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Ano 2016

SÉRIES NUMÉRICAS - SOMAS NÃO ORDENADAS


Professor Oswaldo Rio Branco de Oliveira
http://www.ime.usp.br/~oliveira oliveira@ime.usp.br

Capı́tulo 1 - Séries.

1.1 Introdução...............................................................................................3
1.2 Elementos e motivações (séries de Taylor)...................................................5
1.3 Critérios da Comparação...........................................................................14
1.4 Testes da Raiz e da Razão.........................................................................18
1.5 Critério da Integral....................................................................................27
1.6 Critério de Raabe......................................................................................31
1.7 Série Binomial Real....................................................................................36
1.8 Série Telescópica, Critérios de Dirichlet e Abel.............................................39
1.9 Critério (Leibniz) para Série Alternada........................................................41
1.10 Fórmulas para o lim inf e para o lim sup.....................................................45
1.11 Representação Decimal..............................................................................46

Capı́tulo 2 - Séries, Comutatividade e Associatividade.

2.1 O Exemplo de Dirichlet...............................................................................51


2.2 Séries absolutamente convergentes e comutatividade....................................52
2.1 Associatividade e séries................................................................................57
2.2 Teorema de Riemann...................................................................................59
Capı́tulo 3 - Somas não ordenadas X Séries. Associatividade.

3.1 Introdução..................................................................................................61
3.2 Somas não ordenadas X Séries......................................................................62
3.3 Associatividade............................................................................................69
3.4 Soma de uma sequência dupla. Produto de séries...........................................73
3.5 A exponencial complexa e as funções trigonométricas.....................................78
3.6 Teoremas de Mertens e Abel para o produto de séries.......................................84
3.7 Soma de Cesaro............................................................................................87

Capı́tulo 4 - Somas não ordenadas (arbitrárias) e Associatividade.

4.1 Associatividade.............................................................................................89
4.2 A equivalência das noções de somabilidade.....................................................94

Bibliografia..........................................................................................................97
Capı́tulo 1

SERIES

1.1 - Introdução

Talvez o mais antigo e famoso argumento envolvendo um somatório infinito


seja o paradoxo “Dicotomia”, de Zenão de Eléia (entre 490 e 485 - c. 430 a.C.),
“Um corredor nunca pode chegar ao fim
de uma corrida pois antes de chegar
ao fim, ele precisa chegar ao meio.
Depois, ao meio do que falta
e assim sucessivamente ad infinitum”.

Atualmente, interpretamos tal paradoxo como o cômputo do somatório dos


termos de uma progressão geométrica infinita de razão

r=
1
2
e, é claro, tal soma é 1. Isto é,

+ + + ⋯ = 1.
1 1 1
2 4 8
Porém, para Zenão um somatório infinito não poderia ter soma finita.

Quase um século após Zenão, Eudoxo (408-355? a.C.) utilizou somatórios


infinitos e computou áreas e volumes (método da exaustão).

3
Somatórios infinitos enumeráveis são a base do cálculo integral e surgem
também com a fórmula de Taylor

f ′′ (x0 ) f ′′′ (x0 )


f (x0 ) + f ′ (x0 )(x − x0 ) + (x − x0 )2 + (x − x0 )3 + ⋯
2! 3!
e outros processos de aproximação.

Tendo definido uma forma de somar, dada uma sequência investigaremos se


é possı́vel atibuir a ela um valor (a soma da série) e veremos que com frequência
não seremos capazes de responder qual é este valor.

O axioma/propriedade do supremo é a ferramenta teórica a indicar a soma


de uma série de termos positivos. Na prática, comparamos a série com uma série
geométrica para decidir se existe ou não a soma da série. Séries de números reais
que apresentam termos positivos e termos negativos requerem, em geral, cuidados
extras e para estas mostraremos uns poucos critérios e o Teorema de Riemann1 .

Apresentamos também uma seção dedicada à importante representação deci-


mal de um número real.

Séries de números complexos são redutı́veis a duas séries de números reais.

Neste texto apresentaremos também a importante série binomial complexa.


Entretanto, um estudo mais geral das importantes Séries de Potências Complexas
requer um curso mais especı́fico.

As séries condicionalmente convergentes e as séries absolutamente convergen-


tes são analisadas mais detidamente no segundo e último capı́tulo (Somas Não
Ordenadas).

Este material também não contém um estudo das importantes Séries de Fou-
rier (séries de funções trigonométricas).

1
G. F. B. Riemann (1826-1866) criou a geometria depois utilizada na fı́sica relativı́stica.

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Oswaldo Rio Branco de Oliveira

1.2 - Elementos

Consideremos uma sequência (an )N , real ou complexa.


A série de termo geral an [ou série gerada pela sequência (an )N , também de-
notada (an )] é o par ordenado

((an ), (sn )),

com (sn ) = (sn )N a sequência das somas parciais de (an ) e

s n = a0 + ⋯ + an

a soma parcial de ordem n da série. [Destaquemos que explicitamos como somar


os termos da sequência (an ).]
Tal série é dita convergente se (sn ) converge a um número (em R ou C) e

s = lim sn (se existir o limite)

é a soma da série indicada por


+∞
s = ∑ an .
n=0

A série é dita divergente se a sequência (sn ) é divergente. Neste caso, dizemos


que a soma da série não existe.
Abusando da notação, denotamos uma série arbitrária ((an ), (sn )) por
+∞
∑ an .
n=0

Se a série ∑+∞
n=0 an converge, escrevemos
+∞
∑ an < ∞.
n=0

Ainda, dado p em N, definimos a série ∑+∞


n=p an como

+∞ +∞
∑ an = ∑ bn , onde bn = 0, se n < p, e bn = an se n ≥ p.
n=p n=0

Para investigar a convergência de ∑+∞


n=0 an podemos ignorar qualquer quanti-

dade finita de seus termos pois temos

sn = sp + ∑ am , para todo n > p,


n

m=p+1

5
e é claro que existe lim sn se e somente se existe
m=n
lim
n→+∞
∑ am .
m=p+1

Isto é, a série ∑+∞


n=0 an converge se e somente se a série ∑n=p+1 an converge. Se uma
+∞

destas converge, temos


+∞ +∞
∑ an = s p + ∑ an .
n=0 n=p+1

Uma série complexa ∑+∞ n=0 zn converge se e somente se suas partes real e imaginária,

n=0 Re(zn ) e ∑n=0 Im(zn ), convergem e então segue


dadas pelas séries reais ∑+∞ +∞

+∞ +∞ +∞
∑ zn = ∑ Re(zn ) + i ∑ Im(zn ).
n=0 n=0 n=0

Teorema. Suponhamos an ≥ 0, para todo n ∈ N. Então, a série


+∞
∑ an
n=1

é convergente se e somente se a sequência das somas parciais sn = a1 + ⋯ + an é


uma sequência limitada.
Prova. Imediata aplicação do Axioma/Propriedade do Supremo ♣

Corolário (Critério da comparação para séries de termos positivos).


Suponhamos 0 ≤ an ≤ bn para todo n ∈ N. Se a série ∑+∞
n=0 bn é convergente, então

a série ∑n=0 an é convergente.


+∞

Prova. Segue diretamente do teorema acima ♣

Proposição (Propriedades de linearidade). Sejam ∑+∞ n=0 zn e ∑n=0 wn duas


+∞

séries convergentes de números complexos e seja λ um número complexo. Então,


n=0 (zn + wn ) e ∑n=0 λzn são convergentes e satisfazem
as séries ∑+∞ +∞

+∞ +∞ +∞ +∞ +∞
∑ (zn + wn ) = ∑ zn + ∑ wn e ∑ (λzn ) = λ ∑ zn .
n=0 n=0 n=0 n=0 n=0

Prova. Exercı́cio (segue das propriedades de linearidade para limites de sequências).

6
Oswaldo Rio Branco de Oliveira

Proposição (Critério do termo geral). Seja ∑+∞


n=0 an uma série (real ou com-

plexa) convergente. Então,


lim an = 0.
n→+∞
Prova.
É óbvio que sn+1 − sn = an . Por hipótese, existe a (em R ou C) tal que

lim sn = a.
n→+∞

É fácil ver que lim sn+1 = a. Segue então


n→+∞

lim an = lim (sn+1 − sn ) = lim sn+1 − lim sn = a − a = 0 ♣


n→+∞ n→+∞ n→+∞ n→+∞

Recordemos. Uma sequência (an ) é de Cauchy se dado ǫ > 0 existe n0 tal que

∣an − am ∣ < ǫ, para quaisquer n, m ≥ n0 .

Proposição (Critério de Cauchy para séries). Seja ∑+∞ n=0 an uma série em

C. Tal série converge se e somente se para todo ǫ > 0 existe n0 ∈ N tal que temos

∣an+1 + an+2 + ⋯ + an+p ∣ < ǫ, para quaisquer N > n0 e p ∈ N.

Prova. Seja sn a n-ésima soma parcial da série dada.


É evidente a identidade ∣an+1 + an+2 + ⋯ + an+p ∣ = ∣sn+p − sn ∣. Logo, a série
dada satisfaz a desigualdade desejada se e só se (sn ) é de Cauchy.
Uma sequência em R é convergente se e só se ela é de Cauchy. [Vide
http://www.ime.usp.br/~oliveira/MAT1352-IF-Supremo-2016.pdf.]
Por extensão, uma sequência em C é convergente se e só se ela é de Cauchy.
Portanto, são equivalentes: ∑+∞ n=0 an satisfaz a desigualdade desejada, a

n=0 an converge ♣
sequência (sn ) é de Cauchy, (sn ) converge e a série ∑+∞
Definições. A série ∑+∞
n=0 an , em C, é

n=0 ∣an ∣ < ∞.


○ absolutamente convergente se ∑+∞

n=0 an converge mas ∑n=0 ∣an ∣ = ∞.


○ condicionalmente convergente se ∑+∞ +∞

Logo mais veremos que as séries absolutamente convergentes convergem e


estudaremos o exemplo clássico de série condicionalmente convergente. A saber,
+∞
(−1)n
∑ (série harmônica alternada).
n=1 n

7
Exemplo 1. Temos que
+∞
∑ sin ( ) diverge pois lim sin ( ) ≠ 0.
nπ nπ
n=0 2 n→+∞ 2

Exemplo (Série Geométrica). A série geométrica



∑ z n = 1 + z + z 2 + z 3 + ⋯, onde z ∈ C,
n=0

satisfaz
+∞
∑ zn = , se ∣ z∣ < 1 , e diverge se ∣ z∣ ≥ 1.
1
n=0 1−z
Prova.

Pela fórmula para a soma de uma progressão geométrica finita temos,


1 − z n+1
1 + z + z2 + ⋯ + zn = , se z ≠ 1 ,
1−z
e já vimos que lim z n+1 = 0, se ∣z∣ < 1. Logo,
n→+∞

+∞
1 − z n+1
∑ z n = n→+∞
lim (1 + z + z 2 + ⋯ + z n ) = lim = , se ∣z∣ < 1.
1
n=0
n→+∞ 1−z 1−z

Se ∣z∣ ≥ 1 temos lim z n ≠ 0 e, pelo critério do termo geral, a série diverge ♣


n→+∞

Exemplo 2. A Figura abaixo, ilustra geométricamente a série geométrica e real


+∞
∑ rn , com 0 < r < 1.
n=0

Se θ é o ângulo indicado, por semelhança de triângulos temos


1 + r + ⋯ + rn + ⋯
= = = ⋯ = = ⋯.
1 r rn
1 1 − r r − r2 rn − rn+1
θ

1 r
r2 r3 r4
1
1 r r2 r3 r4 1−r

Figura 1.1: Série Geométrica de Razão 0 < r < 1.

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Oswaldo Rio Branco de Oliveira

Várias das funções usualmente estudadas apresentam um desenvolvimente em


séries. Vejamos algumas delas

Definição. A série de Taylor2 de uma função f ∶ (a, b) → R infinitamente


derivável (que indicamos f ∈ C ∞ ) em torno de um ponto x0 , calculada em um
ponto x, é
+∞
f (n) (x0 )
∑ (x − x0 )n .
n=0 n!

A série de Taylor de f avaliada em x pode convergir ou não ao valor f (x) e


pode até mesmo divergir.

O polinômio de Taylor de ordem n de f em torno de x0 é

f (2) (x0 ) f (n) (x0 )


Pn (x) = f (x0 ) + f (1) (x0 )(x − x0 ) + (x − x0 )2 + ⋯ + (x − x0 )n .
2! n!
O erro cometido ao aproximarmos f (x) por Pn (x) é

Rn (x) = f (x) − Pn (x).

A série de Taylor de f no ponto x converge a f (x) se e somente se

lim Rn (x) = 0.
n→+∞

Neste texto utilizamos as fórmulas de Taylor com resto infinitesimal, integral, de


Cauchy e de Lagrange. Tais fórmulas estão apresentadas em
http://www.ime.usp.br/~oliveira/ELE-FORMULATAYLOR.pdf

Definição. A série de Maclaurin3 de uma função f ∶ (−r, r) → R, com r > 0 e


f ∈ C ∞ , é a série de Taylor de f em torno do ponto x = 0.

2
B. Taylor (1715). Tal série já era conhecida pelo escocês J. Gregory (1638-1675) e, na Índia,
antes de 1550.
3
O escocês C. Maclaurin (1698-1746), em 1742. Alguns matemáticos a anteciparam e Gre-
gory já as conhecia para tan x, sec x, arcsec x e arctan x, vide Exemplo sobre a função arco
tangente. Clio, a musa da história, é com frequência caprichosa ao batizar teoremas.

9
Exemplos 3 (As séries de Taylor-Maclaurin para as funções exponencial
real, seno real e cosseno real). Seguem as séries de Maclaurin das funções
reais ex , sen x e cos x.

(a) Pela que já estudamos sobre a função exponencial real segue
+∞
ex = ∑ , para todo x ∈ R.
xn
n=0 n!

(b) Pela fórmula de Taylor com resto de Lagrange para a função sen x na origem
temos, fixado x ∈ R,

sen x = sen(0) +sen′ (0)x +sen′′ (0) +⋯+ sen(k) (0) + sen(k+1) (x)
x2 xk xk+1
(k + 1)!
,
2! k!

para algum x entre 0 e x. É claro que senn(2n) (x) = (−1)n sen x e também
sen(2n+1) (x) = (−1)n cos x e assim, sen(2n) (0) = 0 e sen(2n+1) (0) = (−1)n .
Ainda mais, é óbvio que

∣ x∣k+1
∣ sen(k+1) (x) ∣≤
xk+1
(k + 1)! (k + 1)!

sendo que temos


∣ x ∣ k+1
→ 0 se k → +∞.
(k + 1)!
Logo,
+∞
sen(x) = x − + − + ⋯ + (−1)n + ⋯ = ∑ (−1)n
x3 x5 x7 x2n+1 x2n+1
(2n + 1)! (2n + 1)!
.
3! 5! 7! n=0

(c) Similarmente a (b) temos





⎪ cos(2n) x = (−1)n cos x, cos(2n+1) x = (−1)n+1 sin x,







⎪ (2n) 0 = (−1)n e cos(2n+1) 0 = 0.
⎩ cos
Logo,
+∞
cos(x) = 1 − + + ⋯ + (−1)n + ⋯ = ∑ (−1)n ♣
x2 x4 x2n x2n
2! 4! (2n)! n=0 (2n)!

10
Oswaldo Rio Branco de Oliveira

Exemplo 4 (A série harmônica). A série harmônica


+∞

1
n=1 n

diverge4 . Verifique.

Exemplo 5 (Série harmônica generalizada). A série harmônica generalizada


+∞

1
p
,
n=1 n

converge se p > 1 e diverge se p ≤ 1.

Prova.

Fixo p > 1, se s2n −1 é a (2n − 1)-ésima soma parcial da série temos

s2n −1 = 1 + ( + ) + ( + + + )
1 1 1 1 1 1
2p 3p 4p 5p 6p 7p

+⋯ + [ + +⋯+ n ]
1 1 1
(2n−1 )p (2n−1 + 1)p (2 − 1)p

< 1+ + + ⋯ +
2 4 2n−1
2p 4p (2n−1 )p

= ∑( ) <
n−1 m
1 1
p−1 , para todo n.
1 − ( 12 )
2 p−1
m=0

Sendo assim, como


+∞

1
p
n=1 n

é uma série de termos positivos, a sua sequência (sn ) das somas parciais é
limitada e portanto a série converge. Desta forma, se p ≤ 1 temos


m m
∑ ∑
1 1
p
n=1 n n=1 n

e portanto a série dada diverge.

4
N. Oresme (1323?-1382), parisiense e bispo católico, provou este resultado em 1350, um
grande feito à época.

11
Exemplo 6 (Série para logaritmo e a série harmônica alternada). Mostre-
mos a convergência da série para a função ln x, chamada série de Mercator(1668)5 ,
e a convergência condicional da série harmônica alternada, dadas por

ln(1 + x) = x − + − + + ⋯ + (−1)n + ⋯ , −1 < x ≤ 1, e


x2 x3 x4 x5 xn+1
2 3 4 5 n+1

=1− + − + + ⋯ + (−1)n + ⋯.
1 1 1 1 1
n+1
ln 2
2 3 4 5
Prova.

Vale a progressão geométrica


1 − (−t)n+1
1 − t + t2 − t3 + ⋯ + (−t)n = , com t ≠ −1.
1+t
Destacando 1/(1 + t) e integrando obtemos, para cada x ∈ (−1, 1],
x (−t)n+1
ln(1+x) = ∫ dt = x− + − +⋯+(−1)n +∫
x 1 x2 x3 x4 xn+1
1+t n+1 1+t
dt.
0 2 3 4 0

◇ Caso x ∈ [0, 1]. Para 0 ≤ t ≤ x ≤ 1 (vide figura) temos 1 ≤ 1 + t.

0 t x 1
Figura 1.2: A disposição 0 ≤ t ≤ x ≤ 1.
Donde concluı́mos
(−t)n+1
∣∫ dt∣ ≤ ∫ tn+1 dt = ≤
xn+2 1
ÐÐÐ→ 0.
x x n→+∞
0 1+t 0 n+2 n+2

◇ Caso x ∈ (−1, 0). Para −1 < x ≤ t ≤ 0 (vide figura),

−1 x t 0
Figura 1.3: A disposição −1 < x ≤ t ≤ 0.
encontramos
0 < 1 + x ≤ 1 + t ≤ 1, 1≤ ≤
1 1
1+t 1+x
e então

RRR x R
RRR (−t)n+1 RRRR 1 ∣ x∣n+2
0

dtRRR ≤ ∣ (−t) ∣ = ≤ ÐÐÐ→ 0 ♣


1 1
RRR ∫ ∫
n→+∞
RRR 1 + x
n+1
1+t 1+x n+2 (1 + x)(n + 2)
dt
RR 0
R R x

5
O danês N. Mercator (1620-1687), que desenhou as fontes de Versailles. Pietro Mengoli
(1625-1686), também danês e um dos principais precursores do estudo de séries infinitas, obteve
o mesmo resultado e chamou de logaritmo natural os valores determinados por tal série.

12
Oswaldo Rio Branco de Oliveira

Exemplos 7 (Série para arco tangente e a série de Leibniz). Mostremos


a convergência da série para arctan x, dita série de Gregory(1671)6 e da série de
Leibniz, dadas respectivamente por

arctan x = x − + − + ⋯ + (−1)n + ⋯, ∣ x∣ ≤ 1 ,
x3 x5 x7 x2n+1
3 5 7 2n + 1

= 1 − + − + + ⋯ + (−1)n+1 + ⋯.
π 1 1 1 1 1
2n + 1
(Leibniz)
4 3 5 7 9
Prova.

Similarmente ao último exemplo acima, integrando

= − + + ⋯ + (−1) + (−1) , com t ∈ R,


1 2(n+1)
2 4 n 2n n+1 t
1 + t2 1 + t2
1 t t t

encontramos

arctan(x) = x− + − +⋯+(−1)n + (−1)n+1 ∫ dt, x ∈ R.


x3 x5 x7 x2n+1 x t2(n+1)

3 5 7 2n + 1 0 1 + t2

Concluı́mos então mostrando que para ∣x∣ ≤ 1 a parcela contendo a integral


na equação acima tende a zero se n → +∞.
De fato, obtemos

∣(−1)n+1 ∫ dt ∣ ≤ ∣∫ t2(n+1) dt∣ ≤ ∣ ∣ ≤ ÐÐÐ→ 0 ♣


x t2(n+1) x x2n+3 1 n→+∞
0 1 + t2 0 2n + 3 2n + 3

Observação. A série de Leibniz converge condicionalmente pois, claramente,


1 1
2n − 1 2n
e, utilizando o Exemplo acima temos
+∞
1 +∞ 1
= ∑ = +∞.
1

n=1 2n 2 n=1 n

6
Gregory foi o introdutor do termo convergência e deduziu a série de Leibniz antes que este.

13
1.3 - Critérios da Comparação

Dado z ∈ C, temos

0 ≤ max(∣Re(z)∣, ∣Im(z)∣) ≤ ∣z∣ ≤ ∣Re(z)∣ + ∣Im(z)∣).

Teorema. Toda série ∑+∞


n=0 zn (em C) absolutamente convergente é convergente.

Prova.

◇ A série complexa dada origina duas séries em R. A saber,


+∞ +∞
∑ Re(zn ) e ∑ Im(zn ).
n=0 n=0

Logo, a série dada converge absolutamente se e somente se sua parte real


e sua parte imaginária convergem absolutamente [devido às desigualdades
max(∣Re(zn )∣, ∣Im(zn )∣) ≤ ∣zn ∣ ≤ ∣Re(zn )∣ + ∣Im(zn )∣]. Portanto, sem perda
de generalidade podemos supor a série em R.
Consideremos então uma série ∑+∞ n=0 ∣an ∣ < +∞, com cada an ∈ R. Temos

0 ≤ an +∣an ∣ ≤ 2∣an ∣ e então, como a série ∑+∞n=0 2∣an ∣ converge, pelo critério da

n=0 (an +∣an ∣) converge.


comparação segue que a série de números positivos ∑+∞
n=0 (−∣an ∣) é convergente, concluı́mos que a série
Portanto, como a série ∑+∞
+∞ +∞ +∞
∑ an = ∑ (an + ∣an ∣) + ∑ (−∣an ∣)
n=0 n=0 n=0

também converge ♣

Seguem resultados que desde o Critério da Comparação abaixo até os Critérios


da Razão e da Raiz, não dependem da relação de ordem em R e sim da função
módulo e, portanto, valem em C.

Proposição (Critério da Comparação). Sejam ∑+∞ n=0 an e ∑n=0 bn séries em


+∞

C. Se existem c > 0 e n0 ∈ N tais que ∣an ∣ ≤ c ∣bn ∣, para todo n > n0 , e ∑+∞
n=0 ∣bn ∣ < ∞

então temos
+∞
∑ ∣an ∣ < ∞.
n=0

Prova. Segue do critério de comparação para séries de termos positivos e das


propriedades de linearidade♣

14
Oswaldo Rio Branco de Oliveira

Exemplo 8. A série
+∞
1 1
∑ sin
n=1 n n
é convergente.

Prova.

Pela conhecida desigualdade

∣ sin θ∣ ≤ ∣θ∣, para todo θ ∈ R,

segue
∣ sin ∣ ≤ 2 , para todo n ∈ N.
1 1 1
n n n
Pelo Exemplo 5 segue
+∞
∑ 2 < ∞.
1
n=1 n

Então, pelo Critério da Comparação, e como convergência absoluta implica


em convergência, concluı́mos que a série dada converge ♣

Exemplo 9. Temos,
+∞
= +∞.
1

n=2 ln n

Prova.

Como
+∞
en = ∑ ≥ n, para todo n ∈ N,
np
p=0 p !

computando o logaritmo natural nos dois lados desta inequação obtemos

ln n ≤ n e ≥ , para todo n ∈ N.
1 1
ln n n
Mas, pelo Exemplo 4 a série harmônica diverge. Isto é,
+∞
= +∞
1

n=1 n

e assim a série dada diverge ♣

15
O critério que segue guarda semelhanças com o critério da comparação (para
séries quaisquer) que acabamos de mostrar. Entretanto, é útil enunciá-lo à parte.

Proposição (Critério da Comparação no Limite). Sejam


+∞ +∞
∑ an e ∑ bn , com cada bn ≠ 0,
n=0 n=0

séries complexas satisfazendo

∣an ∣
= L ∈ [0, +∞].
∣bn ∣
lim
n→+∞

Então, vale o que segue.

(a) Se L = 0 e ∑+∞
n=0 ∣bn ∣ converge, então ∑n=0 ∣an ∣ converge.
+∞

n=0 ∣an ∣ converge se, e só se, ∑n=0 ∣bn ∣ converge.


(b) Se 0 < L < +∞, então ∑+∞ +∞

(c) Se L = +∞ e ∑+∞
n=0 ∣bn ∣ diverge, então ∑n=0 ∣an ∣ diverge.
+∞

Prova.

(a) Se L = 0, então existe n0 ∈ N tal que temos ∣an ∣ ≤ ∣bn ∣ para todo n ≥ n0 .
Logo,
∞ ∞
∑ ∣an ∣ ≤ ∑ ∣bn ∣ < +∞.
n=n0 n=n0

(b) Neste caso, existe n0 tal que para todo n ≥ n0 temos

∣bn ∣ ≤ ∣an ∣ ≤ ∣bn ∣.


L 3L
2 2
A tese segue então do critério da comparação para séries de termos positivos.

(c) Existe n0 ∈ N tal que para todo n ≥ n0 temos ∣an ∣ ≥ ∣bn ∣. Logo,
+∞ +∞
∑ ∣an ∣ ≥ ∑ ∣bn ∣ = +∞ ♣
n=0 n=0

16
Oswaldo Rio Branco de Oliveira

Exemplo 10. Temos,


+∞
13n3 + 2n − 3
∑ < ∞.
n=1 n + 4n − 3n + 20
7 5 2

Prova.

Como a série
+∞
1
∑ 4
n=1 n

é convergente (já mostramos) e


13n3 +2n−3
n4 (13n3 + 2n − 3) 13 + n22 − n33
n7 +4n5 −3n2 +20
= lim 7 = lim = 13 ,
n→+∞ n + 4n5 − 3n2 + 20 n→+∞ 1 + 42 − 35 + 207
lim 1
n→+∞
n4 n n n

pelo Critério da Comparação no Limite segue que a série dada, de termos


positivos, é convergente ♣


Exemplo 11. A sequência ( n n) satisfaz

lim n
n = 1.
n→+∞

Prova. Exercı́cio ♣

Exemplo 12. Temos,


+∞
√ = +∞.
1

n=1 n n
n

Prova.

Pelo Exemplo 11 segue


1

= lim √ = 1.
nn n 1
lim 1
n→+∞
n
n→+∞ n
n

Já vimos que a série harmônica diverge. Isto é,


+∞
= +∞.
1

n=1 n

Logo, pelo Critério da Comparação no Limite, a série dada diverge ♣

17
1.4 - Testes da Raiz e da Razão

Já vimos que toda sequência real tem uma subsequência monótona. Assim,
admitindo −∞ e +∞ como valores para limites, toda sequência tem uma sub-
sequência convergente na reta estendida [−∞, +∞] = R ∪ {−∞, +∞}.

Definições e Notações. Consideremos uma sequência real (xn ).


○ Um valor L ∈ [−∞, +∞] é um valor de aderência de (xn ) se existe uma
subsequência (xnk ) que converge a L (na reta ou em [−∞, +∞]).

○ Seja L = {L ∈ [−∞, +∞] ∶ L é valor de aderência de (xn )}. Denotemos

lim inf xn = inf L e lim sup xn = sup L.


Propriedades. Seja (xn ) uma sequência real. Não é difı́cil ver os fatos abaixo.
◇ Se (xnk ) é uma subsequência convergente a L ∈ [−∞, +∞], então

lim inf xn ≤ L ≤ lim sup xn .

◇ A sequência real (xn ) converge a um valor L na reta estendida [−∞, +∞]


se e somente se L é o único valor de aderência de (xn ). Isto é,

lim xn = L ⇐⇒ lim inf xn = lim sup xn = L.


n→+∞

◇ O lim sup xn e o lim inf xn são ambos valores de aderência de (xn ). Assim,
lim sup xn é o maior valor de aderência de xn e, por outro lado, lim inf xn
é o menor valor de aderência de xn .

◇ Suponhamos lim sup xn real. Então, dado ǫ > 0 existe N tal que temos

xn < lim sup xn + ǫ para todo n ≥ N.

[Caso contrário, existe um valor de aderência de (xn ) que supera lim sup xn .]

O Teste (geral) da Raiz, enunciado abaixo, é também chamado Critério de


Cauchy (1821). Eis o enunciado (traduzido) de Cauchy:
“Ache o limite ou os limites para os quais a expressão (un ) n converge
1

quando n cresce indefinidamente e denote por k o maior destes limites,


ou, em outras palavras, o limite dos maiores valores da dita expressão. A
série será convergente se k < 1 e divergente se k > 1”.

18
Oswaldo Rio Branco de Oliveira

A apresentação dos Testes da Raiz e da Razão inclui duas gerais, que utili-
zam os conceitos lim sup e lim inf. Com frequência, mas não sempre, poderemos
substituir tais limites pelo usual. Abaixo, enfatizamos tais fatos e relacionamos
estes três referidos limites com os dois mencionados testes (gerais e não gerais).

Teorema (Teste da Raiz, geral). Sejam ∑+∞ n=0 an uma série complexa e

lim sup n ∣an ∣ = R ∈ [0, +∞].

(a) Se R < 1, a série dada é absolutamente convergente.

(b) Se R > 1, a série dada é divergente.

(c) Se R = 1, o teste é ineficiente.


Prova.
(a) Seja λ tal que 0 ≤ R < λ < 1. Vide figura.

0 R λ 1

Figura 1.4: A disposição 0 ≤ R < λ < 1



Por definição de lim sup existe n0 tal que se n ≥ n0 então n
∣an ∣ < λ e
+∞ +∞
∑ ∣ an ∣ ≤ ∑ λn < ∞.
n=n0 n=n0

(b) Pela definição de lim sup existe uma subsequência (ank ) satisfazendo

nk
∣ank ∣ > 1, para todo k.

Figura 1.5: A disposição 1 < R


0 1 R

Donde, ∣ank ∣ > 1 se k ∈ N. Logo, lim an ≠ 0 e ∑+∞


n=0 an diverge.

(c) Observemos que


+∞ +∞
1 1
a série harmônica ∑ diverge enquanto a série ∑ 2 converge
n=1 n n=1 n

lim √ = lim √ = 1♣
1 1
e n
n→+∞ n
n n→+∞ n2

Teste da Raiz (simplificado). Suponha lim n ∣an ∣ = R ∈ [0, +∞]. Se R < 1,
n=0 ∣an ∣ converge. Se R > 1, então ∑n=0 an diverge. Se R ∉ {0, 1, ∞},
então ∑+∞ +∞

interpretamos que ∑+∞ n=0 an se comporta como a série geométrica ∑n=0 R .


+∞ n

19
n=0 an em C, com an′ s ≠ 0, sejam
Teorema (Teste da Razão, geral)7 . Dada ∑+∞
∣an+1 ∣ ∣an+1 ∣
r = lim inf e R = lim sup
∣an ∣ ∣an ∣
.

(a) Se R < 1, a série dada é absolutamente convergente.

(b) Se r > 1, a série dada é divergente.

(c) Se r ≤ 1 ≤ R, o teste é ineficiente.

Prova.

(a) Seja λ ∈ R tal que R < λ < 1 (vide figura).

0 R λ 1
Figura 1.6: A disposição R < λ < 1
Pelas propriedades de lim sup, existe n0 tal que para n > n0 temos
∣an+1 ∣
< λ.
∣an ∣
Então, para n > n0 obtemos a desigualdade
∣an ∣ ∣an−1 ∣ ∣an0 +1 ∣
∣an ∣ = ⋯ ∣an0 ∣ ≤ λn−n0 ∣an0 ∣,
∣an−1 ∣ ∣an−2 ∣ ∣an0 ∣
donde segue
+∞
∑ ∣an ∣ < +∞.
n=n0

(b) Existe n0 tal que n ≥ n0 implica (vide figura)


∣an+1 ∣
> 1.
∣an ∣

0 1 r
Figura 1.7: A disposição 1 < r
Donde segue ∣an+1 ∣ ≥ ∣an ∣ ≥ ∣an0 ∣ > 0.

(c) Os exemplos para o Teste da Raiz (geral) servem aqui♣

Teste da Razão (simplificado). Se lim ∣ aan+1 ∣ = ρ ∈ [0, +∞], então r = R = ρ. Se


n=0 ∣an ∣ converge. Se ρ > 1, então ∑n=0 an diverge. Se ρ ∉ {0, 1, +∞},
ρ < 1, então ∑+∞
n
+∞

interpretamos que ∑+∞ n=0 an se comporta como a série geométrica ∑n=0 ρ .


+∞ n

7
Também dito Critério de d’Alembert. Este teste já era conhecido antes de d’Alembert.

20
Oswaldo Rio Branco de Oliveira

Teorema (Comparação entre os limites da razão e da raiz, para sequências).


Seja (xn ) uma sequência limitada em (0, +∞). Temos,
√ √
≤ lim inf n xn ≤ lim sup n xn ≤ lim sup
xn+1 xn+1
lim inf .
xn xn
Em particular,

= L ∈ [0, +∞] então xn = lim
xn+1 xn+1
se lim limn
.
n→+∞ xn n→+∞ n→+∞ xn

Prova.

◇ Basta provar

xn ≤ lim sup
xn+1
lim sup n

xn
pois assim, para a sequência
( )
1
xn n∈N
teremos
lim sup √ ≤ lim sup
1 xn
.
n
xn xn+1
Logo, das identidades

lim sup √ = √ =
1 1 xn 1
e lim sup xn+1
n
xn lim inf xn
n
xn+1 lim inf xn

segue a desigualdade para o lim inf.

◇ Então, é suficiente provarmos que



c > q = lim sup implica lim sup n xn ≤ c.
xn+1
xn
Dado c > q, onde q é o maior valor de aderência da sequência

( ) ,
xn+1
xn N
sabemos que existe p ∈ N tal que

n > p implica ≤ c.
xn+1
xn
Logo, para n > p segue

≤ c, ≤ c , ...., ≤ c.
xp+1 xp+2 xn
xp xp+1 xn−1

21
Multiplicando estas desigualdades membro a membro obtemos

≤ cn−p = p .
xn cn
xp c

Pondo
k=
xp
cp
vemos que k independe de n e, xn ≤ k cn , para todo n > p. Assim, vale a
√ √ √
desigualdade n xn ≤ k c para todo n > p. Portanto, como lim k = 1,
n n

concluı́mos que
√ √ √
xn ≤ lim sup( k c) = lim kc = c ♣
n n
lim sup n

Adendo. Vale então a propriedade

∣an+1 ∣ √
= L ∈ [0, +∞] implica lim n ∣an ∣ = L.
∣an ∣
lim

Logo mais, nesta seção, vemos outra prova deste fato.

Exemplo 13. Consideremos 0 < a < b e a sequência

(xn ) = (a, ab, a2 b, a2 b2 , a3 b2 , a3 b3 , . . .).

Se n é par, encontramos
√ √
= a, xn = (ab) 2 e n xn = ab.
xn+1 n

xn
Se n é ı́mpar, encontramos
√ √
√ 1 √
= b, xn = (ab) 2 a e xn = (ab) 2 2n a = ab 2n√ .
xn+1 n−1
n
1
− n
n
a
xn ab
Por fim temos,
√ √
= min(a, b) , lim sup = max(a, b) , lim n xn = ab ♣
xn+1 xn+1
lim inf
xn xn

Pelo Exemplo 13 (vide também o Exemplo 14) vemos que pode existir o limite
da raiz e sem que exista o da razão. O Teste da Razão é em geral mais “fácil”.
Porém, o Teste da Raiz é mais eficiente.

22
Oswaldo Rio Branco de Oliveira

Exemplos 14. As séries abaixo convergem pelo teste da raiz enquanto o teste
da razão é inconclusivo para ambas.

(a) Consideremos a série

+ + 2 + 2 + 3 + 3 + ... .
1 1 1 1 1 1
2 3 2 3 2 3
Vale o que segue (cheque).


lim inf n an = lim = √
2n 1 1
,
3n 3


lim sup n an = lim =√ ,
2n+1 1 1
2 n+1
2

= lim ( ) = 0 e
an+1 2 n
lim inf
an 3

= lim ( ) = +∞.
an+1 3 n
lim sup
an 2
(b) Consideremos a série

+1+ + + + + + + ⋯.
1 1 1 1 1 1 1
2 8 4 32 16 128 64
Vale o que segue.

= ,
an+1 1
lim inf
an 8

= 2,
an+1
lim sup
an

an = se n é ı́mpar,
n
1


2


an = =
n
n 2 4
n
se n é par e
2n−1 2

lim n an = ♣
1
2

23
Exemplo 15. Vale o que segue.
+∞ √
lim √ = e, = +∞, n! = +∞ e lim √ = 0.
n nn 1

n
lim
n=0 n!
n n
n! n!
Prova.

◇ Aplicando o teste da razão à série dada encontramos

(n + 1)n+1 n! n+1 n
= ( ) = (1 +
1 n
) = e.
(n + 1)! nn
lim lim lim
n n

Logo, a série diverge.

◇ Comparando limites da razão e da raiz, para sequências (v. teorema), segue



= lim √ = e.
n nn n
lim
n! n
n!

◇ Para finalizar, notemos que

lim √ = lim √ = 0.e = 0 ♣


1 1 n
n
n! n n n!

Exemplo 16. A série


+∞
∑ nz n , onde z ∈ C,
n=0

converge absolutamente se ∣z∣ < 1 e diverge se ∣z∣ ≥ 1.

Prova.

Pelo teste da raiz (é também fácil aplicar o da razão) encontramos


√ √ +∞
lim n∣z∣ = ∣z∣ lim n = ∣z∣ e ∑ ∣nz n ∣ < ∞ se ∣z∣ < 1.
n n n

n=0

Por outro lado, se ∣z∣ ≥ 1 obtemos


+∞
∣z∣n ≥ 1, lim n∣z∣n = +∞, lim nz n ≠ 0 e ∑ nz n diverge ♣
n=0

24
Oswaldo Rio Branco de Oliveira

Exemplos 17. As séries complexas obtidas das séries de Taylor na origem de

ex , sin x e cos x,

trocando a variável x ∈ R pela variável z ∈ C convergem absolutamente em C.


Prova.

Sendo as séries, respectivamente,


+∞ +∞ +∞
∑ (−1)n
zn z 2n+1 z 2n
∑ ∑
(2n + 1) ! n=0 (2n) !
, e
n=0 n! n=0

(vide Exemplo 3), basta mostrar que


+∞
∣z∣n
∑ < ∞.
n=0 n!

De fato, as outras duas séries são, em valor absoluto, majoradas por esta.
Aplicando o Teste da Razão encontramos
∣z∣
lim ∣ ∣ = lim = 0, para todo z ∈ C∗ ♣
z n+1 n!
(n + 1) !z n n→+∞ n + 1

Exemplos 18. As séries complexas obtidas das séries reais


+∞
(−1)n xn+1 +∞
ln(1 + x) = ∑ e arctan x = ∑ (−1)n
x2n+1
n+1 2n + 1
,
n=0 n=0

trocando a variável real x pela variável z ∈ C, convergem absolutamente na bola

B(0; 1) = {z ∈ C ∶ ∣z∣ < 1}.

Prova.

As séries a considerar são, respectivamente,


+∞ +∞
∑ (−1)n ∑ (−1)n
z n+1 z 2n+1
n+1 2n + 1
e .
n=0 n=0

Fixemos z ∈ C com 0 < ∣z∣ < 1. Pelo teste da razão temos


∣z∣n+2 (n + 1) ∣z∣2n+3 (2n + 1)
= ∣z∣ e = ∣z∣2 .
n→+∞ (n + 2)∣z∣n+1 n→+∞ (2n + 3)∣z∣2n+1
lim lim

Aplicando o Teste da Razão conscluı́mos que as séries complexas conside-


radas convergem absolutamente se ∣z∣ < 1 ♣

25
A seguir, apresentamos uma versão mais fraca do “teorema comparando os
limites da razão e da raiz, para sequências”. Esta versão não utiliza os conceitos
de “lim sup” ou “lim inf”.

Proposição. (Igualdade entre os limites da razão e da raiz, para sequências).


∣an+1 ∣ √
= L, então ∣an ∣ = L.
n→+∞ ∣an ∣
n
Se lim lim
n→+∞

Prova.

Dado ǫ > 0, seja 0 < δ < ǫ e n0 tal que para cada n ≥ n0 temos
∣an+1 ∣
L−δ < < L + δ.
∣an ∣
Logo,
∣an ∣ ∣an−1 ∣ ∣an +1 ∣
(L − δ)n−n0 ∣an0 ∣ ≤ ∣an ∣ = ..... 0 ∣an0 ∣ ≤ (L + δ)n−n0 ∣an0 ∣
∣an−1 ∣ ∣an−2 ∣ ∣an0 ∣
e, ainda para n > n0 ,
(L − δ)n ∣an ∣ (L + δ)n
≤ ≤
(L − δ)n0 ∣an0 ∣ (L + δ)n0
.

Sendo L − δ < L < L + δ temos (omitimos o caso L = 0, que é similar)


(L − δ)n ∣an ∣ (L + δ)n
≤ ≤
∣an0 ∣
.
Ln 0 Ln 0
Então, definindo
∣an0 ∣
α=
Ln 0
encontramos
√ √ √
n
α(L − δ) ≤ n ∣an ∣ ≤ n α(L + δ), para todo n > n0 .

Como
L−ǫ L+ǫ √
<1< e lim n α = 1,
L−δ L+δ n→∞

fixamos N > n0 tal que


L−ǫ √ L+ǫ
se n > N então < n α<
L−δ L+δ
.

Assim procedendo, concluı́mos com


√ √ √
(L − ǫ) < n α(L − δ) ≤ n ∣an ∣ ≤ n α(L + δ) < (L + ǫ), para todo n > N ♣

26
Oswaldo Rio Branco de Oliveira

1.5 - Critério da Integral

Proposição (Critério da Integral). Sejam ∑+∞ n=0 an , com an ≥ 0 para todo n,

uma série e f ∶ [p, +∞) → [0, +∞), contı́nua e decrescente, com an = f (n) se n ≥ p.
Então,
+∞
f (x) dx converge se e só se a série ∑ an converge.
+∞
a integral ∫
p n=0

Prova. Pode ser útil acompanhar a demonstração com a figura abaixo.

y
y = f (x)
área ap+1
área ap+2
111
000
000
111
000
111 área an
000
111
000
111
000
111
000
111
000
111
000
111 111
000
000
111
000
111 000
111
000
111
000
111
000
111
000
111 000
111
000
111
p p + 1 p + 2 .... n x

Figura 1.8: Ilustração para o Critério da Integral.

Se k ≥ p e x ∈ [k, k + 1], então temos

ak+1 ≤ f (x) ≤ ak , ak+1 ≤ ∫ f (x) dx ≤ ak e


k+1

∑ ak+1 ≤ ∑ ∫ f (x) dx = ∫ f (x) dx ≤ ∑ ak .


n n k+1 n+1 n

k=p k k=p p k=p

Logo, a série ∑+∞


n=1 an é convergente se e somente se

f (x) dx = ∫ f (x) dx < ∞ ♣


n+1 +∞
lim ∫
n→+∞ p p

Uma função como no critério acima sempre existe mas, em geral, não é útil.
Basta definir f em [n, n+1] tendo por gráfico o segmento unindo os pontos (n, an )
e (n + 1, an+1 ).

27
Exemplo 19. Pelo critério da integral a série harmônica generalizada
+∞
, com p ∈ R,
1

np
converge se e somente se p > 1.

Prova.

De fato, se p ≤ 0 é óbvia a divergência. Se p > 0, a função real e contı́nua

[1, +∞) ∋ x ↦ f (x) =


1
xp
é decrescente. Vide figura abaixo

Figura 1.9: Gráficos para 1


xp , com p < 1, p = 1 e p > 1.

O resultado segue então da fórmula




⎪ ∣ = lim , p ≠ 1,
M

1
1−

x−p+1 M p−1


lim
⎪ M →+∞ 1−p 1 p−1
= ⎨
+∞ dx M →+∞
∫1 ⎪
x p




⎪ lim ln ∣1 = lim ln M, p = 1 ♣
M
⎩ M →+∞ M →+∞

28
Oswaldo Rio Branco de Oliveira

Exemplo 20. Supondo α, β > 0, temos


+∞
<∞
1

n=3 nα (ln n)β

se e somente se vale uma das condições: α > 1 ou então, α = 1 e β > 1.


y

xα (α > 1)
ln x
1

1 x

Figura 1.10: Gráficos de xα , com α > 1, e de ln x.

Prova.

◇ O caso α > 1. Este é trivial e segue do critério da comparação, pois temos


+∞
≤ ∑ α < ∞ convergente.
1 1 1
n (ln n)
α β α
com
n n=1 n

◇ O caso 0 < α ≤ 1. Como a função

f (x) = , onde x ≥ 3,
1
xα (ln x)β

é contı́nua e decrescente, analisemos a integral


+∞ 1
∫3 xα (ln x)β
dx.

Com a mudança de variável y = log x obtemos

x = ey , = ey e
dx
dy
+∞ e(1−α)y
= =
+∞ 1 +∞ ey
∫3 xα (ln x)β
dx ∫ln 3 eαy y β dy ∫ln 3 yβ
dy.

29
◇ O sub-caso α < 1. Dado N ∈ N, com N > β, existe uma constante cN > 0 tal
que temos
e(1−α)y ≥ cN y N , para todo y ≥ 0.

Então segue
e(1−α)y
dy = +∞
+∞
∫ln 3 yβ
e pelo Critério da Integral concluı́mos que a série diverge.

◇ O sub-caso α = 1. Temos

∫ln 3 x(ln x)β dx = ∫ln 3 y β dy < ∞ se e só se β > 1 ♣


+∞ 1 +∞ 1

Abaixo está hachurada a região dos parâmetros α, β > 0 tais que a série no
exemplo imediatamente acima converge.
β 111111111111111
000000000000000
000000000000000
111111111111111
000000000000000
111111111111111
000000000000000
111111111111111
000000000000000
111111111111111 α >1eβ ≥0
000000000000000
111111111111111
α=1eβ >1
ou
000000000000000
111111111111111
000000000000000
111111111111111
000000000000000
111111111111111
1 000000000000000
111111111111111
000000000000000
111111111111111
000000000000000
111111111111111
000000000000000
111111111111111
000000000000000
111111111111111
000000000000000
111111111111111
000000000000000
111111111111111
1 α
Figura 1.11: {(α, β) ∶ ∑ < ∞}.

1
nα (ln n)β
n=2

As séries de Abel são as séries do tipo

, onde β > 0.
1
∑ β
n≥2 n(ln n)

Pelo exemplo acima, tais séries convergem se β > 1 e divergem se β = 1.

30
Oswaldo Rio Branco de Oliveira

1.6 - Critério de Raabe

Os critérios a seguir são um refinamento do critério da razão.

Proposição (Critério de Comparação de Razões). Sejam


+∞ +∞
∑ ak e ∑ b k
n=0 n=0

duas séries em C∗ = C − {0}. Suponhamos que exista p ∈ N tal que

∣ ∣ ≤ ∣ ∣ , para todo k ≥ p.
ak+1 bk+1
ak bk
Vale o que segue.
+∞ +∞
Se ∑ ∣bk ∣ converge, então ∑ ∣ak ∣ converge.
n=0 n=0

Dito de outra forma, temos


+∞ +∞
∑ ∣ak ∣ = +∞ ⇒ ∑ ∣bk ∣ = +∞.
n=0 n=0

Prova.

Da hipótese temos, para cada k ≥ p, a desigualdade

∣ ∣ ≤ ∣ ∣.
ak+1 ak
bk+1 bk
Logo, para k ≥ p temos que

∣ak ∣ ∣ak ∣ ∣ap ∣ ∣ap ∣


≤ e então ∣ak ∣ ≤ ∣bk ∣.
∣bk ∣ ∣bk ∣ ∣bp ∣ ∣bp ∣
a sequência decresce,

Pelo critério da comparação, segue a tese ♣

31
Proposição (Critério de Raabe). Seja ∑ an uma série complexa, com ∣an ∣ ≠ 0
+∞

n=0
para cada n, satisfazendo

lim n (1 − ∣ ∣) = L ∈ [−∞, +∞].


an+1
n→+∞ an
As seguintes afirmações são verdadeiras.

(a) Se L > 1, a série ∑ an é absolutamente convergente.


+∞

n=0

(b) Se L < 1, série ∑ ∣an ∣ diverge. Pode ocorrer que ∑ an convirja.


+∞ +∞

n=0 n=0

(c) Se L = 1, o critério é ineficiente.

Prova.

(a) Seja α tal que 1 < α < L. Então, existe N ∈ N para o qual temos

k (1 − ∣ ∣) > α, para todo k ≥ N.


ak+1
ak
Logo, para tais valores de k encontramos

∣ ∣<1− .
ak+1 α
ak k
Para continuarmos façamos uma observação.
Observação. Para α > 1, x ≥ −1 e f (x) = (1+x)α temos f ′′ ≥ 0, f ′ (0) = α,
a concavidade do gráfico de f voltada para cima e a reta tangente ao gráfico
de f no ponto (0, 1) dada pela equação y = 1 + α x. Logo, (1 + x)α ≥ 1 + α x.
Assim, utilizando tal desigualdade para o ponto

x=−
1
k
obtemos
1
∣ ∣ < 1− ≤ (1 − ) =
1 α
= , onde bk =
ak+1 α kα bk+1 1
(k − 1)α
1 .
ak k k (k−1)α
bk

Como temos
+∞
< ∞ (pois α > 1),
1
∑ α
n=0 k

k=0 ∣ak ∣ é convergente.


pelo critério da comparação entre razões segue que ∑+∞

32
Oswaldo Rio Branco de Oliveira

(b) Seja N ∈ N tal que para cada k ≥ N temos

k (1 − ∣ ∣) ≤ 1.
ak+1
ak
Assim,
1 k−1 1
∣ ∣≥1− = = = , onde bk+1 = .
ak+1 k bk+1 1
1
ak k k k−1
bk k
Como a série harmônica diverge, pelo Critério de Comparações de Razões
segue que
+∞
∑ ak diverge.
k=0

No Exemplo 28 veremos que a série


+∞
α(α − 1)...(α − n + 1)
∑ , com − 1 < α < 0 ,
n=0 n!
é condicionalmente convergente. No Exemplo 23 veremos que tal série sa-
tisfaz a condição
α(α − 1)...(α − n + 1)
lim n (1 − ∣ ∣) = α + 1 < 1, onde an =
an+1
.
n→+∞ an n!
(c) Exemplo 21. A série (vide Exemplo 20)
+∞
1

k=2 k ln k

diverge pois
dx = ln (ln x)∣2 = +∞.
+∞
1 +∞
∫2x ln x
Simplificando a expressão na condição no teste de Raabe para tal série
obtemos
(k + 1) ln(k + 1) − k ln k
k (1 − )= [ ].
k ln k k
(k + 1) ln(k + 1) k+1 ln(k + 1)
Como
ÐÐÐÐ→ 1,
k k→+∞
k+1
estudamos a fração entre colchetes na expressão acima,
(k + 1) ln(k + 1) − k ln k ln(k + 1)k+1 − ln k k
=
ln(k + 1) ln(k + 1)

ln(k + 1) (1 + k1 )
k

=
ln(k + 1)
.

33
Mudando para variável contı́nua encontramos a indeterminação


.

Aplicamos então e regra de L’Hospital.


Pela regra de L’Hospital segue

ln(x + 1) (1 + x1 )
x

ln(x + 1)
lim
x→+∞


⎪ ⎡ ⎤⎫
⎪ 1 x ⎢⎢ x2 ⎥⎪
⎥⎪
1
x (−1)
= lim ⎨ (1 +
1 x
) + (x + (1 + ) (1 + ) + ⎬
x
(x+1)(1+ x1 ) 1
⎪ x ⎢⎢ 1 + x1 ⎥⎥⎪
1) ln

⎩ ⎣ ⎦⎪

1
x→+∞
x+1
x x

= lim {1 + (x + 1) [ln (1 + ) − ]}
1 1
x→+∞ x x+1

= lim (x + 1) ln (1 + )
1
x→+∞ x

= lim ln [(1 + ) (1 + )] = ln(e) = 1.


x
1 1
x→+∞ x x

Exemplo 22. A série (vide Exemplo 20)


+∞
1
∑ 2
k=2 k(ln k)

é convergente pois

= dy < ∞.
+∞ 1 +∞ 1
∫2 x(ln x)2
dx ∫log 2 y 2

Simplificando a expressão na condição no teste de Raabe para tal série,


obtemos
k ln2 k
I(k) = k (1 − )
(k + 1) ln2 (k + 1)
(k + 1) ln2 (k + 1) − k ln2 k
= [ ]
k
k+1 ln2 (k + 1)
k ln2 (k + 1) − k ln2 k
= [1 + ].
k
k+1 ln2 (k + 1)

É trivial que
=1 e = 1.
k ln x
k+1 ln(x + 1)
lim lim
x→+∞

34
Oswaldo Rio Branco de Oliveira

Assim, simplificando a análise de I(k) encontramos

k ln2 (k + 1) − k ln2 k ln(k + 1) − ln k ln(k + 1) + ln k


=k
ln (k + 1) ln(k + 1) ln(k + 1)
2 .

Donde segue
ln(k + 1) + ln k
= 2.
ln(k + 1)
lim
k→+∞

Concluindo, temos

ln(k + 1) − ln k ln ( k+1 )
= lim k k
ln(k + 1) k→+∞ ln(k + 1)
lim k
k→+∞

ln (1 + k1 )
k

= lim =0
k→+∞ ln(k + 1)

e lim I(k) = 1♣

Exemplo 23. Seja α ∈ R ∖ N. Então, a série


+∞
α(α − 1)(α − 2)⋯(α − n + 1)
∑∣ ∣
n=1 n!

é convergente se α > 0 e divergente se α < 0.


Prova.

Seja an o termo geral da série dada. Temos, para n → +∞,


α−n
n (1 − ∣ ∣) = n (1 − ∣ ∣)
an+1
an n+1
n−α
= n (1 −) Ð→ α + 1.
n+1
A afirmação segue então imediatamente do Critério de Raabe ♣

35
1.7 - A Série Binomial Real

A descoberta da fórmula binomial é atribuı́da a Newton (em uma carta de


1664 ou 1665) que nunca a publicou ou provou e, ainda, outros já a haviam
estudado. O destaque de Newton deve-se a ele ter mostrado que as séries infinitas
não deviam ser vistas como aproximações mas como outras formas das funções
que representam e, além disso, estabelecido regras operatórias para séries reais
da forma
+∞
∑ an x n
n=0

(hoje chamadas séries de potências) tais como divisão e multiplicação. Abel


mostrou a série binomial complexa para (1 + z)σ , com z ∈ C, ∣z∣ < 1, e σ ∈ C ∖ N,
sujeita a uma definição apropriada de (1 + z)σ .

Teorema (Fórmula Binomial). Seja α ∈ R ∖ N. Definamos os coeficientes

α(α − 1)⋯(α − m + 1)
( )= , onde m ∈ N, com ( ) = 1.
α α
m m! 0
Seja f (x) = (1 + x)α , onde x ∈ (−1, 1]. Vale o que segue.
+∞
(a) (1 + x)α = ∑ ( )xn , se x ∈ (−1, 1).
α
n=0 0

No ponto x = 1, temos
+∞
(b) 2α = ∑ ( ), se α > 0.
α
n=0 0

Prova.

◇ Seja n ∈ N. A função f (x) = (1 + x)α satisfaz

f (n) (x) = α(α − 1) . . . [α − (n − 1)](1 + x)α−n .

Temos f (n) (0) = α(α − 1) . . . [α − (n − 1)] e f (0) (0) = 1. Donde

f (n) (0)
( )=
α
.
n n!

36
Oswaldo Rio Branco de Oliveira

Seja x ∈ (−1, 1]. A fórmula de Taylor com resto integral fornece


x f (N +1) (t)
(1 + x)α = ∑ ( )xn + RN (x), com RN (x) = ∫ (x − t)N dt.
N
α
n=0 n 0 N!

Notemos que

⎪ = α(α−1)⋯(α−N (1 + t)α−N −1 = α(α−1 )(1 + t)α−N −1 ,

f (N +1) (t) )




N! N! N

(1.7.1) ⎨



⎪ (x) = )
N ∫ (1 + t)
α−N −1 (x − t)N dt.
x


α−1

R N α(
0

(a) Fixemos x ∈ (−1, 1). Provemos que RN (x) → 0 se N → +∞.


Analisemos o valor absoluto no integrando em (1.7.1). Isto é,

x−t N
∣(1 + t)α−1 ( ) ∣.
1+t

Dado t entre 0 e x, com x positivo ou não, 1 + t está entre 1 e 1 + x > 0.


Logo,
0 < (1 + t)α−1 ≤ C = C(x) = max (1, (1 + x)α−1 ).

No caso 0 ≤ t ≤ x ≤ 1, temos
x−t
0≤ ≤ ≤ x.
x
1+t 1+t
No caso −1 < x ≤ t ≤ 0, temos −x = ∣x∣ e (vide figura)

−1 x t t∣x∣ 0
Figura 1.12: A disposição −1 < x ≤ t ≤ ∣x∣t ≤ 0.

t − x t∣x∣ + ∣x∣
0≤ ≤ = ∣x∣.
1+t 1+t
Resumindo, obtemos

x−t N
∣(1 + t)α−1 ( ) ∣ ≤ C∣x∣N , para todo t entre 0 e x.
1+t

Donde segue
α−1
∣RN (x)∣ ≤ C ∣α ( )∣ ∣x∣N +1 .
N

37
Mostremos, com o teste da razão, a convergência da série
+∞
α−1 n
∑( )x , se ∣x∣ < 1.
n=0 n
De fato, basta observar que
RRR (α−1)xn+1 RRR
RRR n+1 R (α − 1)(α − 2)⋯(α − 1 − n − 1 + 1)n!
RRR α−1 n RRRRR = ∣ (n + 1)!(α − 1)(α − 2)⋯(α − 1 − n + 1) x∣
RR ( n )x RR
α − n − 1 n→+∞
=∣ x∣ ÐÐÐ→ ∣x∣, se ∣x∣ < 1.
n+1
Portanto, a série converge e seu termo geral tende a 0. Logo,

lim RN (x) = 0.

(b) O caso x = 1 e α > 0. Por (1.7.1), para todo N grande o suficiente segue
α−1 α ∣(α−1 )∣
∣RN (1)∣ ≤ α ∣( )∣ ∫ (1 − t) dt =
1
N N
N +1
.
N 0
O coeficiente binomial é limitado. De fato, denotando (a simbologia é usual)
[∣α∣] o menor número natural que é maior ou igual a α, encontramos
α−1 (α − 1)(α − 2)(α − 3) . . . (α − 1 − N + 1)
∣( )∣ = ∣ ∣
N 1.2.3 . . . N

= ∣(1 − α) (1 − ) (1 − ) ⋯ (1 − ) (1 − ) ⋯ (1 − )∣
α α α α α
2 3 [∣α∣] [∣α∣] + 1 N

≤ ∣(1 − α) (1 − ) ⋯ (1 − )∣ .
α α
2 [∣α∣]
Logo,
RN (1) ÐÐÐ→ 0 ♣
N →+∞

Exemplo 24. Seja x ∈ (−1, 1). Vale a fórmula


+∞
−1 +∞
1.3 . . . (2n + 1) 2n
√ = (1 − x2 )− 2 = ∑ (−1)n ( 2 )x2n = 1 + ∑
1 1

n=1 2.4 . . . (2n)


x .
1 − x2 n=0 n
Prova.
Mera consequência do Teorema (Fórmula) Binomial pois,
−1/2 (− 12 )(− 12 − 1) . . . (− 21 − n + 1)
(−1) (n
) = (−1) n
=
n n!
(1/2)(3/2)...(1/2 + n − 1) 1/2.3/2....(2n + 1)/2
= = =
n! n!
1.3⋯(2n + 1) 1.3⋯(2n + 1)
= = , se n ≠ 0 ♣
2n n! 2.4⋯(2n)

38
Oswaldo Rio Branco de Oliveira

1.8 - Série Telescópica, Critérios de Dirichlet e Abel.

Proposição (Série Telescópica). Seja (bn )N uma sequência complexa. Então,


a série
+∞
∑ (bn − bn+1 )
n=0

converge se e somente se a sequência (bn ) converge e, neste caso, temos


+∞
∑ (bn − bn+1 ) = b0 − lim bn .
n=0

Prova.

n=0 (bn − bn+1 ) converge se e somente se a sequência das


Trivial pois a série ∑+∞
somas parciais

sn = (b0 − b1 ) + ⋯ + (bn − bn+1 ) = b0 − bn+1 , onde n ∈ N,

converge e, sendo este o caso, o limite da série é

lim sn = b0 − lim bn ♣
n→+∞

Exemplo 25 (Uma série telescópica). Temos,


+∞
= 1.
1

n=1 n(n + 1)

Prova.

Basta notar que

lim sN = lim ∑ ( − )
N
1 1
N →+∞ N →+∞ n=1 n n+1

= lim (1 − ) = 1♣
1
N →+∞ N +1

A seguir, veremos o critério de Dirichlet. O alemão P. G. L. Dirichlet (1805-


1859) é o precursor do conceito de função como correspondência.

39
Proposição (Critério de Dirichlet). Em R, consideremos ∑+∞ n=0 an uma série

(não necessariamente convergente) com sequência das somas parciais (sn ) limi-
tada e (bn ) uma sequência decrescente tal que lim bn = 0. Então,
+∞
∑ an bn é convergente.
n=0

Prova.

Temos a1 b1 + a2 b2 = a1 (b1 − b2 ) + (a1 + a2 )b2 = s1 (b1 − b2 ) + s2 b2 ,


a1 b1 + a2 b2 + a3 b3 = s1 (b1 − b2 ) + s2 b2 + a3 b3 = s1 (b1 − b2 ) + s2 (b2 − b3 ) + s3 b3 ,
e, de forma geral (verifique a fórmula, a indução é simples) segue

a1 b1 + a2 b2 + ⋯ + an bn = ∑ si−1 (bi−1 − bi ) + sn bn .
n

i=2

Para M ∈ R tal que ∣sn ∣ ≤ M temos


∞ ∞
∑ ∣si−1 (bi−1 − bi )∣ ≤ M ∑ (bi−1 − bi ) = M b1 .
n=2 n=2

Donde segue que a série



∑ si−1 (bi−1 − bi )
n=2
é absolutamente convergente e portanto convergente. Desta forma, como
lim sn bn = 0, concluı́mos que a série ∑+∞
n=0 an bn é convergente ♣

No resultado abaixo pedimos menos de (bn ), porém exigimos mais de ∑+∞


n=0 an .

n=0 an convergente e (bn ) uma


Proposição (Critério de Abel). Em R, sejam ∑+∞
sequência decrescente de números positivos (não é necessário lim bn = 0). Então,
+∞
∑ an bn converge.
n=0

Prova.

Para c = lim bn , é claro que (bn − c) ↘ 0 [i.e, a sequência decresce e converge


n=0 an (bn − c) converge e, devido à
a 0]. Logo, pelo Critério de Dirichlet ∑+∞
n=0 can = c ∑n=0 an também. Assim, ∑n=0 an bn converge♣
hipótese, ∑+∞ +∞ +∞

O norueguês N. H. Abel (1802-1829), aos 19 anos, provou a impossibilidade da


resolução por radicais das equações algébricas de grau maior ou igual a cinco.
O italiano P. Ruffini (1765-1822) dera uma prova (1799) de tal resultado, menos
satisfatória e que passara despercebida.

40
Oswaldo Rio Branco de Oliveira

1.9 - Critério (Leibniz) para Série Alternada

Proposição (Critério de Leibniz). Se (bn ) é decrescente e lim bn = 0, então


+∞
∑ (−1)n bn converge.
n=0

Prova. Consequência direta do critério de Dirichlet ♣

Como direta (e famosa) aplicação do Critério de Leibniz temos que


+∞
(−1)n
a série harmônica alternada ∑ converge.
n=1 n

Refinemos o critério de Leibnitz e apresentemos uma outra prova (mais geométrica).

Proposição (Critério de Leibniz - 1682). Seja (an ) uma sequência decres-


cente tal que lim an = 0. Seja m ∈ N. Então, a série
+∞
(a1 − a2 + a3 − a4 + a5 − a6 + ⋯) = ∑ (−1)n+1 an converge e
n=1

+∞
∣ ∑ (−1)n+1 an − sm ∣ ≤ am+1 , onde sm = a1 − a2 + ⋯ + (−1)m+1 am .
n=1

Prova.
−a2

−a4
−a6
s2 s4 s6 s5 s3 s1 = a1
+a5 +a3

Figura 1.13: Critério de Leibniz.

Seja (sn ) a sequência das somas parciais da série considerada.


Claramente, a sequência s2n = (a1 −a2 )+⋯+(a2n−1 −a2n ) é crescente. Ainda
claramente, a sequência s2n+1 = a1 −(a2 −a3 )−⋯−(a2n −a2n+1 ) é decrescente.

41
Observemos que



⎪ 0 ≤ s2n ≤ s2n+1 ≤ s1 = a1 ,








⎩ 0 ≤ s2n+1 − s2n = a2n+1 .
Logo, (s2n ) e (s2n+1 ) são monótonas, limitadas e convergentes e tem mesmo
limite α. Portanto, a série em consideração é convergente.
Seja m par ou não, α está entre sm e sm+1 e ∣α − sm ∣ ≤ ∣sm − sm+1 ∣ = am+1 ♣

Exemplo 26. A série


+∞
∑ (−1)n sen ( ) , onde α > 0,
1
n=1 nα

converge absolutamente se α > 1 e condicionalmente se 0 < α ≤ 1.

Prova.

Claramente
sen n1α
> > =1
1
sen 0, se α 0, lim 1
nα n→+∞

e pelo Critério do Limite,
+∞ +∞
∑ sen α < ∞ ⇐⇒ ∑ α < ∞.
1 1
n=1 n n=1 n

Logo, a série dada converge absolutamente se e só se α > 1.


Ainda, como sen′ 0 = cos 0 = 1 > 0, a função θ ↦ senθ é crescente num
intervalo centrado em 0 e

(sen ) ↘ 0, se α > 0.
1

Pelo Critério de Leibniz a série dada converge se 0 < α ≤ 1 ♣

Mostremos que a hipótese (an ) decrescente é essencial no enunciado do Critério


de Leibniz.

42
Oswaldo Rio Branco de Oliveira

Exemplo 27. A série


+∞
∑ (−1)n an , com an = se n é ı́mpar e an =
1 1
se n é par,
n=1 n n!

diverge e lim an = 0.

Prova.

É óbvio que lim an = 0. Como


+∞
1

n=1 n!

é convergente, segue que a série


+∞
∑ bn , com bn = 0 se n é ı́mpar e bn =
1
se n é par,
n=1 n!

é convergente. Portanto, se a série


+∞
∑ (−1)n an
n=1

for convergente então a série


+∞ +∞ +∞
∑ (−1)n an − ∑ bn = ∑ cn , com cn = − se n é ı́mpar e cn = 0 se n é par,
1
n=1 n=1 n=1 n

é também uma série convergente. Encontramos uma contradição pois

1+ + + ⋯
1 1
3 5
diverge (vide observação ao Exemplo anterior) ♣

Exemplo 28. A série abaixo é condicionalmente convergente:


+∞
α(α − 1)(α − 2)⋯(α − n + 1)
∑ , −1 < α < 0.
n=1 n!

Prova.

Seja
α(α − 1)(α − 2)⋯(α − n + 1)
an = .
n!
Pelo Exemplo 23 temos
+∞
∑ ∣an ∣ = +∞.
n=1

43
Porém, sendo
n−α
∣ ∣= < 1, pois − α < 1,
an+1
an n+1
temos que a sequência (∣an ∣) é decrescente e existe

lim ∣an ∣ = L.
n→+∞

Mostremos que L = 0.
Fixando n ∈ N e escrevendo β = 1 + α, da dupla desigualdade −1 < α < 0
segue a dupla desigualdade 0 < β < 1 e, para p ∈ N arbitrário,

n − α n + 1 − (1 + α)
∣ ∣= = =1−
an+1 β
n+1 n+1 n+1
,
an

∣ ∣=∣ ⋯ ∣ = (1 − ) (1 − ) ⋯ (1 − ),
an+p an+p an+p−1 an+1 β β β
an an+p−1 an+p−2 an n+p n+p−1 n+1
β p β p+n β −n
(∗) ∣ ∣ ≤ (1 − ) ≤ (1 − ) (1 − ) .
an+p
an n+p n+p n+p
Como
lim (1 − ) = ea ,
a x
x→+∞ x
tomando em (*) o limite para p → +∞ obtemos

≤ e−β , para todo n ∈ N.


L
an

Desta forma obtemos


0 ≤ eβ L ≤ lim an = L,
n→+∞

o que implica L = 0 pois eβ > 1.


Logo, pelo critério de Leibniz segue que a série
+∞ +∞
∑ (−1)n ∣an ∣ = ∑ an
n=1 n=1

é convergente ♣

44
Oswaldo Rio Branco de Oliveira

1.10 - Fórmulas para lim inf xn e para lim sup xn .

Para uma sequência real e limitada (xn ) ⊂ [m, M ] ⊂ R, onde m ≤ M , podemos


expressar analiticamente o lim inf xn e o lim sup xn . Para cada n ∈ N, consideremos
Xn = {xn , xn+1 , . . .}. É óbvio que X1 ⊃ X2 ⊃ ⋯ ⊃ Xn ⊃ ⋯. Donde segue
m ≤ inf X1 ≤ inf X2 ≤ ⋯ ≤ inf Xn ≤ inf Xn+1 ≤ ⋯ ≤ M
M ≥ sup X1 ≥ sup X2 ≥ ⋯ ≥ sup Xn ≥ sup Xn+1 ≥ ⋯ ≥ m.
As sequências (inf Xn ) e (sup Xn ) são limitadas, respectivamente crescente e
decrescente e então convergentes. Com tal notação temos o resultado que segue.

Teorema. Se (xn ) ⊂ R é uma sequência limitada então

lim inf Xn = lim inf xn e lim sup Xn = lim sup xn .


n→+∞ n→+∞

Prova.
Sejam an = inf Xn e bn = sup Xn , onde n ∈ N. Sejam a = lim an e b = lim bn .
Mostremos que todo valor de aderência de (xn ) pertence a [a, b]. Considere-
mos x = lim xnk , com (xnk ) uma subsequência convergente de (xn ). Temos
ank ≤ xnk ≤ bnk , para todo k ∈ N. É claro que ank → a e bnk → b. Segue
a = lim an = lim ank ≤ x = lim xnk ≤ lim bnk = lim bn = b. Logo, x ∈ [a, b].
Só nos falta então mostrar que a e b são valores de aderência.
Iniciemos com a sequência crescente (an ) = (inf Xn ). Dado ǫ = 1, como
an ↗ a segue que existe m ∈ N tal que a − 1 < am = inf Xm ≤ a. Por
definição de ı́nfimo, existe n = n1 ≥ m tal que inf Xm ≤ xn1 < a + 1. Segue
xn1 ∈ (a − 1, a + 1). Dado ǫ = 1/2, existe m > n1 tal que a − 1/2 < inf Xm ≤ a.
Armentando como antes obtemos n2 > n1 tal que xn2 ∈ (a − 1/2, a + 1/2).
Por iteração, construı́mos ank → a. Logo, a é valor de aderência.
Trocando (xn ) por (−xn ), −b é valor de aderência de (−xn ) e b de (xn )♣

Com as notações8 inf xm para inf Xn e sup xm para sup Xn escrevemos,


m≥n m≥n

lim inf xn = lim inf xm e lim sup xn = lim sup xm .


n→+∞ m≥n n→+∞ m≥n

8
Gauss, com tais notações, definiu corretamente os limites inferior e superior de uma
sequência e provou o Teorema acima, em um fragmento de 1800 só publicado no inı́cio do
século XX.

45
1.11 - Representação Decimal

Em 1790, na França, com a nova ordem , foi criada uma comissão para a re-
forma dos pesos e medidas e em 1799 o sistema métrico como hoje o conhecemos
e o sistema decimal foram adotados. Haviam proponentes do sistema duode-
cimal. A. M. Legendre (1752-1833) não foi apontado por não ser claramente
pró-revolucionário (mediu o comprimento de um meridiano facilitando a adoção
do metro e talvez para provocar os duodecimalistas tenha aventado o sistema de
base onze). Lagrange, a princı́pio , também não foi apontado, por ser estrangeiro.

Um número real x da forma

x = a0 + + 2 + ⋯ + n,
a1 a2 an
10 1 10 10
com a0 um natural arbitrário e a1 , a2 , . . . , an naturais tais que 0 ≤ ai ≤ 9, é usual-
mente indicado em sua representação decimal finita

x = a0 , a1 a2 ... an

e é claro que x ∈ Q. Porém, nem todos os números racionais tem representação


decimal finita. Por exemplo, se

= n , com a, n ∈ N,
1 a
3 10
então 3a = 10n o que é impossı́vel pois 3 não divide 10.

Lema. Dado x ∈ R, é bem definido o número inteiro [∣x∣] = max{n ∈ Z ∶ n ≤ x} e

[∣x∣] ≤ x < [∣x∣] + 1.

Prova.

Mostremos que S = {n ∈ Z ∶ n ≤ x}, obviamente limitado superiormente, é


não vazio. Se x ≥ 0 então 0 ∈ S. Se x ≤ 0 então −x ≥ 0 e então, como N não
é limitado superiormente, segue que existe p ∈ N tal que p ≥ −x e portanto
−p ≤ x. Donde, −p ∈ S. Seja [∣x∣] = sup S.
Pela Propriedade Arquimediana existe n ∈ S tal que [∣x∣] − 1 < n ≤ [∣x∣].
Portanto, n ≤ [∣x∣] < n + 1 e então n + 1 > sup S, n + 1 ∉ S e x < n + 1. Logo,
S = {. . . , n − 2 , n − 1 , n} e n = max S = sup S = [∣x∣] ♣

46
Oswaldo Rio Branco de Oliveira

O número [∣x∣] é o maior inteiro menor ou igual a x e a função

[∣ ⋅ ∣] ∶ R → Z é a função maior inteiro.

Teorema. Seja x ≥ 0. Para todo n ∈ N, existe um decimal finito rn = a0 , a1 . . . an


tal que
rn ≤ x < rn +
1
.
10n
Prova.

Pelo Lema é óbvio que a0 = [∣x∣] é um inteiro positivo e,

a0 ≤ x < a0 + 1.

Consideremos a1 = [∣10(x − a0 )∣]. Como 0 ≤ 10(x − a0 ) < 10, segue que

0 ≤ a1 ≤ 9, a1 ≤ 10(x − a0 ) < a1 + 1 e a0 + ≤ x < a0 +


a1 a1 1
+ .
10 10 10
Analogamente, se
a2 = [∣102 (x − a0 − )∣]
a1
10
obtemos 0 ≤ a2 ≤ 9,

a2 ≤ 102 (x − a0 − ) < a2 + 1 e a0 + + 2 ≤ x < a0 +


a1 a1 a2 a1 a2 1
+ 2 + 2.
10 10 10 10 10 10
Procedendo por indução, obtemos o resultado desejado ♣

Corolário. Mantenhamos a notação acima. Temos, rn ↗ x.


Prova. É óbvio que (rn ) é crescente e, ainda,

0 ≤ x − rn < , para todo n ∈ N ♣


1
10n

Definição. Se x ≥ 0 e a0 , a1 , . . . , an , . . . são dados pelo Teorema imediatamente


acima então
x = a0 , a1 a2 a3 . . .

é uma representação decimal infinita de x.

47
A representação decimal infinita de x > 0 não é necessariamente a única re-
presentação. Uma outra surge ao escolhermos a0 o maior inteiro estritamente
menor que x e trocarmos a desigualdade imposta no enunciado do Teorema da
representação decimal pela condição

rn < x ≤ rn +
1
.
10n
Assim procedendo obtemos

1= + 2 + . . . , + n + . . . = 0, 999999 . . .
9 9 9
10 10 10
e também

= n+1 + n+1 + . . . + n+1 + . . . = 0, 0 . . . 0999 . . . ,


1 9 9 9
10 n 10 10 10
com os 9′ s ocorrendo a partir da (n + 1)-ésima casa decimal.
Por exemplo, para
x=
1
8
temos as representações

= + 2 + 3 = 0, 125000 . . . e
1 1 2 5
8 10 10 10

= + 2 + 3 + 4 + 5 + ⋯ = 0, 124999 . . . .
1 1 2 4 9 9
8 10 10 10 10 10
Proposição. Os números

x= > 0, com m, n ∈ N,
m
10n
tem apenas duas representações decimais.

(a) No caso x ∉ N, temos as possibilidades

a0 , a1 . . . . . ap−1 . ap .9.9.9 . . . , com ap ≠ 9, ou a0 , a1 . . . . ap−1 .(ap +1).0.0.0. . . . .

(b) No caso x ∈ N, temos as possibilidades

a0 , 999 . . . ou (a0 + 1), 000 . . . .

Os demais números em [0, +∞) tem representação única.

48
Oswaldo Rio Branco de Oliveira

Prova.

Suponhamos duas representações distintas de x ≥ 0,

x = a0 + + ⋯ + n + ⋯ = b0 + + ⋯ + n + ⋯ , com 0 ≤ ai , bi ≤ 9 e i ∈ N.
a1 an b1 bn
10 10 10 10
Seja p = min {i ∈ N ∶ ai ≠ bi }. Caso p ≥ 1, temos ai = bi se 0 ≤ i ≤ p − 1 e

+ p+1 + ⋯ + n + ⋯ = + p+1 + ⋯ + n + ⋯, com ap ≠ bp .


ap ap+1 an bp bp+1 bn
10 p 10 10 10 p 10 10
Admitamos, sem perda de generalidade, bp = ap + k, com k ≥ 1. Então,

+⋯+ n +⋯=
ap+1 an k bp+1 bn
p+1 p
+ p+1 + ⋯ + n + ⋯.
10 10 10 10 10
Na equação acima, o máximo no lado esquerdo ocorre se e só se ai = 9, para
todo i ≥ p + 1 e o máximo é
1
.
10p
O mı́nimo no lado direito ocorre se e só k = 1 (estamos supondo k ≥ 1) e
bi = 0, para todo i ≥ p + 1 e o mı́nimo é
1
.
10p
Assim, como vale a igualdade, temos bp = ap + 1 e, para todo i ≥ p + 1, temos
ai = 9 e b i = 0 e

+ ⋯ + p−1 + p + p+1 + ⋯ n + ⋯ = b0 + + ⋯ + p−1 +


a1 ap−1 ap 9 9 b1 bp−1 ap + 1
a0 + .
10 10 10 10 10 10 10 10p
O caso p = 0 é análogo ♣

49
Capı́tulo 2

SÉRIES, COMUTATIVIDADE E
ASSOCIATIVIDADE

2.1 - O Exemplo de Dirichlet

O conceito de convergência de uma série já havia sido utilizado algumas vezes
por Euler (no século XVIII também foi utilizado, entre outros, o de que o termo
geral tende a zero) e muitos matemáticos haviam operado livremente com séries
divergentes e Euler tentara formalizar o estudo destas séries . Com Cauchy e sua
insistência em que as séries divergentes não possuem soma, e o sucesso de Cours
d’Analyse (1821), a definição atual se estabeleceu.

Em 1833, Cauchy notou que uma série de termos reais não todos positivos
poderia ter uma sub-série divergente e Dirichlet (1837) apresentou os rearranjos
da série harmônica alternada

log 2 = 1 − log 2 = 1 + − + + − + ⋯
1 1 1 3 1 1 1 1 1
+ − +⋯ e
2 3 4 2 3 2 5 7 4
e provou a comutatividade para séries absolutamente convergentes.

Em 1854, Riemann escreveu (em seu Habilitationsschrift) que “já em 1829,


Dirichlet sabia que as séries infinitas caem em duas classes essencialmente dife-
rentes, conforme permanecem convergentes ou não após seus termos terem sido
feitos positivos. Em séries do primeiro tipo os termos podem ser arbitrariamente
permutados. Em constraste, o valor de uma série do segundo tipo depende da
ordem de seus termos” e prova seu Teorema do Rearranjo, enunciado a seguir.

51
(Teorema do Rearranjo.) Uma série convergente (de termos reais) que não
é absolutamente convergente pode convergir a um arbitrário dado valor real C
após uma apropriada reordenação de seus termos.

2.2 - Séries Absolutamente Convergentes e Comutatividade

Recordemos que
+∞ +∞
∑ an é absolutamente convergente se ∑ ∣an ∣ < ∞.
n=0 n=0

Definição. A série ∑+∞


n=0 an é comutativamente convergente se todo rearranjo (re-

ordenação)
+∞
∑ aσ(k) , com σ ∶ N → N bijetora,
n=0

é convergente. [Veremos que se a série é comutativamente convergente, então


todo rearranjo tem mesma soma (finita).]

Exemplo (Dirichlet, 1837). A série harmônica alternada


+∞
(−1)n+1

n=1 n

não é comutativamente convergente.

Prova.

Já vimos (Capı́tulo 1) que


+∞
(−1)n+1
∑ = ln 2.
n=1 n

Então,

ln 2 = 1 −
1 1 1 1 1 1 1
+ − + − + − ... e
2 3 4 5 6 7 8

=
ln 1 1 1 1 1
− + − + + ....
2 2 4 6 8 10
É trivial ver que vale a identidade

=0+ +0− +0+ +0− +0+


ln 2 1 1 1 1 1
+ ... ,
2 2 4 6 8 10

52
Oswaldo Rio Branco de Oliveira

pois uma soma parcial de ordem 2n (par) da terceira e última série acima é
igual à soma parcial de ordem n da segunda série acima e, uma soma parcial
de ordem 2n+1 (ı́mpar) da terceira série acima é igual a sua respectiva soma
parcial de ordem 2n.
Somando a primeira série com a terceira série (ambas acima) obtemos

=1+ − + + − + +
3 ln 2 1 1 1 1 1 1 1 1
− + ... ,
2 3 2 5 7 4 9 11 6
que é um rearranjo da série inicial mas com valor diferente♣

Um exemplo como acima, em R, só poderia ocorrer com uma série alternada
pois, felizmente e como é esperado e mostramos abaixo, todos os rearranjos de
uma série de termos positivos tem um mesmo limite em [0, +∞]. Se este limite é
+∞ dizemos que a série diverge comutativamente a +∞.

Recordemos que uma série complexa ∑+∞


n=0 zn converge condicionalmente se
+∞ +∞
∑ zn < ∞ e ∑ ∣zn ∣ = +∞.
n=0 n=0

Se z é o número tal que z = ∑n=0 zn ,


+∞
então z é a soma da série.

Observação. Para uma série ∑+∞ n=0 pn de termos positivos (isto é, pn ≥ 0), con-

vergente ou não, e com sequência de somas parciais (sn ), é fácil ver que
+∞
lim sn = ∑ pn ∈ [0, +∞].
n→+∞
n=0

Teorema (Comutatividade para séries de positivos). Seja ∑+∞ n=0 pn uma

série de termos positivos (convergente ou não) e σ ∶ N → N uma bijeção. Então,


+∞ +∞
∑ pn = ∑ pσ(k) .
n=0 k=0

Prova.

Computando o limite para n → +∞ da trivial desigualdade


+∞
∑ pj ≤ ∑ pσ(k) , para todo k ∈ N,
n

j=1 k=1
segue
+∞ +∞
∑ pn ≤ ∑ pσ(k) .
n=0 k=0
Vice-versa, ∑k=0 pσ(k)
+∞
≤ ∑n=0 pn ♣
+∞

53
Definição. Consideremos uma série real (i.e., de termos reais)
+∞
∑ an .
n=0

A parte positiva de an , indicada pn , e a parte negativa de an , indicada qn , são



⎪ ⎧

⎪ an , se an ≥ 0 ⎪ 0, se an ≥ 0
= ⎨ = ⎨
⎪ ⎪
pn e qn

⎩ 0, se an ≤ 0 ⎪
⎩ −an , se an ≤ 0.

Para todo n ∈ N seguem




⎧ ⎧ ⎪
⎪ pn = ∣an ∣+a
⎪ ⎪ ⎪
n

⎪ 0 ≤ pn ≤ ∣an ∣ ⎪ an = p n − q n ⎪
2
(2.2.1) ⎨ ⎨ ⎨
⎪ ⎪ ⎪
, e
⎩ 0 ≤ qn ≤ ∣an ∣
⎪ ⎩ ∣an ∣ = pn + qn
⎪ ⎪



⎩ qn = 2 .
∣an ∣−an

Mantendo a notação na definição acima, investigamos abaixo as convergências


absoluta, comutativa e condicional de uma série de termo geral an ∈ R, para todo
n ∈ N, analisando as séries determinadas pelas sequências (pn ) e (qn ).
+∞
Teorema. Seja ∑ an uma série de números reais. Vale o que segue.
n=0

(a) ∑ ∣ an ∣ = ∑ pn + ∑ qn .
+∞ +∞ +∞

n=0 n=0 n=0

(b) (Teorema de Dirichlet.) Se a série ∑+∞


n=0 an converge absolutamente então

ela é comutativamente convergente (e todos os rearranjos tem mesma soma),


as séries geradas pelas sequências (pn ) e (qn ) convergem e
+∞ +∞ +∞
∑ an = ∑ p n − ∑ q n .
n=0 n=0 n=0

(c) Se a série ∑ an converge condicionalmente, então ∑ pn = ∑ qn = +∞.


+∞ +∞ +∞

n=0 n=0 n=0

+∞ +∞
(d) 1 Se ∑ an converge condicionalmente, existe rearranjo divergente de ∑ an .
n=0 n=0

1
A argumentação na prova deste item provém da famosa prova do Teorema de Riemann.

54
Oswaldo Rio Branco de Oliveira

Prova. Utilizemos as relações em 2.2.1.

(a) É trivial que


+∞ +∞ +∞
∑ ∣an ∣ = lim ∑ ∣an ∣ = lim [ ∑ pn + ∑ qn ] = ∑ ∣pn ∣ + ∑ ∣qn ∣ .
m m m

m→+∞ m→+∞
n=1 n=1 n=1 n=1 n=1 n=1

(b) Como 0 ≤ pn ≤ ∣an ∣ e 0 ≤ qn ≤ ∣an ∣, segue que as séries ∑+∞


n=0 pn e ∑n=0 qn são
+∞

convergentes. Pelo teorema imediatamente anterior, tais séries são comuta-


tivamente convergentes. Logo, é claro que a série dada pela subtração
+∞ +∞ +∞
∑ p n − ∑ q n = ∑ an
n=0 n=0 n=0

é também comutativamente convergente. De fato, supondo que σ ∶ N → N


é bijetora encontramos
+∞ +∞ +∞ +∞ +∞ +∞
∑ aσ(k) = ∑ pσ(k) − ∑ qσ(k) = ∑ pn − ∑ qn = ∑ an .
k=0 k=0 k=0 n=0 n=0 n=0

n=0 an converge, da identidade an = pn − qn concluı́mos que


(c) Como ∑+∞
+∞ +∞
∑ pn converge ⇐⇒ ∑ qn converge.
n=0 n=0

n=0 ∣an ∣ = +∞. Então, por (a), ao menos uma entre as séries
Por hipótese, ∑+∞
∑n=0 pn e ∑n=0 qn diverge. Logo, estas duas últimas séries divergem.
+∞ +∞

(d) Por (c) temos


+∞ +∞
∑ pn = ∑ qn = +∞.
n=0 n=0
Reordenamos a série da seguinte forma.

Na etapa 1, coletamos os primeiros termos, an ≥ 0, com soma > 1.


Na etapa 2, os primeiros termos negativos cuja soma com os anteriores
é < 0.
Na etapa 3, subtraı́dos de N os ı́ndices já escolhidos, coletamos os
próximos termos positivos cuja soma com os anteriores é > 1.

Por indução, o rearranjo obtido é tal que a sequência (tn ) de suas somas
parciais admite uma subsequência (tnk ) com tnk > 1, para todo k, e uma
outra de termos negativos. Logo, (tn ) diverge ♣

55
Corolário. Seja ∑+∞
n=0 an uma série real. As seguintes afirmações são equivalentes.

(a) A série e todos os seus rearranjos são convergentes.

(b) A série é absolutamente convergente.

n=0 pn e ∑n=0 qn são convergentes.


(c) As séries ∑+∞ +∞

(d) A série é comutativamente convergente.

Prova.

(a) ⇒(b) Pelo teorema imediatamente acima, item (d), a série ∑+∞
n=0 an , conver-

n=0 ∣an ∣ < ∞.


gente por hipótese, não converge condicionalmente. Logo, ∑+∞

(b) ⇔(c) Segue do teorema já citado, item (a).

(b) ⇒(d) Segue do teorema já citado, item (b).

(d) ⇒(a) Óbvio ♣


+∞
Observação. Dada uma série complexa ∑ zn , valem as seguintes propriedades.
n=0

∑n=0 zn
+∞
● A série converge comutativamente se e só se as séries reais
+∞ +∞
∑ Re(zn ) e ∑ Im(zn )
n=0 n=0

são comutativamente convergentes.

● Valem as desigualdades, para todo natural n,

(2.2.2) 0 ≤ ∣Re(zn )∣ ≤ ∣zn ∣ , 0 ≤ ∣Im(zn )∣ ≤ ∣zn ∣ e ∣zn ∣ ≤ ∣Re(zn )∣+∣Im(zn )∣.

Com tais observações obtemos o resultado abaixo para séries complexas.


Corolário. Dada ∑+∞
n=0 zn complexa, as seguintes afirmações são equivalentes.

(a) A série ∑+∞


n=0 zn é absolutamente convergente.

n=0 Re(zn ) e ∑n=0 Im(zn ) são absolutamente convergentes.


(b) As séries reais ∑+∞ +∞

(c) A série ∑+∞


n=0 zn é comutativamente convergente.

Prova. Segue das observações anteriores e do corolário imediatamente acima ♣

56
Oswaldo Rio Branco de Oliveira

2.3 - Associatividade para Séries

Nesta seção são feitos alguns comentários sobre a associatividade para séries.
Esta seção é bem simples e não é imprescı́ndivel para o entendimento do capı́tulo.

Dada uma série


+∞
∑ an = a1 + a2 + a3 + ⋯
n=0

com sequência das somas parciais (sn ), a inserção de parenteses, ainda que infi-
nitos, gera uma série
+∞
∑ bn
n=0

cuja sequência das somas parciais (tn ) é, evidentemente, subsequência de (sn ).
Assim, a inserção de parenteses não altera a soma de uma série convergente.

Entretanto, se a série ∑+∞


n=0 an é divergente, a inserção de parenteses pode até

mesmo resultar em uma série convergente. Este é o caso com a série

1 − 1 + 1 − 1 + 1 − 1 + 1⋯.

que após inserirmos determinados parenteses torna-se a série nula

(1 − 1) + (1 − 1) + (1 − 1) + ⋯.

Definição. Sejam σ ∶ N → N estritamente crescente e duas séries


+∞ +∞
∑ an e ∑ bn
n=1 n=1

relacionadas por

b1 = a1 + a2 + ⋯ + aσ (1) , ..., bn+1 = aσ (n)+1 + aσ (n)+2 + ⋯ + aσ (n+1) , onde n = 1, 2, . . . .

n=1 bn é dita obtida da série ∑n=1 an por associação. Brevemente, dizemos


A série ∑+∞ +∞

que a primeira é uma associação da segunda.


Inversamente, a série ∑+∞
n=1 an é dita obtida da série ∑n=1 bn por dissociação.
+∞

Brevemente, dizemos que a primeira é uma dissociação da segunda.

57
Exemplifiquemos com a série harmônica
+∞
1

n=1 n

e a aplicação estritamente crescente σ ∶ N → N dada por σ(n) = 2n. Então temos,

b1 = 1 + , b2 = + , b3 = +
1 1 1 1 1
2 3 4 5 6
e, de maneira geral, bk = 1/(2k − 1) + 1/(2k) para todo k ∈ N.

Proposição (Lei Associativa para Séries). Suponhamos que a série


+∞
∑ bn
n=1

n=1 an = a. Então temos


é uma associação da série convergente ∑+∞
+∞
∑ bn = a.
n=1

Prova.

Mantendo a notação sn = a1 + ⋯ + an e tn = b1 + ⋯ + bn = sσ(n) segue trivial-


mente, lim tn = lim sσ(n) = lim sn ♣

Observação. Seja ∑+∞n=1 an uma série complexa e absolutamente convergente.

Consideremos N = ⋃ Fi , com cada Fi finito e não vazio, e tal que Fi ∩ Fj = ∅ para


i ≠ j (esta é uma partição de N por conjuntos finitos). Temos
+∞ +∞
∑ a n = ∑ ui , onde ui = ∑ an , para cada i ∈ I.
n=1 i=1 n∈Fi

[Os conjuntos Fi , onde i ∈ I, são ditos dois a dois disjuntos se Fi ∩ Fj = ∅, i ≠ j.]


Prova.

Segue da comutatividade da série absolutamente convergente ∑+∞ n=0 an , lis-

tando sucessivamente, na etapa i, com i = 1, 2, ..., os termos an tais que


n ∈ Fi e então agrupando-os pela associatividade na proposição acima ♣

58
Oswaldo Rio Branco de Oliveira

2.4 Teorema de Riemann

Teorema (Riemann). Seja


+∞
∑ an
n−0

uma série real e condicionalmente convergente. Dados x, y ∈ [−∞, +∞], com x ≤ y,


n−0 bn de ∑n−0 an tal que, se sn = b1 + ⋯ + bn então
existe um rearranjo ∑+∞ +∞

lim inf sn = x e lim sup sn = y.

Prova. Sejam pn a parte positiva de an e qn a parte negativa de an .

Como ∑+∞
n=0 an converge, temos

0 = lim an = lim pn = lim qn .

n=0 ∣an ∣ = +∞, donde segue ∑n=0 pn = +∞ ou ∑n=0 qn = +∞.


Também temos ∑+∞ +∞ +∞

Então, como existe lim ∑ni=1 ai = lim(∑ni=1 pi − ∑ni=1 qi ), concluı́mos que


+∞ +∞
∑ pn = ∑ qn = +∞.
n=0 n=0

Consideremos agora a partição

N = P ⊍ Q, com P = {i ∶ ai = pi ≥ 0} e Q = {j ∶ aj = −qj < 0},

e dois números reais x e y, com x ≤ y. Reordenemos a série ∑+∞


n=0 an tomando

os n1 primeiros ı́ndices em P , indicados {1, . . . , n1 }, tais que

p1 + ⋯ + pn1 > y.

A seguir, sejam os n2 primeiros ı́ndices em Q, indicados {1, 2, . . . , n2 }, tais


que
p1 + p2 + ⋯ + pn1 − q1 − q2 − ⋯ − qn2 < x.

Subtraı́dos em P os ı́ndices já selecionados, escolhemos os novos primeiros


ı́ndices, indicados {n1 + 1, . . . , n3 }, tais que

p1 + p2 + ⋯ + pn1 − q1 − q2 − ⋯ − qn2 + pn1 +1 + ⋯ + pn3 > y.

59
Procedendo analogamente com Q, retirados os ı́ndices já coletados, pegamos
os primeiros ı́ndices {n3 + 1, . . . , n4 } satisfazendo

p1 + p2 + ⋯ + pn1 − q1 − q2 − ⋯ − qn2 + pn1 +1 + ⋯ + pn3 − qn3 +1 − ⋯ − qn4 < x.

Continuando este processo ad infinitum obtemos um rearranjo ∑+∞ n=0 bn de

∑n=0 an tal que se (sn ) é a sequência de suas somas parciais temos, para i
+∞

ı́mpar,
sni+1 < x ≤ y < sni , sni − pni ≤ y e sni+1 + qni+1 ≥ x.

Donde segue 0 < x − sni+1 ≤ qni +1 e 0 < sni − y ≤ pni e então

(sni ), com i par, converge a x e (sni ), com i ı́mpar, converge a y.

Além disso, é fácil ver que para cada i ı́mpar temos

se ni < n < ni+1 então sni +1 ≤ sn ≤ sni .

Assim, se s é um valor de aderência de (sn ) não é possı́vel s > y e também


não é possı́vel s < x. Logo, temos x ≤ s ≤ y e, como x e y são valores de
aderência de (sn ), concluı́mos que x é o menor valor de aderência e y é o
maior valor de aderência. Isto é,

x = lim inf sn e y = lim sup sn .

Os casos x = −∞ ou y = +∞ são análogos, simples, e os deixamos ao leitor♣

Corolário. Consideremos uma série real e condicionalmente convergente


+∞
∑ an
n=0

e x um número real. Então, existe um rearranjo ∑+∞


n=0 bn da série dada tal que

+∞
∑ bn = x.
n=0

Prova. Caso particular do teorema imediatamente acima, com x = y♣

60
Capı́tulo 3

SOMAS NÃO ORDENADAS


VERSUS SÉRIES.
ASSOCIATIVIDADE
3.1 - Introdução

Para séries ainda que convergentes, não é em geral válido


+∞ +∞ +∞
∑ an = ∑ a2n + ∑ a2n+1 ,
n=0 n=0 n=0

como bem mostra a série (convergente) harmônica alternada. De fato, temos


+∞
(−1)2n+1 1 +∞ 1 +∞
(−1)(2n+1)+1 +∞ 1
∑ = − ∑ = −∞ e ∑ =∑ = +∞.
n=1 2n 2 n=0 n n=0 2n + 1 n=0 2n + 1

Entretanto, veremos que para somas não ordenadas e para séries absolutamente
convergentes, efetivamente valem as associações (valem quaisquer associações)
+∞ +∞ +∞
∑ an = ∑ an + ∑ an e ∑ an = ∑ a2n + ∑ a2n+1 .
N 2N 2N+1 n=0 n=0 n=0

Para uma série de números positivos


+∞
∑ pn ,
n=0

veremos que podemos associar os termos de forma totalmente arbitrária. Desta


forma, dada uma série real e absolutamente convergente ∑+∞
n=0 an , escrevendo
+∞ +∞ +∞
∑ an = ∑ pn − ∑ qn , com pn e qn as partes positivas e negativas de an ,
n=0 n=0 n=0

concluiremos que podemos associar de forma arbitrária os termos da série ∑+∞


n=0 an .

61
O caso de uma série complexa (ou de uma soma não ordenada complexa) é
facilmente redutı́vel ao caso real. Assim, tendo em vista que já provamos que as
séries absolutamente convergentes são comutativamente convergentes, ganhamos
muita liberdade ao lidarmos com séries absolutamente convergentes ao aplicarmos
a elas o conceito de associatividade para famı́lias somáveis (apropriado ao
estudo de somas não ordenadas), ao invés da restrita associatividade para séries.

As séries absolutamente convergentes foram interpretadas pelo uruguaio J. L.


Massera (1915-2002) como “séries de borracha” e a tal comentário, modestamente
adicionarı́amos “acrobáticas”.

Com o conceito de somabilidade, para efetuarmos a soma não ordenada de uma


famı́lia
(aj )j∈J

de números reais ou complexos, onde J é um conjunto enumerável (isto é, existe


uma bijeção σ ∶ N → J) arbitrário de ı́ndices, diferentemente do conceito de séries
desprezamos a ordem dos termos e veremos que somabilidade e convergência
absoluta são conceitos equivalentes.

Porém, a somabilidade permite um melhor entendimento da convergência ab-


soluta e generalizar a propriedade associativa para séries (vide Capı́tulo 2).

No próximo capı́tulo (Capı́tulo 4) veremos como somar uma famı́lia não ne-
cessariamente enumerável (isto é, indexada em um conjunto não necessariamente
enumerável), de números reais ou complexos.

3.2 - Somas não ordenadas X Séries

Abaixo mostramos uma forma de estimarmos o valor de uma série de termos


positivos que independe da ordem de seus termos, o que será útil para definirmos
somas de famı́lias enumeráveis e, em particular, somas de sequências.

62
Oswaldo Rio Branco de Oliveira

Teorema. Seja ∑+∞


n=0 pn uma série de termos positivos. Temos

+∞
∑ pn = ρ , com ρ = sup { ∑ pn ∶ F ⊂ N e F f inito } ∈ [0, +∞].
n=0 n∈F

Prova.

Consideremos (sm ) a sequência (crescente) das somas parciais da série dada


e F ⊂ N, com F finito e arbitrário. Pelas desigualdades
+∞
∑ pm ≤ smax(F ) ≤ ∑ pn e sm = ∑ pk ≤ ρ
m∈F n=1 k∈{1,...,m}

é óbvio que
+∞
ρ = sup { ∑ pm ∶ F ⊂ N e F finito} ≤ ∑ pn = lim sm ≤ ρ♣
m→+∞
m∈F n=1

O teorema acima sugere o estudo de somas não ordenadas e para tal introdu-
zimos o conceito de famı́lia somável. Somas não ordenadas ocorrem naturalmente
em Teoria da Probabilidade e em Análise Funcional. O tratamento geral de uma
soma de elementos xi , com i ∈ I e I um conjunto de ı́ndices, supõe I um conjunto
de ı́ndices totalmente arbitrário (vide Beardon [11]). Neste capı́tulo, o conjunto
no qual uma soma é indexada é sempre um conjunto enumerável.

Definição. Seja I um conjunto de ı́ndices (arbitrário) enumerável.

○ Uma famı́lia em C, indexada em I, é uma função x ∶ I → C, que notamos


(xi )I , onde xi = x(i) é o i-termo da famı́lia, para todo i ∈ I.

○ Dadas duas famı́lias (xi )I e (yi )I e λ um escalar em C, definimos a adição

(xi )I + (yi )I = (xi + yi )I

e a multiplicação por um escalar

λ(xi )I = (λxi )I .

63
Toda sequência é, claramente, uma famı́lia. Neste capı́tulo, I e J indicam
conjuntos enumeráveis de ı́ndices . Se I = N×N = N2 , então a famı́lia x ∶ N×N → K
é chamada sequência dupla. No caso I = N × N × N = N3 , a famı́lia x ∶ N3 → K é
chamada sequência tripla.
Baseando-nos no teorema provado acima, temos as seguintes definições.
Definições. Dada uma famı́lia (p i )i∈I de termos em [0, +∞], indicamos

∑ pi = sup { ∑ pi ∶ F ⊂ I e F f inito } .
i∈F

○ Se ∑ pi < ∞ , dizemos que (pi )I é uma famı́lia somável (ou, brevemente,


somável) com soma ∑ p i , também indicada

∑ p i ou ∑ p i .
I i∈I

○ Se I = N e (pn )N é somável, chamamos (pn ) de sequência somável.

Observações. Seja (pi )I uma famı́lia (enumerável) de termos positivos.

● Seja σ ∶ J → I uma bijeção. É fácil ver que vale a igualdade

∑ pi = ∑ pσ(j) .
I J

Logo, a famı́lia (pi )I é somável se e só se a famı́lia (pσ(j) )J é somável.

● Se I = N, é trivial ver que


+∞
∑ pn = ∑ pn .
n=0

Corolário. Seja (pn ) uma sequência de termos positivos. Então, (pn ) é uma
sequência somável se e só se a série ∑+∞
n=0 pn é convergente. Nestes casos temos

+∞
∑ pn = ∑ pn .
n=0

Prova. Segue da observação acima ♣

64
Oswaldo Rio Branco de Oliveira

Corolário. Seja (p i )I uma famı́lia de termos positivos e σ ∶ N → I uma bijeção.


Então, (p i )I é uma famı́lia somável se e somente se a série ∑+∞
n=0 pσ(n) é conver-

gente. Nestes casos temos


+∞
∑ p i = ∑ pσ(n) .
n=0

Prova. Segue da observação e do corolário, ambos acima♣

Comentários.

● A notação para séries,


+∞
∑ xn ,
n=1

indica que estamos somando os termos ordenadamente: desde o primeiro,


x1 , e então o segundo x2 e assim sucessivamente “ad infinitum”. A notação

∑ xn
N

para a soma da sequência (xn ) indica que estamos usando N apenas como
conjunto, sem relevância das propriedades de sua ordem. Assim, para a
soma de uma sequência podemos substituir o conjunto de ı́ndices N por
qualquer outro conjunto enumerável (infinito).

● Visto que para uma série ∑+∞n=0 pn de termos reais e positivos, portanto

convergente ou divergente (para +∞), vale a igualdade


+∞
∑ pn = ∑ pn ,
n=0

concluı́mos que para séries de termos positivos podemos utilizar livremente


a notação
∑ pn

pois não há risco de dubiedade se a interpretarmos como uma série ou como
uma soma (não ordenada).

65
Definição. Seja J um conjunto de ı́ndices enumerável.

○ Uma famı́lia (xj )J de números reais é somável se as famı́lias

(pj )J e (qj )J

das partes positivas e negativas de xj , onde j ∈ J, respectivamente, são


somáveis. Se (xj ) é somável, sua soma (não ordenada) é

∑ xj = ∑ p j − ∑ q j .

○ Uma famı́lia (zj )J de números complexos é somável se as famı́lias

(Re(zj ))J e (Im(zj ))J ,

das partes reais e imaginárias de zj , onde j ∈ J, respectivamente, são


somáveis. Se (zj )J é somável, sua soma (não ordenada) é

∑ zj = ∑ Re(zj ) + i ∑ Im(zj ).

○ Uma famı́lia (zj )J de números reais ou complexos é uma famı́lia absoluta-


mente somável se a famı́lia ( ∣zj ∣ )J é somável. Isto é, se

∑ ∣zj ∣ < ∞.

Comentários.

● Escrevemos
∑ ai < ∞

para indicar que a famı́lia (ai )I é somável.

● Se I = N e (an )N é somável, chamamos (an ) de sequência somável.

● A definição de famı́lias somáveis dada acima é equivalente a usualmente


apresentada nos textos que abordam somas não ordenadas (ou, dito de
outra forma, somabilidade).

66
Oswaldo Rio Branco de Oliveira

Lema (Soma/Série). Seja (zj )J uma famı́lia em C e σ ∶ N → J bijetora. São


equivalentes as propriedades abaixo.

(a) (zj )J é somável.

(b) ( zj )J é absolutamente somável.

(c) ∑ ∣zσ(n) ∣ é (absolutamente) convergente.


+∞

n=0

Ainda, ocorrendo (a) ou (b) ou (c) temos,


+∞
∑ zj = ∑ zσ(n) .
n=0

Prova. Consideremos as famı́lias (Re(zj ))J e (Im(zj ))J e as famı́lias de suas


partes positivas, (pj )J e (Pj )J , respectivamente, e de suas partes negativas, (qj )J
e (Qj )J , também respectivamente.

(a) ⇔(b). É trivial ver que para todo j ∈ J temos

0 ≤ max {pj , qj , Pj , Qj } ≤ ∣zj ∣ ≤ pj + qj + Pj + Qj .

Logo, temos ∑ ∣zj ∣ < ∞ se e somente se ∑ pj , ∑ qj , ∑ Pj e ∑ Qj são finitas.


Donde, a famı́lia (∣zj ∣)J é somável se e somente se (zj ) é somável.

(b) ⇔(c). Segue dos corolários acima.

◇ Para finalizar, suponhamos que (a) ou (b) ou (c) vale. Sendo assim, pelas
definições dadas acima temos ∑ zj = ∑ Re(zj ) + i ∑ Im(zj ) e também temos
∑ Re(zj ) = ∑ pj − ∑ qj e ∑ Im(zj ) = ∑ Pj − ∑ Qj .
Então, aplicando os corolários acima obtemos

∑ pj = ∑ pσ(n) , ∑ qj = ∑ qσ(n) , ∑ Pj = ∑ Pσ(n) ∑ Qj = ∑ Qσ(n) .


+∞ +∞ +∞ +∞
e
n=0 n=0 n=0 n=0

Donde segue,

∑ zj = [ ∑ pσ(n) − ∑ qσ(n) ] + i [ ∑ Pσ(n) − ∑ Qσ(n) ]


+∞ +∞ +∞ +∞

n=0 n=0 n=0 n=0

= ∑ Re[zσ(n) ] + i ∑ Im[zσ(n) ] = ∑ zσ(n) ♣


+∞ +∞ +∞

n=0 n=0 n=0

67
Corolário. Seja (zi )I uma famı́lia somável e J um subconjunto de I. Então,
também a famı́lia (zi )i ∈ J é somável.
Prova.

Pelo lema acima, item (b), temos ∑i∈I ∣zi ∣ < ∞ e, pela inclusão J ⊂ I, a
desigualdade
∑ ∣zi ∣ ≤ ∑ ∣zi ∣ .
i∈J i∈I

Portanto, pelo item (a) do mesmo lema, a famı́lia (zi )I é somável♣

Proposição. Sejam (aj )J e (bj )J famı́lias somáveis em C e λ ∈ C. Então, as


famı́lias (aj + bj )J e (λaj )J são somáveis e valem as propriedades:

(a) ∑(aj + bj ) = ∑ aj + ∑ bj .

(b) ∑ λaj = λ ∑ aj .

Prova. Seja σ ∶ N → J uma bijeção arbitrária.

(a) Pelo lema acima, as séries


+∞ +∞
∑ ∣aσ(n) ∣ e ∑ ∣bσ(n) ∣
n=0 n=0

convergem. Então, pela desigualdade triangular a série


+∞
∑ ∣aσ(n) + bσ(n) ∣
n=0

também converge. Portanto, pelo mesmo lema, a famı́lia (aj +bj )J é somável
e
+∞ +∞ +∞
∑(aj + bj ) = ∑ ( aσ(n) + bσ(n) ) = ∑ aσ(n) + ∑ bσ(n) = ∑ aj + ∑ bj .
J n=0 n=0 n=0 J J

(b) Este caso é análogo ao caso (a) e o deixamos ao leitor♣

68
Oswaldo Rio Branco de Oliveira

3.3 - Associatividade

A associatividade para somas, diferentemente da restrita associatividade para


séries, se dá mesmo particionando N em uma quantidade infinita de subconjuntos
infinitos de N, o que pode ser obtido, por exemplo, listando os números primos

I = {1, 2, 3, 5, 7, . . .},

em ordem crescente, e introduzindo F1 = {1}, o conjunto F2 dos naturais múltiplos


de 2, o conjunto F3 dos naturais múltiplos de 3 mas não de 2, o conjunto F5
dos naturais múltipos de 5 mas não de 2 ou 3, e assim sucessivamente e então
escrevendo
N = ⋃ Fp , com Fp ∩ Fq = ∅ se p ≠ q.
I

Enfatizamos que os resultados nesta seção, para sequências somáveis, se es-


tendem trivialmente a famı́lias somáveis indexadas em um conjunto enumerável
I ao utilizarmos uma bijeção arbitrária σ ∶ N → I. Os enunciamos e provamos
para sequências por comodidade.
O primeiro destes três resultados mostra que podemos: (1) associar livremente
uma famı́lia de números positivos e (2) dissociar cada termo de uma famı́lia de
números positivos livremente como uma famı́lia de números também positivos; no
sentido de que tais operações não alteram a somabilidade ou a não somabilidade
da famı́lia original. Em suma, para computarmos a soma de uma famı́lia de
números positivos podemos introduzir ou suprimir parenteses livremente.
Nesta seção utilizaremos as notações abaixo:

● O sı́mbolo ⊍ indica uma reunião de conjuntos dois a dois disjuntos.

● Uma partição de N é uma reunião N = ⊍ J i , onde I é um conjunto de ı́ndices


I
(enumerável), satisfazendo as seguintes condições:

(a) Ji ∩ Ji′ = ∅ se i ≠ i′ , quaisquer que sejam i e i′ em I.


(b) J i ≠ ∅ para todo i ∈ I.

Meramente sugerimos ao leitor que antes de prosseguir na leitura mostre : “Dados


A e B, dois subconjuntos não vazios de R, então vale sup A + sup B = sup(A + B),
com a convenção sup X = +∞ se X não é majorado superiormente”.

69
Teorema (Associatividade e Dissociatividade). Seja (pn ) uma sequência
de termos em [0, +∞]. Seja N = ⊍ J i uma partição qualquer de N. Então,
I

∑ pn = ∑ ∑ pn .
i ∈ I n ∈J i

Prova.

(≤) Dado F finito em N, por hipótese existe um subconjunto finito de ı́ndices


distintos {i1 , . . . , ik } ⊂ I tal que F ⊂ Ji1 ∪ ⋯ ∪ Jik . Donde segue,

∑ pn ≤ ∑ pn + ⋯ + ∑ pn ≤ ∑ ∑ pn
n∈F Ji1 Jik i∈ I n ∈J i

e então, pela definição de ∑ pn , obtemos a primeira desigualdade

∑ pn ≤ ∑ ∑ pn .
i∈ I n ∈J i

(≥) Dado um conjunto finito de ı́ndices distintos {i1 , . . . , ik } ⊂ I e conjuntos


finitos Fir , com Fir ⊂ Jir se 1 ≤ r ≤ k, então Ji1 ,. . . ,Jik são dois a dois
disjuntos e portanto Fi1 ,. . . ,Fik também. Segue

∑ pn + ⋯ + ∑ pn ≤ ∑ pn .
n∈Fi1 n∈Fik

Na desigualdade acima, fixando os conjuntos Fi2 , . . . , Fik e computando o


supremo sobre a famı́lia dos conjuntos finitos Fi1 contidos em Ji1 obtemos
a desigualdade ∑Ji1 pn + ∑Fi2 pn + ⋯ + ∑Fik pn ≤ ∑ pn . Nesta desigualdade,
fixos Fi3 , . . . , Fik , computando o supremo sobre a famı́lia de conjuntos finitos
Fi2 ⊂ Ji2 segue a desigualdade ∑Ji1 pn + ∑Ji2 pn + ∑Fi3 pn + ⋯ + ∑Fik pn ≤ ∑ pn .
Assim, por indução encontramos

∑ pn + ∑ pn + ⋯ + ∑ pn ≤ ∑ pn .
Ji1 Ji2 Jik

Por fim, como {i1 , i2 , . . . , ik } é qualquer subconjunto finito de I concluı́mos

∑ ∑ pn ≤ ∑ pn ♣
i∈I n∈J i

70
Oswaldo Rio Branco de Oliveira

Corolário (Lei Associativa Para Somas). Seja (an ) uma sequência somável.
Suponha
N = ⊍ J i uma partição arbitrária de N.
I

Então, a famı́lia (an )n∈Ji é somável, para todo i ∈ I, e

∑ an = ∑ ∑ an .
I n∈J i

Prova.

Já vimos que cada sub-famı́lia (an )n∈Ji é somável.

◇ Em R, a identidade anunciada segue da decomposição

∑ an = ∑ p n − ∑ q n ,

com pn e qn as partes positiva e negativa de an , respectivamente, para todo


n ∈ N e da associatividade para sequências somáveis de termos positivos.

◇ Em C, a identidade segue da decomposição

∑ an = ∑ Re(an ) + i ∑ Im(an )

e do caso real provado acima♣

Corolário. Seja (an ) uma sequência somável. Suponha (Im ) uma sequência
crescente arbitrária de subconjuntos de N tal que

⋃ Im = N

(dita uma sequência exaustiva para N). Então, a famı́lia (an )n∈Im é somável, para
todo m ∈ N, e
lim ∑ an = ∑ an .
m→+∞
n∈Im

Prova.

◇ Mantenhamos a notação na prova do corolário acima. Sabemos que cada


sub=-famı́lia (an )Im , é somável. A seguir, dividamos a prova em três casos.

71
(a) Suponhamos an ≥ 0, para todo n ∈ N. É fácil ver que temos

0 ≤ ∑ an ≤ ∑ an para todo m ∈ N,
n∈Im

que a sequência
( ∑ an ) é crescente
n∈Im m∈N
e que vale a desigualdade

lim ∑ an ≤ ∑ an .
m→+∞
n∈Im

Mostremos a reversa desta desigualdade. De fato, é fácil ver que dado F


um subconjunto finito arbitrário de N, existe n ∈ N tal que F ⊂ In e obtemos

∑ an ≤ ∑ an ≤ m→+∞
lim ∑ an .
n∈F n∈Im n∈Im

Donde segue
∑ an ≤ m→+∞
lim ∑ an .
n∈F n∈Im

Por fim, como F é um subconjunto finito arbitrário de N, pela definição de


soma de positivos segue a desigualdade desejada

∑ an ≤ m→+∞
lim ∑ an .
n∈Im

(b) Suponhamos an ∈ R, para todo n ∈ N. A demonstração segue então da


decomposição
∑ an = ∑ p n − ∑ q n

e do caso (a).

(c) Suponhamos an ∈ C, para todo n ∈ N. A demonstração segue então da


decomposição
∑ an = ∑ Re(an ) + i ∑ Im(an )

e do caso (b)♣

72
Oswaldo Rio Branco de Oliveira

3.4 - Soma de uma Sequência Dupla e o Produto de Séries

Seguem versões da lei associativa para uma sequência dupla (a(n,m) ) N×N . In-
dicamos anm = a(n,m) os termos de uma sequência dupla e sua soma por

∑ anm = ∑ anm = ∑ anm .


N×N n,m

Indicamos a sequência dupla com a matriz infinita

⎛ a11 a12 a13 ....... ⎞


⎜ ⎟
⎜ a21 a22 a23 ....... ⎟
⎜ ⎟
⎜ ⎟
⎜ a31 a32 a33 ....... ⎟
⎜ ⎟
⎜ ⎟
⎜ ..... ..... ..... ....... ⎟
⎜ ⎟
⎝ ..... ..... ..... ....... ⎠

Teorema (Soma para sequência dupla). Se ∑ ∣ anm ∣ < ∞, então (anm ) é


somável e vale o que segue.

(a) Se N × N = ⊍ Ji é uma partição de N × N, então


i∈I

∑ ∑ anm = ∑ anm .
i∈I (n,m)∈Ji

(b) Se (Ik )k∈N é uma sequência crescente de subconjuntos de N × N satisfazendo


⋃ Ik = N × N (dita uma sequência exaustiva para N × N), então

lim ∑ anm = ∑ anm .


k→∞
(n,m)∈Ik

(c) (Séries iteradas/ Somatório duplo). Temos


+∞ +∞ +∞ +∞
∑ ∑ anm = ∑ ∑ anm = ∑ anm
n=0 m=0 m=0 n=0

(d) Para toda bijeção σ ∶ N → N × N, vale


+∞
∑ aσ(k) = ∑ anm .
k =0

73
Prova. [Vide figuras 3.1, 3.2 e 3.3(a) a seguir.] A somabilidade de (anm ) é trivial.

(a) Segue do corolário “lei associativa” (vide Figura 3.2).

(b) Segue do último corolário acima (vide Figura 3.1).

(c) Aplicando o item (a) e o lema soma/série (duas vezes), temos


+∞ +∞ +∞ +∞
∑ anm = ∑ ∑ anm = ∑ ∑ anm [analogamente para ∑ ∑ anm ].
N×N n∈N m∈N n=0 m=0 m=0 n=0

(d) Segue do lema soma/série♣

Observação. Supondo
+∞ +∞
∑ an = a e ∑ bm = b,
n=0 m=0

é fácil ver que


+∞ +∞ +∞ +∞
∑ ∑ an bm = ∑ ∑ an bm = ab.
n=0 m=0 m=0 n=0

Antes de definirmos o produto de duas séries notemos que dadas


+∞ +∞
∑ an e ∑ b m ,
n=0

há infinitas maneiras de associarmos os termos da sequência dupla (an bm ) para


formarmos uma série. Nestas notas usaremos apenas o produto de Cauchy abaixo.

Definição. O Produto de Cauchy das séries


+∞ +∞
∑ an e ∑ b m ,
n=0 m=0

é a série
+∞
(a0 b0 ) + (a0 b1 + a1 b0 ) + ⋯ = ∑ cp , com cp = ∑ an b m .
p=0 n+m =p

O produto de Cauchy surge, no caso finito, com a multiplicação de dois po-


linômios arbitrários e, no caso infinito, com o produto de duas séries de potências
arbitrárias. Vide Exemplo 30 e Figura 3.3(b), a seguir.

74
Oswaldo Rio Branco de Oliveira

Corolário. Sejam
∞ ∞
∑ an = a e ∑ b m = b

séries absolutamente convergentes. Então temos ∑ ∣ an bm ∣ < ∞ e ainda,

(a) ∑ an bm = ab.

(b) O produto de Cauchy das séries apresentadas é também uma série absoluta-
mente convergente e tem por soma
+∞
∑ ( ∑ an bm ) = ab.
p=0 n+m=p

Prova.

É claro que
∑ ∣an bm ∣ = (∑ ∣an ∣) (∑ ∣bm ∣) < ∞.

Assim, (an bm ) é somável.

(a) Pela fórmula (c) para a soma de uma sequência dupla segue trivialmente
+∞ +∞
∑ an bm = ∑ ∑ an bm = ab.
n=0 m=0

(b) Considerando a partição (Jp )p∈N de N × N definida por

Jp = {(n, m) ∈ N × N ∶ n + m = p} [vide figura 3.3 (b)]

e então aplicando o item (a), a fórmula (a) para a soma de uma sequência
dupla e o lema soma/série obtemos
+∞ +∞
ab = ∑ an bm = ∑ cp = ∑ cp , com cp = ∑ an bm e ∑ ∣cp ∣ < ∞♣
p∈N p=0 n+m=p p=0

Comentário. Apresentamos a prova acima para o item (b), utilizando o conceito


de somas não ordenadas, devido a: (1) sua concisão e (2) tal conceito é muito
útil para provarmos, também concisamente, teoremas e regras operatórias para
séries de potências.

75
= ×
= ∑
N×N

.
.
.

In
.
.
. I5
I7
I3 I4
I2 I2
I1 . . .

I1
I3 I6

In ⊂ In+1 e ⋃ In = N × N In ⋂ Im ≠ ∅ , n ≠ m , e ⋃ In = N × N
lim ∑ aij = ∑ anm ∑ ∑ aij = ∑ aij
n→+∞ In N×N N In N×N
(a) Sequência exaustiva para N×N. (b) Associatividade.

Figura 3.1: Ilustração ao Teorema 6.23 (b) e (a), respectivamente.

+∞ +∞
∑ ∑ anm
n=0 m=0

+∞ +∞

m=0
∑ a1m ..... ∑ anm
m=0

Figura 3.2: Ilustração ao Teorema 6.23 (c) - ∑ ∑ anm = ∑ anm


+∞ +∞

n=0 m=0 N×N

+∞
∑ ∑ an b m
+∞ +∞
∑ ∑ anm
m=0 n=0
p=0 n+m=p
+∞
∑ anm
n=0

.
.
.
+∞
∑ an1
∑ an b m ∑ an b m
n=0

N × N = ⋃n∈N N × {n}
n+m=1 n+m=p
O Produto de Cauchy
+∞ +∞
(a) ∑ ∑ anm = ∑ anm (b) N × N = ⋃ {(n, m) ∶ n + m = p}
m=0 n=0 N×N p∈N

Figura 3.3: Ilustração ao Teorema 6.23 (c) ; Ilustração à Definição 6.25

76
Oswaldo Rio Branco de Oliveira

Exemplo 29. Justifiquemos a fórmula para o produto de Cauchy.


(a) Se a0 + a1 z + ⋯ + an z n e b0 + b1 z + ⋯ + bm z m são polinômios na variável z ∈ C,
com coeficientes complexos, é claro que

(a0 + a1 z + ⋯ + an z n )(b0 + b1 z + ⋯ + bm z m ) = ∑ cp z p , com cp = ∑ an bm .


n+m

p=0 n+m=p

(b) Sejam f (z) = ∑ an z n e g(z) = ∑ bm z m séries em C e absolutamente con-


+∞ +∞

vergentes qualquer que seja z ∈ C. Já mostramos que


n=0 m=0

f (z)g(z) = ∑ an bm z n z m = ∑ an bm z n+m e que

∑ an bm z n+m = ∑ ∑ an bm z p = ∑ cp z p , com cp = ∑ an bm .
p∈N n+m=p p∈N n+m=p

Pelo lema soma/série temos


+∞
∑ cp z p = ∑ cp z p .
p∈N p=0

Por fim concluı́mos,


+∞
f (z)g(z) = ∑ an bm z n+m = ∑ cp z p , com cp = ∑ an bm .
p=0 n+m=p

Exemplo 30. Se ∣z∣ < 1, a soma da sequência dupla dada pela matriz
⎛ z z2 z 4 ..... ⎞
z3
⎜ ⎟
⎜ z 2 z 3 z 4 z 5 ..... ⎟
⎜ ⎟
⎜ ⎟
⎜ z 3 z 4 z 5 z 6 ..... ⎟
z
⎜ ⎟ (1 − z)2
é .
⎜ ⎟
⎜ ..... ..... ..... .... ..... ⎟
⎜ ⎟
⎝ ..... ..... ..... .... ..... ⎠
Prova. Inicialmente mostremos que a sequência dupla é somável.
A soma dos valores absolutos dos elementos na n-ésima linha, n = 1, 2, . . . é
+∞
∣z∣n
∑ ∣z∣n+p = ∑ ∣z∣n+p =
1 − ∣z∣
,
p∈N p=1

e, somando tais resultados obtemos,


∣z∣n 1 +∞ n ∣z∣
∑ = ∑ ∣z∣ =
n∈N 1 − ∣z∣ 1 − ∣z∣ n=1 (1 − ∣z∣)2
.

Então, a soma da sequência dupla é


z
(1 − z)2

77
3.5 - A Exponencial Complexa e as Funções Trigonométricas

Teorema (Exponencial complexa). A função exponencial complexa,


+∞
exp(z) = ∑ , com z ∈ C,
zn
n=0 n!

é bem definida, satisfazendo as propriedades abaixo.

(a) exp(z + w) = exp(z) exp(w), para quaisquer z w, ambos em C.

(b) exp(0) = 1, e para todo z ∈ C, exp(z) = exp(−z) e exp(z) ≠ 0.


−1

(c) Seja e = lim(1 + 1/n)n o número de Euler. Então,


+∞
exp(1) = e = ∑
1
.
n=0 n!

(d) exp(x) = ex para todo racional x.

(e) A restrição de exp ∶ C → C ao conjunto R é a função exp ∶ R → (0, +∞).

(f) Com a notação ez = exp(z) temos ez = ez e ∣ez ∣ = eRe(z) , para todo z em C.

(g) Vale o limite


= 1.
eh − 1
lim
h→0 h
(h) exp(z) é contı́nua em C.

(i) Vale o limite (a derivada da função exponencial complexa)

= ez , para todo z ∈ C.
ez+h − ez
lim
h→0 h

Prova.

(a) Utilizando a fórmula para o produto de Cauchy das séries absolutamente


convergentes exp(z) e exp(w) obtemos,
+∞
z n +∞ wm +∞
exp(z) exp(w) = ( ∑ )( ∑ ) = ∑ ∑ z w =
1 n m
n=0 n! m=0 m! p=0 n+m=p n! m!

+∞
1 n=p +∞
(z + w)p
= ∑ z n wp−n = ∑ = exp(z + w) .
p!

p=0 p ! n=0 n! (p − n)! p=0 p!

78
Oswaldo Rio Branco de Oliveira

(b) É óbvio que exp(0) = 1. Assim, dado z ∈ C e empregando (a) obtemos,

1 = exp(0) = exp(z − z) = exp(z) exp(−z) .

Donde segue exp(z) ≠ 0. Ainda mais, exp(z)−1 = exp(−z).

(c) Utilizemos de duas formas o desenvolvimento


1 n p=n n 1
(1 + ) = ∑ ( ) p
n p=0 p n

n(n − 1)⋯[n − (n − 1)] 1


= 1+1+
n(n − 1) 1 n(n − 1)(n − 2) 1
2
+ 3
+⋯+
2! n 3! n n! nn
= 1 + 1 + (1 − ) + (1 − ) (1 − ) + ⋯ + (1 − ) ⋯ (1 − ).
1 1 1 1 2 1 1 n−1
2! n 3! n n n! n n
Primeiro, é trivial ver que

(1 + ) ≤ 1 + 1 + + + ⋯ + , para todo n ∈ N.
1 n 1 1 1
n 2! 3! n!
Está provado e ≤ exp(1). Segundo, fixemos m tal que m ≤ n. Então segue

(1 + ) ≥
1 n
n

≥ 1+1+ (1 − )+ (1 − ) (1 − )+⋯+ (1 − ) ⋯ (1 − ).
1 1 1 1 2 1 1 m−1
2! n 3! n n m! n n
A seguir, impondo n → +∞ concluı́mos que

e = lim (1 + ) ≥ 1 + 1 + + ⋯ +
1 n
, para todo m ∈ N.
1 1
n 2! m!
Isto prova e ≥ exp(1).

(d) e (e) São afirmações triviais (vide Capı́tulo 1).

(f) Como ∣z∣ = ∣z∣, segue que a função conjugado C ∋ z ↦ z ∈ C é contı́nua.


Donde segue

zj
ez = lim ∑ = lim ( ∑ ) = lim ∑ = ez .
n n n
zj zj
j=0 j! j=0 j! j=0 j!
n→+∞ n→+∞ n→+∞

Ainda mais,

∣ez ∣2 = ez ez = ez ez = ez+z = e2Re(z) = ( eRe(z) ) .


2

Então, utilizando que eRe(z) ≥ 0 obtemos eRe(z) = ∣ez ∣.

79
(g) É fácil ver que temos

1 +∞ hn 1 +∞ hn
= (∑ − 1) = = 1+ +
eh − 1 h h2
∑ + ⋯.
h h n=0 n! h n=1 n! 2! 3!

Logo, supondo ∣ h∣ ≤ 1 e h ≠ 0, obtemos

∣ h∣ ∣ h∣2
∣ − 1∣ ≤ ( + ⋯) ≤ ∣ h∣ [ + + ⋯] ≤ e∣ h∣.
eh − 1 1 1
+
h 2! 3! 2! 3!

Donde segue,
lim ( − 1) = 0.
eh − 1
h→0 h

(h) Dado z ∈ C temos, pelo item anterior,

lim (ez+h − ez ) = lim ez ( ) h = ez .1.0 = 0.


eh − 1
h→0 h→0 h

(i) Pelo item (g) segue

= lim = ez lim = ez ♣
ez+h − ez ez eh − ez eh − 1
lim
h→0 h h→0 h h→0 h

Definamos a seguir as funções trigonométricas complexas sen z e cos z, z ∈ C.


Notemos que até aqui, neste texto, a apresentação das funções trigonométricas
esteve baseada em considerações geométricas.

Pela associatividade para somas não ordenadas, dado θ ∈ R temos (por favor,
cheque)

(3.5.1) eiθ = (1 − + ⋯ + (−1)n + ⋯) + i (θ − + ⋯ + (−1)n


θ2 θ2n θ3 θ2n+1
(2n)! (2n + 1)!
+ ⋯) .
2! 3!

Ainda, as partes real e imaginária da série acima são as séries de Taylor na origem
das funções reais cos θ e senθ, respectivamente (vide Capı́tulo 1).

80
Oswaldo Rio Branco de Oliveira

Apresentamos então as seguintes definições analı́ticas.

Definição. Dado z ∈ C, indicamos

cos z = 1 − + ⋯ + (−1)n sen z = z − + ⋯ + (−1)n


z2 z 2n z3 z 2n+1
(2n)! (2n + 1)!
+⋯ , + ⋯.
2! 3!

Corolário (Fórmula de Euler). Dado θ ∈ R, temos

eiθ = cos θ + isen θ.

Prova. Segue da fórmula 3.5.1 e da definição acima♣

A seguir, verifiquemos que as funções cos x e sen x, com x ∈ R, obtidas restrin-


gindo as funções complexas cos z e sen z ao eixo real, possuem as propriedades
geométricas e analı́ticas que esperamos.

Teorema. As funções cos x e sen x são deriváveis e satisfazem, ∀x ∈ R,

cos′ x = −senx e sen′ x = cos x.

Prova.

Seja h ∈ R. Do teorema “exponencial complexa” segue

eix = lim = −i lim


eix+ih − eix ei(x+h) − eix
.
h→0 ih h→0 h
Logo, identificando as partes reais e imaginárias na identidade acima temos



⎪ cos x = lim sen(x+h)−sen x
= sen′ x


⎪ h→0 h







⎪ sen x = − lim cos(x+h)−cos x
= cos′ x ♣
⎩ h→0 h

A seguir, apresentamos a definição do número π dada por Landau.


Landau foi perseguido durante o nazismo por ser judeu, perdendo seu posto
de professor em Berlim. Bierberbach, um de seus detratores, alegara que sua ma-
temática não era germânica. Provavelmente se referindo, entre outras “razões”,
à definição do número π sugerida por Landau.

81
Teorema (Número de Landau). Existe o menor l > 0 tal que cos l = 0.
Prova.

É óbvio que cos 0 = 1. Mostremos que cos 2 < 0. Escrevendo

cos 2 = (1 − + ) + [(− + ) + (− ) + ⋯] ,
22 24 26 28 210 212
(10)! (12)!
+
2! 4! 6! 8!
temos
= −1 + = −
22 24 2 1
1−
+
2! 4! 3 3
e com cada uma das parcelas entre colchetes satisfazendo

=− (1 − ) < 0, com n ı́mpar e n ≥ 3.


22n 22n+2 22n 4
(2n)! (2n + 2)! (2n)! (2n + 2)(2n + 1)
− +

Segue então que cos 2 < 0.


A função cos x = Re(eix ), onde x ∈ R, é contı́nua e pelo teorema do valor
intermediário ela se anula em algum ponto entre 0 e 2. Então, é fácil concluir
que existe o menor real estritamente positivo l tal cos l = 0 (cheque)♣

Definição (O número π). Indicamos π = 2l, com l o número da Landau.

Proposição. Valem as propriedades abaixo.

(a) ∣eiθ ∣ = 1 = cos2 θ + sen2 θ, para todo θ ∈ R.

(b) eiπ/2 = i e eiπ = −1.

(c) A função exp(z) é periódica com perı́odo 2πi. Isto é,

ez+2πi = ez , para todo z ∈ C.

(d) Se θ ∈ (0, 2π) então eiθ ≠ 1.

(e) ez = 1 se e somente se z ∈ 2πiZ.

(f) (Representação Fundamental). Se ω ∈ C é tal que ∣ω∣ = 1, então existe


um único θ ∈ [0, 2π) tal que eiθ = ω.

(g) A imagem da função exponencial exp ∶ C Ð→ C é o conjunto C∗ = C ∖ {0}.

82
Oswaldo Rio Branco de Oliveira

Prova.

(a) Temos, ∣eiθ ∣2 = eiθ eiθ = eiθ e−iθ = e0 = (cos θ + isen θ)(cos θ − isen θ) = 1.

(b) Pela Fórmula de Euler e pela definição de π segue

eiπ/2 = cos(π/2) + isen(π/2) = isen(π/2) .

Pelo item (b) temos 1 = ∣eiπ/2 ∣ = ∣sen(π/2)∣. Logo, sen(π/2) = ±1. É fácil
ver que cos θ é positiva em (0, π/2), implicando que sen θ é crescente em
(0, π/2), com ∣sen θ∣ ≤ ∣eiθ ∣ = 1 para todo θ ∈ R. Seguem então

sen(π/2) = +1 e eiπ/2 = i.

(c) Temos ez+2πi = ez e2πi = ez (eiπ/2 )4 = ez i4 = ez .

(d) Dado θ ∈ (0, 2π), consideremos

α= ∈ (0, ) .
θ π
4 2
Como cos 0 = 1 e cos(π/2) = 0 e a função cos x (com cos x = sen′ x) é
estritamente positiva no intervalo (0, π/2), temos que a função sen x é es-
tritamente crescente neste intervalo. É claro que sen0 = 0 e, pelo item (b),
sen(π/2) = 1. Logo, concluı́mos que sen x ∈ (0, 1) se x ∈ (0, π/2). Donde
então segue eiα ∉ {+1, −1, +i, −i}. Logo, eiθ = (eiα )4 ≠ 1.

(e) Dado n ∈ Z, pelo item (c) segue e2πni = (e2πi )n = (e0 )n = 1.


Inversamente, se ez = 1 então 1 = ∣ez ∣ = eRe z . Logo, pelas propriedades (b)
e (f) da expoencial obtemos Re z = 0. Assim, podemos escrever z = iy,
com y ∈ R. É fácil ver que existe um único número inteiro n ∈ Z tal que
y ∈ [2nπ, 2(n + 1)π). Logo, y − 2nπ ∈ [0, 2π). Desta forma, utilizando
o item (c) seguem as identidades 1 = ez = eiy = eiy−2nπi = e(y−2nπ)i , com
y − 2nπ ∈ [0, 2π). Então, pelo ı́tem (d) obtemos y − 2nπ = 0. Portanto,

z = iy ∈ 2πiZ.

83

(f) Seja ω = a + ib, com 1 = ∣ω∣ = a2 + b 2 .
Suponhamos a > 0 e b > 0 [logo, a, b ∈ (0, 1)]. Como a função cos x restrita a
[0, π/2] é contı́nua, estritamente decrescente e satisfaz cos 0 = 1 e cos π/2 = 0,
pelo teorema do valor intermediário segue que

existe θ ∈ (0, π/2) tal que cos θ = a.

Donde encontramos

sen2 θ = 1 − cos2 θ = 1 − a2 = b2 .

Assim, como a função sen x é positiva em [0, π/2] [vide a prova do item
(b)], segue que sen θ = b. Logo,

eiθ = cos θ + isen θ = a + ib = ω.

Suponhamos a < 0 e b > 0. Então, existe θ ∈ (0, π/2) tal que eiθ = b − ai.
Assim, α = θ + π/2 ∈ (π/2, π) e eiα = ei(θ+π/2) = eiθ eiπ/2 = (b − ai)i = a + bi = ω.
Suponhamos b < 0 e a ≠ 0. Pelos casos acima existe θ ∈ (0, π) tal que
eiθ = −a − bi. Assim,

α = θ + π ∈ (0, 2π) e eiα = eiθ eiπ = (−a − bi)(−1) = a + bi = ω.

O caso a = 0 e o caso b = 0 são triviais.


A unicidade segue do item (d). De fato, dados θ1 e θ2 em [0, 2π) tais que
eiθ1 = eiθ2 , é claro que podemos supor θ2 ≥ θ1 . Logo, temos θ2 − θ1 ∈ [0, 2π)
e ainda, ei(θ2 −θ1 ) = eiθ2 e−iθ1 = eiθ1 e−iθ1 = e0 = 1. Portanto, θ2 − θ1 = 0 e θ2 = θ1 .

(g) Dado w ∈ C ∖ {0}, temos ∣w∣ ≠ 0 e assim, como exp ∶ R → (0, +∞) é bijetora,
existe x ∈ R tal que ex = ∣w∣. Ainda mais, como

∣ ∣ = 1,
w
∣w∣

pelo item (f) segue que existe y ∈ R tal que eiy = w


∣w∣ . Logo, ex+iy = w ♣

84
Oswaldo Rio Branco de Oliveira

Proposição. Utilizemos a identificação usual C ≡ R2 , como espaço vetoriais reais


e como espaços métricos. Então, para todo k ∈ Z, a restrição dada abaixo é uma
bijeção.



⎪ exp ∶ R × [kπ, kπ + 2π) Ð→ R2 ,







⎪ exp(x, y) = (ex cos y, ex sin y).

replacemen

iR . iR R2 ∖ {(0, 0)}
.
.
exp
4πi
0000000000000000
1111111111111111
2πi
1111111111111111
0000000000000000
0000000000000000
1111111111111111
0 −2πi R R

−4πi

Figura 3.4: A aplicação exp ∶ R2 → R2 ∖ {(0, 0)}

Prova. Deixamos ao leitor verificar♣

Abaixo utilizamos a fórmula, onde N é ı́mpar e z, w ∈ C (cheque),

(z + w)N = [( )z 2n+1 w2m + ( )z 2m w2n+1 ] .


N N

2n+1+2m=N 2m 2n + 1
Teorema. Sejam z e w arbitrários em ∈ C. Então,

sen (z + w) = sen z cos w + sen w cos z.

Prova. Pela definição das funções sen z e cos w e pela fórmula acima temos,
sen z cos w + sen w cos z =

= ∑ (−1)n+m [ (2n+1)! (2m)! (2n+1)! ]


+∞
∑ z 2n+1 w 2m z 2m w2n+1
(2m)! +
k=0 2n+1+2m=2k+1

= ∑ (−1)k [(2n+2m+1 )z 2n+1 w2m + (2n+2m+1 )z 2m w2n+1 ]


+∞
∑ 1
(2n+2m+1)! 2m 2n+1
k=0 2n+1+2m=2k+1

= ∑ (2k+1)! (z + w)2k+1 = sin(z + w) ♣


+∞
(−1)k
k=0

85
3.6 - Teoremas de Mertens e Abel para o produto de séries

A série
(−1)n
+∞
∑√
n=1 n+1
não é absolutamente convergente pois temos
+∞
√ ≥ = +∞,
1 1 1
e ∑
n+1 n+1 n=1 n

mas é condicionalmente convergente pelo Critério de Leibniz.


+∞
Exemplo 31. O produto de Cauchy da série ∑ (−1)
n
√ por si mesma diverge.
n=1 n+1
Prova.

Seja
(−1)n
an = √ , onde n ∈ N.
n+1
Dados m, n ∈ N, temos 0 ≤ (m − n)2 = m2 − 2mn + n2 e
√ √
2 m + 1 n + 1 ≤ m + 1 + n + 1 = m + n + 2.

Então, supondo m + n = p obtemos

(−1)p am an = √ √ ≥
1 2
e
m+1 n+1 p+2

(−1)p ∑ am an ≥ ∑ = (p + 1) ≥ 1, para todo p ∈ N.


2 2
m+n=p m+n=p p + 2 p+2
Então, como o termo geral (do produto de Cauchy)

c p = ∑ am an
m+n=p

não tende a zero, o produto de Cauchy é uma série divergente♣

n=0 an e ∑m=0 bm e uma bijeção σ ∶ N ×N → N, a série ∑p=0 cp ,


Definição. Dadas ∑+∞ +∞ +∞

com cp = an bm e p = σ(n, m), é um produto das séries ∑+∞


n=0 an e ∑m=0 bm .
+∞

Notemos que o produto de Cauchy entre duas séries ∑+∞ n=0 an e ∑n=0 bn não é,
+∞

em geral, um produto. Porém, ele pode ser obtido por associação de algumas das
séries definidas como um produto das duas citadas séries.

86
Oswaldo Rio Branco de Oliveira

Teorema (Mertens, 1875).1 Se ∑+∞ n=0 an = A, com convergência absoluta, e

∑n=0 bn = B, então o produto de Cauchy destas séries converge e tem soma AB.
+∞

Prova.

Sejam cn = ∑ ak bn−k e
n

k=o

An = ∑ ak , B n = ∑ bk , C n = ∑ ck , βn = Bn − B.
n n n

k=0 k=0 k=0

Então,

Cn = a0 b0 + (a0 b1 + a1 b0 ) + ⋯ + (a0 bn + a1 bn−1 + ⋯ + an b0 )


= a0 Bn + a1 Bn−1 + ⋯ + an B0
= a0 (B + βn ) + a1 (B + βn−1 ) + ⋯ + an (B + β0 )
= An B + (a0 βn + a1 βn−1 + ⋯ + an β0 ).
Destacando a segunda parcela entre parenteses no último membro acima,

γn = a0 βn + a1 βn−1 + ⋯ + an β0 ,

temos Cn = An B + γn . Então, como temos lim An B = AB, resta apenas


verificarmos lim γn = 0.
Por hipótese seguem
+∞
α = ∑ ∣an ∣ < ∞ e lim βn = 0.
n=0

Dado ǫ > 0 existe N ∈ N tal que ∣βn ∣ ≤ ǫ, para todo n ≥ N . Donde, para
n > N segue

∣γn ∣ ≤ ∣β0 an + ⋯βN an−N ∣ + ∣βN +1 an−N −1 ∣ + ⋯ + ∣βn a0 ∣


≤ ∣β0 an + ⋯βN an−N ∣ + ǫα.
Assim, como lim an = 0 se n → +∞, temos

lim ∣β0 an + ⋯βN an−N ∣ = 0


n→+∞

e consequentemente

lim sup ∣γn ∣ ≤ ǫα, para todo ǫ > 0♣

1
Franz C. J. Mertens (1840-1927), de ancestralidade germânica, nasceu em uma vila à época
na Prussia e hoje na Polônia e foi aluno de Weierstrass em Berlim.

87
Utilizando séries de potências, prova-se facilmente o resultado abaixo.

n=0 an e ∑n=0 bn e também


Teorema (Abel, 1826). Suponhamos que as séries ∑+∞ +∞

seu produto de Cauchy ∑+∞


n=0 cn convergem. Então,

+∞ +∞ +∞
∑ c n = ( ∑ an ) ( ∑ b n ) .
n=0 n=0 n=0

n=0 an , com cada an = 0, é a série nula.


Definição. A série ∑+∞

Teorema. Sejam ∑+∞ n=0 an = a e ∑m=0 bm = b séries convergentes não nulas. Con-
+∞

sideremos uma bijeção σ ∶ N × N → N e a série produto ∑+∞p=0 cp , onde cp = an bm

e com σ(n, m) = p. Então, tal série produto é absolutamente convergente se e


n=0 an e ∑m=0 bm são também absolutamente convergentes.
somente se as séries ∑+∞ +∞

Ainda mais, sob tais hipóteses temos


+∞
∑ cp = ab.
p=0

Prova.

(⇒) Por hipótese temos ∑ ∣an bm ∣ < ∞ e então, para an0 ≠ 0 temos

∣an0 ∣ ∑ ∣bm ∣ = ∑ ∣an0 ∣∣bm ∣ ≤ ∑ ∣an bm ∣ < ∞.


m m

Donde segue ∑ ∣bm ∣ < ∞. Analogamente obtemos ∑ ∣an ∣ < ∞.

(⇐) É claro que

∑ ∣cp ∣ ≤ (∑ ∣an ∣) (∑ ∣bm ∣) , para todo N ∈ N.


N

p=1

Logo, a série ∑+∞


p=0 cp é absolutamente convergente.

Por fim, ocorrendo uma das hipóteses no enunciado temos que a sequência
dupla (an bm ) é somável. Assim, pelo lema soma/série segue
+∞
∑ an bm = ∑ cp = ab♣
p=0

88
Oswaldo Rio Branco de Oliveira

3.7 - Somabilidade de Cesaro

A Soma de Cesaro é uma das mais úteis formas de somabilidade e muito


importante em Séries de Fourier (também o Critério de Dirichlet é importante
para Séries de Fourier).
Exercı́cio. Seja (zn ) uma sequência convergente a z. Então a sequência τn =
(z1 + ⋯ + zn )/n formada pelas médias aritméticas de (zn ) também converge a z.
Vejamos que o conceito Somabilidade segundo Cesaro é mais geral que Séries.

Definição. Dada a série ∑+∞ n=0 zn , seja sn a sua n-ésima soma parcial e seja

τn = , onde n ∈ N.
s1 + ⋯ + sn
n
n=0 zn é Cesaro-somável [ou (C,1) somável] se (τn ) converge. Se lim τn = s
A série ∑+∞
então s é a soma de Cesaro [ou soma (C,1)] de ∑+∞
n=0 zn e escrevemos
+∞
∑ zn = s (C, 1).
n=0

n=0 zn = s ∈ C então
Teorema. Se ∑+∞
+∞
∑ zn = s (C, 1) [i.e., no sentido de Cesaro].
n=0

Prova. Segue do exercı́cio imediatamente acima, pois lim sn = s♣

Exemplo 32. Seja an = z n , com ∣z∣ = 1 e z ≠ 1. Então,


+∞ +∞
= (C, 1) ∑ (−1)n−1 = (C, 1).
1 1
∑z n−1
e
n=1 1−z n=1 2
Prova.

Pela fórmula para a soma de uma progressão geométrica temos,

sn =
1 zn
− ,
1−z 1−z
n 1
(z + ⋯ + z n ) 1 z(1 − z n )
τn = = =
s1 + ⋯ + sn 1−z − 1−z 1
1 − z n (1 − z)2
− .
n n
Desta forma, com a desigualdade
z(1 − z n ) ∣1 − z n ∣
∣ ∣ = ≤
2
(1 − z) 2 ∣1 − z∣ 2 ∣1 − z∣ 2
concluı́mos que
lim τn =
1

n→+∞ 1−z

89
Capı́tulo 4

SOMAS NÃO ORDENADAS


(arbitrárias) E
ASSOCIATIVIDADE

4.1 - Associatividade

A definição de famı́lias somáveis a seguir, equivale à usual. De fato, decorre da


definição clássica de somabilidade que uma famı́lia de vetores (vj )J em um espaço
vetorial normado e completo (V, ∥ ⋅ ∥) [isto é., um espaço em que as sequências
de Cauchy convergem] é somável se e só se ela é absolutamente somável [isto é,
∑J ∥vj ∥ < ∞]. Com a definição aqui adotada, tal equivalência se mantém. [Vide
também seção 4.2.]

Seja J um conjunto de ı́ndices arbitrário (logo, estamos dispensando a hipótese


“J enumerável”) e seja X um conjunto arbitrário. Uma famı́lia em X, indexada
em J, é uma função x ∶ J → X. Indicamos a famı́lia x por

(xj )j∈J ou (xj )J ou, brevemente, (xj ).

Dada uma famı́lia (pj ) contida em [0, +∞], definimos

∑ pj = sup { ∑ pj ∶ F é subconjunto finito de J} em [0, +∞].


j∈J j∈F

Tal sup é finito se e somente se existe um real M ≥ 0 tal que

∑ pj ≤ M, para todo subconjunto finito F contido em J.


j∈F

91
Também escrevemos

∑ pj para ∑ pj , ou mesmo ∑ pj
J j∈J

se o conjunto de ı́ndices J é subentendido.

Proposição. Sejam (pj )J e (qj )J duas famı́lias em [0, +∞]. Então,

(a) ∑(pj + qj ) = ∑ pj + ∑ qj .

(b) ∑ λpj = λ ∑ pj , para todo λ em [0, +∞).

(c) (Propriedade Comutativa) Se σ ∶ K → J é uma bijeção, então

∑ pj = ∑ pσ(k) .
J K

Prova.

(a) e (b). Triviais

(c) São iguais os conjuntos sobre os quais computamos

∑ pj e ∑ pσ(k) ♣
J K

Dada uma famı́lia (pj )J em [0, +∞], se ∑J pj é finito (um número real), dize-
mos que (pj )J é uma famı́lia somável e que sua soma é o número real (e positivo)

∑ pj .
J

Escrevemos
∑ pj < ∞,
J

para indicar que (pj )J é uma famı́lia somável.

Dada uma famı́lia de conjuntos Jk , onde k ∈ K, dois a dois disjuntos [i.e.,


se k1 ≠ k2 então Jk1 ∩ Jk2 = ∅] indicamos a sua reunião por

⊍ Jk = ⊍ Jk .
k∈K K

92
Oswaldo Rio Branco de Oliveira

Teorema (Associatividade). Seja (pj )J uma famı́lia em [0, +∞] e J uma


reunião de conjuntos Jk , com k em K, dois a dois disjuntos. Então,

∑ pj = ∑ ∑ pj .
J k∈K j∈Jk

Prova. Mostremos duas desigualdades.

◇ Dado F finito e contido em J, por hipótese existem ı́ndices distintos k1 , . . . , kl ,


todos em K, tal que F ⊂ Jk1 ⊍ . . . ⊍ Jkl . Donde segue

∑ pj = ∑ pj + ⋯ + ∑ pj ≤ ∑ pj + ⋯ + ∑ pj ≤ ∑ ∑ pj
F F ∩Jk1 F ∩Jkl Jk 1 Jk l k∈ K j ∈J k

e então, pela definição de ∑J pj ,

∑ pj ≤ ∑ ∑ pj .
J k∈ K j ∈J k

◇ Dados ı́ndices distintos k1 , . . . , kl em K e conjuntos finitos Fkr , com Fkr ⊂ Jkr


se 1 ≤ r ≤ l, os conjuntos Jk1 ,. . . ,Jkl são dois a dois disjuntos e portanto os
conjuntos Fk1 ,. . . ,Fkl também. Sendo assim, temos

∑ pj + ⋯ + ∑ pj ≤ ∑ pj .
Fk1 Fkl J

Então, fixando os conjuntos Fk2 , . . . , Fkl e computando o supremo sobre a


famı́lia dos conjuntos finitos Fk1 contidos em Jk1 obtemos a desigualdade

∑ pj + ∑ pj + ⋯ + ∑ pj ≤ ∑ pj .
Jk 1 Fk2 Fkl J

Argumentando analogamente (l − 1)-vezes obtemos

∑ pj + ∑ pj + ⋯ + ∑ pj ≤ ∑ pj .
Jk 1 Jk 2 Jk l J

Por fim, como {k1 , k2 , . . . , kl } é qualquer subconjunto finito de K concluı́mos

∑ ∑ pj ≤ ∑ pj ♣
k∈K j∈J k J

93
Seja x ∈ R. Suas partes positiva e negativa são, respectivamente,

⎪ ⎧

⎪ x, se x ≥ 0 ⎪ 0, se x ≥ 0
p=⎨ q=⎨
⎪ ⎪
e

⎩ 0, se x ≤ 0 ⎪
⎩ −x , se x ≤ 0.

Temos,

⎪ ⎧
⎪ ⎧

⎪ 0 ≤ p ≤ ∣x∣ ⎪ x=p−q ⎪ p=
∣x∣+x
⎨ ⎨ ⎨
⎪ ⎪ ⎪
2
, e
⎩ 0 ≤ q ≤ ∣x∣
⎪ ⎩ ∣x∣ = p + q
⎪ ⎩ q=

∣x∣−x
2 .

Definição. Seja J um conjunto de ı́ndices.

○ Uma famı́lia (xj ) de números reais é somável se as famı́lias (pj ) e (qj )


das partes positivas e negativas de xj , com j em J, respectivamente, são
somáveis.
Se a famı́lia (xj ) é somável, sua soma (não ordenada) é

∑ xj = ∑ p j − ∑ q j .

○ Uma famı́lia (zj ) de números complexos é somável se as famı́lias

(Re(zj ))J e (Im(zj ))J ,

das partes reais e imaginárias de zj , com j em J, são somáveis.


Se a famı́lia (zj ) é somável, sua soma (não ordenada) é

∑ zj = ∑ Re(zj ) + i ∑ Im(zj ).

○ Uma famı́lia (zj ), de números reais ou complexos, é uma famı́lia absoluta-


mente somável se a famı́lia
( ∣zj ∣ )J

é somável. Isto é, se


∑ ∣zj ∣ < ∞.

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Oswaldo Rio Branco de Oliveira

Teorema. Seja (zj ) uma famı́lia de números complexos. São equivalentes:

(a) (zj ) é somável.

(b) (zj ) é absolutamente somável.

Prova.

Consideremos as famı́lias de números reais (Re(zj ))J e (Im(zj ))J e as


famı́lias de suas partes positivas, denotadas (pj ) e (Pj ), respectivamente, e
de suas partes negativas, denotadas (qj ) e (Qj ), também respectivamente.
Para todo j em J temos

0 ≤ max {pj , qj , Pj , Qj } ≤ ∣zj ∣ ≤ pj + qj + Pj + Qj .

Logo, ∑ ∣zj ∣ é finita se e somente se ∑ pj , ∑ qj , ∑ Pj e ∑ Qj são finitas.


Donde concluı́mos que a famı́lia (∣zj ∣) é somável se e somente se a famı́lia
(zj ) é somável♣

Corolário. Seja (zj )J somável e K ⊂ J. Então, a famı́lia (zk )k∈K é somável.


Prova.

Pelo teorema acima temos ∑J ∣zj ∣ < ∞. É fácil ver que ∑K ∣zk ∣ ≤ ∑J ∣zj ∣.
Utilizando novamente o teorema acima, concluı́mos que (zk )K é somável♣

Proposição Seja K fixo. Sejam (aj )J e (bj )J famı́lias somáveis em C e λ ∈ C.


Então, as famı́lias (aj + bj )J e (λaj )J são somáveis e valem as propriedades:

(a) ∑(aj + bj ) = ∑ aj + ∑ bj .

(b) ∑ λaj = λ ∑ aj .

Prova. Exercı́cio.
Teorema (Propriedade Comutativa). Seja (zj )J uma famı́lia somável ar-
bitrária de números complexos e σ ∶ K → J uma bijeção. Então,

∑ zj = ∑ zσ(k) .
J k∈K

Prova. Exercı́cio.

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Teorema (Lei Associativa para Somas Não Ordenadas). Seja (zj )J uma
famı́lia somável em C. Suponha J uma união de conjuntos Jk , com k em K, dois
a dois disjuntos. Então, a famı́lia (zj )j∈Jk é somável, para todo k em K, e

∑ zj = ∑ ∑ zj .
J k∈K J k

Prova.

Devido à definição de somável para famı́lias complexas e à linearidade da


soma, podemos supor (zj ) somável e contida em [0, ∞). Pela associativi-
dade para somas de números positivos (já vista), segue a tese♣

4.2 - Equivalência das Definições de Somabilidade

Com o teorema abaixo (neste texto chamado teorema de equivalência) mos-


tramos diretamente (sem utilizar a teoria de somabilidade em espaços vetoriais
normados e completos abstratos) que em C é equivalente a definição de famı́lia
somável apresentada neste texto e a usual definição enunciada no item (b) do
teorema que segue.

Teorema (Equivalência). Dada uma famı́lia (aj )J , são equivalentes as propri-


edades abaixo.

(a) A famı́lia (aj )J é somável.

(b) Existe α ∈ C tal que ∀ǫ > 0, existe um conjunto finito Fǫ ⊂ J tal que

∣ ∑ aj − α∣ < ǫ ,
j∈F

qualquer que seja o conjunto finito F tal que Fǫ ⊂ F ⊂ J.

Prova.

(a) ⇒(b) Por hipótese, as famı́lias (Re(aj ))J e (Im(aj ))J são somáveis. Donde,
escrevendo α = Re(α) + iIm(α) e utilizando as desigualdades

∣Re(z)∣ ≤ ∣z∣, ∣Im(z)∣ ≤ ∣z∣ e ∣z∣ ≤ ∣Re(z)∣ + ∣Im(z)∣,

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Oswaldo Rio Branco de Oliveira

podemos supor (aj ) e α em R. Então, as famı́lias (pj )J e (qj )J , das partes


positivas e negativas de (aj )J , respectivamente, são somáveis e temos

∑ pj = P = sup {∑ pj ∶ F é finito e contido em J} < ∞.


F

Dado ǫ > 0 existe, por definição de sup, Fǫ finito contido em J tal que

P − ǫ < ∑ pj ≤ P.

Então, se F é finito e tal que Fǫ ⊂ F ⊂ J, temos

P − ǫ < ∑ pj ≤ ∑ pj ≤ P
Fǫ F

e portanto
P − ǫ ≤ ∑ pj ≤ P
F

Analogamente existe Q ∈ R e Gǫ finito tal que, se G é finito e Gǫ ⊂ G ⊂ J,

Q − ǫ ≤ ∑ qj ≤ Q.
G

Consideremos Hǫ = Fǫ ∪ Gǫ . Para H finito tal que Hǫ ⊂ H ⊂ J segue

P − ǫ ≤ ∑ pj ≤ P e Q − ǫ ≤ ∑ qj ≤ Q.
H H

Portanto
P − ǫ − Q ≤ ∑ pj − ∑ qj ≤ P − Q + ǫ,
H H

o que implica
−ǫ ≤ ∑(pj − qj ) − (P − Q) ≤ ǫ.
H

Finalmente, pondo α = P − Q e recordando a identidade aj = pj − qj ,

∣∑ aj − α∣ ≤ ǫ,
H

para todo conjunto H finito tal que Hǫ ⊂ H ⊂ J. Isto encerra este caso.

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(b) ⇒(a) Analogamente ao caso “(a)⇒(b)”, podemos supor (aj ) e α em R.
Dado ǫ = 1 existe F finito (que fixamos) em J tal que

∣ ∑ aj − α∣ < 1, para todo G finito tal que F ⊂ G ⊂ J.


j∈G

Seja H finito e arbitrário, com H ⊂ J. Seja H ′ = {j ∈ H ∶ aj = pj ≥ 0}.


Então, da desigualdade
∑ aj ≤ ∑ p j
H ′ ∩F F

segue facilmente

∑ p j = ∑ aj = ∑ aj + ∑ aj
H H′ H ′ ∩F H ′ ∖F

≤ ∑ pj + ∑ aj − α + α − ∑ aj .
F F ∪(H ′ ∖F ) F

Assim, como pj é positivo para todo j, pela desigualdade triangular segue


RRR RRR
R R
∑ pj ≤ ∑ pj + RRRR ∑ aj − α RRRR + ∣ α − ∑ aj ∣ ≤ ∑ pj + 1 + 1.
H F R
RRF ∪(H ′ ∖F ) RRR F F

Sendo F fixo, ∑F pj é um real fixo. Logo, da definição de supremo segue

∑ pj ≤ 2 + ∑ pj < ∞.
J F

Ainda, como (−aj )J também satisfaz (b), também temos

∑ qj < ∞ (com qj a parte negativa de aj ).


J

Logo, por definição, (aj )J é somável ♣

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Oswaldo Rio Branco de Oliveira

BIBLIOGRAFIA

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2. Boulos, Paulo. Exercı́cios Resolvidos e Propostos de Sequências e Séries de


Números e de Funções, E. Edgard Blücher, 1986.

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Association of America, 2007.

4. Gouvêa, Fernando Q. Séries Infinitas, Apostila, Escola Politécnica da USP


e Instituto de Matemática da USP, 1983.

5. Guidorizzi, H. L. Um Curso de Cálculo, vol 1, 5 ed., LTC Editora, 2001.

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Mathematics, Springer 2000.

7. Jahnke, H. N. (editor), A History of Analysis, History of Mathematics, Vol


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1976.

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complex power series and unordered sums, arXiv (2012). Available at
http://arXiv.org/abs/1207.1472.

10. Shilov, G. E. Elementary Real and Complex Analysis, Dover Publications,


INC, 1996.

11. Spivak, M. Calculus, Editorial Reverté, 1978.

Departamento de Matemática
Universidade de São Paulo
oliveira@ime.usp.br
http://www.ime.usp.br/~oliveira

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