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crusoe.com.br/edicoes/124/o-ministro-e-as-empreiteiras
10 de setembro de
2020
10.09.20
Rodrigo Rangel
Luiz Vassallo
Aquele e-mail, porém, era apenas um de um acervo monumental com o qual delegados
e procuradores da Lava Jato ainda deparariam. Uma parte o próprio Marcelo
Odebrecht entregou espontaneamente como parte de seu acordo. Outra, mais extensa,
foi encontrada quando os investigadores finalmente conseguiram, depois de muitas
tentativas, quebrar as várias camadas de criptografia do notebook do empreiteiro,
apreendido ainda na 14ª fase da Lava Jato, em junho de 2015. Como continha menção
a autoridades com foro privilegiado, o material reunido pela força-tarefa da operação
em Curitiba foi transferido para um HD de 1 terabite e enviado para o relator da
operação no Supremo Tribunal Federal, o ministro Edson Fachin. A quantidade de
informações era oceânica: 1.888.621 arquivos, entre eles mais de 700 mil e-mails,
muitas planilhas e textos diversos.
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O disco rígido continha uma espécie de espelho do computador pessoal de Marcelo.
No STF, o procedimento foi autuado em segredo de justiça. Em agosto do ano passado,
Fachin enviou os autos para análise da Procuradoria-Geral da República. Àquela
altura, os dados já haviam sido processados e era possível realizar pesquisas por
palavras-chave. Foi a partir dali que, mergulhando no universo dos arquivos ainda
secretos do empreiteiro, os procuradores destacados para atuar nos processos da Lava
Jato que correm na PGR descobriram que aquela mensagem revelada por Crusoé em
abril de 2019 era só uma de dezenas que faziam menção a Toffoli e aos vários assuntos
que a Odebrecht tentou resolver, sempre buscando a ajuda do hoje ministro, no
período em que ele era chefe da AGU no governo Lula.
Os procuradores viram nesse conjunto de e-mails indícios suficientes para apurar, nas
palavras deles, “o possível cometimento de fato penalmente relevante por José Antonio
Dias Toffoli, praticado à época em que ocupava o cargo de advogado-geral da União”.
As trocas de mensagens, com a devida contextualização, chegaram a ser reunidas em
uma peça bem-acabada que deveria ser enviada na sequência a Edson Fachin pelo
procurador-geral da República, Augusto Aras, pedindo a abertura de um procedimento
específico para apurar as suspeitas relacionadas a Toffoli. Não se tem notícia, até hoje,
de que Aras tenha dado o devido encaminhamento ao material. Em vez de serem
reconhecidos pela coragem da iniciativa, os procuradores que realizaram o trabalho só
tiveram problemas – em junho passado, eles pediram demissão coletiva e deixaram o
grupo de trabalho da Lava Jato na PGR por discordarem do animus de Augusto Aras
em relação à operação.
O mesmo grupo, como o leitor verá mais adiante, havia preparado um segundo pedido
de investigação que poderia alcançar Toffoli, desta vez em razão de sua relação com
outra empreiteira, a OAS. Na primeira quinzena de julho, uma reportagem do
jornalista Diego Escosteguy narrou os bastidores do esforço vão dos procuradores e
revelou alguns dos principais achados relacionados ao ministro. Crusoé avançou na
apuração e teve acesso, com exclusividade, não só à íntegra do material reunido pelos
investigadores como também à gravação de um depoimento sigiloso no qual, por quase
quatro horas, dois dos integrantes da então equipe da Lava Jato na PGR, com
autorização do ministro Edson Fachin, ouviram Marcelo Odebrecht sobre os arquivos
relacionados a Toffoli.
A empreiteira esperava que, dada a sua precedência no tema, teria caminho livre para
tocar os empreendimentos sem ser incomodada por concorrentes. Mas não foi
exatamente o que aconteceu. Houve alguns embates no caminho, inclusive dentro do
próprio governo e nos tribunais. A Odebrecht tinha, por exemplo, um contrato de
exclusividade com possíveis fornecedores de turbinas para as usinas que passou a ser
questionado. Quando os projetos avançaram, a companhia foi acusada de agir para
limitar a concorrência. Também havia conflitos relacionados aos leilões das duas
usinas. A empresa de Marcelo Odebrecht acabou ficando com o projeto de Santo
Antônio, em 2007, e um consórcio integrado pela Camargo Corrêa, outra gigante da
empreita pilhada nas investigações do petrolão, levou Jirau, no ano seguinte. A AGU
comandada por Toffoli, que chegou a montar uma força-tarefa para tratar do assunto
depois de ser destacado por Lula para dirimir o impasse entre as construtoras aliadas,
era peça chave no processo e catalisou uma parte expressiva do interesse da
Odebrecht, interessada em resolver as querelas a seu favor – por fim, as duas gigantes
acabaram agraciadas.
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2018, na esteira do furdúncio interno decorrente das investigações. Adriano é
apontado por Marcelo como aliado do pai dele, Emílio Odebrecht, e do cunhado,
Maurício Ferro – hoje, ele trata os dois como inimigos figadais dentro do grupo.
Os e-mails reunidos pelos procuradores mostram que Marcelo Odebrecht cobrava com
frequência que Adriano Maia se mantivesse próximo a Toffoli, seja diretamente, seja
por meio dos tais intermediários, os advogados Sérgio Renault e Luiz Tarcísio Teixeira
Ferreira. Renault chegou a ocupar postos de confiança no governo durante a era
petista. Foi assessor de assuntos jurídicos da Casa Civil e também secretário de
reforma do Judiciário do Ministério da Justiça, a convite do então ministro Márcio
Thomaz Bastos. Luiz Tarcísio, também próximo ao PT, trabalhou na gestão de Marta
Suplicy na prefeitura de São Paulo. Foi no apartamento de Luiz Tarcísio, na capital
paulista, que Marcelo Odebrecht teve um dos encontros pessoais com Toffoli – o outro
foi na casa do ministro. Em ambos, segundo o empreiteiro, Adriano Maia estava
presente. Marcelo Odebrecht queria que Adriano cuidasse de manter viva a relação, até
para não sobrecarregá-lo. Ele fazia questão de cobrar isso rotineiramente. “Me
encontrei em um jantar esta 5ª com Toffoli e ficamos de marcar um encontro. Você
conseguiu manter contato?”, escreveu Marcelo a Adriano Maia em abril de 2013 – o
ministro havia sido empossado no Supremo quatro anos antes. Adriano responde
assim, com a observação de que os antigos intermediários seguiam disponíveis:
“Marcelo, desde que ele se tornou ministro do Supremo, não. Meu contato se dava
através de Renault e Tarcísio, com quem sempre podemos contar para reavivá-lo (eles
sempre mencionam isso)”.
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Em setembro de 2009, dias após Toffoli ser escolhido por Lula para ocupar uma vaga
no Supremo, Marcelo Odebrecht e Adriano Maia se articulam para ajudar no processo
de aprovação do ministro pelo Senado. Onze dias antes da sabatina, Marcelo escreve:
“Temos que ver como promover uns encontros reservados de T com alguns amigos da
casa de cima de CMF. Eles e nós podemos ter com isto um aliado no futuro”. CMF é
Cláudio Melo Filho, um dos lobistas mais atuantes da Odebrecht em Brasília,
especialmente no Congresso Nacional. Cláudio Melo está copiado no e-mail. Adriano,
que tinha a incumbência de fazer a ponte, diz: “Checarei interesse do t e falo com
claudio”. O próprio Marcelo se coloca à disposição para ajudar. “Me avisem se
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conveniente eu estar em algum”, escreve ele. A uma semana da sabatina, Adriano
atualiza o assunto. “Me alinhei com claudio sobre um contato que ele pediu para
fazermos. Sem a presença dele.” No depoimento aos procuradores, Marcelo dirime
eventuais dúvidas sobre o episódio: ele confirma que Toffoli aceitou a oferta de ajuda
da Odebrecht e pediu que a empreiteira fizesse contato com pelo menos um senador.
“Nesse caso aqui você vê que foi minha iniciativa. Por que eu digo isso? Porque aí
depois, o Adriano bota: checarei o interesse dele e falo com Cláudio. Aí, eu digo: me
avise se conveniente eu estar. Aí, o Adriano fala: me alinhei com Claudio sobre um
contato que ele, o Toffoli, pediu para fazer. Quer dizer, provavelmente Adriano foi lá:
Toffoli, precisa de alguma ajuda? Toffoli deve ter dito: não, mas tem um senador em
especial que eu tô vendo alguma dificuldade , será que vocês podem me ajudar? Pelo
que tá aí… O que na verdade era mais do que comum. É o que o pessoal chamava de
beija-mão, todos os ministros depois que eram escolhidos e antes de serem aprovados,
eles faziam isso, e para fazer isso, muitas vezes eles buscavam empresários que
tinham… E nesse caso eu mesmo perguntei a Adriano: ó, você não quer checar com o
Toffoli se ele quer isso? E pelo retorno, ele pediu para falar com um.”
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Um dos procuradores indaga: “Em que sentido um juiz, um ministro poderia ser um
aliado da empresa?”. Marcelo, de novo recorrendo ao cuidado de sustentar que não via
ilegalidade no ato, diz: “Você ter um ministro que você ajudou ele”. “Na verdade é o
seguinte. O que que você cria a expectativa? Se você ajudou o cara de alguma maneira,
lá na frente ele recebe você, ele vai te escutar, cria uma boa vontade”, prossegue. Na
sequência, o empreiteiro sintetiza o relacionamento com Toffoli e diz o que esperava
desse relacionamento. “Existia, sim, essa relação, a gente tentou aproximação, uma das
razões que eu sempre dizia para o Adriano manter esse contato é porque eu achava
que era uma pessoa que tinha o potencial, que seria importante a gente ter ele como
um aliado futuro.”
A orientação do chefe foi seguida à risca por Adriano Maia, a julgar pelo teor dos e-
mails reunidos pela equipe da PGR e pelo que o próprio Marcelo Odebrecht narrou em
depoimento. Adriano atuou, por exemplo, em uma costura para que a Odebrecht
entrasse nas discussões sobre a construção e a possível privatização do sistema de
saneamento do município paulista de Marília, terra dos Toffoli. Um dos irmãos do
ministro, José Ticiano Dias Toffoli, era o vice-prefeito da cidade à época. Ao reunir
informações sobre o caso, os procuradores concluíram haver indícios de que, em troca
do possível negócio, a Odebrecht se comprometeu a apoiar campanhas de políticos
locais. A empreitada acabaria não dando certo – como mostraremos mais adiante,
depois de um jantar em Brasília em que Toffoli aproximou o irmão de outro
empreiteiro, Léo Pinheiro, a OAS acabou ficando com o projeto.
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Apesar de se esforçar para não ser peremptório ao falar das mensagens que lançam
suspeitas sobre a relação com Toffoli, em várias ocasiões Marcelo Odebrecht diz que os
e-mails são claros. Em um deles, ao tratar do esforço contra o cancelamento do
crédito-prêmio de IPI, ele exorta Adriano Maia a “buscar nossos ‘amigos’” na advocacia
da casa e alerta dois diretores do grupo: “Estejam atentos ao DGI decorrente da linha
AM (Adriano Maia). Não costuma ser baixo, até porque o intermediário que me foi
qualificado por eles para negociar estes temas cobra bem a parte dele”. DGI, no
dicionário da Odebrecht, é um acrônimo para despesas gerais indiretas – ou seja,
propina. Para os procuradores, que esmiuçaram a mensagem na peça enviada ao
gabinete de Aras, é uma indicação de que Marcelo entendia que o melhor caminho
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para solucionar a questão era por meio da AGU e da Casa Civil, recorrendo aos serviços
dos “amigos de Adriano Maia”. O intermediário em questão, concluem os
procuradores, é Sérgio Renault.
É nesse contexto que, depois de saber que Toffoli havia visitado o Supremo para tratar
da inclusão na pauta da corte de um processo que poderia colocar um fim na questão,
o que ia no sentido contrário ao interesse da empresa, Marcelo escreve a outros
executivos, com cópia para Adriano Maia: “AM precisa falar com o amigo. Ele não quer
o dele?”. Os investigadores leram a mensagem como uma indicação de que Marcelo
queria que Adriano acionasse Toffoli. Sobre a pergunta “ele não quer o dele?”,
chegaram a escrever em um dos expedientes da apuração: “Não se mostra necessário
fazer maiores ilações para inferir o significado dessa corriqueira expressão: ele deixa a
entender que essa conduta do então AGU, contrária aos interesses da Odebrecht,
impediria que ele recebessse algum benefício (DGI) da empresa”. Nessa troca de
mensagens, há um detalhe curioso: Adriano Maia, ao responder a Marcelo,
simplesmente apaga da mensagem do chefe a pergunta. Os procuradores escreveram:
“A expressão ‘ele não quer o dele?’ mostrou-se tão explícita que o próprio Adriano
Maia – ao responder a mensagem de Marcelo Odebrecht confirmando que teria uma
reunião no dia seguinte para ‘tratar do tema’, isto é, tratar do seu amigo Toffoli, faz
uma pequena (mas sintomática) alteração no conteúdo dos e-mails copiados,
justamente excluindo aquela frase”.
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Àquela altura, a Odebrecht queria que o Palácio do Planalto mantivesse, sem vetos, o
texto de uma medida aprovada a fórceps pelo Congresso que contemplava o pleito da
companhia. Ao mesmo tempo, queria empurrar o julgamento do tema no Supremo, o
que poderia jogar o plano por terra. A essa altura, Marcelo Odebrecht escreve: “Se for
para resolver (o problema que ele criou no S e os vetos) acho que T e R valem até
mesmo o número da chantagem deles”. A antiga equipe da Lava Jato na PGR relaciona
“T” a Toffoli e “R” a Renault, um dos dois intermediários. O próprio Marcelo
Odebrecht diz que Toffoli credenciou o advogado como seu interlocutor. O “número da
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chantagem” seria, na leitura dos procuradores, o valor alto que, segundo Marcelo, foi
pedido para resolver o imbróglio. No depoimento, o empreiteiro confirma a suspeita e
reafirma o que já havia explicitado nos e-mails: ele propôs pagar de 20% a 25% do
valor exigido de imediato pelos intermediários e deixar o restante para depois.
A Odebrecht, diz Marcelo, faria uma espécie de vaquinha com outras empresas
interessadas no tema para pagar a diferença. O expediente é similar ao que ele usou ao
atender, em outra situação, a um pedido de propina feito por Antonio Palocci, o
“Italiano” das planilhas da empreiteira. No dia seguinte à mensagem do “número da
chantagem”, Marcelo Odebrecht reforça, em um novo e-mail: “E a meta ficou claro
(sic): Vencer ou postergar julgamento S e os vetos do jeito que queremos?”. É Adriano
Maia, o suposto “amigo” de Toffoli, quem responde: “Ficou”. As metas, na leitura dos
procuradores, eram postergar o julgamento no STF, supostamente com a ajuda da
AGU, ou evitar os vetos do Planalto. Nenhuma delas foi alcançada, o que, registra a
peça da Lava Jato, “não afasta a existência da negociação em si, bem como da
promessa de atuação”.
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O outro dos dois temas principais dos e-mails de Marcelo Odebrecht, a questão das
hidrelétricas do rio Madeira, se desenrola em 2007. Nesse caso, os interesses da
empreiteira eram vários. Muitos se sobrepunham. E quase todos passavam, de alguma
forma, pela AGU. Pode-se dizer que a já conhecida mensagem em que Marcelo se
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refere ao “amigo do amigo de meu pai” é uma espécie de ponto de partida para as
discussões. Uma hora depois de disparar a cobrança, aliás, Marcelo diz: “Não podemos
relaxar. Esta frente e a do amigo do amigo de meu pai decidem o jogo a nosso favor”.
Meses depois, ele pergunta como está agindo o “amigo de Adriano” – ou seja, Toffoli –
e de novo fala em “preço”: “Temos como motivá-lo a nos defender mais? Diria que
pelo desgaste que possamos estar tendo pelo envenenamento da moça o apoio dele
vale uma parceria/preço bem alto”. A moça seria a então ministra Dilma Rousseff, que
se opunha aos interesses da empreiteira no projeto das usinas. “Ao que parece, o apoio
de Toffoli é dado em troca de um alto preço a ser pago pela Odebrecht”, anotam os
procuradores em uma das peças obtidas por Crusoé. Eles destacam os seguintes
pontos acerca das tratativas sobre os projetos do rio Madeira:
Na sequência, Adriano Maia diz que a posição de Toffoli em relação aos temas de
interesse da Odebrecht refletirá a vontade de Lula, que vinha acompanhando o tema e
sofrendo pressão de empreiteiros concorrentes. A certa altura, ele afirma que os
pareceres deveriam ser favoráveis à Odebrecht, mas que Toffoli tinha um limite: além
de não poder contrariar as decisões do então presidente, seu chefe imediato, o então
advogado-geral já estava demasiadamente exposto no tema. Ao fazer esse relato a
Marcelo Odebrecht, Adriano menciona o que ouvira de Sérgio Renault, o suposto
intermediário da relação: “Renault diz que meu amigo não confrontará diretamente a
decisão do governo. Que não se espere isso dele, por conta da forte exposição que ele
diz já ter tido no tema”. Um mês depois, Marcelo pede notícias sobre o acerto com o
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“amigo”. Adriano responde da seguinte forma: “Acertei o conceito. Não detalhamos
ainda a proposta. O Renault estah sabendo que faremos uma proposta de solução
ainda este ano”.
Pouco antes de pedir demissão coletiva por discordar da postura de Augusto Aras em
relação à Lava Jato, os procuradores deixaram escrito no expediente em que
defendiam a abertura de uma apuração no Supremo sobre a relação entre Toffoli e a
Odebrecht que, embora não seja possível, de antemão, atestar a existência de ilícitos,
as mensagens contextualizadas por eles formam um mosaico que aponta para a
necessidade de investigação. Os procuradores observam que, devido ao gigantismo do
acervo obtido a partir da quebra da criptografia do notebook de Marcelo Odebrecht,
novos documentos ainda podem surgir em relação ao assunto.
Léo Pinheiro, da OAS, ao ser preso pela Lava Jato: encontros reservados com
Toffoli
Entre os capítulos de sua delação, Léo Pinheiro limitou-se a falar de uma doação a
José Ticiano, o irmão de Toffoli que foi vice-prefeito de Marília. Ainda assim, essa
parte do relato foi arquivada pela sucessora de Janot na PGR, Raquel Dodge. Acontece
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que, mais recentemente, o mesmo grupo de procuradores que se debruçava sobre os e-
mails da Odebrecht teve acesso a uma parte ainda desconhecida dos registros da
central de pagamentos de propina da OAS. Lá estavam registrados, com todas as
letras, o pagamento de uma pequena obra na casa de Toffoli e os repasses para o irmão
do ministro – uma parte, inclusive, via caixa dois. Diante das novas evidências, os
procuradores pediram que Aras solicitasse ao Supremo o desarquivamento do
procedimento que Dodge mandara para a gaveta e, além disso, incluísse o próprio
Toffoli na investigação, por supostamente ter recebido vantagem indevida do
presidente da OAS.
Adriano Machado/Crusoé
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Em maio de 2013, o empreiteiro escreve a um de seus auxiliares: “O Ricardo me ligou
dizendo que lhe pediu um assunto da residência do amigo dele. Pode providenciar”.
“Ok, o pessoal da empresa já marcou de ir lá novamente para verificar esta nova
demanda. Lhe explico pessoalmente”, respondeu minutos depois o funcionário da
OAS. A despesa com a reforma foi registrada nos arquivos secretos da empreiteira em
agosto de 2013. Não se tem notícia, também nesse caso, de que o atual procurador-
geral da República, Augusto Aras, tenha enviado para o Supremo a petição preparada
por seus ex-auxiliares. Crusoé está aberta a manifestações de Toffoli — que nesta
quinta-feira, 10, transferiu a presidência do Supremo para o ministro Luiz Fux — e dos
demais personagens mencionados nesta reportagem.
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A hora da Lava Toga
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10 de setembro de
2020
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genro, Cristiano Zanin, advogados do ex-presidente Lula, e o ex-presidente do STJ,
César Asfor Rocha, acusado de receber 2,67 milhões de reais por meio de
subcontratações feitas por três escritórios contratados pela entidade na gestão Diniz.
Embora não tenha sido denunciado, o onipresente Frederick Wassef, que atuou na
defesa de Jair Bolsonaro e de seu filho Flávio é outro aparecer na história. Os
escritórios de Wassef e de dezenas de outros advogados são suspeitos de integrar um
esquema que pode ter desviado cerca de 355 milhões de reais. Os repasses a Wassef se
deram por meio do escritório da advogada Luíza Eluf. Dados obtidos pelo Conselho de
Controle de Atividade Financeira, o Coaf, mostram que ele recebeu ao menos 2,6
milhões. Surgiu, na investigação, até mesmo um elo de Wassef com Delúbio Soares, ex-
tesoureiro do PT. O MPF explica que a contratação de Luíza ocorreu a pedido do
publicitário Marcelo Cazzo, “não tendo o trabalho realizado justificado o valor de
contratação”. Segundo Diniz, a advogada, com quem se encontrou uma única vez em
2016, foi indicada ao publicitário por “Ivan Guimarães, dono da empresa Corseque
Security, com quem a Fecomércio também mantinha contrato”. Ivan Guimarães foi
presidente do Banco Popular no primeiro mandato de Lula, indicado ao cargo por
Delúbio Soares, ex-tesoureiro do PT. Guimarães, afirmou Diniz, “era muito próximo
de Frederick Wassef”.
Em junho de 2020, quando o acordo foi selado e homologado pelo juiz Marcelo Bretas,
os investigadores tinham o mapa dos caminhos que, enfim, levariam a Lava Jato para
dentro do Judiciário. Por meio das revelações de Diniz e do material amealhado na
investigação, foi possível detalhar uma velha prática conhecida — mas nunca
investigada nesse nível — sobre como se dão as relações nada ortodoxas entre
poderosos enrolados na Justiça, advogados e integrantes do Judiciário.
Pedro Ladeira/Folhapress
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filho do ministro do TCU Aroldo Cedraz. De acordo com Diniz, a contratação não tinha
por objetivo qualquer tipo de assistência técnica nos processos, mas a “compra da
solução no TCU”.
Além de explicar os motivos das contratações, Diniz detalhou no seu acordo como se
deu a arquitetura do esquema que desviou 151 milhões de reais da Fecomércio e do
Sistema S – o valor, diz o MPF, refere-se apenas ao que já foi confirmado, mas pode
alcançar 355 milhões de reais. É quando entram em cena o advogado Roberto Teixeira
e seu sócio Cristiano Zanin – a dupla foi denunciada por receber 68 milhões da
Fecomércio. Os advogados de Lula foram apresentados a Diniz em 2012 pelo advogado
Fernando Hargreaves. Na delação, o ex-presidente da Fecomércio-RJ narra um
encontro no bar da piscina do Copacabana Palace, no Rio de Janeiro. Segundo o MPF,
para tentar estancar uma fiscalização na Fecomércio dirigida por Carlos Gabas,
conselheiro fiscal da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo
e ex-ministro da Previdência dos governos do PT, Teixeira cobrou 10 milhões de reais,
exigindo que 1 milhão de reais fosse entregue em espécie e que o contrato fosse feito
em nome de Diniz e não da Fecomércio.
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Flagrados, mas candidatos
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10 de setembro de
2020
Em um ponto a réplica de Paes não erra. As acusações, de fato, são antigas. Vieram à
tona em 2017, no bojo da delação da Odebrecht. Mas a denúncia aceita no mês
passado pela Justiça Eleitoral vai além dos meros depoimentos dos executivos da
empreiteira, como ele sugere. Registros de entregas de dinheiro vivo feitos pelo doleiro
da Odebrecht e delações de um ex-secretário e do próprio marqueteiro de campanha
de Paes são algumas das novas provas dos repasses ilícitos que o ex-prefeito prefere
ignorar.
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Eduardo Paes é apenas um dos políticos que, embora mencionados em delações e
incluídos em planilhas de empreiteiras, tentarão triunfar nas urnas este ano – fazendo
figa para que a população esqueça o que eles fizeram no verão passado. O elenco dos
candidatos delatados não escolhe ideologias nem matizes partidários. Vai do DEM ao
PCdoB, passando, é claro, pelo sempre encrencado PT e pelos não menos enrolados
PTB, PSDB, PSB, PSD, PDT, Progressistas, Podemos e Republicanos – deste último
partido, faz parte do rol de aspirantes a renovar o mandato nas urnas o prefeito do Rio,
Marcelo Crivella.
Nesta quinta-feira, 10, dois dias após a operação contra Eduardo Paes, Crivella – o
mesmo que Paes acusou de estar sendo beneficiado com a ação contra ele – recebeu a
visita dos investigadores na prefeitura e no condomínio onde mora. O MP apura a
existência de um “QG da propina” dentro da Riotur, empresa municipal de turismo,
que foi delatado pelo doleiro Sergio Mizhay. Entre os alvos da operação está Mauro
Macedo, tesoureiro das campanhas de Crivella que teria operado outros esquemas para
o bispo licenciado da Igreja Universal, como o recebimento de cerca de 3 milhões de
reais da Fetranspor, a federação das empresas de ônibus, nas eleições de 2016 e 2010.
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No interior do estado, a delação da empreiteira baiana também ameaça as reeleições
de influentes líderes partidários, como o tucano Duarte Nogueira, em Ribeirão Preto, e
o petista Edinho Silva, em Araraquara. Em São Bernardo do Campo, terra do ex-
presidente Lula, o ex-ministro Luiz Marinho, do PT, tentará retomar a prefeitura que
comandou por oito anos no auge da era petista com um enorme passivo político-
policial: a acusação de recebimento de 12 milhões de reais de propina da OAS em troca
de obras superfaturadas na cidade. Marinho aparece na delação da CCR,
concessionária de rodovias, juntamente com o companheiro de partido Emídio de
Souza, deputado estadual que tentará voltar à prefeitura de Osasco. Ele é acusado de
receber caixa 2 para a campanha de Aloizio Mercadante ao governo do estado em
2010.
Jogar uma cortina de fumaça sobre o tema corrupção será mais complicado na capital
paranaense, berço da Lava Jato. Lá, dois parlamentares que postulam a prefeitura
foram citados em delações. O emedebista João Arruda foi acusado por um ex-
superintendente do Ministério da Agricultura no Paraná de receber propina de
frigoríficos da região durante a Operação Carne Fraca. Já o ex-prefeito Gustavo Fruet,
do PDT, é um dos nomes listados por Benedicto Junior, ex-executivo da Odebrecht,
como beneficiário de 200 mil reais de caixa 2 nas eleições de 2010 e 2012. Ainda no
sul do país, a planilha do Departamento de Operações Estruturadas da empreiteira
baiana expõe candidatas a prefeita de espectros políticos antagônicos. Em
Florianópolis, Angela Amin, do Progressistas, e em Porto Alegre, Manuela D’Ávila, do
PCdoB.
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Cocal, no Piauí, preso duas vezes por desvio de recursos públicos. Em discurso
acompanhado de gargalhada de Ciro Nogueira, líder do Centrão, Monção admitiu que
roubou, só que menos do que atual prefeito e rival na disputa. “Não roubei o tanto que
esse aí (sucessor) roubou não, está entendendo? Esse é descarado”, afirmou. Saímos
do “rouba, mas faz” para o “rouba, mas menos”.
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Roberto Livianu critica a pena de censura imposta ao procurador Deltan Dallagnol
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O procurador de Justiça que preside o Instituto Não Aceito Corrupção critica os
ataques à Lava Jato e diz que a vontade de Augusto Aras não pode ser maior do que a
instituição
10.09.20
Helena Mader
Nos anos 1990, quando fazia doutorado em direito na Universidade de São Paulo,
Roberto Livianu envolveu-se com uma bandeira que se transformaria na causa de sua
vida: o combate à corrupção. Sob a orientação do professor e jurista Miguel Reale
Júnior, o então jovem promotor de Justiça do Ministério Público de São Paulo
defendeu uma tese em que expôs a realidade de desvios de recursos públicos no país.
Em 2012, quando ele liderou uma campanha de conscientização sobre os danos da
corrupção para a sociedade, sua militância na área ganhou projeção nacional. Lançada
no auge do julgamento do escândalo do mensalão, a ação foi a semente para o grande
projeto de Livianu: o Instituto Não Aceito Corrupção. Criado há cinco anos, o grupo
realiza pesquisas, desenvolve políticas públicas anticorrupção, faz uma análise de
projetos de lei em andamento no Congresso, e, principalmente, atua na mobilização da
sociedade contra malfeitos em todas as esferas de poder.
A Operação Lava Jato tem sido alvo de vários ataques, que culminaram
com a saída do procurador Deltan Dallagnol. Acredita que isso representa
o fim da operação?
Eu espero que a Lava Jato não tenha terminado. A Lava Jato tem uma dinâmica de
trabalho colaborativa, na forma de força-tarefa, e está sujeita apenas a decisões
administrativas da cúpula do Ministério Público. O procurador-geral da República não
é o dono do Ministério Público. Existem instâncias da administração superior. Há uma
demanda por parte da sociedade pelo combate à corrupção. Não se pode simplesmente
implodir a Lava Jato e não responder a essa demanda da sociedade. A vontade do
procurador-geral da República não é vontade única. Existem outros organismos na
instituição, existe a vontade da sociedade, o poder vigilante da mídia. Não há dúvida
alguma de que a Lava Jato está sob cerco.
A PEC que restringe o foro privilegiado foi aprovada pelo Senado em 2017,
mas está parada na Câmara desde então. O sr. acha que os deputados vão
aprovar a proposta?
Essa proposta dormita na gaveta do presidente da Câmara e isso é motivo de vergonha
para o Brasil perante o mundo. Sou membro do Ministério Público e defendo o fim do
foro para membros do Ministério Público também. Não se justifica mais termos
figuras imunes, blindadas. O foro privilegiado nos envergonha. Precisamos de
isonomia, igualdade para todos.
Que pontos o sr. avalia como indispensáveis para uma efetiva reforma
política no Brasil?
Acho que a reforma política é a reforma das reformas, ela é imprescindível para que
tenhamos avanços civilizatórios. Temos que debater a questão do sistema de voto e
tantas outras que giram em torno disso, como falhas no controle dos partidos. Foge-se
de um debate sobre regras de integridade para os partidos e não há democracia e
transparência verdadeira dentro deles. Para piorar, no ano passado, aprovaram uma
autorização para o uso de recursos do fundo partidário para a compra de helicópteros
e iates de luxo. Isso é um acinte. Os partidos precisam se moldar à democracia, à
transparência e à ética.
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O mais soviético resiste
crusoe.com.br/edicoes/124/o-mais-sovietico-resiste
10 de setembro de
2020
Kaleniskava agora está detida em Minsk, assim como outros rostos que se destacaram
nos protestos que se seguiram à eleição de 9 de agosto. No pleito, Lukashenko, há 26
anos no poder, declarou-se vencedor com 80% dos votos. A suspeita de fraude foi o
que levou mais de 200 mil bielorussos a se manifestar. Setores da sociedade que nunca
haviam desafiado o ditador, como professores, médicos e funcionários de estatais,
uniram-se às passeatas. Nos últimos dez dias, porém, todos os que lideraram o
movimento foram presos, deportados, deixaram o país após receber ameaças ou se
encontram desaparecidos.
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Na quarta-feira, 9, o advogado Maksim Znak, de 37 anos, um dos últimos integrantes
do “Conselho de Coordenação” da oposição em Belarus, foi sequestrado. Uma foto de
Znak sendo conduzido por homens mascarados em roupas civis foi publicada no
Telegram. Após avisar pelo telefone que havia homens em frente ao prédio em que ele
estava, a ligação caiu. Znak só teve tempo de mandar a frase “são mascarados” por
mensagem de texto. A polícia e os serviços secretos não confirmaram a prisão de Znak,
mas o enredo corresponde ao ocorrido com outros adversários da ditadura, que foram
detidos e depois apareceram como exilados ou presos. Da precária comissão formada
pelos manifestantes para negociar uma transição com o governo, apenas a escritora
Svetlana Aleksiévich, vencedora do prêmio Nobel de Literatura, permanecia livre até
esta quinta-feira. Mesmo assim, durante a semana, um grupo tentou invadir seu
apartamento.
Reprodução
Ao pedir ajuda a Vladimir Putin, a Belarus reata as relações com a Rússia, que
andavam estremecidas. Ao longo de sua história, os laços entre os dois países foram
estreitados e afrouxados em diversos momentos. Antiga Bielorússia, o país foi parte do
Império Russo, tornou-se independente em 1918 e teve regiões anexadas pela Polônia
até ser totalmente anexado pela União Soviética, em 1939.
Com o colapso da URSS, em 1991, a Belarus não trilhou o caminho de seus vizinhos,
como a Lituânia e a Polônia, que abriram seus mercados e se democratizaram. Em vez
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disso, seguiu como “o mais soviético dos ex-estados soviéticos”, nas palavras de
Maxim Samorukov, do Centro Carnegie de Moscou. Passou a viver de refinar o
petróleo russo e revendê-lo para o Ocidente. A prática propiciou estabilidade
econômica, postergando reformas de mercado e permitindo a manutenção da antiga
oligarquia. Lukashenko, um ex-diretor de uma fazenda coletiva, eleito presidente em
1994, foi quem mais se beneficiou dessa articulação comercial entre o Leste e o Oeste.
Reprodução/redes sociais
A aproximação com a Rússia deve ampliar o abismo entre o ditador e a população. Nos
anos 1990, os bielorussos apoiaram o arcaísmo de Lukashenko porque viram nele uma
garantia contra a instabilidade econômica. Esse sentimento diluiu-se com os anos. No
ano passado, pesquisas mostraram que a maioria da população prefere trabalhar no
setor privado a ganhar salários estagnados em alguma estatal. Jovens que viajam com
frequência para a Polônia e para a Lituânia não suportam mais o comportamento
autoritário de Lukashenko, que chegou a visitar policiais antimotim com roupas
militares e um rifle nas mãos.
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Abusos
crusoe.com.br/edicoes/124/abusos
10 de setembro de
2020
Jair Bolsonaro derreteu nas redes sociais. A AP Exata, que mede em tempo real as
mensagens presidenciais, mostrou que, em 2020, a repercussão das asnices
bolsonaristas foi positiva em 32 dias e negativa em 202 (o resto foi neutro).
É claro que Jair Bolsonaro sabe disso. É claro também que, tendo derretido nas redes
sociais, ele resolveu macaquear Lula, com sua aposta em instrumentos de persuasão
mais arcaicos, como esmola, escambo e propaganda. A esmola e o escambo sempre
funcionam. Quanto à propaganda, ela pode comprar o rebotalho da imprensa,
pingando uns trocados nas contas da escória do jornalismo.
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Não me amolem
crusoe.com.br/edicoes/124/nao-me-amolem
10 de setembro de
2020
MarioSabino
10.09.20
Monguillot começou a ser insultado pelos homens. Ele reagiu e foi empurrado para
fora do ônibus. Caído no chão, o motorista levou socos e pontapés principalmente na
cabeça, desferidos por dois dos agressores. Levado para o hospital, Monguillot teve
morte cerebral, aos 59 anos. Deixou mulher e três filhos jovens. A brutalidade que o
vitimou não foi exceção, outras semelhantes vêm acontecendo na França. Ao ser
entrevistado pelo jornal Le Figaro sobre tais ocorrências, o ministro do Interior,
Gérald Darmanin, disse: “Assistimos a um crise de autoridade. É preciso parar o
‘enselvajamento’ de uma certa parte da sociedade”.
Quando li a frase, ela me pareceu razoável, visto que “selvagem” está dicionarizado
também em francês na acepção de “não civilizado” — e civilizado é sinônimo de
respeitoso, educado, cordial e outras qualidades que, espero, continuem a ser
apreciadas. Qual não é a minha surpresa quando vi a fala de Darmanin ser objeto de
críticas zangadas e discussões acirradas, alvo inclusive do ministro da Justiça da
França, Éric Dupond-Moretti. Perguntado a respeito, o colega de Darmanin afirmou:
“’Enselvajamento’ é uma palavra que suscita o sentimento de insegurança. Pior do que
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a insegurança, é o sentimento de insegurança”. E completou: “Quero dirigir-me à
inteligência dos franceses e não aos seus baixos instintos, porque o sentimento de
insegurança pertence à ordem da fantasmagoria”.
Fui entender a indignação ao ler o que escreveu o jornalista René Naba, em artigo
publicado no jornal Le Parisien: “Um policial que comete um ato selvagem é um erro
grave. Mas um negro ou um árabe que atira num policial ou joga o carro contra ele é
enselvajamento. O vocabulário não é neutro”. Ou seja, como os assassinos de
Monguillot possivelmente não eram brancos, o ministro do interior estaria sendo
racista e xenófobo quando empregou a palavra relativa a selvagem. Ele a teria tomado
de empréstimo da extrema direita, que a emprega constantemente para assombrar os
franceses com a ideia que o país está sendo invadido por imigrantes ilegais e perigosos.
Aliás, integrantes do Front National, partido da direitista Marine Le Pen, chegaram a
difundir na internet a foto de um homem de 29 anos como um dos agressores de
Monguillot, no que se revelou ser uma fake news.
Aqui do meu canto, gostaria de dizer que continuarei a usar o termo “selvagem” e
todos a ele relacionados, neologismos também, independentemente de serem
utilizados da forma que for pela extrema direita ou de serem motivo de admoestações
da patrulha da esquerda. Quando assisti à depredação do Boulevard Saint-Germain,
em Paris, por um monte de brancos, chamei-os de selvagens, sem nem sequer cogitar
longinquamente que a expressão do meu estupor pudesse conotar outra coisa que
gente sem respeito, sem educação, sem civilidade. Assim como o ministro do Interior
francês, acho que o mundo está sendo tomado pela selvageria de todos os lados. A
brutalidade é selvagem, a ignorância é selvagem, a corrupção é selvagem, a destruição
do ambiente é selvagem. O preconceito é selvagem. O autoritarismo é selvagem,
inclusive em relação à língua.
As palavras não são neutras, tem razão o jornalista francês que escreveu no jornal Le
Parisien, mas boa parte delas sofreu tamanha transformação nos seus significados, às
vezes em curto espaço de tempo, que acepções pejorativas primeiras foram canceladas,
sem chance de ressurreição, por mais que haja idiotas tentando fazer isso. A história
pode transformar em ruínas o que parecia ser eterno e fazer terra arrasada do que se
afigurava inexpugnável — tal é a sua beleza, tal é a sua tragédia, a depender do caso. A
língua é também processo histórico. Veja-se o exemplo de “gótico”, palavra que
designa o estilo que floresceu na França e erigiu as mais belas catedrais do mundo. Ela
foi utilizada originalmente pelos italianos, para definir o que julgavam ser a arte dos
godos bárbaros. Quem diria hoje que, por ser gótica, a Notre-Dame de Paris, lambida
por chamas selvagens, no sentido de indomadas, foi construída por alienígenas
incultos e desprezíveis? Por falar em bárbaro, em português do Brasil, o termo ganhou
também o significado de bonito, gentil, amigo, muito legal e por aí vai — o exato
oposto de acepções anteriormente atribuídas a ele.
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Segurança pública tem jeito
crusoe.com.br/secao/sergio-moro/seguranca-publica-tem-jeito
10 de setembro de
2020
SergioMoro
10.09.20
Os demais desafios que preexistiam não nos deixaram, porém, com a pandemia.
Tendem talvez a se agravar.
Em 2018, houve uma melhora, com 48.943 vítimas, uma redução de cerca de 13,5%. Já
em 2019, houve 39.509 vítimas, uma redução ainda mais expressiva, de 19%, esta sem
precedentes históricos.
Ainda assim, 39 mil é um número muito elevado. Outros indicadores criminais não
ficam atrás e são também elevados, como os 188.806 roubos de veículos e os 53.883
estupros.
Este ano de 2020 é atípico. Há dúvidas se ele poderá ser considerado na linha histórica
de maneira apropriada, tendo em vista os efeitos ainda incertos da pandemia na
segurança pública.
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Eu, pessoalmente, imaginava que os crimes iriam cair por conta das medidas de
distanciamento social. As primeiras informações colhidas sobre os indicadores
criminais não confirmaram tal expectativa. Embora não oficiais, dados colhidos pelo
monitor da violência do G1 apontaram elevação do número de assassinatos em março
e abril de 2020, na comparação com os mesmos meses de 2019. Foram 4.151 em março
de 2020, contra 3.729 em março de 2019, e 3.950 em abril de 2020, contra 3.656 em
abril de 2019. É certo que, em fevereiro de 2020, já havia ocorrido um aumento do
número de homicídios, mas esse acréscimo pelo menos em parte encontra explicação
provável nos movimentos de paralisação das polícias estaduais naquele mês,
especialmente no Ceará.
De todo modo, as reduções havidas em 2018 e 2019 confirmam que a violência não é
um dado da natureza em relação a qual os brasileiros precisam se resignar. Sim, é
possível com políticas públicas consistentes reduzir a criminalidade.
Fizemos tudo isso durante minha gestão no MJSP, com atenção especial ao crime
organizado e à criminalidade violenta. Conseguimos até alguns avanços legislativos no
combate a eles. Já quanto ao enfrentamento da corrupção, os avanços pretendidos,
especialmente legislativos, encontraram maior dificuldade.
Enfim, segurança pública tem jeito. Tão importante quanto à reforma tributária e a
administrativa, é a segurança pública, que envolve o direito de ter a tranquilidade de
sair à rua, sem o receio de tornar-se mais uma vítima. Planejamento, investimento,
focalização e integração são os movimentos necessários.
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Wassef e o fuzil AR-15
crusoe.com.br/edicoes/124/wassef-e-o-fuzil-ar-15
10 de setembro de
2020
Bruno Santos/Folhapress
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Itamaraty de olho no general
crusoe.com.br/edicoes/124/itamaraty-de-olho-no-general
10 de setembro de
2020
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Conta outra, Lula
crusoe.com.br/edicoes/124/conta-outra-lula
10 de setembro de
2020
Que o ex-presidente Lula já se assanha para 2022, mesmo impedido pela Justiça de se
candidatar, todos já sabem – o petista confia plenamente que os processos contra ele
na Justiça serão anulados, depois de julgada a suspeição do ex-juiz Sergio Moro no
STF. O que poucos sabem é o que ele anda se dispondo a fazer para ganhar o apoio da
esquerda e se consolidar como “o mais talhado” para conduzir o país a uma “transição
para um novo contrato social”, seja lá o que isso signifique. A interlocutores, Lula
garante que, se for eleito, no primeiro ano de governo colocará para votar o fim da
reeleição com a ampliação da duração do mandato para cinco anos. Claro que ninguém
acreditou. “Conta outra”, disse um político que compôs a aliança do PT em 2018.
Adriano Machado/Crusoé
Lula diz que, se eleito, acaba com a reeleição e amplia mandato para 5 anos
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Lancha de Cabral desencalha
crusoe.com.br/edicoes/124/lancha-de-cabral-desencalha
10 de setembro de
2020
Após dois leilões fracassados, o juiz federal Marcelo Bretas, da 7ª Vara Criminal do
Rio, autorizou a venda da lancha Manhattan, que pertenceu ao ex-governador Sérgio
Cabral, pela metade do preço anunciado inicialmente. A embarcação de 80 pés, com
suíte, bar lounge e bote com motor, foi apreendida pela Lava Jato após a prisão de
Cabral e da ex-mulher dele, Adriana Ancelmo, e levada a leilão pela primeira vez no
ano passado pelo valor de 2,9 milhões de reais. Nenhuma oferta, no entanto, havia
atingido o lance mínimo. Após mais de um ano encalhada, com o laudo de reavaliação
reduzindo significativamente o valor, Bretas deu aval para que a lancha fosse
comprada por uma empresária de Angra dos Reis, no litoral fluminense. O preço: 1,4
milhão de reais.
Reprodução/TV Globo
A lancha de Sérgio Cabral foi finalmente vendida por 1,4 milhão de reais
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24 horas no batente
crusoe.com.br/edicoes/124/24-horas-no-batente
10 de setembro de
2020
A psicóloga Emanuela Dourado Rabelo Ferraz, que foi flagrada acumulando três
cargos públicos de forma ilegal, quer encerrar a polêmica sob a alegação de que já
devolveu parte dos salários aos cofres públicos. A afilhada política do senador Ciro
Nogueira, presidente nacional do PP, exerceu concomitantemente três cargos – um na
Câmara dos Deputados, outro no governo do Piauí e o terceiro na área da saúde do
Distrito Federal. Em sustentação apresentada ao Tribunal de Contas do DF esta
semana, a defesa de Emanuela tentou demonstrar “a boa fé” da cliente ao afirmar que
ela restituiu 74 mil reais à Câmara. Disse ainda que a psicóloga atuava
presencialmente no comando do Instituto de Gestão Estratégica de Saúde do DF,
trabalhava de maneira remota no gabinete da deputada federal Iracema Portella, ex-
mulher de Ciro Nogueira, e também despachava virtualmente como assessora do
governador Wellington Dias, até então aliado do presidente do PP. Só não explicou
como conseguia trabalhar 24 horas por dia, de segunda a sexta-feira, já que os cargos
que ocupava tinham carga horária de 8 horas diárias cada.
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A morte da Dersa
crusoe.com.br/edicoes/124/a-morte-da-dersa
10 de setembro de
2020
Adriano Machado/Crusoé
Edital de Doria para retomada das obras do Rodoanel decretou o fim da Dersa
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Parem de ressuscitar os malditos anos 80
crusoe.com.br/edicoes/124/parem-de-ressuscitar-os-malditos-anos-80
10 de setembro de
2020
RuyGoiaba
10.09.20
A idealização de qualquer década geralmente guarda relação direta com o fato de que a
pessoa que idealiza não viveu aquele período. Ou, se viveu, estava chapada demais
para lembrar direito —em geral, é o que acontece com os boomers vivos nos anos 60
que até hoje acham aquela época uma maravilha.
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No meu caso, isso acontece com os anos 80, aos quais sobrevivi —não sem sequelas,
obviamente. No Brasil, passamos metade dessa década sob o general Figueiredo
(“quem quiser que não abra eu prendo, arrebento”) e a outra metade sob os bigodes do
poeta José Sarney: COMO é possível alguém achar que isso foi bom? Que saudade da
inflação galopante e de esperar até três anos para receber telefone depois de comprar,
hein? E de ouvir os cliques das maquininhas de remarcar preço no mercado, então?
Fora aquela supernovidade que era a Aids.
– Os fiscais do Bolsoney
Como se não bastasse o aumento dos preços do arroz lembrar a época em que o grande
vilão da inflação no Brasil era o chuchu —não Geraldo Alckmin, a hortaliça mesmo—,
ainda aparece Jair Bolsonaro pedindo “patriotismo” aos donos de supermercado. Ato
contínuo, o Ministério da Justiça determina que mercados e produtores se expliquem
sobre a alta de preços do produto. Só estão faltando os buttons de fiscal do Bolsoney e
as lojas fechadas “em nome do povo brasileiro”. (A inflaçãozona também, mas logo
esse governo aí dá um jeito.)
Artista popular, em geral, é bem burrão quando se trata de dar palpite sobre qualquer
coisa que não seja a própria arte, mas os brasileiros capricham —e, nesse grupo, têm
especial destaque os “roqueiros dos anos 80”. Em vez de morrer, como Cazuza ou
Renato Russo, ou se retirar para uma velhice digna no Parque dos Dinossauros, alguns
deles continuam fazendo questão de dar OPINIÕES no Twitter, com toda a
inteligência e sofisticação que se espera do pensamento deles. Já escrevi aqui sobre o
glorioso Roger do Ultraje e, hoje, cito o não menos glorioso Leoni do Kid Abelha, que
está na outra ponta da ferradura ideológica: recentemente, o compositor da imortal
“tira essa bermuda que eu quero você sério” foi ao Twitter elogiar um neostalinista, na
linha “veja bem, ele não é stalinista, só defende o Stálin quando os liberais fazem isso e
aquilo”. Claro! Neonazistas também não são nazistas: eles só defendem Hitler quando
alguém se esquece da “humilhação à Alemanha no Tratado de Versalhes”, ora.
(Para não dizerem que estou sendo injusto, registro aqui que sou fã incondicional da
Paula Toller e da pandeirada que, dizem, ela deu no Leoni. Obra de arte.)
(Um amigo tem a teoria de que gostar desse tipo de coisa é como adolescente curtir
black metal norueguês, aquele pessoal bacana que queimava igrejas e matava gente: é
o gosto por “coisas extremas”, que tende a passar com a idade. O problema é quando
os adultos chamam essa turma para a mesa deles, em vez de deixar trancada no quarto
de castigo, sem internet e sem Toddy.)
Pois é: tem gente que não acha suficiente voltar à década de 80 do século 20 e quer ir
ainda mais longe, de volta àqueles tempos idílicos anteriores à presença do
colonizador europeu nas Américas. Aquela época de paz, harmonia e, uma vez ou
outra, sacrifícios humanos com paulada no crânio e gente esfolada viva.
O pior dessa história é a ofensa à minha dignidade de gordo: ai de quem ousar mexer
com meu café com leite e meu pão com manteiga. Vá você aprender tupi-guarani e
fazer fogueira na sua sala para cozinhar uma mandioca, ô cretino.
***
A GOIABICE DA SEMANA
Nesta semana, não há rival possível: o troféu TEM de ir para a bancada do PCdoB
aprovando por unanimidade, em julho, aquela emenda concedendo às igrejas um
perdão de dívidas tributárias que podem chegar a R$ 1 bilhão, coisinha pouca.
Também não dá para não adaptar a frase atribuída ao Tim Maia: aqui no Bananão,
prostituta se apaixona, traficante se vicia e comunista perdoa um bilhão de dívida das
igrejas. Esse PC não tinha como ser mais do B.
PCdoB
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Jandira Feghali, do PC do B, é uma legítima comunopentecostal. Aleluia,
camaradas!
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