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Vol. 4 (1). jul/dez 2014

LESBOFOBIA: A CONSTRUÇÃO DE UM NOVO CONCEITO

Eduardo Rezende de Almeida Gomes1


Jamily Fehlberg2

Resumo

Trata-se de um trabalho teórico acerca do termo Lesbofobia e sua diferenciação em


relação ao termo Homofobia, o qual acaba por condensar outras tantas formas de
segregação sexual. Foi constatado a existência de muito poucos trabalhos acadêmicos
produzidos hoje sobre o tema, o que fomentou a busca por informações midiáticas
acerca do polêmico termo “lesbofobia”. Entretanto, pretende-se que o estudo trabalhe
com a perspectiva das atualidades sobre o primeiro termo dentro da mídia digital. Para
isso foram visitados sites em português que figuram no buscador GOOGLE como
referências para o termo. Foram encontradas grandes debates sobre o tema e menções
deste em muitos sites que vigoram como referências para o Movimento LGBT da
Bahia, grande articulador e empreendedor de ideias e discursos na área de Direitos
Humanos no país. Contudo, o termo possui sua existência já atestada por alguns
dicionários, principalmente europeus, e além disso é extremamente necessária sua
existência e popularização, pois marca as diversas segregações pelas quais as mulheres
lésbicas atravessam em seu cotidiano, tão somente de ser homossexual, mas também
por serem mulheres.
Palavras- Chave: Homofobia, Mídia Digital, Lesbofobia

Abstract

This is a theoretical work about lesbophobia term and this differentiation from the
Homophobia, which eventually condense many other forms of sexual segregation. It has
been found that there are few academic papers written today on the subject, which
encouraged the search for media information about the term "lesbophobia". However, it
is intended that the study work with the prospect of an update on the first term within
the digital media. For that were visited sites in portuguese listed in GOOGLE search.
Founded great debates on the subject and mentions in many sites, and in the LGBT
Movement of Bahia, great articulator and enterprising ideas and discourses in Human
Rights in the country. However, the term has its existence already attested by some
dictionaries, mainly European, and besides it is extremely necessary existence and
popularity, it marks the various segregations in which lesbian women experience in
their daily lives, as only to be homosexual, but also because they are women.

Key-words: Homophobia, Digital Media, Lesbophobia

1
Graduando em Psicologia pela Universidade Federal de Sergipe.
2
Doutora em Psicologia pela Universidade Federal do Espírito Santo, Professora de Psicologia da
Faculdade Pio Décimo.
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Introdução relacionado à sexualidade4 (Ambrósio,


A existência da Homofobia 2014) Geralmente receosos da perda do
em nossa sociedade é sem dúvidas um apoio das bancadas cristãs no
fato concreto, visto a grande quantidade Congresso, que exigem o direito de
de crimes registrados na mídia pregar e impor um estilo de vida
televisionada ou digital sob essa “heteronormativo” no país, nossos
natureza. Entretanto, pouco ainda candidatos se escusam de adotar uma
registram-se discussões sobre o termo postura clara e incisiva a respeito, o
nos meios acadêmicos como pode-se que, obviamente, permite a
verificar ao longo desse texto. O parco continuidade, senão o agravamento, do
interesse acadêmico, nítido na produção problema.
bibliográfica brasileira sobre o tema, Importante acrescentar, no
não parece ser pactuada por todos os entanto, que se é ponto pacífico a
brasileiros, uma vez que são muitos os existência do comportamento
ataques violentos e represálias aos discriminatório contra homossexuais no
indivíduos que praticam a nosso país e no mundo, de acordo com
homoafetividade, sejam eles homens, o trabalho de Silva (2011) o preconceito
mulheres ou transgêneros. Segundo é reproduzido em várias instituições
pesquisa divulgada pelo Grupo Gay da presentes na formação das crianças
Bahia/GGB no início deste ano, um atualmente. A questão discutida por
homossexual foi morto no Brasil a cada esse autor levanta o discurso de crianças
28 horas em 2013. Os dados e adolescentes de uma comunidade
apresentados registram um crescimento menos favorecida do interior da Bahia,
desse tipo de crime em 15% no país nos no qual encontrou vários fragmentos de
últimos 4 anos. A entidade acusa os violência e menosprezo pelas formas de
governos de implantar uma homofobia homoafetividade em diversas situações.
institucional. 3Também segundo dados ‘quando aquele viado passa
encontrados por Graupe e Grossi (2013) aqui na rua’, ‘quando os
a homofobia nos países sulamericamos meninos ficam passando a mão
de uma forma geral “se expressa por na minha bunda’, ‘na rua eu
meio de diversas formas intolerantes e vejo as pessoas xingando os
violentas.” (p.02), o que fica ainda mais homens de viado, chamando as
nítido no registro de aproximadamente mulheres de sapatona’, ‘xinga
260 mortes no Brasil em 2011, por porque eles são viados, Deus
motivos homofóbicos. fez homem, tem que ser
Diante deste quadro, torna-se homem’, ‘é verdade, como
difícil identificar o que causa mais Deus fez tem que ficar’. Enfim,
assombro: A negativa do Congresso os termos citados acima eram
Nacional em criminalizar essa prática, usados como forma de
ou o fato de nenhum dos principais
candidatos brasileiros à presidência da 4
Nenhum dos Programas de Governo dos três
república nas eleições de 2014 principais candidatos à presidência da República
assumirem publicamente o empenho na se compromete a intensificar esforços no
regulamentação da lei que tornaria sentido de criminalizar a prática da homofobia
no país. A Candidata Marina Silva, do PSB
crimes as ações baseadas no preconceito chegou a incluir o compromisso com o
“casamento gay” e a criminalização da
homofobia, voltando atrás menos de 24 horas
depois, após protestos da bancada evangélica do
3
Fonte: Revista Congresso em Foco de Congresso Nacional.
14/02/2014.
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legitimar preconceitos, seriam reservadas ao desprezo e à


construir e modelar atitudes e condenação.
corpos sob o viés Muitos questionamentos são
heteronormativo. Percebe em feitos sobre as nomenclaturas e as
algumas falas que há fortes políticas públicas a serem adotadas na
conotações de cunho religioso, identificação e no combate a atos
que demarca na construção de violentos contra homossexuais. Não são
‘pessoa’ destas crianças e poucas as vozes que se levantam para
adolescentes um olhar de dizer que o termo homofobia não é
repressão, frente o permitido e amplo o suficiente para abarcar todos
não permitido, frente o que aqueles que sofrem esse tipo de
natural e antinatural discriminação. Têm-se afirmado que,
abominável aos olhos do via de regra, o termo faria clara
‘Deus’ cristão. (Silva, 2011 p. referência apenas aos homossexuais do
08) sexo masculino, ignorando as
importantes e muito específicas
Segundo Borrillo (2009) e Mott condições pessoais de mulheres
(1988) o termo homofobia foi cunhado homossexuais, “comumente, ou
em 1971 nos Estados Unidos, entretanto coloquialmente chamadas Lésbicas”.
somente na década de 90 aparece nos Complexa e, muitas vezes
dicionários. Segundo Mott (1988), o disfarçada, a homofobia teria, assim, um
termo “Homofobia” descreve um caráter amplo, vitimando muitos que
comportamento não se enquadram na divisão clássica
patológico variável de dos gêneros, negando-lhes direito à
cultura para cultura, cujas vivência de suas práticas homoafetivas
manifestações podem e disseminado o ódio que, conforme
oscilar da simples má apontado pela pesquisa divulgada pelo
vontade em relacionar-se GGB, pode, não raro, desencadear
socialmente com rechaço, ódio e culminar em
membros desta minoria violência.Tão ampla seria tal termo que
sexual, até formas mesmo seus pesquisadores preferem
extremas de preconceito delimitá-lo em segmentos com
e discriminação, como características próprias como o termo
sentimentos de raiva ou “Lesbofobia”, que ainda segundo
atitudes agressivas contra Borrillo (2009) possui em si ainda um
os gays (MOTT, 1988) agravante que acrescenta ao fato do
indivíduo ser homossexual, o fato de ser
Já Borrillo (2009), acrescenta mulher e necessariamente sofrer
que a homofobia seria “a atitude de preconceito por esse fato.
hostilidade para com os homossexuais. Alguns autores
[...]. Embora seu primeiro elemento seja propuseram diferenciar
a rejeição irracional ou mesmo o ódio “gayfobia” de
em relação a gays e lésbicas, a “lesbofobia”,
homofobia não pode ser reduzida a declinações possíveis
isso.”. (p. 16). No caso específico da da homofobia
homofobia, um dos seus objetivos seria específica. As
a manutenção de uma hierarquização representações de cada
sexual, na qual a heterossexualidade um dos sexos, assim
seja considerada válida e desejada, como as funções que os
enquanto às outras orientações sexuais acompanham,
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merecem, de fato, uma discriminação homoafetiva de uma


terminologia própria. A forma geral, utilizando termos genéricos
lesbofobia consiste em como “homossexual”, ou “pessoa
uma especificidade no humana”.
cerne de outra: a lésbica Para a realização deste
sofre uma violência trabalho, buscou-se informações que
particular advinda de pudessem esclarecer o tema da fobia
um duplo menosprezo, gay feminina, a fim de entender se a
pelo fato de ser mulher utilização do termo Lesbofobia,
e pelo de ser defendido por uma série de ativistas e
homossexual. escritores, mais do que uma questão de
Diferentemente do gay, capricho ou de vernáculo, realmente
ela acumula colabora na manutenção de um canal de
discriminações contra o comunicação útil e específico para as
sexo e contra a mulheres homossexuais que tanto
sexualidade. (Borrillo, sofrem com um cotidiano sexista.
2009 p. 23)
Lesbofobia: a atualidade do termo
Levando-se em conta nas mídias digitais.
especificamente a homoafetividade A editora do blog “Lugar de
feminina havia uma tendência de Mulher”, Jessica Ipólito, em artigo
menosprezo ou desconsideração entre a publicado pela revista eletrônica Vírus
sociedade anterior à emancipação Planetário (2013), defende o uso do
feminina, “desdém dos homens pela termo “Lesbofobia” alegando que a
sexualidade feminina – inclusive a violência sofrida pelos homens gays em
sexualidade lésbica, pensada como nossa sociedade não seria exatamente
inofensiva – se transforma em violência da mesma ordem que a violência sofrida
quando as mulheres contestam o status pelas mulheres na mesma situação. Para
atribuído a seu sexo, ou seja, quando se ela, embora o termo “Homofobia” não
recusam a ser esposas e mães” (p.30). “carregue gênero”, é usualmente
Os movimentos feministas foram atribuída aos homens. Homofobia e
grande impulsores nos ganhos obtidos Lesbofobia, assim, “seriam palavras
pelas mulheres de uma forma geral, mas distintas que atingem sujeitos distintos”.
colocaram a “ameaça lésbica” como (IPÓLITO, 2013) A autora reafirma a
uma das formas desprezíveis de necessidade da distinção, acrescentando
manifestação sexual, pois alijavam a que, no seu entender, as mulheres
mulher de sua “natureza” materna e lésbicas seriam invisíveis para a nossa
angelical. sociedade.
No trabalho de Sala e Grossi Razão parece assistir à
(2012) foram analisados 253 cartazes escritora. O termo “Invisibilidade”
que concorreram em quatro edições de surge com espantosa frequência nos
um concurso nas escolas de ensino textos que falam sobre a história da
fundamental e médio da capital de Santa homossexualidade feminina. Para
Catarina, cujo tema era lesbofobia, Brown (1986), O “falocentrismo”
transfobia e homofobia nas escolas. imperante na Europa medieval só
Interessante notar que dentre os conseguia enxergar a sexualidade
resultados poucas menções foram feitas atrelada a um pênis. Mulheres sentiam
ao termo Lesbofobia de forma distinta, atração por homens, e homens, como se
pois a maior parte dos cartazes sabia, poderiam sentir atração por
analisados mencionava referência à homens. Era difícil aceitar do fato de
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que mulheres pudessem se sentir sobre mulheres gays nos Estados


realmente, ou ainda, exclusivamente, Unidos da América (Lesbianism in
atraídas por outras mulheres (e, como se América, de Donald Cory), acrescenta
sabe, a História da humanidade foi haver quase nada sobre esse assunto em
escrita por homens). Aos olhos da nossos registros históricos. Para ele, se
mente pública, da medicina e da lei, isso os registros de casos de
praticamente não acontecia. Enquanto homossexualidade masculina no Brasil
os homossexuais masculinos eram foram em grande parte destruídos,
julgados e condenados aos milhares graças ao preconceito e à moral cristã, a
pelos tribunais civis e eclesiásticos entre homossexualidade feminina não teria
a era medieval e o início da era sido sequer documentada. Para o autor,
moderna, praticamente não existem essa falta de documentação
registros de condenações de mulheres se deve mais à cegueira,
sob a mesma acusação. indiferença e preconceito dos
Que não se pense, porém, que a homens face à sexualidade
sociedade medieval ignorava a realidade feminina, considerada assunto
da homossexualidade feminina. Sabia- de menor importância e
se que existia. A brandura com que era indigno de atenção do sexo
tratada, no entanto, denotaria, ainda forte. Portanto, a história do
para Brow (1986), uma visão lesbianismo até pouco tempo
condescendente, baseada, mais uma era uma página totalmente em
vez, numa perspectiva falocêntrica que branco, que somente nos
não enxergaria como digno de atenção últimos anos tem merecido a
um contato sexual em que não houvesse tenção de alguns poucos
um pênis, ou, por outro lado, que estudiosos. E devido aos
entendia que a mulher, ao se relacionar milênios de alienação e
com outra mulher, estaria, inferioridade da mulher em
compreensivelmente, tentando ascender nosso mundo, geralmente têm
a um estrato superior de existência, sido os intelectuais do sexo
através da imitação do comportamento masculino que iniciam tais
do homem, tido como ser superior. estudos e pesquisas.] (p.08).
Assim, ao longo da história, as
leis civis e eclesiásticas sempre Dessa forma, confirmando a
tenderam a punir as relações alegação do virtual desconhecimento da
homossexuais entre mulheres com sociedade a respeito da questão, caberia
muito mais brandura, muitas vezes, em indagar: isso não teria sido bom? Até
analogia às normas relativas aos desvios que ponto essa vida “abaixo do radar”
mais simples de sexualidade da época, realmente existiu? Quais foram as suas
como a masturbação, reservando as consequências? Em que medida o
punições mais duras e exemplares para preconceito contra as mulheres
os “crimes” nos quais houvesse homossexuais realmente demanda um
comprovada a participação de indivíduo atendimento especial?
do sexo masculino, com a prática de O fato é que essa invisibilidade
coito anal e ejaculação. (MOTT, 1988) talvez não tenha sido tão efetiva.
Luiz Mott, em sua Obra Mesmo que as leis civis ou canônicas
“Lesbianismo no Brasil” (MOTT, tenham feito vista grossa para a questão,
1987), reafirma a questão da no que se refere ao grupo social, ter um
invisibilidade das mulheres comportamento fora do padrão sexual
homossexuais. Após afirmar que só em considerado legítimo e aceitável sempre
1965 foi publicada a primeira obra foi um problema grave, independente do
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gênero. “Manchar a honra da família” matéria publicada no jornal inglês The


nunca foi um crime previsto em lei, mas Guardian, em julho de 2013, a
sempre foi punido com severidade. Lesbofobia seria o “casamento” da
Surras, castigos, humilhações, Homofobia com a misoginia e o
tratamentos médicos, internações e sexismo. As mulheres gays, que já
lobotomia são alguns dos exemplos de seriam discriminadas naturalmente pela
punições contra jovens gays ou lésbicas, sua condição de gênero 6, sofreriam
elencados por Mott (1987). No caso preconceito triplicado por não
específico das mulheres, no entanto, corresponder à sua “determinação
pelas condições próprias do seu gênero comportamental socialmente
e histórico de submissão forçada ao estabelecida” e ainda por tentar
longo dos últimos milhares de anos, “disputar” o espaço historicamente
precisamos admitir que as situações reservado aos homens. (CZVZELKA,
enfrentadas por elas teriam que ser de 2013)
outra ordem. Ao se declararem ou se As consequências práticas
mostrarem gays, os indivíduos do sexo dessa visão distorcida e segmentária da
masculino, mais recentemente, sociedade em relação às mulheres gays
experimentavam e ainda experimentam não são, infelizmente, difíceis de
tratamento diferente daquele reservado localizar. Existiria uma “Falta de
às mulheres. Enquanto os homens acessibilidade da mulher lésbica nos
eram/são frequentemente espancados órgãos policiais e jurídicos”, nas
e/ou expulsos de casa, garantindo, no palavras de Marinalva Santa, presidente
entanto, seu direito à liberdade, às do Grupo Matizes, do Piauí. Para a
mulheres muitas vezes restavam os ativista, em discurso no Fórum
casamentos forçados, tão logo a Piauiense de Violência Doméstica e
tendência gay se manifestasse. Familiar Contra a Mulher, realizado em
Por outro lado, ainda no lastro junho de 2013 na sede da OAB/PI, as
da perspectiva machista e heterocêntrica políticas públicas de proteção à mulher
que perpassa todos os aspectos da nossa não contemplam as mulheres lésbicas.
sociedade, tivemos a “legítima defesa Para ela, os casos de violência, familiar
da honra” como argumento de defesa, ou não, física ou psicológica, além da
algumas vezes bem-sucedido, de discriminação no local de trabalho e
maridos assassinos. Os “estupros estupros corretivos, por exemplo, não
correcionais”, por outro lado, ainda são absorvidos pelas Delegacias da
muito comuns em todo mundo, Mulher que, despreparadas para lidar
sobretudo em toda a África do Sul5, são com essa situação, encaminham as
apenas alguns dos “corretivos” vítimas para a Delegacia de Direitos
aplicados especificamente contra as Humanos, o que dificultaria o
mulheres gays, baseados na crença de acompanhamento dos casos e os
que o lesbianismo se originaria, levantamentos de dados necessários à
naturalmente, da falta de contato criação de políticas públicas de apoio e
heterossexual experimentada pelas prevenção, além de causar claro
vítimas de violência. constrangimento à vítima.
Esses são apenas alguns A situação é ainda mais
exemplos que reforçariam um caráter complexa e assustadora quando se
cruel da violência contra as mulheres
lésbicas. Para Jane Czvzelka, em 6
Para Simone de Beauvoir, em sua obra clássica
5 “O Segundo Sexo”, “O mundo sempre
Fonte: pertenceu aos machos”.
http://paradalesbica.com.br/2011/01/estupro-
corretivo/
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analisa a questão do acesso lésbico ao Os gays masculinos são


sistema de saúde pública. Para Mérli discriminados, mas são
Leal Silva e Larissa Alves de Freitas visíveis. Na visibilidade a
Marques, ambas autoras de dois estudos luta e o enfrentamento
sobre este tema, não são poucas as são constantes e a
mortes causadas pela ignorância dos orientação sexual é
profissionais da saúde em lidar com a nítida, não ocultada. O
questão da homossexualidade feminina. sistema de saúde não
Os profissionais simplesmente supõem enxerga, a comunicação
a heterossexualidade da paciente, não divulga e a sociedade
demonstrando muitas vezes seu ignora. Os movimentos
desconforto diante de afirmações em sociais ligados à causa
sentido contrário. Muitas lésbicas são lésbica têm buscado
mal orientadas pelos profissionais ou construir uma agenda
simplesmente deixam de frequentar os política com a sociedade
consultórios em virtude de e os meios de
constrangimentos sofridos durante as comunicação, mas o
consultas. (SILVA, 2013). poder hegemônico da
Para MARQUES (2012), a heterossexualidade como
heteronormatividade, dominante nos princípio normativo da
currículos dos cursos da área de saúde e, orientação sexual das
por conseguinte, nos centros de mulheres tem dado
tratamento, limita a atuação dos trabalho para a militância
profissionais, que sequer conhecem as lésbica feminista. (Silva,
especificidades do sexo entre mulheres. 2014 S/P).
Não raro, as mulheres lésbicas são
levadas a se acreditar não expostas às A blogueira Núbia Carla que
doenças sexualmente transmissíveis, construiu um grande espaço digital no
não havendo campanhas de educação ou qual são debatidos muitos assuntos
políticas de aconselhamento em sentido atuais sobre o tema e muitas denúncias,
contrário. Por outro lado, os construiu uma espécie de página
preconceitos dos profissionais da saúde denúncia do que ela mesma descreve
muitas vezes levam as pacientes a como lesbofibia. Nessa página estão
abandonar tratamentos ou mesmo as contidos links que ligam os usuários até
consultas ginecológicas, que deveriam órgãos do judiciário responsáveis por
ser regulares. A Autora cita o caso de crimes contra violência, pois o que
uma paciente que, após observar várias esclarece para os usuários “a homofobia
mulheres serem examinadas às portas no Brasil não é crime, mas a violência
fechadas, teve sua consulta realizada sim” (Carla, 2015), e pode ser
com as portas abertas, após informar à denunciada e punida.
médica sua condição sexual.
Segundo Silva (2014), o Conclusão
problema da segregação e da Contudo a conclusão do trabalho de
invisibilidade social das lésbicas no SALA e GROSSI (2012) aponta para
sistema de saúde contrasta com a um redirecionamento dos discursos
visibilidade dos gays masculinos, muito discriminatórios em segmentos da
mais expostos e, por isso, melhor população nos quais são fomentadas
reconhecidos pelo sistema de saúde ações inovadoras e que pretendem ser
pública, principalmente após o advento construtoras de novas formas de
da AIDS. Para a autora, entender a homofobia de uma forma
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geral. Registra-se nos resultados obtidos LESBOFOBIA se configura como uma


por essas autoras novas formas de tentativa de jogar luz sobre essas
construção e desconstrução de conceitos questões específicas das mulheres
entre crianças e adolescentes, os quais homossexuais, assegurando-lhes voz e
são estimulados a elaborarem outras igualdade de direitos com os indivíduos
formas de pensar as relações de gênero heterossexuais. Novas políticas
em sociedade. Nas escolas participantes precisam ser desenvolvidas e
do estudo há um trabalho contínuo e implantadas junto aos sistemas político,
uma larga preocupação do combate ao judiciário, policial e de saúde, entre
preconceito e à segregação de qualquer outros, de modo a entender essas
forma. demandas e fazê-las efetivas. A
Segundo Graupe e Grossi (2013) o aceitação e o respeito ao diferente não
trabalho de pesquisa e extensão ao qual pode ser uma questão política deste ou
o concurso de cartazes, citado acima, daquele administrador, mas um fato
faz parte é o Núcleo de Identidades de consumado e irreversível. Certamente
Gênero e Subjetividades (NIGS), que as iniciativas como o Núcleo de
pertencente a Universidade Federal de Identidades de Gênero e Subjetividades
Santa Catarina (UFSC), cujas frentes (NIGS), são exemplos a serem seguidos
possuem como tema básico ações contra e em nossa sociedade, na tentativa de
a homo-lesbo-transfobia. Esse trabalho reversão deste problema que vem
certamente levanta reflexões sobre a atingindo cada vez maior segmento da
relevância do trabalho educativo e população brasileira.
preventivo realizado em instituições que
atendem crianças, visando assim a REFERÊNCIAS
reformulação dos discursos de ódio e Beauvoir, S. (1970). O Segundo Sexo.
violência existentes hoje entre os Difusão Europeia do Livro. São
segmentos mais jovens de nossa Paulo,1970.
população.
Embora ambos os termos Borrillo, D. (2009). A homofobia. In:
homofobia e lesbofobia tenham Lionço, T.; Diniz, T. (org) (2009).
conexões profundas e se refiram ao Homofobia e Educação: um desafio
medo e ataque ao desviante sexual, não ao silêncio. Brasília: Letras Livres :
restam dúvidas de que as mulheres EdUnB.
realmente carecem de uma atenção
especial voltada às suas necessidades e Brown, J.(1986). A lesbofobia através
condições específicas. Há problemas dos Tempos. Atitudes Para com o
vividos por elas, situações que só dizem Lesbianismo. Immodest Acts. Oxford
respeito a elas e esse fato precisa ser University Press, 1986. Tradução Maria
observado. Realmente, as batalhas Josefina S. In: Movimento LGBT do
vividas pelos homossexuais masculinos Estado do Amazonas. Disponível em:
junto à sociedade e aos órgãos públicos, http://lgbtamazonas.blogspot.com.br/20
colocaram-nos numa condição de 09/04/lesbofobia-atraves-dos-
protagonismo que, sem ignorar o seu tempos.html. Consulta em 07 set 2014.
merecimento, precisa ser relativizado, a
fim de abarcar outros indivíduos Czyzselska, J. (2014). Lesbophobia is
igualmente vítimas do heterocentrismo Homofobia With a Side-Order of
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há milhares de anos. Disponível em:
Mais do que uma questão de http://www.theguardian.com/commentis
vernáculo, o uso do termo free/2013/jul/09/lesbophobia-
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