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A nossa grande dificuldade radica na nossa dificuldade em articular fé e razão nas novas
coordenadas que nos dá a sociedade atual. No fundo, nos tempos atuais temos uma particular
dificuldade para orar e celebrar a nossa fé através da liturgia. Quem ora ‘em verdade e em espírito’
consegue articular fé e razão de um modo criativo e de colaboração mútua. Desde os inícios do
cristianismo, os cristãos se relacionaram com Deus de um modo trinitário: dirigiam suas orações ao
Pai, manifestado por Jesus Cristo, animados no Espírito Santo.
Tanto o racionalismo como o fideísmo são atitudes que dificultam uma vida de oração
profunda e sincera. E nos tempos atuais, ambas as atitudes se manifestam em dinâmicas bem
definidas: o racionalismo como hegemonia da razão instrumental, e o fideísmo está subsumido na
secularização. Muitas vezes queremos compreender a Trindade com uma razão instrumental, tão
acostumados à eficiência e ao utilitarismo no sistema de pensamento atual. No entanto, esse
razonamento tende a parcelar o conhecimento, enfatizando a compreensão trinitária das pessoas, e
enfraquecendo o aspecto relacional da Trindade. Sob este olhar, cada pessoa da Trindade tem a sua
função e utilidade na economia da salvação, mas desde uma perspectiva que não consegue sintetizar
as relações entre cada uma das pessoas. E, no canto contrário, nos encontramos hoje com uma
experiência de fé relegada à vida pessoal, resposta ao discurso hegemônico da secularização. E uma
fé encapsulada tende a parcelar agora a complexidade da vida humana, levando ao crente a
suspender o juízo diante daquilo que não consegue abranger, numa tentativa de respeitar os
múltiplos olhares do mundo atual. Isto conduz a uma falsa compreensão tanto da unidade ao interior
da Trindade como das relações intratrinitárias. A unidade entre as pessoas da Trindade é mútua
dependência e relação em pericorese, e não uma uniformidade ou transcendência inalcançável. Do
mesmo modo, as relações intratrinitárias estão abertas a toda a criação, e não só ao crente individual
ou à comunidade de fé.