SERTÃO: VEREDAS” DE JOÃO GUIMARÃES ROSA

4.1 A formação da construção da Identidade Jagunço – Natureza

4.2 A formação da construção da Identidade Jagunço – Sociedade

4.3 A formação da construção da Identidade Jagunço – Herói e Anti-Herói

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

REFERÊNCIAS

BAUMAN, Zygmunt. O Mal-Estar da Pós-Modernidade. 1. Ed. Rio de Janeiro: Jorge


Zahar Ed., 1998.
CÂNDIDO, Antônio. Literatura e Sociedade. 8. Ed. São paulo: TA.
Queiroz/Publifolha, 2000.

_____________ Tese e Antítese: Ensaios. O homem dos avessos. 4. Ed. São Paulo:
T.A. Queiroz., 2002.

DURKHEIM, E. A Divisão do Trabalho Social. São Paulo: Abril Cultural, 1978a (Os
Pensadores)
_____________ As Regras do Método Sociológico. São Paulo: Companhia Editora
Nacional, 1978b.

GIDDENS, Anthony. Modernidade e Identidade. 1. Ed. Rio de Janeiro: Zahar Ed.,


2002.

GIL, Antônio Carlos. Métodos e técnicas de pesquisa social / Antônio Carlos Gil – 6
ed. –São Paulo: Atlas, 2008.

HALL, Stuart. A Identidade Cultural na Pós-Modernidade. 6.ed. Rio de Janeiro:


DP&A, 1998.

KÖCHE, José Carlos. Fundamentos de metodologia científica: teoria da ciência e


iniciação à pesquisa. 28ª ed. Vozes, Petrópolis, RJ: 2009.

Linguagem e poder: in A ordem do discurso, São Paulo, Loyola, 18a ed. 2009,
tradução de Laura Fraga de Almeida Sampaio.

MINAYO, M. C. de L. (Org.) Pesquisa social: teoria, método e criatividade. 21.


Petrópolis: Vozes, 2002.

PITANGUY, Lenice Guimarães de Paula. Entrevista: João Guimarães Rosa.


Germina: Revista de Literatura & Arte, ago. 2006.

RIBEIRO, D. O Brasil sertanejo. O povo brasileiro: a formação e o sentido do Brasil.


Rio de Janeiro: Cia das Letras, 1995. p.339-363.

ROSA, Guimarães. Academia Brasileira de Letras. Disponível em:


<http://www.academia.org.br/academicos/joao-guimaraes-rosa/biografia> Acesso
em: Setembro/2018.
_______________. Academia Brasileira de Letras. Disponível em:
<http://www.academia.org.br/academicos/joao-guimaraes-rosa/bibliografia> Acesso
em: Setembro/2018.

_______________. Wikipedia. Disponível em: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Guimar


%C3%A3es_Rosa> Acesso em: maio/2018.

SEVERINO, Antônio Joaquim. Metodologia do trabalho científico. 23ª ed. Cortez,


São Paulo: 2007.
Textos a serem revisados posteriormente:

GRANDE SERTÃO: VEREDAS

Nonada. Tiros que o senhor ouviu foram de briga de homem não, Deus esteja.
Alvejei mira em árvore, no quintal, no baixo do córrego. Por meu acerto. Todo dia
isso faço, gosto; desde mal em minha mocidade. Daí, vieram me chamar. Causa
dum bezerro: um bezerro branco, erroso, os olhos de nem ser se viu; e com
máscara de cachorro. Me disseram; eu não quis avistar. Mesmo que, por defeito
como nasceu, arrebitado de beiços, essa figurava rindo feito pessoa. Cara de gente,
carão de cão: determinaram era o demo. Povo prascóvio. Mataram. Dono dele nem
sei quem for. Vieram emprestar minhas armas, cedi. Não tenho abusões. O senhor ri
certas risadas... Olhe: quando é tiro de verdade, primeiro a cachorrada pega a latir,
instantaneamente depois, então, se vai ver se deu mortos. O senhor tolere, isto é o
sertão. Uns querem que não seja: que situado sertão é por os campos-gerais a fora
a dentro, eles dizem, fim de rumo, terras altas, demais do Urucaia. Toleima. Para os
de Corinto e do Curvelo, então o aqui não é dito sertão? Ah, que tem maior! Lugar
sertão se divulga: é onde os pastos carecem de fechos; onde um pode torar dez,
quinze léguas, sem topar com casa de morador; e onde criminoso vive seu cristo-
jesus, arredado do arrocho de autoridade. O Urucuia vem dos montões oestes. Mas,
hoje, que na beira dele, tudo dá fazendões de fazendas, almargem de vargens de
bom render, as vazantes; culturas que vão de mata em mata, madeiras de grossura,
até ainda virgens dessas lá há. O gerais corre em volta. Esses gerais são sem
tamanho. Enfim, cada um o que quer aprova, o senhor sabe: pão ou pães, é questão
de opiniães... O sertão está em toda a parte.

Do demo? Na gloso. Senhor pergunte aos moradores. Em falso receio, desfalam no


nome dele dizem só: o Que-Diga. Vôte! não... Quem muito se evita, se convive.
Sentença num Aristides o que existe no buritizal primeiro desta minha mão direita,
chamado a Vereda-da-Vaca-Mansa-de-Santa-Rita todo mundo crê: ele não pode
passar em três lugares, designados: porque então a gente escuta um chorinho,
atrás, e uma vozinha que avisando: "Eu já vou! Eu já vou!..." que é o capiroto, o que-
diga... E um Jisé Simpilício quem qualquer daqui jura ele tem um capeta em casa,
miúdo, satanazim, preso obrigado a ajudar em toda ganância que executa; razão
que o Simpilício se empresa em vias de completar de rico. Apre, por isso dizem
também que a besta pra ele rupeia, nega de banda, não deixando, quando ele quer
amontar... Superstição. Jisé Simpilício e Aristides, mesmo estão se engordando, de
assim não-ouvir ou ouvir. Ainda o senhor estude: agora mesmo, nestes dias de
época, tem gente porfalando que o Diabo próprio parou, de passagem, no
Andrequicé. Um Moço de fora, teria aparecido, e lá se louvou que para aqui vir
normal, a cavalo, dum dia-e-meio ele era capaz que só uns vinte minutos bastava...
porque costeava o Rio do Chico pelas cabeceiras! Ou, também, quem sabe sem
ofensas não terá sido, por um exemplo, até mesmo o senhor quem se anunciou
assim, quando passou por lá, por prazido divertimento engraçado? Há-de, não me
dê crime, sei que não foi. E mal eu não quis. Só que uma pergunta, em hora, às
vezes, clareia razão de paz. Mas, o senhor entenda: o tal moço, se há, quis mangar.
Pois, hem, que, despontar o Rio pelas nascentes, será a mesma coisa que um se
redobrar nos internos deste nosso Estado nosso, custante viagem de uns três
meses... Então? Que-Diga? Doideira. A fantasiação. E, o respeito de dar a ele assim
esses nomes de rebuço, é que é mesmo um querer invocar que ele forme forma
com as presenças!

Não seja. Eu, pessoalmente, quase que já perdi nele a crença, mercês a Deus; é o
que ao senhor lhe digo, à puridade. Sei que é bem estabelecido, que grassa nos
Santos-Evangelhos. Em ocasião, conversei com um rapaz seminarista, muito
condizente, conferindo no livro de rezas e revestido de paramenta, com uma vara de
maria-preta na mão proseou que ia adjutorar o padre, para extraírem o Cujo, do
corpo vivo de uma velha, na Cachoeira-dos-Bois, ele ia com o vigário do Campo-
Redondo... Me concebo. O senhor não é como eu? Não acreditei patavim.
Compadre meu Quelemém descreve que o que revela efeito são os baixos espíritos
descarnados, de terceira, fuzuando nas piores trevas e com ânsias de se travarem
com os viventes dão encosto. Compadre meu Quelemém é quem muito me consola
Quelemém de Gois. Mas ele tem de morar longe daqui, da Jijujã, Vereda do Buriti
Pardo... Arres, me deixe lá, que em endemoninhamento ou com encosto o senhor
mesmo deverá de ter conhecido diversos homens, mulheres. Pois não sim? Por
mim, tantos vi, que aprendi. Rincha-Mãe, Sangue-d’Outro, o Muitos-Beiços, o
Rasga-em-Baixo, Faca-Fria, o Fancho-Bode, um Treciziano, o Azinhavre... o
Hermógenes... Deles, punhadão. Se eu pudesse esquecer tantos nomes... Não sou
amansador de cavalos! E, mesmo, quem de si de ser jagunço se entrete, já é por
alguma competência entrante do demônio. Será não? Será?

De primeiro, eu fazia e mexia, e pensar não pensava. Não possuía os prazos. Vivi
puxando difícil de difícel, peixe vivo no moquém: quem mói no asp’ro, não fantaseia.
Mas, agora, feita a folga que me vem, e sem pequenos dessossegos, estou de
range rede. E me inventei neste gosto, de especular ideia. O diabo existe e não
existe? Dou o dito. Abrenúncio. Essas melancolias. O senhor vê: existe cachoeira; e
pois? Mas cachoeira é barranco de chão, e água se caindo por ele, retombando; o
senhor consome essa água, ou desfaz o barranco, sobra cachoeira alguma? Viver é
negócio muito perigoso...

Explico ao senhor: o diabo vige dentro do homem, os crespos do homem ou é o


homem arruinado, ou o homem dos avessos. Solto, por si, cidadão, é que não tem
diabo nenhum. Nenhum! é o que digo. O senhor aprova? Me declare tudo, franco é
alta mercê que me faz: e pedir posso, encarecido. Este caso por estúrdio que me
vejam é de minha certa importância. Tomara não fosse... Mas, não diga que o
senhor, assisado e instruído, que acredita na pessoa dele?! Não? Lhe agradeço!
Sua alta opinião compõe minha valia. Já sabia, esperava por ela já o campo! Ah, a
gente, na velhice, carece de ter sua aragem de descanso. Lhe agradeço. Tem diabo
nenhum. Nem espírito. Nunca vi. Alguém devia de ver, então era eu mesmo, este
vosso servidor. Fosse lhe contar... Bem, o diabo regula seu estado preto, nas
criaturas, nas mulheres, nos homens. Até: nas crianças eu digo. Pois não é ditado:
"menino trem do diabo"? E nos usos, nas plantas, nas águas, na terra, no vento...
Estrumes... O diabo na rua, no meio do redemunho...

Hem? Hem? Ah. Figuração minha, de pior pra trás, as certas lembranças. Mal haja-
me! Sofro pena de contar não... Melhor, se arrepare: pois, num chão, e com igual
formato de ramos e folhas, não dá a mandioca mansa, que se come comum, e a
mandioca-brava, que mata? Agora, o senhor já viu uma estranhez? A mandioca-
doce pode de repente virar azangada motivos não sei; às vezes se diz que é por
replantada no terreno sempre, com mudas seguidas, de manaíbas vai em
amargando, de tanto em tanto, de si mesma toma peçonhas. E, ora veja: a outra, a
mandioca-brava, também é que às vezes pode ficar mansa, a esmo, de se comer
sem nenhum mal. E que isso é? Eh, o senhor já viu, por ver, a feiúra de ódio
franzido, carantonho, nas faces duma cobra cascavel? Observou o porco gordo,
cada dia mais feliz bruto, capaz de, pudesse, roncar e engulir por sua suja
comodidade o mundo todo? E gavião, corvo, alguns, as feições deles já representam
a precisão de talhar, para adiante, rasgar e estraçalhar a bico, parece uma quicé
muito afiada por ruim desejo. Tudo. Tem até tortas raças de pedras, horrorosas,
venenosas que estragam mortal a água, se estão jazendo em fundo de poço; o
diabo dentro delas dorme: são o demo. Se sabe? E o demo que é só assim o
significado dum azougue maligno tem ordem de seguir o caminho dele, tem licença
para campear?! Arre, ele está misturado em tudo.

Que o que gasta, vai gastando o diabo de dentro da gente, aos pouquinhos é o
razoável sofrer. E a alegria de amor compadre meu Quelemém diz. Família.
Deveras? É, e não é. O senhor ache e não ache. Tudo é e não é... Quase todo mais
grave criminoso feroz, sempre é muito bom marido, bom filho, bom pai, e é bom
amigo-de-seus-amigos! Sei desses. Só que tem os depois e Deus, junto. Vi muitas
nuvens.

[...]

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