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DIREITO AUTORAL

Durante os vinte anos de atuação na área de Direito Autoral, nos mais diversos
segmentos, observamos que o desinteresse sobre a matéria é inversamente proporcional a
sua importância.

Na América do Norte, Europa e Ásia, evidentemente ressalvadas algumas exceções,


a Propriedade Intelectual, da qual o Direito Autoral faz parte, é matéria legal significativa e
vital, notadamente em virtude de sua relevância econômica.

Efetivo objeto de estudo em outros países, no Brasil notamos que quando o assunto
é a Propriedade Intelectual certamente estaremos discutindo marcas e patentes, relegando-
se para segundo plano o Direito Autoral.

Pecam as universidades brasileiras e os profissionais do Direito, que pouco


contribuem para reversão deste quadro.

Pecam, também, aqueles que, por força de atividade profissional ou empresarial,


pouco têm feito para discussão e avanço de um tema que lhes diz respeito diretamente, na
medida em que o Direito Autoral é ferramenta legal fundamental para garantia de retorno
econômico da atividade empresarial e laborativa.

Esse quadro, no entanto, começa a mudar, e o melhor exemplo é visto nesta obra,
proposta por entidade representativa de um setor econômico, no caso o audiovisual, que se
preocupa em principiar uma abordagem efetiva do Direito Autoral.

Ao Congresso Brasileiro de Cinema, portanto, cabem os louros desta iniciativa. Para


nós, profissionais do Direito que atuam na área, assim como para todos aqueles que de
alguma forma se relacionam com o Direito Autoral, mesmo de forma inconsciente, este
livro representa, por certo, um divisor de águas no processo de conscientização do Direito
Autoral no meio cinematográfico brasileiro.

Coube-nos contribuir com a elaboração dessa obra através de uma visão geral do
Direito Autoral, de forma tal a permitir aos leitores uma compreensão inicial do tema.

O Direito Autoral é complexo, cheio de nuances que geram inúmeras discussões e


interpretações, carecendo, e merecendo, de profundo e continuado estudo para sua plena
compreensão. Não obstante, nosso compromisso é esclarecer seus princípios e aspectos
basilares. Se conseguirmos, de algum modo, contribuir para reflexão sobre o Direito de
Autor, despertando no leitor interesse sobre a matéria, teremos alcançado nossos objetivos
com absoluto êxito.

Obra Audiovisual e Obra Cinematográfica


Preliminarmente, em nome da precisão, vale ressaltar que as obras cinematográficas
e videofonográficas são espécies do gênero obra audiovisual.

Por obra audiovisual, entende-se “a que resulta da fixação de imagens com ou sem
som, que tenha por finalidade de criar, por meio de sua reprodução, a impressão de
movimento, independentemente dos processos de sua captação, do suporte usado inicial ou
posteriormente para fixá-lo, bom como dos meios utilizados para sua veiculação” (art. 5º,
VIII, da lei 9.610/98).

A lei 5.988/73, anterior a atual LDA (Lei do Direito Autoral), oferecia, de forma
clara, tal distinção, definindo, inclusive, as figuras dos produtores cinematográficos e
videofonográficos.

Porém, a prática diária é no sentido de considerar a obra audiovisual (aqui como a


obra videofonográfica) e a obra cinematográfica como espécies de um gênero não
explicitado. Melhor exemplo é a agencia reguladora do setor, a ANCINE, que, durante as
discussões de sua formação, tanto em 2000/01 como em 2005, chegou a ser denominada de
ANCINAV – Agencia Nacional do Cinema e Audiovisual.

A Origem:

Sófocles, Homero, Virgilio, Platão e muitos outros pensadores da antiguidade foram


imortalizados através de suas obras.

Não obstante, jamais receberam remuneração pela reprodução de suas obras,


realizada, desde a Grécia Antiga até o século XV, por meio de escribas.

No século XV surge a impressão gráfica com tipos móveis, inventada por


Gutenberg, o que permitiu, a partir de então, a reprodução de obras literárias em escala
industrial, surgindo, por conseqüência, a necessidade da intervenção do Direito para
harmonização das relações advindas de um novo fato social.

É, pois, a partir da invenção da impressão gráfica que começam a surgir às


primeiras normas relativas aos direitos autorais.

Em 1710, surge na Grã-Bretanha, a primeira norma relativa a Direitos Autorais.


Trata-se do Copyright Act, da Rainha Ana.

A Revolução Francesa, ao final do século XVIII, por sua evidente proposta em


relação aos direitos individuais, resulta no reconhecimento do direito do autor (como
criador), surgindo assim o Droit D´Auter.

Perduram até hoje as duas vertentes de origem dos direitos autorais, o copyright e o
droit d´auter.
O droit d´auter, linha seguida pelo Brasil, na qual se fundamenta a Convenção de
Berna, dirige-se à proteção do autor, conferindo-lhe exclusividade na utilização de sua
obra.

Já o copyright, de origem inglesa, e adotado pelos Estados Unidos, é direcionado à


proteção da obra, concedendo ao seu titular (que não necessariamente será seu autor) a
exclusividade de sua exploração econômica.

No Brasil, surge, em 1973, a lei 5.988, que regula os direitos autorais e conexos,
substituída, em 1998, pela lei 9.610, atualmente em vigor.

É importante notar que antes da lei 5.988/73 haviam normas relativas aos direitos
autorais, inclusive no Código Civil Brasileiro.

Os Tratados Internacionais.

Os principais tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário, relativos a


Direitos Autorais e conexos, são a Convenção de Berna, de 1886, revista Paris, em 1971, e
a Convenção de Roma, de 1961, que trata da proteção dos artistas intérpretes ou
executantes, dos produtores de fonogramas e dos organismos de radiodifusão.

A Conceituação do Direito de Autor

De acordo com Carlos Alberto Bittar, o “Direito de Autor ou Direito Autoral é o


ramo do Direito Privado que regula as relações jurídicas, advindas da criação e da
utilização econômica de obras intelectuais estéticas e compreendidas na literatura, nas artes
e na ciência”. (Carlos Alberto Bittar, Direito de Autor, 4ª. Edição, Forense Universitária,
pág. 8).

Doutrinariamente, o Direito de Autor é um direito sui generis, por conter aspectos


de direitos patrimoniais e morais que formam um conjunto indivisível.

Ainda segundo Carlos Alberto Bittar, tais características levam o Direito de Autor a
condição de Direito autônomo.

Autor e Obra – Sujeito e Objeto do Direito Autoral

O Direito Autoral visa proteger o autor, os titulares dos direitos autorais (investidos
nesta condição quando sucessores hereditários), os titulares dos direitos patrimoniais de
autor (que obtiveram tais direitos por meio de negócio jurídico, como a cessão) e, enfim, a
obra, sendo os primeiros (autor e titulares) os sujeitos e a última (a obra) o objeto da tutela
legal.

O Autor e Titulares Derivados

O titular originário dos direitos autorais é aquele que cria e materializa a obra,
independentemente de “sua idade, estado ou condição mentais, inclusive, pois, os
incapazes, de todos os níveis” (Carlos Alberto Bittar, Direito de Autor, 4ª. Edição, Forense
Universitária, pág. 33)

Neste sentido se manifesta a lei 9.610/98, em seu art. 11, que determina:

“art. 11 – Autor é a pessoa física criadora de obra literária, artística ou


científica”.

Ora, se apenas ao ser humano é dada a capacidade de criação intelectual, nada mais
lógico que a ele, e apenas a ele, se invista a titularidade originária dos direitos autorais.

Não obstante, existe a figura do titular derivado, que adquire, total ou parcialmente,
a título universal ou singular, os direitos autorais.

Uma das formas de aquisição total dos direitos autorais ocorre quando da sucessão
hereditária. Nestes casos, transferem-se aos herdeiros os direitos patrimoniais e morais do
autor.
Nos demais casos, a transmissão de direitos autorais, para pessoas físicas e/ou
jurídicas, ocorre por meio de negócio jurídico, como a cessão. Nesses, são transferidos ao
cessionário apenas os direitos patrimoniais de autor, eis que os denominados direitos
morais são inalienáveis e irrenunciáveis, conforme estabelece o art. 27, da lei 9.610, de
1998.

Existe, contudo, a possibilidade de uma pessoa jurídica ser a titular originária dos
direitos patrimoniais de autor, sendo, no caso do audiovisual, a obra coletiva o melhor
exemplo.

A obra coletiva é aquela “criada por iniciativa, organização e responsabilidade de


uma pessoa física ou jurídica, que a publica sob seu nome ou marca e que é constituída pela
participação de diferentes autores, cujas contribuições se fundem numa criação autônoma”
(art. 5, VIII, letra h, da lei 9.610/98).

Ao conjugarmos ao supracitado dispositivo legal ao art. 5, XI, e os arts. 11,


parágrafo único, e art. 17, parágrafo 2º, todos da lei 9.610/98, temos uma perfeita e
inequívoca construção legal que demonstra a capacidade de a pessoa jurídica ser o titular
originário de diretos autorais relativos a obra audiovisual.

Art. 5 Para efeitos desta lei considera-se:


................................................................

VIII- obra:

h) coletiva: “criada por iniciativa, organização e responsabilidade de ma


pessoa física ou jurídica, que a publica sob seu nome ou marca e que é
constituída pela participação de diferentes autores, cujas contribuições se
fundem numa criação autônoma”
XI- produtor: a pessoa física ou jurídica que toma a iniciativa e tem a
responsabilidade econômica da primeira fixação do fonograma ou da
obra audiovisual, qualquer que seja a natureza do suporte utilizado;

Art. 11 – Autor é a pessoa física criadora de obra literária, artística ou


cientifica.
Parágrafo único: a proteção concedida ao autor poderá aplicar-se às
pessoas jurídicas nos casos previstos nesta lei.

Art. 17 – É assegurada a proteção às participações individuais em obras


coletivas.
................................
§ 2 - Cabe ao organizador a titularidade dos direitos patrimoniais sobre o
conjunto da obra coletiva.

Apesar de titular dos direitos patrimoniais de autor sobre a obra audiovisual, o


exercício dos direitos morais compete ao seu diretor, conforme estabelece o art. 25, da lei
9.610/98.

“Art. 25 Cabe exclusivamente ao diretor o exercício dos direitos morais


sobre a obra audiovisual.”.

No caso específico do audiovisual, a caracterização legal da pessoa jurídica como


titular originário dos direitos patrimoniais de autor é obtida através da observância
sistemática dos dispositivos acima reproduzidos. Cumpre observar, contudo, que o
exercício dos direitos morais ficará sempre reservado ao diretor da obra.

Ainda em relação ao audiovisual, é importante observar que, por força do art. 16, da
lei 9.610/98, são co-autores da obra audiovisual o “autor do assunto ou argumento literário,
musical ou lítero-musical e o diretor”.

Em vista disto, a fim de que o produtor audiovisual se coloque em posição de titular


dos direitos patrimoniais de autor, vale ressaltar a importância de instrumentos contratuais
que transfiram ao produtor os direitos patrimoniais de autor que cabem ao autor e ao
diretor.

A obra

Obras, por definição, são “as criações do espírito, expressas por qualquer meio ou
fixadas em qualquer suporte, tangível ou intangível, conhecido ou que se invente no
futuro”, como se observa no art. 7º da lei 9.610/98.

O artigo supracitado elenca, de forma exemplificativa, as obras protegidas pelo


Direito Autoral, uma vez que, em face da inesgotável capacidade criativa do ser humano,
não seria possível, tão pouco aceitável, estabelecer limites legais para o processo de
desenvolvimento da manifestação intelectual.
Não raras vezes surgem dúvidas e discussões acerca do alcance da definição de obra
e, por conseqüência, sobre o que é ou não passível de proteção pelo Direito Autoral.

Idéias, por exemplo, são consideradas como patrimônio comum da humanidade,


portanto não se encontram sob a tutela legal do Direito Autoral. Todavia, a partir do
momento em que as idéias se concretizam, se materializam, tomam forma e são expressas e
fixadas, passam a contar com a proteção do Direito de Autor.

O Início e Duração da Proteção

A proteção objetiva do Direito Autoral inicia-se quando da criação da obra, não


sendo necessário seu registro, tampouco sua comunicação ao público.

O registro da obra, mesmo sendo de caráter facultativo, deve ser feito com vistas a
dirimir dúvidas futuras relativas, por exemplo, a autoria. Não é raro o fato de duas ou mais
pessoas, residentes em locais diferentes e sem qualquer contato, direto ou indireto,
conceberem obras similares ou até mesmo idênticas em sua estrutura central.

Em ocorrendo tal hipótese, por certo haverá uma disputa judicial. Como a
anterioridade da criação será vital no processo (jurídico) para determinação da autoria, o
registro da obra, nos locais estabelecidos no art. 19, da Lei 9.610/98 (que remete ao art. 17
da Lei 5.988/73) terá valor inestimável na decisão final em favor de uma das partes da
disputa.

Ademais, sempre que se operar uma cessão de direitos patrimoniais o registro do


contrato relativo a tal transação, para ser válido contra terceiros, deve, obrigatoriamente, ser
averbado a margem do registro da obra ou registrado em Cartório de Títulos e Documentos.

No que tange a duração da proteção aos direitos autorais, a legislação brasileira adota as
seguintes regras:

a) O autor goza de proteção vitalícia;


b) Os herdeiros gozam de proteção por setenta anos, a contar de 1º de janeiro do ano
subseqüente a morte do autor;
c) Quando se tratar de obra em co-autoria, e for a obra indivisível, o prazo de setenta
anos acima mencionado começará a contar a partir da morte do último dos co-
autores sobreviventes;
d) No caso de obras anônimas ou pseudônimas, o prazo de proteção será de setenta
anos, a contar de 1º de janeiro do ano subseqüente ao de sua primeira publicação;
e) No caso de obras audiovisuais e fotográficas, o prazo em questão também será de
setenta anos, a contar de 1º de janeiro do ano subseqüente ao de sua divulgação.

Ao final do prazo de proteção, a obra passa para o domínio público, podendo ser utilizada
por quem quer que seja, sem necessidade de prévia autorização de terceiros.

Direitos Morais e Patrimoniais de Autor


O Direto Autoral comporta dois grupos de prerrogativas: um de ordem patrimonial
e, o outro, de ordem moral.

Os diretos morais de autor “se relacionam à defesa da personalidade do autor,


consistindo em verdadeiros óbices a qualquer ação de terceiros com respeito a sua criação”,
enquanto os direitos patrimoniais de autor “se referem à utilização econômica da obra,
representando os meios pelos quais o autor dela pode retirar proventos pecuniários” (Carlos
Alberto Bittar, Direito de Autor)

Portanto, o direito de manter a obra inédita, de reivindicar autoria, de assegurar a


integridade da obra e de retirá-la de circulação são alguns dos direitos morais previstos no
art. 24, da lei 9.610/98.

A capacidade de utilizar, fruir e dispor da obra são relacionadas aos direitos patrimoniais de
autor, cujas disposições legais encontram-se no Capítulo III, do Título III, arts. 29 a 45, da
lei 9.610/98.

É importante observar que a utilização de qualquer obra prescinde de prévia e


expressa autorização do autor ou de seu titular, sendo essa uma regra basilar do Direito
Autoral.

As limitações aos Direitos Autorais

A lei do Direito Autoral estabelece limites ao exercício dos direitos de autor,


aplicáveis apenas aos casos expressamente previstos no art. 46 da lei 9.610/98.

Apesar da clareza das disposições, por vezes verifica-se que sua aplicação prática
não é tão simples.

Como exemplo, citamos o inciso VIII, do supracitado art. 46, que estabelece:

“art. 46 Não constitui ofensa aos direitos autorais:


..................................................................................
VIII – a reprodução, em quaisquer obras, de pequenos trechos de obras
preexistentes de qualquer natureza, ou de obra integral, quando de artes
plásticas, sempre que a reprodução em si não seja o objetivo principal da
obra nova e que não prejudique a exploração normal da obra reproduzida
nem cause prejuízo injustificado aos legítimos interesses dos autores”.

Visto o texto legal, de pronto surge uma questão – o que é um pequeno trecho, para
os fins previstos no artigo em análise?
Ora, um pequeno trecho de uma ópera ou de uma sinfonia difere substancialmente
do pequeno trecho de um spot de rádio, um jingle ou uma música popular. Enquanto a
ópera e a sinfonia podem ser obras de mais de uma hora de duração, um spot de rádio e um
jingle não duram mais do que de um a três minutos, podendo ter até mesmo trinta
segundos, enquanto uma música popular possui em média de três a seis minutos.

Da mesma forma, um pequeno trecho de As Ilíadas ou de Os Lusíadas, de Homero e


Camões, difere enormemente, em termos quantitativos, de um poema de Pablo Neruda ou
Fernando Pessoa.

No mesmo sentido, agora no audiovisual, certamente encontraremos a mesma


questão ao aplicarmos o dispositivo a vinhetas, mensagens publicitárias (veiculadas em
mídia eletrônica) em comparação a filmes de curta, média e longa metragem.

Assim, como definir o que seja um pequeno trecho? Há algum parâmetro de tempo,
de estrofes, de compassos, de frames ou de tamanho?

Mas a questão não se encerra aqui.

Como determinar se o uso do pequeno trecho da obra preexistente na obra nova,


pressupondo que, concretamente, já se tenha definido que de fato se trata de um pequeno
trecho, não causará prejuízo a exploração normal da obra reproduzida? E mais, como saber
se a utilização em tela não causará prejuízo injustificado aos legítimos interesses dos
autores?

É possível ocorrer uma situação de fato na qual, em havendo a utilização do


pequeno trecho de obra preexistente em obra nova, o autor da obra preexistente sinta-se
prejudicado e, mais, que comprove prejuízos efetivamente causados, seja por conta da
exploração da obra ou por força de contrato firmado com terceiros com garantias de
exclusividade de uso da obra reproduzida.

Vê-se, portanto, que, em relação ao dispositivo legal ora tratado, é tênue a linha
divisória entre a legalidade e a ilegalidade, sendo, via de conseqüência, fundamental,
necessário e imprescindível a realização de análise de sua aplicabilidade caso a caso, sob
pena de ocorrência de violação a direito autoral.

A Transferência de Direitos

É comum observarmos confusão entre a cessão e o licenciamento, pelo que, cabe


esclarecer as distinções entre ambos.

No licenciamento, obtém-se, junto ao autor ou titular de direitos patrimoniais de


autor, a capacidade de uso da obra sob determinadas condições e limites, tais como prazo,
territórios, modalidades de utilização, suportes materiais, processos de comunicação,
idiomas e versões, dentre outras.
Na cessão, que pode ocorrer a titulo universal ou singular, o cessionário obtém do
autor ou titular dos direitos patrimoniais de autor, a capacidade de exploração econômica da
obra de forma mais ampla.

A cessão universal de direitos patrimoniais de autor é, via de regra, o negócio


jurídico pelo qual o cessionário obtém plena capacidade de exploração econômica da obra,
em geral sob condições amplas como, por exemplo, (i) validade da cessão por todo o prazo
de proteção aos direitos de autor; (ii) para toda e qualquer forma e processo de
comunicação da obra ao público, suporte material e mídia; (iii) para todos os territórios do
mundo; (iv) para todos os idiomas. O principal objetivo da cessão universal, portanto, é a
transferência integral dos direitos patrimoniais de autor, conferindo ao cessionário a
titularidade e capacidade de fruir e gozar, a plenitude, de tais de direitos, como se o autor
fosse.

Já na cessão singular de direitos patrimoniais de autor, o cessionário obtém diretos


restritos de exploração econômica da obra. Nela, portanto, transfere-se para o cessionário
apenas parte dos direitos patrimoniais, ficando sob a esfera de domínio do autor tudo o que
não foi expressamente transferido para o cessionário.

Por certo que a confusão existente entre licenciamento e cessão se origina da cessão
singular e da cessão universal, visto que, a princípio, são negócios jurídicos similares (sob
alguns aspectos, mas somente sob a óptica dos não versados na matéria legal ora em tela).

Neste ponto, faz-se necessário tecer algumas considerações acerca de alguns dos
mais importantes artigos da lei 9.610/98, que interferem de forma direta e profunda nas
transações relacionadas aos direitos de autor, quais sejam:

“Art. 4º - Interpretam-se restritivamente os negócios jurídicos sobre


direitos autorais”.

O art. 4º é, sem dúvida, um dos mais importantes dispositivos da LDA ao


considerarmos a elaboração e análise de instrumentos contratuais.

Impondo a interpretação restritiva aos negócios jurídicos relacionados aos direitos


de autor, seja na cessão, concessão, licenciamento ou de qualquer outro negócio jurídico,
restringe-se a transação ao que estiver expressamente pactuado entre as partes, não cabendo
qualquer tipo de interpretação, especialmente de ordem extensiva.

Assim, por exemplo, a cessão de direitos de obra audiovisual que confere ao


cessionário a capacidade de transmissão e retransmissão da obra por radiodifusão e não
prevê o uso de satélites artificiais, compromete completamente o sistema de exibição
simultânea em rede nacional, uma vez que o uso de satélites é o meio pelo qual as
emissoras e retransmissoras de radiodifusão estabelecem a comunicação em rede.
No mesmo sentido, se o contrato em questão não estabelece o uso de cabos, fibras
óticas e outros meios físicos de transmissão, fica prejudicada a exibição da obra nos casos
em que a emissora de radiodifusão disponibilizar seu sinal para os operadores de tv a cabo.

O mesmo raciocino aplica-se a todos os demais termos e condições do contrato, tais


como as previsões relativas a modalidades de utilização, suportes materiais, territórios,
idiomas, dentre muitas outras disposições necessárias e imprescindíveis para que o
adquirente de Direitos Autorais tenha plena capacidade de uso da obra cedida na forma
efetivamente acordada. Conseqüentemente, nem sempre o que foi acordado entre as partes
encontra-se efetivamente contratado, o que poderá causar prejuízos a uma das partes, ou a
ambas.

O cuidado na elaboração de contratos é fundamental, não bastando apenas ser um


profundo conhecedor do Direito Autoral. O conhecimento técnico da industria e do negócio
para o qual estão voltadas as tratativas das partes, as negociações e o negócio jurídico em
andamento é fundamental no processo de contratação.

A partir deste momento cabe verificar aspectos relativos aos direitos morais e patrimoniais
de autor na cessão de direitos.

No que diz respeito aos direitos morais de autor, necessário verificar o disposto no art. 27,
da LDA.

“Art. 27 – Os direitos morais do autor são inalienáveis e irrenunciáveis”

Em virtude do disposto no artigo acima reproduzido, torna-se nula e não escrita


cláusula contratual que estabeleça a alienação dos direitos morais do autor.

A título exemplificativo, vejamos sua aplicação no caso da obra audiovisual.

Sabemos que o diretor é co-autor da obra audiovisual (art. 16, lei 9.610/98),
cabendo a ele o exercício dos direitos morais (art. 25, lei 9.610/98).

Sabemos, ainda, que podemos estabelecer a titularidade de direitos patrimoniais de


autor em favor do produtor audiovisual.

Temos conhecimento que a exploração econômica da obra audiovisual demanda,


por vezes, sua alteração (adaptação), a fim de atender exigências de licenciados e
cessionários, com versões, portanto, para tv aberta, tv paga, pay-per-view, vídeo-on-
demand ou DVD.

Pois bem, se um dos direitos morais conferidos ao autor é capacidade de assegurar a


integridade da obra, como garantir ao produtor a possibilidade de alteração da obra
audiovisual, com vistas a atender aos diversos formatos (versões) exigidas pela industria,
visto que a cessão de direitos morais é vedada?
A solução reside em autorização prévia do diretor que viabilize tais alterações,
cabendo ressaltar que, a qualquer momento, ele poderá exercer seu direito moral de zelar
pela integridade da obra e se opor às modificações nela introduzidas.

Portanto, mais uma vez, observa-se a necessidade de elaboração de instrumentos


contratuais que considerem as práticas da cadeia produtiva do audiovisual, de forma a
investir o titular dos direitos patrimoniais de autor plena exploração da obra.

Ao tratarmos dos direitos patrimoniais de autor, devemos analisar o art. 49 da LDA.

“Art. 49 – Os direitos de autor poderão ser total ou parcialmente


transferidos a terceiros, por ele ou por seus sucessores, a titulo universal
ou singular, pessoalmente ou por meio de representantes com poderes
especiais, por meio de licenciamento, concessão, cessão ou por outros
meios admitidos em Direito, obedecidas as seguintes limitações:

I- a transmissão total compreende todos os direitos de autor, salvo os


de natureza moral e os expressamente previstos em lei;
II- somente se admitirá a transmissão total e definitiva dos direitos
mediante estipulação contratual escrita;
III- na hipótese de não haver estipulação contratual escrita, o prazo
máximo será de cinco anos;
IV- a cessão será válida unicamente para o país em que se firmou o
contrato, salvo estipulação em contrário;
V- a cessão só se operará para modalidades de utilização já existentes
a data do contrato;
VI- não havendo especificações quando a modalidade de utilização, o
contrato será interpretado restritivamente, entendendo-se como
limitada apenas a uma que seja aquela indispensável ao
cumprimento da finalidade do contrato.

No que tange a cessão total ou parcial, já tecemos considerações a respeito.

A representação, mencionada no caput do art. 49, deve, como estabelecido, conter


poderes específicos, diretamente relacionados a transação e ao negócio jurídico que se
pretende empreender.

Trata-se, via de conseqüência, de procuração na qual o autor ou titular de direitos


patrimoniais de autor confere a seu procurador poderes bastantes para assinar contratos,
documentos, acordos, autorizações e outros instrumentos contratuais referentes a cessão,
licenciamento, concessão ou outra modalidade de transação admitida em Direito e que
tenha por objeto a obra e os direitos do autor sobre ela.

Tal procuração deve conter, obrigatoriamente, previsões relativas ao objeto da


transação (a obra) e o alcance da alienação (licenciamento, cessão – universal ou singular –
e etc.), com todo o detalhamento dos poderes conferidos ao procurador e o que ele
efetivamente poderá contratar em nome do outorgante da procuração.

A inexistência de correspondência entre o contrato firmado e o alcance da


procuração outorgada resultará na possível anulação de dispositivo contratual conflitante
com os termos do mandato.

Os incisos I e II incluem-se em considerações anteriores, razão pela qual não cabem


comentários complementares.

O inciso III é cristalino, restando frisar apenas a necessidade de previsão expressa


quando houver pretensão de firmar contratos com prazos superiores a cinco anos.

Quanto ao inciso IV, é importante ressaltar a necessidade de especificação expressa


dos territórios para os quais o negócio jurídico será válido, quando houver limitações
territoriais, ou seu alcance para o território nacional e exterior, quando não houver
limitações de ordem territorial.

O inciso V, no entanto, gera dúvidas, merecendo maior atenção.

O que são modalidades de utilização? Suporte material e processos de comunicação


significam o mesmo que modalidade de utilização?

Entendemos que modalidade de utilização significa as possibilidades de


comunicação da obra ao público, que não se confundem com os suportes materiais e
processos de comunicação utilizados para tanto.

Por exemplo, o home vídeo é uma modalidade de utilização que poderá dispor do
VHS, do disc-laser e/ou do DVD como suportes materiais para fixação da obra audiovisual
que, por fim, permitem levar a obra ao público.

Além disto, a exibição em televisão aberta, televisão paga, pay-per-view, vídeo-on-


demand e near vídeo on demand são modalidades de utilização que utilizam a radiodifusão,
fibras óticas, satélites (DBS e DTH) e outros meios físicos e aéreos como meios e processos
para comunicação da obra audiovisual ao público.

As modalidades de utilização, portanto, configuram o objetivo final de exploração


econômica da obra audiovisual, enquanto os suportes materiais e processos de comunicação
são meios utilizados para se atingir o objetivo estabelecido – as modalidades de utilização.

Tratando-se de questão controversa, visto que alguns autoralistas defendem tese no


sentido de que modalidade de utilização e suporte material se confundem, restam ainda
muitas discussões a respeito, além de decisões judiciais que consolidem um entendimento
geral, para que as dúvidas existentes sobre o tema sejam dirimidas em definitivo. Até lá,
defendemos que modalidade de utilização e suporte material distinguem-se entre si,
entendendo que nosso ponto de vista se adequa às regras e processo lógico de interpretação
jurídica de norma legal e às práticas da cadeia produtiva do audiovisual.
A transferência de direitos autorais está sujeita, ainda, ao disposto no art. 51 da LDA.

Art. 51 A cessão dos direitos de autor sobre obras futuras abrangerá, no


máximo, o período de cinco anos.
Parágrafo Único: O prazo será reduzido a cinco anos sempre que
indeterminado ou superior, diminuindo-se, na devida proporção, o preço
estipulado.

A cessão de obra futura é outro ponto que, em alguns momentos, gera dúvidas.

Trata-se, a cessão de obra futura, de prazo limite para a cessão contratada ou de


prazo máximo para cessão de obras a serem criadas?

Vemos, por vezes, algumas afirmações, inclusive de renomados autoralistas, de que


a limitação de tempo estipulada no art. 51 se refere ao prazo de validade da cessão de
direitos da obra existente, com o que não concordamos.

Em verdade, o art. 51 tem por intenção impedir a realização de negócios jurídicos


prejudiciais aos autores, que, por força de necessidade ou pressão econômica, poderiam se
submeter a condições contratuais com prazos superiores a cinco anos, com o
comprometimento irreversível de suas futuras criações, sujeitas a uma cessão única e
perene.

Tendo em vista que o artigo em tela não limita, em termos temporais, a cessão de
obra existente, assim como não impede a cessão de obra futura, há de se entender que sua
correta interpretação é no sentido de limitar em cinco anos a cessão de diretos patrimoniais
de autor relativos às obras ainda a serem criadas.

Para sustentação de nosso posicionamento, citamos José de Oliveira Ascensão,


reconhecidamente um dos mais importantes e notáveis mestres do Direito Autoral.

“Mais difícil é saber se mesmo uma obra futura determinada pode


ser objeto de transmissão total. O escritor aliena já os direitos sobre o
romance X, que se propõe a escrever.
Claro que o efeito só se pode produzir quando e se o romance for
escrito. Mas poderia entender-se que a identificação da obra suporia uma
obra já criada.
Porém, o art. 54 pretende justamente possibilitar esse negócio. É
válida a cessão de direitos de autor sobre obras futuras (determinadas),
desde que o negócio não ultrapasse obras a produzir num lapso de 5 anos.”
(Jose de Oliveira Ascensão, Direito Autoral, 2ª Edição, Ed. Renovar,
1997- págs. 368/369).

Observa-se, portanto, que a cessão em tela se refere às obras que serão criadas
durante o período de cinco anos, a contar de data estabelecida entre as partes contratantes.
No limite, no que diz respeito a tais obras (futuras), a cessão pactuada (em relação as obras
criadas no período de cinco anos) poderá ser válida por todo o prazo de proteção aos
Direitos Autorais.

Os Direitos Conexos

Servimo-nos de J. Ramon Obon Leon, citado por Antonio Chaves (Direitos


Conexos, Editora LTR – 1999 – pág. 23), para definição dos direitos conexos, por sua
exemplar clareza.

“ Em termos gramaticais, “conexo” é aquilo que se aplica ao que está


entrelaçado ou relacionado ao outro. E, em derivação, as “conexões” são
os direitos e coisas anexas a outra principal. De seu lado, “afim” é o
próximo, o contíguo; o que tem afinidade, analogia ou semelhança de uma
coisa com outra.
Se considerarmos estes termos dentro do âmbito jurídico em estudo,
verificaremos que neles se pretendeu agrupar institutos de índole diferente
como são os artistas intérpretes, os produtos de fonograma e os
organismos de radiodifusão, com o objeto de equipará-los ao direito de
autor.
Em outras palavras, buscou-se aglutinar dentro de um mesmo
conceito dois distintos tipos de direitos: um de caráter intelectual (o dos
artistas intérpretes) e outro de caráter empresarial ou industrial (o dos
produtores de fonogramas e organismos de radiodifusão”.

O art. 89, da lei 9.610/98 determina os sujeitos da tutela legal relativa a direitos
conexos, quais sejam, os artistas intérpretes ou executantes, os produtores fonográficos e as
empresas de radiodifusão.

“art. 89 As normas relativas aos direitos de autor aplicam-se, no que


couber, aos direitos dos artistas intérpretes ou executantes, dos
produtores fonográficos e das empresas de radiodifusão.”

As questões que surgem a partir do reconhecimento dos direitos conexos são muitas.
Por exemplo, na medida em que a lei é taxativa, e não exemplificativa, é possível equiparar
as programadoras de tv por assinatura às empresas de radiodifusão, estas últimas entendidas
como radiodifusão de sons e imagens, para fins de reconhecimento de direitos conexos às
primeiras? E mais, os dubladores, equiparam-se aos artistas, no que tange aos direitos
conexos?

Entendemos que, nos dois casos, a resposta é positiva.

Porém, em vista dos objetivos deste trabalho, voltado para o setor audiovisual
(videofonográfico e cinematográfico), e considerando que o tema direitos conexos, por si
só, já demandaria um trabalho exclusivamente dedicado ao assunto, nos fixaremos nas
questões relativas aos artistas, regidos pela lei 6.533, de 24 de maio de 1978, que
regulamenta as profissões de artista e técnico em espetáculo de diversões, e sua incidência
no audiovisual.

O 2º, da lei 6.533/78, define o artista como “o profissional que cria, interpreta ou
executa obra de caráter cultural de qualquer natureza, para efeito de exibição ou divulgação
pública, através de meios de comunicação de massa ou em locais onde se realizam
espetáculos de diversão pública”

Vista a definição legal do artista, cumpre esclarecer a inconteste aplicabilidade da


lei 6.533/78 à atividade cinematográfica, conforme é possível constatar pelo disposto no
art. 3º, e seu parágrafo único, abaixo transcritos.

“art. 3º Aplicam-se as disposições desta Lei às pessoas físicas ou


jurídicas que tiverem a seu serviço os profissionais definidos no artigo
anterior, para realização de espetáculos, programas, produções ou
mensagens publicitárias.
Parágrafo único: Aplicam-se, igualmente, as disposições desta Lei às
pessoas físicas ou jurídicas que agenciem colocação de mão-de-obra de
profissionais definidos no artigo anterior”.

Portanto, considerando que a atividade audiovisual eventualmente contará com a


participação do artista para sua realização, não há que se colocar em dúvida que os
produtores videofonográficos e cinematográficos estão sujeitos à observação das normas
contidas na lei 6.533/78

Ora, ao considerarmos que o produtor audiovisual pode, por conta de uma forte e
bem construída base contratual, ser o titular de direitos patrimoniais de autor relativos as
obras audiovisual e cinematográfica, cuja justificativa se fundamenta na necessidade de
construção de uma indústria autossustentável, alicerçada na capacidade do produtor em
gerar receitas através da plena exploração econômica da obra audiovisual, faz-se necessário
observar, com cuidado e atenção, as questões legais impostas por força da participação do
artista em tais obras. Ao observarmos, inclusive, que as normas de direito autoral se
aplicam aos direitos conexos, mais cristalina fica a necessidade de atenção e cuidado.

Estabelece o art. 13, e seu parágrafo único, da lei 6.533/78:

“art. 13- Não será permitida a cessão ou promessa de cessão de direitos


autorais e conexos decorrentes da prestação de serviços profissionais.

Parágrafo único: Os direitos autorais e conexos dos profissionais serão


devidos em decorrência de cada exibição da obra”.

Ao conjugarmos o artigo acima transcrito com dispositivos da lei 9.610/98,


podemos vislumbrar que uma das principais dificuldades para exploração plena das obras
audiovisuais emerge da relação do artista com a obra.
E nesse contexto, é fundamental a análise dos dispositivos legais a seguir transcritos.

“Art. 4º - Interpretam-se restritivamente os negócios jurídicos sobre


direitos autorais”.

Art. 22 – Pertencem ao autor os direitos morais e patrimoniais sobre a obra


que criou
Art. 28 – Depende de prévia e expressa autorização do autor a utilização
da obra por quaisquer modalidades, tais como:
................................................

VII- a distribuição para oferta de obras ou produções mediante cabos, fibra


ótica, satélites, ondas ou qualquer outro sistema que permita ao usuário
realizar a seleção da obra ou produção para percebe-la em um tempo e
lugar previamente determinados por quem formula a demanda, e nos casos
em que o acesso às obras e produções se faça por qualquer sistema que
importe em pagamento pelo usuário;

VIII- a utilização, direta ou indireta, da obra literária, artística ou


científica, mediante:
................................................

d) radiodifusão sonora ou televisiva;


e) captação de transmissão de radiodifusão em locais de freqüência
coletiva;
g) exibição audiovisual, cinematográfica ou por processo assemelhado;
h) emprego de satélites artificiais;
i) emprego de sistemas ótico, fios telefônicos ou não, cabos de qualquer
tipo e meios de comunicação similares que venham a ser adotados;

XI – quaisquer outras modalidades de utilização existentes ou que venham


a ser criadas.

Art. 68. Sem prévia e expressa autorização do autor ou titular, não poderão
ser utilizadas obras teatrais, composições musicais ou lítero-musicais e
fonogramas, em representações e execuções públicas.

§ 1º Considera-se representação pública a utilização de obras teatrais no


gênero drama, tragédia, comédia, ópera, opereta, balé, pantomimas e
assemelhadas, musicadas ou não, mediante a participação de artistas,
remunerados ou não, em locais de freqüência coletiva ou pela
radiodifusão, transmissão e exibição cinematográfica.
§ 2º Considera-se execução pública a utilização de composições musicais
ou lítero-musicais, mediante a participação de artistas, remunerados ou
não, ou a utilização de fonogramas e obras audiovisuais, em locais de
freqüência coletiva, ou quaisquer processos, inclusive a radiodifusão ou
transmissão por qualquer modalidade, e a exibição cinematográfica.

§ 3º Consideram-se locais de freqüência coletiva os teatros, cinemas,


salões de baile ou concertos, boates, bares, clubes ou associações de
qualquer natureza, lojas, estabelecimentos comerciais e industriais,
estádios, circos, feiras, restaurantes, hotéis, motéis, clínicas, hospitais,
órgãos públicos da administração direta ou indireta, fundacionais e
estatais, meios de transporte de passageiros terrestre, marítimo, fluvial ou
aéreo, ou onde quer que se representem, executem ou transmitam obras
literárias, artísticas ou científicas.

Art. 90. Tem o artista intérprete ou executante o direito exclusivo de, a


título oneroso ou gratuito, autorizar ou proibir:

I - a fixação de suas interpretações ou execuções;


II - a reprodução, a execução pública e a locação das suas interpretações
ou execuções fixadas;
III - a radiodifusão das suas interpretações ou execuções, fixadas ou não;
IV - a colocação à disposição do público de suas interpretações ou
execuções, de maneira que qualquer pessoa a elas possa ter acesso, no
tempo e no lugar que individualmente escolherem;
V - qualquer outra modalidade de utilização de suas interpretações ou
execuções.
...............................................................................
§ 2º A proteção aos artistas intérpretes ou executantes estende-se à
reprodução da voz e imagem, quando associadas às suas atuações.

Pois bem, (i) se as normas relativas aos direitos de autor aplicam-se aos direitos dos
artistas; (ii) se os negócios jurídicos relativos a direitos autorais devem ser interpretados
restritivamente; (iii) se depende de prévia e expressa autorização do autor a utilização da
obra por quaisquer modalidades; (iv) se o artista tem o direito exclusivo de autorizar ou
proibir as utilizações de suas participações em obras audiovisuais; (v) se é vedada a cessão
ou promessa de cessão de direitos autorais e conexos dos artistas; (vi) se tais direitos são
devidos aos artistas a cada exibição da obra; e (vii) se a normas da lei 6533/78 são
aplicáveis às pessoas físicas ou jurídicas que tiverem artistas a seu serviço, para realização
de programas, produções ou mensagens publicitárias; é correto afirmar que (i) é
imprescindível ao produtor cinematográfico firmar com os artistas contratos que prevejam a
plena utilização da obra e (ii) que tais contratos devem prever todas as modalidades de
utilização da obra e da interpretação artística e, inclusive, suas respectivas remunerações.

Portanto, vemos que as imposições legais das leis mencionadas resultam num forte
vínculo entre o artista e a obra, vínculo este que, se não regulado através de instrumentos
contratuais perfeitamente elaborados, poderá prejudicar irremediavelmente a exploração
econômica da obra audiovisual, por conta de óbices a sua circulação plena no mercado, o
que será determinante no processo de construção de uma indústria audiovisual
autossustentável.

Mas como o Direito não é uma ciência exata, a tese acima pode ser contestada com
base no art. 81, da LDA, que trata da utilização de obra audiovisual. Estabelece o artigo em
questão que:

“Art. 81. A autorização do autor e do intérprete de obra literária, artística ou


científica para produção audiovisual implica, salvo disposição em contrário,
consentimento para sua utilização econômica.

De fato, é possível entender que o artigo transcrito resulte na conclusão de que a


mera autorização, do intérprete (artista) para produção audiovisual é o bastante para que a
obra seja objeto de utilização econômica. No limite, visto que a participação em obra
audiovisual se traduz em autorização tácita, na medida em que nenhum artista atua partindo
do pressuposto que o destino da obra serão as prateleiras, e, ainda, que nenhum Magistrado
haverá de entender em contrário, seria dispensável qualquer formalização contratual com os
artistas.

Porém, com base na doutrina e na jurisprudência dominante, aliadas a falta de uma


sólida cultura legal no Brasil em relação aos Direitos Autorais, não nos permitimos adotar
tal entendimento, pelo que, em face dos altos custos de uma produção audiovisual e dos
eventuais prejuízos resultantes da impossibilidade de total exploração econômica da obra,
entendemos que é impraticável desconsiderar a necessidade de estabelecer,
contratualmente, a relação entre artista e produtor, com ênfase na capacidade deste último
de realizar a exploração econômica da obra, prevalecendo, pois, nossas assertivas
anteriores a respeito da questão.

Outro ponto que pode gerar controvérsias surge graças a infeliz redação dada ao art.
92, da LDA, agora no que diz respeito a cessão de direito autorais e conexos dos artistas
intérpretes.
Art. 92. Aos intérpretes cabem os direitos morais de integridade e
paternidade de suas interpretações, inclusive depois da cessão dos
direitos patrimoniais, sem prejuízo da redução, compactação, edição ou
dublagem da obra de que tenham participado, sob a responsabilidade do
produtor, que não poderá desfigurar a interpretação do artista.

A mera leitura do art. 92, dissociada de estudo mais aprofundado da matéria, enseja
a equivocada conclusão que os direitos autorais e conexos (de ordem patrimonial) dos
artistas intérpretes podem ser objeto de cessão a terceiros.

Tal entendimento é completamente equivocado. O art. 13, da lei 6.533/78, como já


visto, deixa clara e inconteste a proibição de cessão de tais de direitos, mesmo os de ordem
patrimonial.
Ademais, não há qualquer disposição, na LDA que revogue aquele artigo. Ao
contrário, a lei 9.610/98, em suas Disposições Finais e Transitórias, art. 115, mantém em
vigor a lei 6.533/78, o que dirime, em definitivo, qualquer dúvida existente.

E além disso, para fins de interpretação de um conjunto de leis deverá sempre


prevalecer o princípio da especialidade da norma.

Merece atenção, inclusive, o § 2º, do art. 90, da LDA, que estipula que “a proteção
aos artistas intérpretes ou executantes estende-se à reprodução da voz e imagem, quando
associadas às suas atuações”.

É de conhecimento de todos que a divulgação, através de agressivas estratégias de


marketing, é vital para o sucesso da obra cinematográfica, consumindo recursos
substanciais, por vezes equivalentes aos custos de produção.

Obviamente, para tanto, são elaboradas peças publicitárias nas quais as imagens
e/ou vozes dos artistas são reproduzidas com a finalidade específica de promover o produto
(obra) audiovisual.

Nestes casos, é inconteste que as reproduções supracitadas estão diretamente


associadas a atuação do artista na obra audiovisual, ainda que não aproveitadas cenas que
integrem a obra. Em assim o sendo, é de suma importância a formalização de pactos, entre
artista e produtor, que permitam a utilização da imagem e voz do primeiro para os fins
mencionados.

A desconsideração a tais necessidades legais pode levar à inviabilidade das ações de


marketing, na medida em que tais ações podem ser vedadas com base em uso não
autorizado de imagem e voz.

Sincronização e Execução – A Música na Obra Audiovisual

Vemos regularmente a existência de dúvidas relativas a utilização de obras musicais


em produções audiovisuais, o que tem gerado, por vezes, alguma dificuldade no
entendimento do que seja sincronização e execução musical e o papel das editoras musicais,
dos produtores fonográficos e do ECAD.

A sincronização musical ocorre quando da inclusão de obra musical em obra


audiovisual.

A execução musical se dá quando da exibição da obra audiovisual, momento em


que a obra musical, objeto da sincronização, é comunicada ao publico através das emissões
em televisão e salas de projeção, por exemplo.

Ao realizar a sincronização musical, o produtor audiovisual estará,


obrigatoriamente, diante das seguintes relações:
a) com a editora musical, entidade que, por mandato concedido pelo autor ou titular
de direitos autorais, é responsável por autorizar ou proibir o uso de uma obra musical que
conste em seu catálogo de representação;

b) com o produtor fonográfico, sempre que na sincronização for utilizada obra


musical que conste de obra fonográfica.

Em ambos os casos será imprescindível a obtenção de direitos de sincronização


musical, junto a editora musical e/ou produtor fonográfico.

Quando se tratar de obra musical caída em domínio público, a utilização é livre,


independentemente de autorização de editora musical e/ou produtor fonográfico, salvo nos
casos em que se tratar de obra fixada em fonograma, quando será necessária a autorização
do produtor fonográfico.

A execução musical, por ser outra forma de utilização, como mencionado acima,
estará sujeita a interferência do Escritório Central de Arrecadação e Distribuição - ECAD,
responsável pelos direitos relativos a execução pública. Neste caso, a responsabilidade é tão
somente daquele que exibe a obra musical, como, por exemplo, as emissoras de televisão
aberta, os operadores de televisão por assinatura, as empresas proprietárias de salas de
exibição e demais usuários da obra audiovisual responsáveis por sua exibição em locais
públicos e/ou de freqüência coletiva.

Petrus Barretto é Advogado especializado em Direito do Entretenimento, Propriedade


Intelectual e Mídia. Foi Diretor Jurídico da Globosat e é sócio fundador do escritório de
advocacia Petrus Barretto & Associados, sediado no Rio de Janeiro. Pós-graduado em
Propriedade Intelectual pela FGV-RJ, Pós-graduado em Direito Processual, pela
Universidade Candido Mendes, foi Professor de Direito Autoral da Fundação Getúlio
Vargas – RJ e da Faculdade de Direito da Universidade Candido Mendes. Autor de artigos
publicados em revistas especializadas e conferencista, ministra palestras sobre Direitos
Autorais, Propriedade Intelectual, Mídia, Comércio Internacional de Bens Culturais e
outros temas correlatos, no Brasil e no exterior.

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