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A)

a.1)
O código penal prescreve que para a conformação do crime de
associação criminosa, obrigatoriamente deverá haver 3 (três) ou mais pessoas,
com fim específico de cometer crimes1. Já no delito de organização criminosa
faz-se crucial a existência 4 (quatro) ou mais pessoas, estruturalmente
ordenada e que se encontre caracterizada divisões de tarefas no bojo da
organização criminosa, por certo, com o objetivo de obter vantagem de
qualquer natureza mediante a prática de infrações penais cujas penas máximas
extrapolem os 4 (quatro) anos.2
Contudo, é necessário distinguir que a configuração do crime
de organização criminosa acarreta um gravame superior ao outro3, assim, de
plano, a pena prevista na lei 12.850/13 estabelece uma pena de 3 (três) à 8
(oito) anos de reclusão, enquanto que a infração penal prevista no código penal
estabelece a pena de 1(um) à 3 (três) anos.
Assim, para a configuração do delito de organização criminosa
a doutrina vem expondo que há necessidade de demonstração, além dos
elementos previstos no tipo objetivo, a necessidade de demonstração de
estabilidade e permanência do vínculo associativo criminoso, não prevalecendo
a figura típica com a mera prática de crimes em conjunto com outras pessoas.
No presente caso é notório o preenchimento de elementares expressas do tipo
de organização criminosa, tais como: estruturalmente ordenada e
caracterizada pela divisão de tarefas, afinal, há a demonstração de hierarquia e
organização por parte do Ministro da Saúde e Alexandrino, que inclusive,
sustenta funcionários com o fim exclusivo de acobertar as transações

1
Art. 288.  Associarem-se 3 (três) ou mais pessoas, para o fim específico de cometer
crimes:                          
Pena - reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos
2
Art. 1o  Esta Lei define organização criminosa e dispõe sobre a investigação criminal, os
meios de obtenção da prova, infrações penais correlatas e o procedimento criminal a ser
aplicado.
§ 1o  Considera-se organização criminosa a associação de 4 (quatro) ou mais pessoas
estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, ainda que informalmente,
com objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza, mediante a
prática de infrações penais cujas penas máximas sejam superiores a 4 (quatro) anos, ou que
sejam de caráter transnacional.
3
O conceito de organização criminosa não pode ser banalizado, especialmente pela gravidade
da sanção que comina. BITENCOURT, Cezar Roberto. Parte Especial – IV. p. 497.
fraudulentas executadas por eles, ou até mesmo, subsistindo a figura da
associação criminosa.
Entretanto, os papéis exercidos pelos empresários se
adequaria melhor, em tese, na figura da associação criminosa (art. 288 CP) ou
concurso de pessoas (art. 29 do CP), visto que não há estrutura organizada ou
vínculo de estabilidade e permanência para cometimentos de inúmeros ilícitos
penais advindas dos empreendedores, em que pese a proposta de ajuda nos
“próximos governos”, o presente caso menciona que os empresários somente
aceitaram realizar o pagamento para dispensar a atual licitação, e não porque
desejam se unir ao restante dos partícipes, assim, as atividades exercidas por
esses não demonstram clara organização, vínculo associativo permanente e
estável, e suas atividades são legítimas e lícitas 4, ou seja, empreender.
Portanto, é defensável a figura da organização criminosa ou
associação criminosa para o Ministro da Saúde, Alexandrino e as 2 (duas)
testemunhas/funcionários da imobiliária, portanto, entende-se, como
supramencionado que a melhor figura que se ajusta as circunstâncias descritas
no caso 2 para os empresários seria a figura da associação criminosa ou
concurso de pessoas, conquanto, subsiste a reunião de 3 (três) ou mais
pessoas, especificamente, com o fim de cometer crime, porém, de modo
pontual e isolado, uma única vez, neste sentido, leciona BITENCOURT:
“Na realidade, queremos demonstrar que é injustificável a confusão que roti-
neiramente se tem feito entre concurso eventual de pessoas (art. 29) e
associação criminosa (art. 288). Com efeito, não se pode confundir aquele
— concurso de pessoas —, que é associação ocasional, eventual,
temporária, para o cometimento de um ou mais crimes determinados, com
esta que é uma associação para delinquir, configuradora do crime de
associação criminosa, que deve ser duradoura, permanente e estável, cuja
finalidade é o cometimento indeterminado de crimes”. 5

Por fim, entende-se que a conduta do Ministro da Saúde e


Alexandrino reclama uma maior sanção moral e penal, contudo, na ação dos
empresários, em que pese a necessidade de vigorosa repreensão moral, a
reprovabilidade penal deve se encontrar dentro dos ditames da legalidade.

4
Nessas associações empresariais (comercial, industrial etc.) a finalidade não é praticar crimes
ou obter vantagem de qualquer natureza mediante a prática de infrações penais, mas aquela
constante de seu respectivo contrato social, ainda que se pratiquem crimes em seu meio.
Quando no seio da empresa ocorrer a prática indiscriminada de crimes, poderá, no máximo,
caracterizar a tradicional “associação criminosa”,
5
BITENCOURT, Ceza Roberto. Op. Cit. p. 496.
b) Corrupção Ativa e Concussão de Rosário da Silva;

O crime de corrupção ativa encontra-se no rol de crimes


cometidos por particulares contra à administração em geral, no presente
caso, Rosário da Silva era Secretário da Saúde, atuando na condição de
funcionário público, portanto, não houve oferecimento de nenhuma
espécie de vantagem indevida para outro funcionário público na
condição de particular, Rosário atuava delituosamente no cargo/função
pública e em razão dela obteve vantagens indevidas.

“A conduta típicas alternativamente prevista consiste em oferecer


(apresentar, colocar à disposição) ou prometer (obrigar-se a dar) vantagem
indevida (de qualquer natureza: material ou moral) a funcionário público,
para determiná-lo a praticar (realizar), omitir (deixar de praticar) ou retardar
(atrasar) ato de ofício (incluído na esfera de competência do funcionário).”

c.1

O delito de corrupção passiva é crime próprio de


funcionário público, nas circunstâncias apresentadas, Walter, Noel, Paulo e
Ricardo são particulares, empresários, que participam, em tese, de infrações
penais contra a administração pública, contudo, lhe faltam elemento essencial
para serem sujeitos ativos do crime de corrupção passiva, qual seja, a
condição de funcionário público.
No magistério de BITENCOURT:

“Sujeito ativo somente pode ser o funcionário público, ao contrário da


corrupção ativa, que pode ser praticada por qualquer pessoa,
independentemente de condição ou qualidade especial.”6

Assim, a realização dos verbos núcleos do tipo de corrupção


passiva devem ser praticados por um funcionário público ou por algum
particular a mando deste.7

6
BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal – Parte Especial, v. 5. P. 113.
7
“Isso quer dizer, no caso da solicitação, que esta pode ser feita pelo próprio funcionário
público àquele a quem ele solicita a vantagem, ou pode haver um intermediário, que em nome
do funcionário público proceda à solicitação.”. BUSATO, Paulo César. Direito Penal. v. lll. 2017.
p. 508.
Portanto, não restou configurado tal figura típica nas condutas
praticadas por Walter, Noel, Paulo e Ricardo, os sujeitos não solicitaram e nem
receberam vantagens em razão de cargo público, afinal, nenhum deles
ostentavam o referido status.
E mais, os sujeitos não preencheram os elementos normativos
objetivos do tipo de corrupção passiva, não solicitaram e nem receberam
vantagem indevida decorrente de função pública ou antes de assumi-la.

d) Lavagem de Dinheiro de Alexandrino e Rosário da Silva;

O artigo 1º da lei 9.613/98 dispõe que se configura o crime de


lavagem de dinheiro com a ocultação ou dissimulação da natureza, origem ou
propriedade de bens8, no caso, consta que Alexandrino e Rosário compraram
um imóvel com o dinheiro ilícito para encobrir a origem ilícita dos valores
percebidos. E mais, além de demonstrado o preenchimento do tipo objetivo do
delito, o caso expõe a intenção e a configuração da tipicidade subjetiva, veja:

“[...] imobiliária de Alexandrino, o qual mantinha essa atividade para ocultar


e justificar os valores ganhos com a propina entre ele e Rosário da Silva.
No referido “contrato de gaveta” constou como objeto principal, visando
ocultar o valor ilícito da propina, a compra de um imóvel, apartamento
situado em Curitiba/PR, no bairro Cabral”

Portanto, Alexandrino e Rosário conheciam a origem ilícita dos


bens decorrente de transação ilícita e, assim, direcionaram a verba para
transação dissimulada com intuito de falsear a realidade, restando configurado
o crime de lavagem de dinheiro. Neste sentido já decidiu a jurisprudência,
observe:
PENAL. APELAÇÃO. LAVAGEM DE CAPITAIS. OCULTAÇÃO E DISSIMULAÇÃO DE
RECURSOS PROVENIENTES DE OPERAÇÕES CLANDESTINAS DE CÂMBIO E
TRÁFICO DE ENTORPECENTES. ART. 1º , I E VI , DA LEI 9.613 /98.
MATERIALIDADE E AUTORIA DELITIVA COMPROVADAS. DOLO. CONSCIÊNCIA
DA ORIGEM ILÍCITA DO DINHEIRO. DESPROVIMENTO.9

8
1o  Ocultar ou dissimular a natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou
propriedade de bens, direitos ou valores provenientes, direta ou indiretamente, de infração
penal.
9
TRF3. Ap. Crim. 0000152-25.2001.4.03.6004. 2ªT. Rel. Des. Cotrim Guimarães. j. em
26.02.2013. DJe de 05.03.2013.
e) Fraude em Licitações, artigo 89 da Lei 8.666/1993 de todos os envolvidos, inclusive
do secretário da saúde e do Governador do Estado.

C)

A lei de licitações preceitua que para a configuração do delito


previsto no art. 89 da lei 8.666/93 é necessário a demonstração dos seguintes
elementos: a) dispensa ou inexigência de licitação nos casos em que seja
obrigatório a sua realização ou b) inobservância das formalidades pertinentes à
dispensa ou inexigibilidade10.
É vigorosa a discussão sobre a ocorrência da consumação da
referida infração penal, a doutrina e a jurisprudência divergem quanto ao
momento da consumação do delito, contudo, majoritariamente, entende-se que
a realização dos verbos por si só não caracteriza o crime mencionado, a
doutrina expõe que é necessário além dos requisitos supramencionados, a
efetiva contratação do serviço, que decorre da dispensa ilegal de licitação.
Assim, nas circunstâncias apresentadas, reputo ilegal a prisão
em flagrante realizada pela Policia Federal, observe, a prisão em flagrante é
autorizada pela Carta Constitucional11 e reiterada na norma infraconstitucional,
sendo assim, o texto processual penal prevê o seguinte:

“Art. 301. Qualquer do povo poderá e as autoridades policiais e seus


agentes deverão prender quem quer que seja encontrado em flagrante
delito.” 12

Conforme a descrição normativa, os agentes policiais que se


defrontarem com uma situação de flagrância devem prender13 quem seja
encontrado praticando o crime. A prisão em flagrante está fundamentada em
10
Art. 89. Dispensar ou inexigir licitação fora das hipóteses previstas em lei, ou deixar de
observar as formalidades pertinentes à dispensa ou à inexigibilidade:
Pena - detenção, de 3 (três) a 5 (cinco) anos, e multa.
Parágrafo único. Na mesma pena incorre aquele que, tendo comprovadamente concorrido para
a consumação da ilegalidade, beneficiou-se da dispensa ou inexigibilidade ilegal, para celebrar
contrato com o Poder Público.
11
CF/88 Art. 5º LXI - ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e
fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou
crime propriamente militar, definidos em lei;
12
Código de Processo Penal – Artigo 301.
13
A distinção é relevante. Qualquer pessoa do povo pode; a autoridade policia deve. E
isso porque a tarefa se inclui entre os deveres funcionais dos órgãos policiais, militares
ou não.
PACELLI. Op. Cit. p. 605.
casos excepcionais, de necessidade e urgência, CARNELLUTI ensina que o
flagrante é a visibilidade do delito14, que o doutrinador define como “la llama,
que denota com certeza la combustión; cuando se v ela llama, es indudable
que alguna cosa arde”15.
Entretanto, no caso em tela, não estava ocorrendo uma
infração penal no momento da prisão, ora, se o crime do art. 89 ocorre com a
dispensa, inexigência ou inobservância e se consuma no momento da
contratação dos serviços, não há que se reputar aparente cometimento de um
ilícito no momento em que um indivíduo adentra ao gabinete e entrega uma
mala de dinheiro.
Em que pese a necessidade de uma censura moral ao referido
ato, e claro, por estar no bojo de um cometimento de um ilícito (entrega de
vantagem ilícita), o ato de remunerar o agente público não configura uma
infração penal, pelo menos, não dentro das hipóteses do artigo 89 da lei
8.666/93, assim, em estrita observância ao princípio da taxatividade (lex certa),
na ocasião não estava ocorrendo, repiso, manifesta ação delituosa.
O art. 302 do CPP estabelece as situações de flagrância,
atente:
Art. 302. Considera‐se em flagrante delito quem:
I – está cometendo a infração penal;
II – acaba de cometê‐la;
III – é perseguido, logo após, pela autoridade, pelo ofendido ou por qualquer
pessoa, em situação que faça presumir ser autor da infração;
IV – é encontrado, logo depois, com instrumentos, armas, objetos ou papéis
que façam presumir ser ele autor da infração.

Em tese, as hipóteses em que determinou a a atuação vigorosa


da Policia Federal em realizar o flagrante foram os dispostos no inciso I ou II,
porém, como anteriormente mencionado não havia atual situação de
cometimento de ilícito, e mais, não há informações que o crime acabava de ser
cometido, como exposto, a consumação do crime se dá com a contratação e o
caso exposto não revela o momento que o ato de contratação de serviços
ocorreu.
Complementando, o magistério de LOPES JR:

14
CARNELUTTI, Francesco. Lecciones sobre el Proceso Penal. Trad. Santiago Sentis
Melendo. Buenos Aires: 1950, p. 77.
15
CARNELUTTI, Op. Cit. 78.
“O flagrante do inciso I ocorre quando o agente é surpreendido cometendo o
delito, significa dizer, praticando o verbo nuclear do tipo. Inclusive, a prisão
nesse momento poderá, dependendo do caso, evitar a própria consumação.
No inciso II, o agente é surpreendido quando acabou de cometer o delito,
quando já cessou a prática do verbo nuclear do tipo penal. Mas, nesse caso,
o delito ainda está crepitando (na expressão de Carnelutti), pois o agente
cessou recentemente de praticar a conduta descrita no tipo penal.” 16

Portanto, não se verifica a realização do núcleo do tipo previsto


na lei 8.666/93 no momento do flagrante, assim, entende-se a perfectibilização
de uma prisão em flagrante inadequada e/ou ilegal.

16
LOPES JR, Aury. Direito Processual Penal. 14ª ed. São Paulo: Saraiva, 2017. p. 602.

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