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O que é agitação e o que é propaganda?

Algumas questões na era das mídias digitais

“20. Nossa tarefa mais importante antes do levante revolucionário declarado é a propaganda e a
agitação revolucionária. Esta atividade e sua organização é conduzida freqüentemente ainda da antiga
maneira formalista. Em manifestações ocasionais, reuniões de massas e sem cuidado com o conteúdo
revolucionário concreto dos discursos e panfletos.” Em “A Estrutura, os Métodos e a Ação dos Partidos
Comunistas”, III Internacional, 1921.
https://www.marxists.org/portugues/tematica/1921/congresso/estrutura.htm

Boa parte da militâ ncia revolucioná ria conhece o termo agitprop, popularizado pelos partidos
comunistas da III Internacional em meio aos movimentos contra a exploraçã o e a opressã o. A agitaçã o
e a propaganda, reunidas por meio desse acrô nimo, sempre tiveram um lugar de destaque em meio à s
tarefas da militâ ncia comunista. Como leninistas, acreditamos que a atividade fundamental de toda
militâ ncia comunista “deve consistir em um trabalho de agitaçã o política unificada; que ilumine todos
os aspectos de vida e dirija-se à s massas em geral”. Mas, afinal, o que é agitaçã o, e o que é propaganda,
e qual a diferença entre ambas as coisas?
Uma das melhores sínteses sobre a questã o está na obra “Que Fazer?”, de Lenin. A citaçã o pode
ser um pouco longa, mas vale a pena transcrevê-la para, depois, retornarmos à s vá rias questõ es que
esse síntese permite levantar, em nossa época. Referindo-se à formulaçã o de Plekhanov sobre o tema, e
criticando as ideias de Martynov a respeito, Lenin repete:

“[…] as palavras de Plekhanov: ‘O propagandista inculca muitas ideias em uma ú nica


pessoa, ou em um pequeno nú mero de pessoas; o agitador inculca apenas uma ú nica ideia,
ou um pequeno nú mero de ideias, em troca, inculca-as em toda uma massa de pessoas’.
[…]
[Pensamos] (com Plekhanov e todos os dirigentes do movimento operá rio internacional)
que um propagandista, ao tratar, por exemplo, do problema do desemprego, deve explicar
a natureza capitalista das crises, mostrar o que as torna inevitáveis na sociedade moderna,
mostrar a necessidade da transformaçã o dessa sociedade em sociedade socialista etc. Em
uma palavra, deve fornecer “muitas ideias”, um nú mero tã o grande de ideias que, de
imediato, todas essas ideias tomadas em conjunto apenas poderã o ser assimiladas por um
nú mero (relativamente) restrito de pessoas.
Tratando da mesma questã o, o agitador tomará o fato mais conhecido de seus ouvintes, e o
mais palpitante, por exemplo uma família de desempregados morta de fome, a indigência
crescente etc., e apoiando-se sobre esse fato conhecido de todos, fará todo o esforço para
dar à massa “uma ú nica ideia”: a [ideia] da contradiçã o absurda entre o aumento da
riqueza e o aumento da miséria; esforçar-se-á para suscitar o descontentamento, a
indignaçã o da massa contra essa injustiça gritante, deixando ao propagandista o cuidado
de dar uma explicaçã o completa dessa contradiçã o.
Por isso, o propagandista age principalmente por escrito, e o agitador de viva voz. Nã o se
exige de um propagandista as mesmas qualidades de um agitador. Diremos que Kautsky e
Lafargue, por exemplo, sã o propagandistas, enquanto Bebel e Guesde sã o agitadores.
Distinguir um terceiro domínio, ou uma terceira funçã o da atividade prá tica, funçã o que
consistiria em “atrair as massas para certos atos concretos”, é o maior dos absurdos, pois o
“apelo” sob forma de ato isolado, ou é o complemento natural e inevitável do tratado
teó rico, do folheto de propaganda, do discurso de agitaçã o, ou é uma funçã o pura e
simples de execuçã o.
De fato, tomemos, por exemplo, a luta atual dos sociais-democratas alemã es contra os direitos
alfandegá rios sobre os cereais. Os teó ricos redigem estudos especiais sobre a política alfandegá ria,
onde “apelam”, digamos assim, para se lutar por tratados comerciais e pela liberdade do comércio; o
propagandista faz o mesmo em uma revista, e o agitador nos discursos pú blicos. Os “atos concretos” da
massa sã o, nesse caso, a assinatura de uma petiçã o endereçada ao “Reichstag” contra a majoraçã o dos
direitos alfandegá rios sobre os cereais. O apelo a essa açã o emana indiretamente dos teó ricos, dos
propagandistas e dos agitadores, e diretamente dos operá rios que passam as listas de petiçã o nas
fá bricas e domicílios particulares.”
Existem, entã o, dois critérios que Lenin destacada como diferenças entre a agitaçã o e a
propaganda: um critério principal, referente à "densidade do conteú do" e à amplitude do
pú blico; e um critério acessório, relacionado à forma da comunicaçã o (escrita ou oral).
Esmiuçando o critério principal, é oportuno desfazer algumas confusõ es. A começar
pelo termo “propaganda”, cujo significado na tradiçã o da social-democracia alemã (de onde
Lenin e os bolcheviques aprenderam o termo) é bastante distinto do uso corriqueiro do termo,
que nã o se pode confundir com a noçã o comercial e burguesa de propaganda. Na verdade,
nada poderia ser mais diferente.
O conceito comercial de propaganda está muito mais pró ximo daquilo que
chamaríamos agitaçã o: a publicidade comercial busca inculcar em um amplo pú blico uma
ú nica ideia bastante simples, qual seja, a ideia da utilidade e da necessidade de se consumir tal
ou qual mercadoria e marca.
Enquanto a “propaganda” comercial busca tã o somente promover uma empresa
(construindo a credibilidade de sua marca e a crença na qualidade de suas mercadorias); a
propaganda comunista busca nã o apenas nossa autopromoçã o e a divulgaçã o de nossos
símbolos (identidade visual), mas a explicaçã o aprofundada dos fenô menos contraditó rios das
relaçõ es sociais existentes.
A respeito de nossa propaganda, seria preciso acrescentar: é bastante arraigado na
tradiçã o socialista brasileira o há bito de chamar de “formação” aquilo que é, no mais das
vezes, propaganda. Esse péssimo há bito chega ao extremo de produzir consequências
organizativas, quando separamos estes trabalhos como coisas distintas (e, com isso, no mais
das vezes, tornamos nossa agitprop em pura agitaçã o, quando nã o em propaganda de má
qualidade).
Ocorre que, na verdade, cursos abertos, rodas de discussã o, grupos de estudo públicos,
palestras, etc, nã o sã o nada mais que formas nã o-escritas de propaganda! Quando
consideramos essa atividade como "formaçã o", em um domínio distinto em relaçã o à
propaganda teó rica, nosso trabalho nesse terreno resulta desconexo ou até mesmo
"professoral". Nã o raras vezes, essas "formaçõ es" dã o aos ouvintes interessantes
conhecimentos teó ricos, mas que nã o lhes conduzem muito seguramente à conclusã o de
concepçõ es política revolucioná rias. Como toda propaganda, essas "formaçõ es" também nã o
podem se perder em escolasticismo, e devem estabelecer com nitidez a relaçã o existente entre
a teoria propagada e a estratégia, a tá tica, o programa, em suma, as concepçõ es teó ricas
aplicadas à prá tica que sã o produto das luta ideoló gica comum do intelectual coletivo
partidá rio.
Uma outra coisa distinta é a formação de quadros propriamente dita (a preparaçã o de
propagandistas, agitadores, organizadores, etc). Aqui, com efeito, o aprofundamento polêmico
pode ultrapassar a finalidade de propaganda revolucioná ria - pois, presume-se, trata-se de
aprofundar a formaçã o de militantes que já se dedicam efetivamente ao trabalho político sob
uma perspectiva revolucioná ria. No entanto, também isso é prejudicado quando se faz uma má
propaganda a título de "formaçã o" e, entã o, dá -se por cumprido o trabalho formativo dos
quadros. A verdadeira formaçã o fica, assim, relegada a um segundo plano – ou, por vezes,
realizada puramente em sua dimensã o técnica (basta ver como as oficinas de produçã o
audiovisual ou de ediçã o, por exemplo, quase sempre ocorrem desacompanhadas da formaçã o
política dos quadros técnicos da comunicaçã o). Entre essas dimensõ es técnicas, a preparaçã o
na arte da orató ria costuma ser bastante negligenciada, como se fosse uma mera questã o de
aptidã o nata, dispensando qualquer aprimoramento e desenvolvimento. [1]
Outro engano corrente é aquele mesmo que Lenin critica na definiçã o dada por
Martynov para a agitaçã o. Muitos camaradas consideram que a agitaçã o significaria o plano da
comunicaçã o voltado ao "chamado à açã o". Mas, como Lenin aponta, "o 'apelo' sob forma de
ato isolado, ou é o complemento natural e inevitável do tratado teó rico, do folheto de
propaganda, do discurso de agitaçã o, ou é uma funçã o pura e simples de execuçã o." Tanto a
agitaçã o quanto a propaganda (se nã o queremos ser meros falastrõ es professorais, mas
propagandistas revolucioná rios) devem infundir o espírito de combate e de açã o em nossos
espectadores.
Tomar esse critério para definir nossa agitaçã o significaria, por um lado, negligenciar o
aspecto do "chamado à açã o" em nossa propaganda; tanto quanto o aspecto de "luta
ideoló gica" de nossa agitaçã o. É digno de nota, a esse respeito, o exemplo de agitaçã o
oferecido por Lenin, que trata nã o de alguma injustiça ou arbitrariedade pontual, mas
justamente de um dos traços da contradiçã o fundamental da sociabilidade capitalista: a
contradiçã o entre a crescente socializaçã o da produçã o e a crescente concentraçã o da
propriedade, que se expressa, entre outras coisas, no simultâ neo crescimento da riqueza e da
miséria social. O agitador, tanto quanto o propagandista, faz “luta de classes na filosofia” e,
ainda mais importante, faz luta ideoló gica de massas, e nã o apenas nos meios mais
intelectualizados.
Feitos esses apontamentos em torno do critério principal, resta analisar o critério
acessó rio ("o propagandista age principalmente por escrito, e o agitador de viva voz"). Lenin
pronuncia com nitidez o cará ter secundá rio deste critério (por isso fala "principalmente", e
nã o de modo absoluto). Mesmo à sua época, já circulavam impressos de cará ter
eminentemente agitativo (cará ter que também se pode atribuir à s charges impressas, por
exemplo, desde os cartazes e panfletos da época da Revoluçã o Francesa). Do mesmo modo, os
propagandistas já atuavam também por meios orais, especialmente por meio de palestras
itinerantes (os “propagandistas volantes”, que Lenin menciona em “Carta a um camarada”).
No entanto, entre a época de Lenin e a nossa há um século de grandes
revolucionamentos nos meios técnicos de produçã o e difusã o da comunicaçã o. Tais
modificaçõ es nos meios de comunicaçã o contribuíram para tornar esse critério acessó rio de
diferenciaçã o cada vez menos apropriado.
Isso ocorre, primeiramente, porque surgiram novos meios de formalizaçã o, de registro
da comunicaçã o. Uma palestra de um propagandista, tanto quanto o discurso de um agitador,
podem ser gravados e reproduzidos infinitas vezes, necessitando ser proferidos uma ú nica
vez. Tornou-se possível editar essas mesmas comunicaçõ es orais de modo a complementá -las
com imagens, que demonstrem graficamente aquilo que o discurso enuncia. A “agitaçã o oral”
hoje também pode ser feita por meio de á udios em grupos de mensagens, etc. Ao mesmo
tempo, se as imagens desempenhavam um papel secundá rio nas publicaçõ es impressas,
adquirem, em especial nas mídias digitais, o papel de principal veículo de conteú dos textuais
(sejam os "memes" ou mesmo as mais simples frases diagramadas em meio à s fotos).
Em segundo lugar, em especial apó s o advento da Internet, modificaram-se
significativamente os aspectos de nosso trabalho de “distribuiçã o de literatura”. Há um século,
seria praticamente impossível obter contato com a literatura comunista senã o através do
trabalho partidá rio de distribuiçã o de literatura. Se o pró prio mercado editorial já passou a
suprir parte desta demanda, a Internet modificou definitivamente a dificuldade material de
acesso à literatura revolucioná ria – vejamos, por exemplo, o brilhante trabalho de portais
como o www.marxists.org.
Mas qual o interesse em insistir nessa questã o? Ora, na Era da Prensa, a época em que
os meios técnicos permitiam sustentar aquele critério acessório de diferenciaçã o com alguma
segurança; esta distinçã o era um ponto de apoio para a divisã o especializada do trabalho nas
organizaçõ es revolucioná rias. Enquanto os agitadores se qualificavam como oradores, os
propagandistas se preparavam para desempenhar o papel de publicistas e redatores. Em
ambos os casos, esses e essas camaradas eram coletivamente destacadas e coordenadas nestas
tarefas.
E hoje? Cada vez mais as fronteiras entre a agitaçã o e a propaganda se confundem.
Virtualmente, como todo cidadã o se tornou um “jornalista” por meio de seu perfil online,
também todo militante se tornou um publicista digital. Com o acesso facilitado aos meios de
publicaçã o, em seus perfis pessoais, muitos camaradas buscam atuar duplamente como
agitadores e propagandistas, sem preparo especializado – e mesmo a criaçã o de diversas
"pá ginas" virtuais é produto de açõ es isoladas, sem conexã o orgâ nica.
Ainda mais: como as mídias digitais sã o uma via interativa de mã o dupla, é muito
comum que a agitaçã o e a propaganda ocorram desordenadamente, passando de uma à outra
sem muito cuidado e reflexã o. Um exemplo: se algum camarada publica uma peça de agitaçã o
e é interpelado, nos comentá rios da postagem, sobre alguma questã o mais complexa,
rapidamente buscará respondê-la, mesmo sem grande domínio do tema. Com isso, se substitui
precariamente a prévia preparaçã o do propagandista pela pesquisa imediata, em busca de
fontes que respaldem uma reposta previamente concebida.
Dialogamos com dezenas de interlocutores em um mesmo debate, negligenciando seus
níveis desiguais de consciência e suas diferentes posiçõ es materiais e políticas. Respondemos
raivosamente tanto ao pequeno burguês reacioná rio que sequer mereceria atençã o quanto ao
trabalhador entorpecido pelo bombardeio midiá tico de mentiras. Esquece-se que,
naturalmente, quanto mais profunda a explicaçã o e mais complexo o tema, menos provável
que seja absorvida por "muitas pessoas", ainda mais em um ambiente desvinculado de
qualquer experiência efetiva de organizaçã o e luta de massas. Contudo, nã o importa o quã o
amplamente as novas mídias permitam que nossa comunicaçã o se espalhe: a distinçã o entre
níveis de compreensã o nas vá rias camadas da classe trabalhadora segue existindo, e nã o de
elimina senã o pela combinaçã o consistente entre participaçã o efetiva nas lutas de classes e a
influência, paciente e prolongada, de toda a propaganda socialista! Ignorando essa verdade,
muitos camaradas se afobam e buscam coagir os interlocutores a aceitar as verdades do
marxismo, a golpes de ironia, ofensas e desdém. [2] O dogmatismo nunca esteve tã o em alta,
talvez, quanto na época em que basta linkar uma citaçã o direto da fonte para atestar a
veracidade de uma posiçã o.
Talvez seja ainda mais importante do que nunca insistir, portanto, na questã o da
paciência na propaganda, já manifestada por Lenin: “Para nã o deixar nenhuma sombra de
dú vida neste tocante, eu enfatizei por duas vezes nas Teses [de Abril] a necessidade de um
trabalho “explicativo” paciente e persistente, adaptado às necessidades práticas das massas”.
Quando os bolcheviques eram acusados caluniosamente de serem “agentes dos interesses
alemã es”, Lenin insistia que, “desmentindo a farsa e a difamaçã o, devemos, com mais calma
que nunca” pensar a fundo nas questõ es, sem nos bastar nas respostas prontas impacientes.
Essa afobaçã o desordenada nã o apenas enfraquece a agitaçã o (passando ela para um
plano secundá rio), como produz efeitos danosos no plano da propaganda, agravando a
dispersã o de nosso “trabalho explicativo”. E, na verdade, a centralizaçã o da propaganda é um
dos desafios fundamentais da organizaçã o revolucioná ria, e a condiçã o da pró pria unidade na
agitaçã o.
Quando vemos o tipo de preocupaçã o que, já à época de Lenin, a organizaçã o dos
propagandistas provocava, nã o é difícil compreender como a dinâ mica digital ajuda a encubar
os piores há bitos liberais de nossos intelectuais e publicistas de esquerda (em “Carta a um
camarada”):

"A propaganda deverá ser feita de forma uníssona por todo o comitê, a quem
corresponde centralizá -la rigorosamente. (...)
Quanto aos propagandistas, ainda gostaria de dizer algumas palavras contra a
tendência usual de abarrotar essa profissã o com pessoas pouco capazes rebaixando com isso,
o nível da propaganda. À s vezes, entre nó s, qualquer estudante indiscriminadamente é
considerado propagandista, e todos os jovens exigem que se lhes “dê um círculo”, etc. Temos
que lutar contra essa prá tica, pois sã o muitos os males que daí advém. As pessoas realmente
firmes quanto aos princípios, e capazes de ser propagandistas sã o muito poucas (e para
chegar a sê-lo é preciso estudar muito e acumular experiência), e a estas pessoas é necessá rio
especializá -las, ocupar-se delas e cuidá -las com zelo. É preciso organizar vá rias aulas por
semana para esse tipo de pessoas, saber enviá -las oportunamente a outra cidade e, no geral,
organizar visitas dos mais há beis propagandistas pelas diversas cidades."

Se é verdade que as mídias digitais permitem ampliar a abrangência do nosso trabalho


de massas, incumbindo contingentes cada vez maiores de quadros na produçã o e distribuiçã o
de nossa agitaçã o e propaganda – entã o, organizar de modo consequente e planejado a
atuaçã o dispersa de centenas de militantes é uma das questõ es candentes de nosso
movimento, no século XXI.
Ainda estamos reagindo à chamada “crise do jornalismo”. Nã o apenas ainda
organizamos de forma insuficiente nossa atuaçã o virtual como permitimos, muitas vezes, que
essa desorganizaçã o nos atinja no plano do trabalho físico (refletindo na distribuiçã o dos
jornais impressos, na correspondência e na literatura partidá ria, nos contatos entre os
organismos e militantes, etc).
Retomar a discussã o aberta sobre nossa agitaçã o e nossa propaganda é um ponto de
partida inevitável. Só assim poderemos aproveitar as oportunidades [3] que esses novos
veículos abrem, assegurando nossa unidade de açã o e, ao mesmo tempo, ampliando também a
consistência de nossas redes orgâ nicas, físicas, de distribuiçã o de panfletos, jornais,
comunicados, etc. Nã o basta que um debate efêmero venha à tona a cada nova situaçã o (cada
novo caso problemá tico de agitaçã o e propaganda virtual, cada nova confusã o na resposta aos
eventos da conjuntura, etc). O ponto de partida para organizar de nosso trabalho comum na
luta ideoló gica deve ser a pró pria organizaçã o da discussã o sobre os dilemas de nossa luta
ideoló gica diante dos desafios da comunicaçã o digital. De nenhum outro modo poderemos
sistematizar as experiências já existentes rumo a uma atuaçã o planejada e sistemá tica, que
escape à reatividade.

[1] Outra questã o sobre a qual valeria uma reflexã o, ligada a este tema terminoló gico da
“formaçã o”, é a distinçã o entre o "trabalho de base", termo corrente entre nó s, e o "trabalho de
massas", conforme formulado por Lenin. Nã o se trata apenas de uma diferente escolha de
palavras: enquanto o trabalho de massas compreende a agitaçã o e a propaganda de modo
integrado, concebido à escala geral de todo um país (um trabalho que demanda açõ es locais,
mas concebido à escala de massas); o trabalho de base pode muito bem existir de modo
localizado, sem qualquer perspectiva programá tica integral, sem exigir a conjugaçã o de
diferentes esforços e á reas de atuaçã o, etc. Por isso mesmo, talvez, todo o falató rio tã o
presente na esquerda há uma década sobre a “falta de trabalho de base” nã o tenha levado a
grandes soluçõ es: agrava a dispersã o, empurra a militâ ncia para as diversas frentes locais de
atuaçã o cotidiana, sem muito bem sanar as debilidades da esquerda na luta ideoló gica em um
plano mais geral e unitá rio. Sem dú vida alguma o trabalho pedagó gico à escala local é uma
necessidade primá ria no trabalho de organizaçã o, agitaçã o e propaganda. Mas nã o devemos
relegar o pró prio trabalho de coordenaçã o dos propagandistas, agitadores e organizadores
atuando entre as massas ("na base") como um trabalho desprezível, menor, burocrá tico, etc.
O "trabalho de base" aparece no discurso corrente como a panaceia contra o distanciamento
entre dirigentes e dirigidos, e como cura contra a açã o puramente performá tica. Mas nenhuma
agitaçã o pode prescindir de alguma dose de performance. Seria um despropó sito extrair, da
crítica da açã o performá tica, uma negaçã o da importâ ncia de açõ es como o teatro político de
rua, por exemplo. Nesse sentido, a crítica da açã o performá tica deve frisar muito mais a falta
de consequência na luta ideoló gica do que um repú dio de tal ou qual forma de agitaçã o e
propaganda. Uma açã o é meramente performá tica nã o porque é também performá tica, e sim
porque lhe falta conexã o com um planejamento mais amplo e sistemá tico, associado ao
conjunto do trabalho de propaganda e de organizaçã o.
https://lavrapalavra.com/2016/03/02/acao-performatica-a-politica-revolucionaria-entre-a-
depressao-e-o-extase/

[2] Abordei alguns aspectos dessa questã o em um texto anterior: ““Nã o sou obrigado”:
impaciência e arrogâ ncia na esquerda”.
https://lavrapalavra.com/2018/11/05/nao-sou-obrigado-impaciencia-e-arrogancia-na-
esquerda/

[3] A esse respeito, é bastante interessante observar os apontamentos dos camaradas do PTB
belga.
https://lavrapalavra.com/2018/12/17/voce-toma-uma-solucao-racista-e-chuta-os-de-baixo-
ou-um-anticapitalista-que-atinge-os-de-cima/

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