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A Antropologia e a Cultura Brasileira

Ruben George Oliven

I colônias, ela encontrava sua razão de ser


no estudo de sociedades indígenas de gru­
D urante m uito tem po, a A ntropologia no pos rurais e, eventualm ente, até de grupos
Brasil m anteve um status relativam ente urbanos identificados com as “cam adas
baixo q uando com parado ao das outras menos favorecidas da população”. O objeto
Ciências Sociais. D o mesmo m odo, os estu­ de estudo eram geralm ente os “ outros”, re­
dos sobre a cultura de diferentes classes tratados com o portadores de um a cultura
sociais brasileiras ocupavam um papel diferente da nossa.
secundário. C om parada a outros tem as, a O s relatos de muitos dos antropólo­
questão cultural parece ter estado até há gos brasileiros que fizeram esse iipo de
pouco relegada a um plano de m enor des­ estudo caracterizavam-se, freqüentem ente,
taque. p o r serem m uito descritivos e pouco preo­
Q uando se observa a situação atual, cons­ cupados em relacionar os fenôm enos obser­
tata-se que o panoram a alterou-se m uito. A vados com fenômenos da mesma natureza
questão cultural está na ordem do. dia e é que ocorriam no resto da sociedade. Este
discutida intensam ente quando se debate a era o cam po de estudo dos sociólogos e
construção de um Brasil dem ocrático e se cientistas políticos, seara fechada aos an tro ­
analisa a participação popular nos destinos pólogos, ou, para usar u m term o m uito
do País. A cham ada N ova República, inau­ caro à A ntropologia, u m tabu.
gurada com o fim do ciclo m ilitar, criou A p artir da década de 50 ocorre um pro­
inclusive u m M inistério da C ultura, e nos cesso que é im portante registrar. Os cien­
últim os anos a A ntropologia desfruta de um tistas sociais latino-americanos em geral, e
alto conceito, havendo quem a considere a brasileiros em particular, com eçaram a ter
ciência social hegem ônica no Brasil. um a crescente preocupação com a proble­
Como e p o r que se operou essa m udan­ m ática do desenvolvim ento econômico e
ça? Explicar esse fenôm eno à luz das m odi­ com propostas que perm itissem superar o
ficações ocorridas na sociedade brasileira é atraso de suas sociedades. O s intelectuais
o objetivo deste artigo. que se ocuparam dessa questão refutaram
as teorias que explicavam o subdesenvolvi­
II m ento em função de supostos traços de
nossa cultura ou de características psicos­
A A ntropologia tem um a longa tradição sociais de nossa população e procuraram
n o Brasil (M elatti, 1984; Corrêa, 1988). form ular interpretações que explicassem
Como em outros países que não possuíam nossa situação a p artir das relações econô-

74 BIB, Rio de Janeiro, n. 27, pp. 74-88, 1.° semestre de 1989


micas e políticas que m antínham os com os “ ( . . . ) inadequação do esquem a con­
países centrais. ceituai dos antropólogos ao estudo de
Começou, então, a haver um a forte rea­ novos problem as em ergentes, m as tam ­
ção contra interpretações culturalistas do bém [nas] dificuldades que encontram
subdesenvolvim ento. Estas ideologias, como, para en ten d er alguns dos problem as
por exemplo, a teoria da m odernização, básicos de seus próprios, velhos e p er­
foram substituídas p o r questões com o a do m anentes cam pos de interesse e de pes­
desenvolvim ento e, m ais tarde, pela tem á­ quisa” .
tica da dependência e da m arginalidade,
enfoques considerados m uito m ais adequa­ A firm ava ele que, naquele m om ento his­
dos p ara in terp re tar as formações sociais tórico,
latino-americanas.
Cresceu, assim, nas Ciências Sociais bra­ “ ( . . . ) nenhum cientista social, que
sileiras, principalm ente na Sociologia, um a apresente um m ínim o de experiência e
tendência que buscava explicações m ais glo- inteligência ao observar as estruturas
balizantes e de caráter histórico, tendência em m udança e as resistências à m udan­
que produziu trabalhos de alto valor expli­ ça na A m érica L atina ( . . . ) poderá p re­
cativo, a ponto de u m historiador salientar tender entender e explicar as pro fu n ­
que esses intelectuais, “em bora não fossem das m udanças em processo nessas so­
historiadores de ofício — e talvez p o r isso ciedades em term os de ‘aculturação’,
mesmo — conseguiram fornecer um a visão ‘transculturação’, ‘enculturação’, ‘con-
integrada da história do Brasil traculturação, ou quaisquer outras fo r­
(M ota, 1975:18). mas equivalentes, tão em voga h á um
Mas o fato de que um grande núm ero quarto de século atrás. D aí a lenta
de cientistas sociais brasileiros ten h a, com em ergência de novas hipóteses de tra ­
razão, rejeitado teorias culturalistas p ara balho, caracterizadas por seu escopo
interpretar o subdesenvolvim ento de seu nitidam ente sociológico, que procuram
país fez com q u e a m aioria deles abando­ realizar a análise científica de processo
nasse o estudo de questões culturais. As­ de desenvolvim ento sem se lim itar à
sim, a rejeição d o culturalism o como fonte crônica epidérm ica de aspectos pito­
legítima de explicação de nosso subdesen­ rescos e secundários deste processo, nos
volvimento levou tam bém à rejeição da cul­ quais o culturalism o se concentrou e
tura como um cam po de estudo legítimo, se esgotou” (Costa Pinto, 1963: 78 e
num processo em que, por assim dizer, o 80).
bebê foi jogado fo ra ju n to com a água do Passado praticam ente u m quarto de sé­
banho (O liven, 1979). culo desde que essas afirmações foram fei­
Essa situação fo i responsável pelo fato tas, tornou-se lugar-comum falar em desen­
de que durante u m longo período de tem po volvimento. E ntretanto, se não há mais sen­
todo aquele que se ocupasse da cultura tido em voltar às explicações culturalistas
fosse, com freqüência, rotulado de conser­ criticadas há um quarto de século pelo refe­
vador. A conseqüência foi um acentuado rido autor, tam bém não é mais possível d ar
historicism o e econom icism o das Ciências conta da situação e da diversidade do Brasil
Sociais brasileiras, esquem a através do qual de hoje som ente em term os de desenvolvi­
a cultura era geralm ente desprezada e com­ mento, dependência etc. A situação, na rea­
parecia como algo pertencente à superes­ lidade, é bem mais complexa e convém
tru tu ra e que p o d eria, p ortanto, ser m eca­ explicitá-la.
nicam ente d ed u zid a a p a rtir d a infra-estru-
tura. rrr
N a m edida em que o culturalism o era Se com pararm os o Brasil de hoje com o
um a corrente m u ito forte na A ntropologia, que era há um quarto de século, constata­
esta começou a ser encarada com o uma remos que mais de dois terços de nossa
ciência conservadora e que não conseguiria população atual é urbana, a m aior parte
d ar conta das transform ações que estavam dos produtos m anufaturados que consum i­
ocorrendo em países com o o Brasil. Assim, mos é produzida dentro de nossas frontei­
escrevendo no com eço da década de 60, um ras e a m aioria de nossa força de trabalho
em inente sociólogo desenvolvim entista bra­ urbana encontra-se no setor terciário. Pos­
sileiro via sérios p ro b lem as não som ente na suímos um a sólida rede de transportes e

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um eficiente sistem a de comunicações (tele­ geiro, está crescentem ente voltado para pro­
fones, telex, correio, satélites etc.) e o nível cessos de produção m odernos, form as de
técnico de nossas redes de comunicação de organização mais “ racionais” e burocráti­
massa é com parável ao das dos países mais cas (no sentido w eberiano) e i-elações de
adiantados. Tem os usinas nucleares, plata­ produção impessoais.
form as m arítim as de petróleo, realizamos O setor inform al, por seu tu rno , é inten­
transplantes cardíacos e contam os com mais sivo em força de trabalho, usando formas
de 65 universidades, várias delas m inistran­ não-capitalistas de produção, e altam ente
do ensino pós-graduado. flexível, estando longe de ser burocrático
E ntretanto, a concentração de renda e de ou “racional” (de novo no sentido w ebe­
propriedade é das mais acentuadas, 25% da riano).
população adulta é analfabeta (e, portanto, N o nível político um processo sem elhan­
até 1985, não tinham direito de votar), as te está ocorrendo. À m edida que a acum u­
taxas de m ortalidade infantil perm anecem lação de capital desenvolve-se, existe um
bastante elevadas e m uitos brasileiros con­ im pulso em direção à eficiência, procedi­
tinuam m orrendo de fome e por falta de mentos legais e burocráticos, regras univer­
atendim ento médico. sais, im pessoalidade etc. Isto pode ser visto
Isto nos traz diretam ente à análise do tipo em setores vitais do sistem a, principalm en­
de capitalism o que está sendo desenvolvido te no funcionam ento de certas áreas do ser­
no Brasil. Como outros países latino-am eri­ viço público e de grandes em presas esta­
canos, nosso país industrializou-se de um tais. Os exemplos seriam as im pressionantes
m odo diferente da m aioria dos países adian­ m elhorias n o setor de com unicações, a com­
tados. Não só nunca ocorreu um a separação petitividade de empresas e fundações p ú ­
radical entre os interesses da oligarquia blicas, o estabelecim ento de um eficiente
rural e os da burguesia industrial, como sistema de cobrança de im posto de renda
tam bém o m odo de produção capitalista etc.
até agora não foi capaz de subordinar intei­ E ntretanto, modos “inform ais” de com­
ram ente a si outros modos de produção. portam ento caracterizaram os governos mi­
E m bora o capitalism o brasileiro tenha, litares e podem ser encontrados em vários
até recentem ente, m ostrado um a natureza aspectos da vida política, a começar pela
bem dinâm ica, ele não é capaz de incorpo­ constante m udança casuística nas regras
ra r ao sistem a produtivo toda a população do processo político, a fim de servir os inte­
urbana em idade de trabalho. Esta massa resses do m om ento. O utros exemplos pode­
de desem pregados e subem pregados vem riam incluir o abuso de poder, a tolerância
form ar a m aior parte do assim cham ado em relação às mais variadas form as de cor­
“ setor inform al” da economia u rb an a, e rupção, as vastas áreas do serviço público
existem evidências sugerindo que ele não altam ente im pregnadas de m orosidade buro­
é com posto som ente por recém-chegados à crática e só passíveis de serem vencidas
cidade, mas tam bém por indivíduos em po­ através de pistolões o u despachantes, a dis­
brecidos de origem urbana. tribuição de favores e apadrinham entos po­
É im portante frisar que esse setor infor­ líticos etc.
m al é criado pelo próprio processo de de­
senvolvim ento capitalista industrial que IV
tam bém cria o setor form al, e que o pri­ Tinham razão os autores que argum enta­
m eiro não é m arginal ao últim o, m as que ram que os traços culturais e psicossociais
ambos fazem parte da mesma dinâm ica de não eram obstáculos a um processo de cres­
acum ulação de capital. cimento econômico. D e fato, o Brasil expe­
A intensificação da acum ulação capita­ rim entou um processo de desenvolvim ento
lista, o btida com crescentes investim entos que é freqüentem ente cham ado de moder­
estrangeiros e com a im portação de tecno­ nização conservadora, em que o tradicional
logia sofisticada e poupadora de mão-de- combínou-se com o m oderno e no qual a
-obra, cria, assim, um a situação peculiar, em m udança articulou-se com a conservação.
que um setor form al e um setor inform al Em verdade, convive no Brasil um a multi­
da econom ia com partilham lado a lado, de plicidade de fenôm enos no cam po e na
um modo inter-relacionado, o mesmo es­ cidade que é fru to de nosso processo de
paço. desenvolvim ento desigual e com binado.
O setor form al, que tende a utilizar téc­ Q uando se exam ina a sociedade brasi­
nicas intensivas em capital e capital estran­ leira, constata-se que ela é altam ente dife­

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renciada e m ultifacetada. Trata-se de uma O “ caso Juruna” eclodiu quando o depu­
sociedade pluricultural e plurinacional. C on­ tado proferiu um discurso num português
vivem num mesmo espaço geográfico índios, arrevesado e afirm ou que “ todos os m inis­
camponeses, bóias-frias, assalariados ru rais, tros de Estado são ladrões” , o que levou
migrantes, operários, assalariados urbanos, estes a quererem processá-lo p o r calúnia e
trabalhadores do setor inform al, classes ofensa à honra. Se ele dom inasse m elhor
médias, industriais, fazendeiros etc. Além os códigos existentes n o m eio parlam entar
disto, como sabem os, o Brasíí é com posto e afirmasse “com enta-se que todos os m i­
por etnias diferentes. N ão só pelas três nistros de Estado são ladrões”, n ad a disso
raças que são apontadas como form ando a provavelm ente teria ocorrido.
nacionalidade, m as tam bém pelos descen­
dentes de im igrantes europeus e asiáticos V
que aqui aportaram no século passado e
neste. Apesar de falarem o português, eles O episódio Juruna, além de servir para
têm, freqüentem ente, ouíros idiom as como dram atizar a questão das diferenças no
língua m aterna. Brasil, nos rem ete a um a reflexão sobre
Recentemente, Fry (1982) m ostrou que, nossa identidade nacional e a dificuldade
num bairro rural distante não mais de 150 em aceitar a diversidade cultural.
quilômetros da cidade de São Paulo fala-se, O pensam ento d a nossa intelectualidade
além do português, uma “língua” de origem tem oscilado n o que diz respeito a essas
africana que pode ser vista como um sinal questões (O liven, 1982). Assim, em certos
diacrítico desta com unidade. Do mesmo momentos, nossa cu ltu ra é profundam ente
modo, é significativo que, p ara realizar o desvalorizada p o r nossas elites, tom ando-se,
filme Os M uckers, sobre u m a revolta mes­ em seu lugar, a cu ltu ra européia ou norte-
siânica de im igrantes alemães ocorrida de -americana com o m odelo. Como reação, em
1868 a 1898 no Estado do Rio G rande do outros mom entos, nota-se que certas m ani­
Sul, seu diretor tenha decidido fazer os festações da cultura brasileira passam a ser
personagens falarem num dialeto alemão profundam ente valorizadas, exaltando-se
(que é usado ainda hoje na região) e co­ símbolos populares.
locou legendas em português, apesar do A mesma oscilação pode ser verificada
filme desenrolar-se no Brasil e ser finan­ no que diz respeito à questão de decidir
ciado pela Em brafilm e, a em presa estatal quem são os produtores válidos d a cultura
criada para fom entar o cinem a brasileiro. brasileira e, em últim a análise, de deter­
Assim como existem diferentes regiões no m inar o q u e é cultura. Uma prim eira pers­
Brasil com peculiaridades bastante m arca­ pectiva tende a considerar com o cultura
brasileira tão-somente aquelas manifestações
das e cuja vitalidade a. nível cultural cum ­
intelectuais e artísticas da elite. U ma pers­
pre ressaltar, nunca é demais lem brar que
pectiva pretensam ente alternativa tende a
existem tam bém aproxim adam ente duzentas valorizar as manifestações culturais das
nações indígenas n o País que falam línguas classes populares com o as verdadeiras raí­
próprias e que lutam p o r m anter suas terras zes de nossa nacionalidade. Mas essa valo­
e sua identidade cultural. rização é feita sob um a ótica nostálgica e
Neste sentido, o cham ado “caso Ju ru n a” freqüentem ente ufanista. Assim, parte de
é altam ente esclarecedor. Trata-se d e um nossa intelectualidade apressa-se a “defen­
episódio envolvendo um cacique xavante d e r” a cultura popular dos ataques q u e o
que se elegeu deputado federal em 1982, progresso estaria lhe desferindo, adotando
em nom e da causa indígena, porém com u m a postura paternalista e essencialmente
os votos d a população do Estado do Rio museológica.
de Janeiro — já que índios, enquanto anal­ Em verdade, o que se percebe é que,
fabetos, não tin h am direitos eleitorais na­ no prim eiro tipo de colocação, proclama-se
quela época. A o assumir seu m andato na a existência de um a C ultura Brasileira com
Câmara dos D eputados, o índio-deputado “c” m aiúsculo que, em bora produzida por
manifestou seu desejo de expressar-se na apenas um grupo social restrito, seria váli­
sua língua m aterna, o xavante, falado no da p ara toda a nação; inversam ente, no
Brasil m uito antes do português. M as, ao segundo tipo de colocação, erige-se um a
contrário de outros países onde se perm ite imagem cristalizada das m anifestações cul­
o uso de mais de um a língua, a Mesa da turais que nossas classes dom inadas teriam
Câmara não deu a autorização necessária. desenvolvido no passado.

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O que essas perspectivas não conseguem O efeito dessa proposta é a tentativa de
perceber é a dinâm ica existente entre as sugerir um ethos brasileiro, que seria único
classes sociais no processo de produção e intraduzível. Assim como nos orgulhamos
cultural. Assim, em certos m om entos, o que da im possibilidade de traduzir a palavra
é considerado cultura brasileira é a apro­ saudade, nos orgulharíam os tam bém de
priação e reelaboração, p o r parte de nossas nossas características igualm ente impossíveis
classes dom inantes, de traços culturais ge­ de serem captadas pelos estrangeiros: o jei-
rados nas m etrópoles, tidos com o os únicos tinho, o galho quebrado, a m alandragem , a
dignos de serem adotados pelas elites. O sacanagem , a m alícia, o dengue, a sensua­
processo inverso é representado pela valo­ lidade, a inzona etc. Enfim , o Brasil não
rização daquilo que seria m ais autentica­ seria passível de redução a categorias ra ­
m ente brasileiro, o que pode ser detectado cionais porque nos trópicos a razão se d er­
desde o século passado. rete e todos se m isturam gostosamente
Q uando se analisam as ideologias do ca­ num a grande loucura.
ráter nacional brasileiro, pode-se observar É revelador que nas diferentes variantes
a elaboração de dois modelos básicos cons­ desses dois m odelos de construção de iden­
truídos a p artir de um a questão com um . A tidade o que se desenvolve é um tipo que
suposição eurocêntrica de que seria impos­ tem mais conotação de nacionalidade e /o u
sível construir um a civilização nos trópicos raça do que de classes. É nesta perspectiva
é tom ada com o um desafio a ser vencido. que se encontram soluções com o a figura
A prim eira solução consiste em apostar do “caxias” , M acunaím a (nosso herói sem
na seriedade do brasileiro e afirm ar que, nenhum caráter), o homem cordial, o m a­
havendo esforço e líderes, é possível fazer landro e a idéia tão bem captada por
vingar um a civilização nestas terras. Esta O sw ald de A ndrade de que no Brasil, dife­
vertente é sim bolizada pelo m undo da rentem ente da E uropa, o contrário do bur­
“ordem e progresso” e vai encontrar seu guês não seria o proletário, m as o boêmio.
desenvolvim ento na imagem do “ caxias”, Sim ultaneam ente à form ação dessas duas
do “ povo ordeiro” e, m ais recentem ente, imagens, percebe-se tam bém um processo
do “este é um país que vai pra frente” e através do qual manifestações culturais que
do “vamos trabalhar p ara vencer a crise”. estavam inicialm ente restritas a certos
Tal visão perpassa nossa história recente e grupos sociais são apropriadas por parte
é apresentada constantem ente por um a do resto da sociedade e transform adas em
parte de nossas classes dom inantes e inte­ símbolos nacionais, assum indo, assim, um
lectuais a seu serviço com o a verdadeira caráter de identidade brasileira (Oliven,
imagem dó Brasil. 1983).
A solução pretensam ente alternativa ao Procurando desvendar as articulações
desafio de construir um a civilização nos entre o que tradicionalm ente é cham ado de
trópicos, em bora seja aparentem ente menos cultura popular e o que tradicionalm ente
rígida, é tão ideológica quanto a prim eira é cham ado de cultura dom inante, poder-
e apresenta a outra face da mesma m oeda. se-ia lançar como hipótese a existência de
De uma m aneira caricata, segue o seguinte pelo menos dois tipos de movimentos
raciocínio: sabem os que o velho Freud ensi­ opostos.
nava que a civilização e a cultura são O prim eiro ocorre quando as classes do­
frutos da repressão, e que u m personagem minantes apropriam -se, reelaboram e, pos­
de Dostoievski afirm ava que se Deus não teriorm ente, transform am em símbolos na­
existe, íudo é perm itido. O corre, com o todo cionais m anifestações culturais originalmen­
m undo sabe, que Deus é brasileiro, e se te restritas às cam adas populares e "que, fre­
não existe pecado do lado debaixo do Equa­ qüentem ente, eram reprim idas pelo Estado.
dor, é preciso perguntar que tipo de cul­ O segundo m ovim ento percorre um a tra­
tura pode haver no Patropi, pois não exis­ jetória inversa e ocorre quando as classes
tindo pecado não h á o que reprim ir. populares apropriam -se, reelaboram e, pos­
A resposta a esse dilema é que aqui só teriorm ente, transform am em símbolos na­
é possível um tipo m uito especial de cul­ cionais m anifestações culturais originalm en­
tura, já que as categorias racionais não fun­ te restritas às camadas dom inantes e que,
cionariam nos trópicos. A imagem que é freqüentem ente, lhes conferiam um a m arca
proposta é a de um a cultura tropical com de distinção.
características totalm ente diferentes das de O que há de comum a am bos os movi­
outros países. mentos é a apropriação de expressões espe­

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cíficas a certos grupos e sua recodificação brasileira (O liven, 1984a). Ele surge mais
e introdução em um outro circuito no qual intensam ente na década de 30, quando há
esses elem entos são dotados de novo signi­ uma intensificação da industrialização no
ficado e, portanto, utilizados de form a a Brasil, e se expressa como um a recusa ao
afetar seu significado original. N a verdade, trabalho assalariado, num a época em que
esse processo de ressem antização envolve este ainda não recobria todo o espaço social
um grau de com plexidade bem m aior do no País. D urante a ditadura do Estado
que pode parecer à prim eira vista, já que, Novo (1937-45), o governo reprim iu essa
além da relação entre a cultura po p u lar e tem ática m usical e incentivou — através de
a cultura hegemônica, incluí tam bém a prêm ios — os com positores a enaltecerem
intervenção do Estado e a ação dos meios o valor do trabalho. M as, apesar de te r se
de com unicação de massa. tornado cada vez mais difícil sobreviver
Dessa m aneira, alguns de nossos m ais sem trabalhar no Brasil, a m alandragem
“ autênticos” símbolos nacionais têm origem acabou tornando-se um símbolo nacional e
em manifestações culturais que eram origi­ passou a significar um a atitude diante da
nalm ente restritas às cam adas populares e vida.
que, freqüentem ente, eram reprim idas pelo Se tom arm os a trajetória inversa dos p ro ­
Estado. cessos até agora analisados, verem os que
Por exem plo, a feijoada era inicialm ente, pelo menos duas de nossas mais “ autênti­
tanto nos Estados Unidos como no Brasil, cas” manifestações populares têm origem
um alim ento de escravos, que utilizavam em nossas elites. Assim, o carnaval, que é
as sobras de porco desprezadas por seus um de nossos rituais nacionais (D a M atta,
senhores. M as, en quanto nos Estados Unidos 1973 e 1979), não foi trazido ao Brasil
continua sendo com ida de negros (soul por escravos e posteriorm ente adotado por
food), no Brasil ela é um p rato nacional outros segmentos da população, mas veio
(Fry, 1982). com os prim eiros colonizadores sob a form a
Do mesmo m odo, o candom blé era, no do entrudo, tendo assim se conservado, sem
início, um a religião de negros, em que as sofrer m aiores modificações, até aproxim a­
divindades africanas eram disfarçadas atra­ dam ente meados do século passado.
vés da fachada de santos católicos e cuja A p artir dessa época, o desenvolvim ento
p rática era, então, reprim ida pela polícia. de um estilo de vida burguês europeu em
E ntretanto, desde o final do século passado algumas cidades, em decorrência do rápido
até nossos dias, o candom blé sofreu um a enriquecim ento trazido pela cafeicultura,
série de transform ações que im plicaram a deu origem ao carnaval “veneziano” , que
gradativa aceitação e absorção dos terrei­ im plicou o aparecim ento de form as de d i­
ros mais tradicionais pela cultura de massa, vertim ento restritas a diferentes camadas
pelo turism o, por parte da Igreja Católica sociais. Em bora todas as cam adas sociais
e por vários intelectuais. De form a seme­ promovessem seus bailes de m áscaras em
lhante, a um banda, que pode ser conside­ recintos fechados, a form a socialm ente mais
rad a um a síntese do pensam ento religioso aceita de desfile era o corso. A través dele,
brasileiro, na m edida em que incorpora as famílias m a is'ric a s exibiam suas fan ta­
elem entos africanos, católicos e espíritas sias em veículos para serem assistidas e
kardecistas, consolidou-se na sociedade bra­ aplaudidas pelo resto da população. Por
sileira quando um a liderança com posta por seu turno, os ranchos, os cordões e blocos
intelectuais de classe m édia codificou seus eram freqüentem ente proibidos e persegui­
ritos e a tornou menos “selvagem” (O rtiz, dos pela polícia e acabaram por ser expul­
1978). sos do centro das cidades, localizando-se
Igualm ente, o sam ba, outro “ legítim o” nos bairros mais periféricos, onde to rn a­
símbolo da cultura brasileira, era, n o come­ ram-se m odos típicos das classes populares
ço, produzido e consum ido nos “ m orros” brincarem o carnaval (Pereira de Q ueiroz,
do Rio de Janeiro e reprim ido com violên­ 1980).
cia pela polícia. Foi com a crescente im por­ A p artir.d a década de 30 surge um a nova
tância do carnaval que o sam ba passou a fase p ara o carnaval brasileiro, que começa
ser consum ido pelo resto da população e a sentir a influência das transform ações
transform ou-se na música brasileira por sociais e econôm icas e do surgim ento de
excelência. novos meios de com unicação de massa
O mesmo pode ser dito a respeito do (inicialm ente o rádio e depois a televisão):
tem a da m alandragem na música popular o carnaval “ veneziano” começa a desapa­

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recer rapidam ente, perm anecendo apenas os de 1970 foi utilizada pelo governo, que
bailes à fantasia. No Rio de Janeiro, os procurou associá-la ao “milagre econôm ico”.
cortejos de blocos e ranchos crescem em Os processos que acabam de ser anali­
im portância, dando origem às escolas de sados tornam-se mais complexos à m edida
sam ba, que passam a se constituir na forma que cresce a atuação dos m eios de com u­
predom inante de desfile, form ando um nicação de massa e do Estado relativam ente
padrão que tende a se reproduzir na maio­ à cultura.
ria das grandes cidades. No que diz respeito aos m eios de com u­
As décadas seguintes m ostram que, com nicação de m assa, é im portante analisar
o desenvolvim ento da indústria cultural e com o se dá, p o r exem plo, na televisão, o
do turism o, o carnaval popular sofre um processo de apropriação e reelaboração cul­
processo sem elhante ao já ocorrido em re­ tural. Seria tam bém im portante perguntar
lação ao sam ba: passa a ser com erciali­ o que ocorre com as culturas regionais
zado e transform ado em m ercadoria que é através da ação dos m eios de com unicação
veiculada pelos meios de comunicação, de massa. O qué significa, p o r exem plo,
em especial a televisão, que o apresentam a transform ação, via rádio e televisão, de
como símbolo de identidade nacional. As­ cantores nordestinos em cantores nacio­
sim, apesar de terem se apropriado do car­ nais?
naval, as classes dom inadas tiveram , por No começo da década de 60 o regiona­
seu turno, o seu carnaval reapropriado e lismo, especialm ente o nordestino, era visto
transform ado em artigo de consum o e tu ­ como um dos temas mais candentes da
rismo e em símbolo de identidade nacional nacionalidade. T al tem ática, contudo, logo
(Simson, 1981). seria ap ropriada pelo Estado e os meios
Um processo sem elhante ocorreu em re­ de com unicação, através de um a m anipu­
lação ao futebol, que foi trazido ao Brasil lação que a transform a em assunto trivial
no final do século passado por jovens de e anódino, criando program as q u e procuram
famílias abastadas que foram estudar na valorizar “ aquilo que é nosso”. Em alguns
Inglaterra. Inicialm ente, o futebol estava program as, patrocinados pelo E stado, isto
restrito às cam adas superiores das grandes significa não só divulgar m úsicas d o fol­
cidades brasileiras e era disputado sob clore de algum a região brasileira com o algo
form a am adora em competições assistidas que precisa ser lem brado e valorizado, mas
pela “n a ta ” da sociedade. tam bém atender à solicitação de um ouvin­
E ntretanto, a p artir do final da década te que deseja ouvir um a m úsica de algum
de 20 o significado do futebol alterou-se. cantor “pop u lar” . Pois, nesta proposta, o
A consolidação de um a sociedade urbano- Brasil seria justam ente esse painel caleidos­
-industrial no Brasil e a ascensão das mas­ cópico de m anifestações regionais (apresen­
sas ao cenário político reflete-se no futebol, tadas de um m odo museológico e tendendo
que adquire u m crescente aspecto de espe­ para o exótico e turístico) que precisam
táculo de m assas executado p o r jogadores ser conhecidas e valorizadas ju n to com as
profissionais provindos de cam adas popu­ criações produzidas nos grandes centros e
que são divulgadas nas m ais distantes áreas
lares, freqüentem ente negros, que nele viam
do País com o form a de m odernidade e inte­
um a possibilidade de ascensão social.
gração.
A tualm ente, apesar de ser u m esporte O papel do Estado brasileiro em relação
extrem am ente popular, n o nível profissio­ à cu ltu ra é complexo: ele não é apenas o
nal o futebol envolve grandes somas de agente de repressão e de censura, m as tam ­
dinheiro. O fato de alguns jogadores serem bém o incentivador d a produção cu ltu ral e,
m uito bem rem unerados faz com que o acima de tudo, o criador de um a imagem
futebol continue representando o sonho de integrada do Brasil, que ten ta se apropriar
m uitos elem entos das classes populares de do m onopólio da m em ória nacional.
ascenderem socialm ente e presta-se à difu­ O Estado evoca a si o p apel de m anter
são de um a im agem de “ dem ocracia racial”. acesa a cham a da m em ória nacional e , por
Por ser, hoje, um esporte popular entre conseguinte, transform a-se no criador e
todas as classes sociais, o futebol pode ser bastião da identidade nacional. O fato de
m anipulado como um poderoso símbolo de este mesmo Estado p erm itir a crescente des­
unidade nacional e coesão social e racial. nacionalização de nossa econom ia n ã o é
Isto ficou claro com o modo pelo qual a assumido como contraditório, já que essas
vitória brasileira no cam peonato m undial duas questões são propostas como desvin-

80
culadas. É im portante lem brar que são jus­ p o r Deus e bonito p o r n atu reza” . A letra
tam ente grandes em presas estrangeiras como da música retrata, em senso com um , um a
a Shell e a X erox que fazem a defesa de forma de representar o Brasil. M as sem
nosso folclore em suas publicidades. querer discordar de tão poética m etáfora,
É nisto que consiste a tentativa de subs­ o mínim o que se poderia dizer é que grande
tituir um m odelo fundam entalm ente basea­ parte do território nacional está fo ra dos
do na coerção p o r u m m odelo ancorado na trópicos. De m odo sem elhante, m uitas
hegem onia, que funcionaria basicam ente em outras coisas ficam de lado nas descrições
termos de m anipular símbolos nacionais. tradicionais do Brasil. Consideramo-nos o
Neste sentido, é im portante pensar o que m aior país católico do m undo, no qual se
significa, em term os de hegem onia, a ten­ falaria um a única língua e no qual o sam ba
dência de ap ro p riar, recodificar e transfor­ e o carnaval do Rio de Janeiro seriam a
m ar m anifestações culturais, inicialm ente expressão da nacionalidade. O fato de estar
restritas a certos grupos, em sím bolos na­ havendo um processo crescente de urb an i­
cionais. Poder-se-ia argum entar que é justa­ zação e um a integração das redes de com u­
m ente n o processo de apropriação de m ani­ nicação de m assa seria responsável pela
festações culturais e sua subseqüente trans­ acentuação do processo de homogeneização
form ação em sím bolos de identidade nacio­ cultural, ap rofundando ainda mais a uni­
nal que reside u m a das peculiaridades da formização dos hábitos e atitudes da p opu­
dinâm ica cultural brasileira. Não é que o lação.
fenôm eno não ocorra em outras culturas (o G ostaria de argum entar que essa form a
jazz nos Estados Unidos e o tango na A r­ de descrever as coisas é apenas um a das
gentina são exem plos típicos), m as ele p are­ representações da realidade, e, com o tal,
ce ser m uito m ais intenso no Brasil. é um a construção social. Ela não corres­
O que se observa na cultura brasileira ponde, entretan to , com o vim os, aos fatos.
é um fenôm eno m uito peculiar. Em vários A sociedade brasileira está, n o m om ento,
países desenvolvidos e de tradição dem o­ em penhada em reconstruir um a ordem de­
crática as diferenças sociais foram consi­ mocrática e dim inuir as desigualdades
deravelm ente reduzidas e o acesso aos bene­ sociais e econômicas. C ontudo, a dificul­
fícios econômicos e aos direitos civis, am ­ dade em aceitar a diversidade cultural faz
pliado. E ntretanto, freqüentem ente, as fro n ­ com que, freqüentem ente, o term o dem o­
teiras culturais continuam bem dem arcadas, cracia seja entendido com o sinônim o de
o que ocorre tan to em sociedades relativa­ consenso e hom ogeneidade. N o desejo de
m ente novas com o a norte-am ericana (onde, elim inar as desigualdades sociais e econô­
micas, acabam os p o r desconsiderar as dife­
apesar de ter acontecido com o jazz um
renças culturais e as diferenças de n atu ­
fenôm eno parecido com o da feijoada b ra­
reza política. E esta postura, como nos ensi­
sileira, as fronteiras étnicas continuam bem
na a experiência histórica, é um cam inho
delim itadas), q u an to em sociedades mais
seguro em direção ao totalitarism o.
antigas com o a inglesa (onde as diferenças
D o mesmo m odo, hegem onia, com fre­
sociais transparecem inclusive em nível de
qüência, é entendida com o sinônim o de u n i­
sotaque, p ara não m encionar a questão da
form ização, aproxim ando-se quase de seu
nacionalidade).
antônim o, que é a coerção. Q ualquer que
Em nenhum a dessas sociedades existe a seja, entretanto, a definição de hegem onia,
crença n um ethos próprio originado a p a r­ ela certam ente é o contrário de padroni­
tir de um processo de apropriação e reela- zação e im plica a existência de u m a classe
boração de sím bolos culturais. O que pa­ ou grupo que consiga, através de sua lide­
rece caracterizar o Brasil é justam ente o rança política e m oral, articular as dife­
fato de ser um a sociedade de im ensas renças existentes.
diferenças sociais e econômicas n a qual N essa sucessão de mal-entendidos sobre
verifica-se um a tendência de transform ar a dem ocracia, esta acaba freqüentem ente
manifestações culturais em sím bolos de coe­ sendo mais u m a evocação do que u m a prá­
são social, que são m anipulados como tica efetiva. O im portante passa a ser a
form as d s identidade nacional. alusão ao term o, já que em um mom ento
de lu ta a eficácia é considerada mais rele­
VI vante que a dem ocracia, que acaba tendo
sem pre que esperar pelo dia que virá. Isto
Uma canção pop u lar brasileira descreve term ina levando a u m autoritarism o no co­
o Brasil com o “ um país tropical, abençoado tidiano e a u m a concepção de democracia

81
como um a referência ao futuro. A expe­ único movim ento fem inino que conhecia
riência histórica nos mostra, novam ente, era o dos quadris. O corre que, com as
que a dem ocracia, para vingar, tem de ser m udanças sociais e econôm icas e com o
tecida nas células, com o prática d o dia-a- crescente ingresso de m ulheres na força
-dia, sob pena de não passar dc um a evo­ de trabalho e em atividades que antes eram
cação que não terá lugar senão n o dia que restritas aos hom ens, elas estão se organi­
virá. zando e form ulando suas reivindicações, a
É justam ente com a lu ta pela dem ocra­ exem plo do que ocorre em outros países.
cia e com o processo de “ab ertu ra” polí­ Os movimentos fem inistas colocam em
tica que m arcaram o fim do ciclo m ilitar questão a própria sexualidade, tem a que é
que a cultura passou a ganhar m aior visi­ tam bém focado pelos grupos e m ovimentos
bilidade no Brasil. Novas questões come­ homossexuais, que até h á pouco não tinham
çaram a vir à tona e m ovim entos populares com o se organizar num país de tradição
com eçaram a se organizar. Vários destes m achista, em que qualquer desvio do que é
m ovim entos estão mais preocupados com considerado o paradigm a heterossexual
questões freqüentem ente consideradas locais tende a ser estigm atizado. As tentativas de
e menores, m as não obstante fundam entais, os grupos hom ossexuais se organizarem são
do que com as grandes tem áticas tradicio­ tam bém extrem am ente recentes e certam en­
nais. te mexem com as representações sobre
O que se observa atualm ente n o Brasil sexualidade existentes no País.
é um intenso processo de constituição de N este sentido, é interessante 1er os depoi­
novos atores políticos e de construção de m entos de pessoas que participaram de
novas identidades sociais. Elas incluem a m ovim entos de guerrilhas no Brasil d u ran ­
identidade etária (representada, por exem­ te as décadas de 60 e 70 e constatar que,
plo, pelos jovens enquanto categoria social), mesmo em m ovim entos que propunham
a identidade sexual (representada pelos m udanças radicais na sociedade brasileira,
m ovim entos fem inistas e pelos homosse­ a questão do prazer era reprim ida no coti­
xuais), as identidades religiosas (represen­ diano de seus mem bros, que tendiam a vê-la
tadas pelo crescim ento das cham adas reli­ como algo que desviava energias da ativi­
giões populares), as identidades regionais dade revolucionária (G abeira, 1979). Um
(representadas pelo ressurgim ento das cul­ dos m ais destacados guerrilheiros brasileiros
turas regionais no Brasil), as identidades causou furor e n tre a esquerda tradicional
étnicas (representadas pelos m ovimentos ao voltar do exílio, após a anistia de 1979,
negros e pela crescente organização das e declarar que não estava disposto a esperar
sociedades indígenas) etc. que ocorresse um a revolução p ara te r direi­
N a m edida em que identidades são for­ to a atingir u m orgasmo. u
m uladas em oposição ou contraste a outras É revelador quer, no Brasil, o discurso
identidades, o que se busca são justam ente m usculino sobre os afetos se dê, de form a
as diferenças. Assim, a construção dessas pública, praticam ente só na música. Esta é
identidades passa pela elaboração de traços a instância privilegiada em que o hom em
da cu ltu ra brasileira que são apropriados brasileiro fala de si, de suas alegrias, de
e usados como sinais diacríticos, isto é, suas tristezas, de suas esperanças e, princi­
sinais que conferem um a m arca de distin­ palm ente, de seus sentim entos em relação
ção aos vários grupos. à m ulher (O liven, 1987).
O que se verifica atualm ente n o Brasil É tam bém na m úsica que aparece a pro­
é, em últim a análise, a redescoberta das blem ática do trabalho en quanto oposto ao
diferenças. Esse processo não se dá a p artir prazer. U m tem a recorrente da m úsica de
dos intelectuais, mas a p artir dos m ovim en­ m alandragem , que cresceu a p artir da déca­
tos sociais. P o r isto, a té recentem ente, da de 1930, quando a industrialização se
várias dessas questões eram consideradas intensifica, é justam ente a dificuldade de
não-problem áticas p o r m uitos intelectuais conciliar o trab alh o com o p razer (Oliven,
brasileiros. 1984a).
Assim, p o r exemplo, até há pouco tem po N o Brasil, a m úsica desem penha um
praticam ente não se falava na existência de papel central não só no dia-a-dia, m as tam ­
um a questão fem inina. Q uando começaram bém em nossos grandes rituais nacionais
a surgir m ovim entos feministas, um conhe­ (o carnaval, o D ia da P átria, as procissões).
cido hum orista brasileiro, refletindo talvez T alvez seja por isto que a m úsica brasileira
o senso com um , chegou a afirm ar q u e o é tão variada (apesar do estereótipo de que

82
no Brasil só há sam ba), tão rica e popular defender seus territórios e fazer o Estado
neste país q u e é um dos m aiores m ercados cum prir sua obrigação de dem arcá-los, em
consum idores de m úsica do m undo. face da am eaça constante d e invasão que
Falar em m úsica significa falar em jovens, elas sofrem (Santos, 1982).
que são os grandes consum idores de m úsi­
ca e os particip an tes dos vários festivais e V II
shoivs que ocorrem pelo País afora. Mas,
até recentem ente, não se falava em jovens É interessante observar q u e boa parte
no Brasil, ap esar de elés serem visíveis em dos cientistas sociais brasileiros, nas últim as
inúm eras m anifestações culturais e políti­ décadas, ficaram relativam ente indiferentes
cas. Se agora se fala mais neles, o mesmo a essa efervescência cultural. Sua preocupa­
ainda não acontece com os velhos, possi­ ção girava, em boa parte, em torno dos
velm ente p o rq u e a m aioria da população grandes tem as, como o desenvolvim ento, o
m orre cedo neste país. Estado, a luta de classes etc. Como reação
N o que diz respeito a m udanças na área ao culturalism o enquanto m odo (equivoca­
religiosa, é de se assinalar o im pressionante do) de explicar nosso subdesenvolvim ento,
crescim ento das cham adas religiões p opula­ a cultura ficou reduzida a um segundo
res, p rincipalm ente a U m banda e o Pente- plano. Ela era vista, então, o u com o retra­
costalismo. A recente agonia e m orte do tada no grande plano das ideologias da
presidente eleito T ancredo Neves eviden­ cultura brasileira e do caráter nacional bra­
ciou, mais um a vez, u m a intensa religiosi­ sileiro, ou, inversam ente, com o algo que
d ade da p o pulação brasileira. Esta religio­ pudesse ser deduzido m ecanicam ente da
sidade obviam ente não é só católica. infra-estrutura, num a estran h a dialética
Q uanto à afirm ação de identidades regio­ onde não havia lugar p a ra contradições.
nais, desde 1930 verifica-se no Brasil um Assim, nossas expressões cu lturais seriam
processo de crescente centralização econô­ ou exóticas m anifestações d a alm a nacio­
mica, política e adm inistrativa, com a con­ nal, ou não passariam de “ ópio do p ovo” .
seqüente u n ificação do País e o enfraque­ A conseqüência desse acentuado histori­
cim ento dos poderes regional e estadual. cismo e econom icism o das Ciências Sociais
Este processo persiste até nossos dias e brasileiras foi responsável n ão só por privi­
acentua-se a p a rtir de 1964, quando tem legiar certos tem as, com o p o r considerar
lugar u m a m aior integração do mercado outros como secundários, senão irrelevan­
nacional e a im plantação de redes de estra­ tes, enquanto objeto de estudo. Isto fez
das, de telefonia, de com unicação d e massa com que um a série de m anifestações cul­
etc. Com estas m edidas, o poder das regiões turais fossem desconsideradas, apesar de
e dos Estados enfraqueceu-se mais ainda. sua visibilidade e adesão popular.
E ntretanto, apesar — ou talvez p o r causa Uma das esferas mais privilegiadas foi a
— dessa crescente centralização, observam- do trabalho, especialm ente o fab ril, e os
-se hoje, n o Brasil, tendências contrárias a processos d e conscientização social que
ela, que se m anifestam através da ênfase dele decorreriam . Essa preocupação é com­
na necessidade de um verdadeiro federa­ preensível se considerarm os que o Brasil
lismo, da proclam ação das vantagens de experim entou um intenso processo de indus­
um a descentralização adm inistrativa, do trialização a p a rtir de 1930. N a m edida em
clam or p o r u m a reform a trib u tária que que no início desta industrialização boa
entregue m ais recursos p ara os Estados e
parte dos operários tinha origem ru ra l, a
m unicípios, e da afirm ação de identidades
tem ática da urbanização ganhou im portân­
regionais e estaduais que salientam suas
diferenças em relação ao resto do Brasil. cia. Assim, a indústria e a cidade passa­
E ntre essas identidades regionais está não ram a ser vistas como agentes de m udança
som ente a do N ordeste, mas tam bém a do e condições necessárias ao desenvolvim en­
Rio G rande do Sul, estado no qual está to. Esta preocupação, quando levada ao
havendo u m ressurgim ento da cu ltu ra gaú­ exagero, fez com que tudo aquilo q u e não
cha (Q liven, 1984b). se encaixasse num a lin h a de “ desenvolvi­
É im portante tam bém lem brar a reorga­ m ento” fosse encarado com o atraso, num a
nização de m ovim entos negros (Borges Pe­ perspectiva m uito sem elhante às “ sobrevi-
reira, 1983; Seyferth, 1983). De form a seme­ vências cu ltu rais” que os antropólogos evo-
lhante, cabe ressaltar a crescente organiza­ lucionistas do século passado viam nos
ção das sociedades indígenas, que procuram fenôm enos que não se en quadravam nos

83
seus esquem as, e que M alinow ski soube através dos quais a cham ada realidade b ra
bem criticar. sileira se desdobra diante dela m esm a” (Da
Como entram nesse quadro os antropó- M atta, 1979, p. 35). O estudo destes rituais
iogos brasileiros? Por form ação, eles se es­ perm iíe ap reender com o os brasileiros re­
pecializaram no estudo da cultura que, em presentam sua sociedade e com o dram ati­
sociedades simples, é praticam ente sinônim o zam suas contradições.
de sociedade. A lguns desses antropólogos, O mesmo vale, possivelm ente, p ara o
depois de se dedicarem aos objetos trad i­ futebol; mas apesar da im ensa populari­
cionais de pesquisa da A ntropologia, pas­ dade deste esporte, quase não existem pes­
saram a se interessar pelos aspectos cultu ­ quisas sobre ele. Os incipientes estudos
rais dos segm entos mais complexos da so­ antropológicos sobre o futebol (Soares, 1975
ciedade em que vivem , procurando aplicar e 1979; Neves, 1979; A raújo, 1982; Da
os m étodos e preocupações antropológicas M atta, Neves, G uedes e Vogeí, 1982} indi­
ao que estavam estudando. cam que, à sem elhança do que Geertz
Eles com eçaram , cada vez m ais, a se dar (1975) m ostrou em relação às rinhas de
conta que várias de suas preocupações em galos em Bali, esta pode ser um a form a de
relação às sociedades simples constituíam -se, ajudar a lançar luz sobre a cultura brasi­
tam bém , num cam inho fundam ental para leira.
a compreensão da dinâm ica do que ocorre Assim como o futebol, a telenovela é um
nas regiões urbano-industriais do Brasil. A fenôm eno que m obiliza literalm ente milhões
questão das m anifestações culturais de di­ de pessoas no Brasil. Surpreende, entre­
ferentes grupos sociais despontava, neste tanto, a quase inexistência de estudos sobre
sentido, com o u m rico e praticam ente inex­ este gênero no Brasil. Um a das raras pes­
plorado cam po de investigação social, já quisas sobre o tem a (Leal, 1983), um estu­
que a tendência predom inante nas Ciências do antropológico que com para telespecta­
Sociais era a de explicações totalizantes, dores de classes populares com os de clas­
nas quais havia pouco lugar p ara a proble­ ses m édia e alta, m ostrou que a “ leitura
m ática da vida cotidiana de diferentes clas­ social” da telenovela varia de acordo com
ses sociais envolvidas nos processos histó­ o grupo considerado, cujos m em bros ten­
ricos analisados pelas interpretações glo­ dem a reelaborar as m ensagens veiculadas.
bais. A classe média, aliás, tem sido pouco
Na m edida em que a form ação dos antro­ estudada pelos cientistas sociais brasilei­
pólogos tende a enfatizar a não-separação ros. Eles têm se voltado m uito mais para
das esferas de vida e a perceber o que o cam pesinato, o operariado e os em presá­
M auss cham ou de fatos sociais totais, os rios, e tendido a considerar a classe média
antropólogos conseguiram m ostrar que é como não sendo um a classe social no sen­
possível estudar a sociedade brasileira a tido estrito do term o. E studos antropológi­
partir de espaços ainda não pesquisados. cos (Velho, 1981), entretan to , têm m ostra­
D o mesmo m odo, a preocupação d e com­ d o a im portância d o e stu d o das camadas
preender e se colocar no lugar do “ o u tro ”, médias urbanas, e com o elas perm item uma
que tam bém faz parte da form ação dos reflexão sobre a fam ília, o parentesco e a
antropólogos e que é responsável pelo cul­ noção de pessoa e indivíduo no Brasil.
tivo de um estranham ento diante dos fenô­ O estudo d a fam ília e do indivíduo im pli­
menos observados em outras culturas, foi ca o estudo da m ulher, área na qual tem
transposta com m uito sucesso pelos antro­ havido um a série de estudos feitos p o r an­
pólogos brasileiros ao estudarem processos tropólogos brasileiros (Franchetto, Caval­
que fazem parte de seu cotidiano. E stra­ canti e H eilborn, 1981), preocupados com
nhar o fam iliar tem se revelado u m bom a divisão de papéis sexuais e com a con­
cam inho p ara entender a sociedade brasi­ dição fem inina em nossa sociedade. Estes
leira. estudos estão interessados em analisar como
De fato, representações sobre a sociedade é construída a identidade fem inina no Brasil
brasileira podem , com freqüência, ser ob­ a p artir de como se dá a oposição entre o
servadas em esferas até há pouco despre­ público e o privado, dom ínios associados
zadas. Foi isto que os nossos antropólogos respectivam ente ao m undo masculino e
começaram a fazer. Assim, por exem plo, os feminino.
grandes rituais nacionais do Brasil (o car­ É claro que a construção da identidade
naval, a p arad a do D ia da P átria e as pro­ fem inina é perpassada pela estrutura de
cissões religiosas) são “modos fundam entais classes existentes n o Brâsil. N este sentido,

84
um a das preocupações de antropólogos b ra­ entre este processo e urbanização. A im­
sileiros é com parar a fam ília das classes pressionante expansão de religiões popula­
alta e m édia com a das classes populares res como a U m banda e o Pentecostalism o
(Corrêa, 1982; D urham , 1980) e entender (Fry e H ow e, 1975) justam ente nas cida­
a im portância do parentesco no Brasil de des mais industrializadas do Brasil rep re­
hoje (A breu Filho, 1982). senta um exem plo da com plexidade do fe­
A A ntropologia tem , aliás, se ocupado nômeno. Um a religião com o a U m banda,
m uito dos m odos de vida das classes popu­ que tem crescido não som ente en tre as
lares. Isto aparece tanto em pesquisas sobre classes baixas, m as tam bém entre as médias,
o trabalho, através do estudo de cam pone­ surge e é m ais forte justam ente n o Sudeste
ses (Soares, 1981), m igrantes (Menezes, brasileiro, a região mais urbanizada e indus­
1976), m ineiros (Eckert, 1985), operários trializada do País, estando concentrada nas
(Lopes, 1978; M acedo, 1979), com o em pes­ grandes cidades. Trata-se, p ortanto, de um a
quisas sobre a cu ltu ra popular (A rantes, religião essencialm ente urbana (O rtiz, 1978).
1982; Brandão, 1981; M agnani, 1982; D o mesmo m odo, cum pre lem brar que
O rtiz, 1980). nas Ciências Sociais existe toda um a cor­
O estudo de culturas populares tem sido rente de pensam ento — inspirada, em sua
um a preocupação central das pesquisas vertente m ais conservadora, em teorias
antropológicas. N ão se trata de estudos como a da Escola de Chicago, e, em suas
que procuram analisar estas form as cultu­ vertentes mais “ progressistas”, em teorias
rais enquanto entidades autônom as, mas com o o da indústria cultural da Escola de
como fazendo parte de um a sociedade cada F rankfurt — que postula que a form ação
vez mais com plexa onde há um a constante de um a sociedade urbano-industrial tende­
interação entre a cultura popular e os meios ria a destruir, nos m igrantes e habitantes
de com unicação de massa e onde há um a de cidades, suas raízes e tradições cultu­
articulação entre o que é cham ado de tra­ rais, im pondo-lhes um a cu ltu ra padronizada
dicional e o que é cham ado de m oderno. pelos meios de com unicação de m assa, que
N este sentido, é interessante constatar seriam responsáveis por um processo de
que a realidade brasileira tende a refu tar homogeneização de com portam entos, valo­
as proposições que p arte da literatu ra sobre res, práticas e orientações.
urbanização aponta com o conseqüência da O que se observa, en tretanto, é que a
vida u rb an a. Por serem seus pressupostos dinâm ica cultural, em cidades com o as b ra­
teóricos, equivocados, as proposições destes sileiras, é bem m ais com plexa (Oliven,
autores sobre as conseqüências da vida 1980), havendo u m a rica articulação entre
urbana têm sido refutadas por pesquisas expressões da cu ltu ra popular e da indús­
de cientistas sociais que estudaram a reali­ tria cultural.
dade brasileira, provavelm ente p o rq u e a A cidade de São Paulo, centro da econo­
industrialização deste país se desenvolveu m ia brasileira, é um exemplo revelador
de m aneira diversa da das sociedades cen­ neste sentido. Além das m anifestações dos
trais. As pesquisas têm dem onstrado que meios de com unicação de m assa, a cidade
m uitas das proposições das teorias sobre os é fortem ente im pregnada p o r manifestações
efeitos da urbanização, bem com o da mo­ da cu ltu ra pop u lar e pela influência regio­
dernização, não se confirm am nas cidades nal dos nordestinos que p ara lá m igraram .
do Brasil, país de desenvolvim ento capita­ P rova disto é a existência de m ais de d u ­
lista tardio e dependente, onde o “ tradi­ zentos circos, a grande m aioria circos-teatros
cional” se articula com o “ m oderno” e no que estabelecem u m intrincado relaciona­
qual o desenvolvim ento se dá sob forma m ento com os meios de com unicação de
desigual e com binada. massa (M agnani, 1984).
Assim, p o r exemplo, no que diz respeito
à religiosidade, a secularização, que é fre­ V III
qüentem ente apontada como um a conse­
qüência inevitável da urbanização, é um Sabemos que inúm eros autores argum en­
processo m uito mais complexo do que pa­ taram que u m a sociedade com plexa, apesar
rece à prim eira vista. A inserção de popu­ da heterogeneidade de sua estru tu ra social,
lações em relações capitalistas provavel­ tende a hom ogeneizar seus m em bros do
m ente tenderá a causar mudanças religio­ ponío de vista cultural, o que seria positivo
sas, mas estas não necessariam ente signifi­ ou negativo, dependendo do ponto de vista
cam secularização, nem existe um a relação considerado. A questão, entretanto, não é

85
tão simples. N a verdade, os mem bros de de novos atores e na construção de novas
um a sociedade complexa partilham de um identidades sociais. Começou, assim, um
patrim ônio cultural comum mas têm , por processo de redescoberta das diferenças.
sua vez, inúm eras diferenças derivadas de Na m edida em que a form ação antropo­
vivências próprias. D iferentes concepções e lógica faz com que se procure entender e
visões de m undo convivem nu ma socieda­ respeitar as diferenças dentro de um a pers­
de deste tipo. Nestas sociedades, nas quais pectiva de diversidade cultural, boa parte
a noção de indivíduo é central, há um a dos antropólogos lançou-se com sucesso a
constante negociação de identidades sociais. procurar aplicar suas teorias e m étodos de
Na m edida em que identidades não cons­ análise ao estudo de sua própria sociedade.
truídas em oposição ou contraste a outras Se nos lem brarm os da intensidade com
identidades, elas são form uladas a p artir que a sociedade brasileira está se comple-
de diferenças. Isto nos traz de volta à nos­ xificando, fica claro que o estudo das p rá­
sa questão inicial. ticas e orientações culturais de diferentes
Este artigo com eçou a p artir da consta­ grupos sociais é um cam po privilegiado no
tação da m udança do síatus da A ntropo­ qual se refletem e através do qual são me­
logia e da questão cultural nas Ciências diadas suas contradições. Por isto, os fenô­
Sociais brasileiras. Procurou-se m o strar que, menos que têm sido pesquisados p o r antro­
com o recente processo de dem ocratização pólogos brasileiros constituem-se em elemen­
do Brasil, a cultura passou a ganhar m aior tos de fundam ental im portância p ara a
visibilidade, principalm ente na constituição compreensão do Brasil de nossos dias.

Bibliografia Citada

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