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de Saúde Pública
Resumo
A precariedade de informaçôes sobre a demanda infantil em serviços de saúde
mental dificulta o conhecimento do perfil epidemiológico dos transtornos mentais infanto-juvenis,
presentes na rede pública de atenção, repercutindo sobre a organização do cuidado no âmbito
do SUS. O atual panorama de reorganização da assistência pública em saúde mental, onde se
inclui a tarefa de disponibilizar um cuidado adequado à população infanto-juvenil, exige
informações que auxiliem no diagnóstico de morbidade para o planejamento de serviços em
áreas definidas de assistência. Estudos epidemiológicos brasileiros têm revelado prevalência de
desordens psiquiátricas de 10% a 13%, no grupo etário entre 5 e 14 anos. Apresentamos dados
ambulatoriais e de internação hospitalar relativos à assistência ao sofrimento mental infanto-
juvenil no âmbito da atenção pública em Salvador, Bahia. Retardo Mental foi o diagnóstico mais
freqüente no ambulatório especializado e o segundo maior motivo de internação hospitalar.
Palavras-chave: saúde mental, epidemiologia, infância, adolescência.
Abstract
The scarcity of information concerning the needs of young people in mental health
services causes difficulties in establishing the epidemiological profile for mental health problems
a
Instituto de Saúde Coletiva UFBA - Rua Padre Feijó 29, 40 andar Canela Salvador Bahia, CEP 40110-170. Telefone (71) 332 5137 Fax
237 5856, e-mail darci@ufba.br
b
Aluna da Escola de Medicina e Saúde Pública - FDC Avenida Dom João VI , nº 275, Brotas, CEP 4029.000, Salvador, Bahia. Tel: (71)
356-1430 / 7471 / 1941. Fax: (71) 356-1936.
c
Hospital Especializado Mário Leal -Rua Conde de Porto Alegre no 27, IAPI. CEP 40330 200 TELFAX:71-334-1344.
d
Rua Padre Feijó, s/n, Ambulatório Magalhães Neto, 3º andar, Telefax: (71) 2474634, Canela, Salvador – Bahia, CEP 40110-170
Autor para correspondência
Darci Neves Santos bolsista da FAPESB
INTRODUÇÃO
A precariedade de informações sobre a demanda de crianças e adolescentes, em
serviços de saúde mental, dificulta o conhecimento do perfil epidemiológico dos transtornos
mentais infanto-juvenis presentes na rede pública de atenção, repercutindo sobre a organização
do cuidado no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). Chama atenção, em nosso meio, a
ausência de registros sobre a demanda infanto-juvenil em saúde mental assistida em serviços
ambulatoriais, espaço de atenção importante para este grupo etário. Já foram observados, desde
os anos 70, um desconhecimento da real extensão dos problemas emocionais da população
infanto-juvenil brasileira e a insuficiência de serviços gerais e especializados aptos para assistir a
essa clientela.1 Diante do panorama atual de reorganização da assistência em saúde mental pela
viabilização do SUS e dada a importância em disponibilizar um cuidado adequado à população
infanto-juvenil, é preciso informações que auxiliem no diagnóstico de morbidade para o
planejamento de serviços assistenciais em áreas definidas.
A morbidade psiquiátrica na infância e adolescência tem sido avaliada em países em
desenvolvimento, como Etiópia, Sudão e Índia, com taxas de prevalência variando entre 3% e
11%, enquanto as taxas de retardo mental oscilam entre 8 e 12 por mil crianças do grupo etário
entre três e dez anos.2 Observações realizadas na população assistida em Serviços de Assistência
Primária revelaram um percentual de 29% de crianças entre 5 e 14 anos demandando cuidados
em saúde mental.3 Poucos são os estudos epidemiológicos brasileiros de base comunitária sobre
problemas mentais infanto-juvenis. O primeiro detectou, nos anos 70, uma prevalência de 13%
para crianças de 5 a 14 anos no bairro do Maciel, em Salvador.4 Na década de 80, realizou-se
um inquérito epidemiológico em duas fases, estudando uma amostra representativa de 828
crianças do bairro de Amaralina, com aproximadamente 60.000 habitantes. Esse estudo revelou
uma prevalência de 10% de transtornos psiquiátricos na faixa etária entre 5 e 14 anos.5
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Revista Baiana Investigações realizadas no Sudeste do país encontraram taxas de prevalência em torno de 12 %
de Saúde Pública
para crianças de área urbana e rural, no grupo etário entre 7 e 14 anos, em Campos do Jordão.6
Considerando a escassez de informações sobre a ocorrência de transtornos mentais
infanto-juvenis no contexto brasileiro e a importância de dados que possam subsidiar a
implementação e desenvolvimento de serviços em Psiquiatria da Infância e Adolescência,
procura-se, com este trabalho, apresentar dados secundários relativos à assistência ao sofrimento
mental infanto-juvenil, em equipamentos institucionais de atenção pública no município de
Salvador, visando uma contribuição de base epidemiológica para a reflexão sobre a organização e
implementação de ações de tratamento e promoção em saúde mental de crianças e adolescentes,
no Sistema Único de Saúde.
MATERIAL E MÉTODOS
Levantamento Ambulatorial
Realizou-se um levantamento diagnóstico da demanda infanto-juvenil assistida no
Ambulatório de Saúde Mental Mário Leal, em Salvador-Bahia, em junho de 2003, examinando-se
274 prontuários médicos de indivíduos menores de 19 anos, atendidos no primeiro trimestre de
2002. Extraiu-se informação sobre: idade, sexo, diagnóstico pela CID10, profissional que realizou
o atendimento e data do diagnóstico.
Levantamento hospitalar
Foram coletados dados sobre o atendimento infanto-juvenil por serviços
hospitalares de saúde mental no município de Salvador, no ano de 2000. Esses dados foram
obtidos através do Sistema de Informações Hospitalares do Sistema Único de Saúde (SIH-SUS), a
partir das autorizações de internações hospitalares (AIH). As informações obtidas compuseram um
banco de dados do Microsoft Excel.
RESULTADOS
Do Levantamento Ambulatorial - Dos 274 prontuários examinados 68% foram de
sujeitos do sexo masculino com predomínio da faixa etária entre 15 e 19 anos. Apenas 1,4% dos
diagnósticos foram realizados em crianças menores de 5 anos (Tabela 1). Encontrou-se como
diagnóstico mais freqüente o retardo mental, com um percentual de 42% (Tabela 2). Seguiram-se
os transtornos emocionais e comportamentais, com início na infância ou adolescência, presentes
em 22,6% do conjunto de diagnósticos. O terceiro grupo de diagnósticos diz respeito aos
transtornos invasivos do desenvolvimento atingindo 9,8%, dentre os quais 12 registros (44,4%)
para autismo infantil, sendo que apenas dois indivíduos receberam o diagnóstico de autismo antes
TABELA 2. Diagnósticos registrados segundo sexo e categoria da CID 10, no primeiro trimestre de 2002, pelo Ambu-
latório Mário Leal, Salvador BA.
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Revista Baiana TABELA 3. Diagnósticos de internação psiquiátrica registrados pelo DATASUS, segundo idade e categoria da CID 10,
de Saúde Pública para o município de Salvador, no ano de 2002
DISCUSSÃO
Os dados de internação hospitalar demonstram que as psicopatologias da infância e
adolescência são diagnosticadas a partir dos 10 anos de idade, predominando o diagnostico de
esquizofrenia e seus correlatos, com 70,2%. Retardo mental tem presença importante nesse
espaço de assistência, seguido de alterações de humor e transtornos pelo uso de álcool e outras
substâncias psicoativas. No nível ambulatorial o retardo mental constituiu a maior demanda por
serviço especializado, seguido dos transtornos emocionais e comportamentais e dos transtornos
invasivos do desenvolvimento. Em uma posição intermediária, ficaram os transtornos psicóticos e
neuróticos relacionados a condição de stress
O diagnostico de retardo mental ao distinguir-se, numericamente, entre os demais,
permite pensar na possibilidade de que os sujeitos assim diagnosticados pudessem também
apresentar patologias em Eixo I, as quais, eventualmente, não foram observadas. Por outro lado, a
freqüência elevada desses diagnósticos em um serviço de natureza ambulatorial remete à
indagação sobre os motivos de consulta neste nível de atenção, já que somente as alterações de
comportamento justificariam tratamento em serviço especializado de saúde mental. Embora a
alteração de conduta seja freqüente entre pacientes com retardo mental, acredita-se que seja
parte da própria dificuldade de adaptação inerente a este quadro, que se agrava por dificuldades
ambientais as quais poderiam ser controladas a partir dos processos educacional e de habilitação,
responsáveis pela integração social desses pacientes. Desta forma, fica claro a importância dos
processos de habilitação como definidores dos serviços básicos destinados ao atendimento dessa
população. 7
No que diz respeito aos 22 % de diagnósticos relativos a transtornos emocionais e
comportamentais, trata-se de um percentual esperado, já que incluem categorias que vão desde
transtornos de déficit de atenção e hiperatividade até transtornos de conduta. A literatura assinala
40
Revista Baiana dos CAPES infantis, e a escassez de estudos epidemiológicos abordando o atendimento
de Saúde Pública
psicológico em instituições públicas. Observe-se que, se os diagnósticos corresponderem
corretamente à condição clínica detectada, é preciso refletir sobre a fragilidade da estrutura
pública de recursos para o adequado seguimento da criança com suspeita de transtorno invasivo
do desenvolvimento, considerando-se, ainda, que tais achados possam indicar a dificuldade de se
estabelecer um diagnóstico definitivo em faixas etárias menores. Distorções de encaminhamento
são geralmente observadas, na medida em que o abuso de substância psicoativa não se faz
presente nos diagnósticos ambulatoriais, sendo restrito ao tratamento hospitalar. Neste sentido,
observe-se, também, a freqüência elevada de retardo mental ocupando espaços de tratamento
tanto ambulatorial quanto hospitalar, quando, na verdade, poderia beneficiar-se de programas
educacionais integrados à comunidade.
AGRADECIMENTOS
Dra. Iná Maria Santos, Diretora do Hospital Especializado Mário Leal, pela
colaboração para obtenção dos dados ambulatoriais deste estudo. Estatística Eva Costa, pela
colaboração no manejo do banco DATASUS. Dr. Celso Vilas Boas pela discussão inicial sobre
autismo infantil.
REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS
8. Bordin AI. Aspectos Gerais de Psiquiatria Infantil. In: Almeida PO, Dratcu L,
Laranjeira R, Manual de Psiquiatria, 1a ed Rio de Janeiro: Ed. Guanabara Koogan;
1996. p 250-64
10. Goodman R; Scott S. Epidemiology IN: Child Psychiatry 2a ed. Reino Unido
Blackwell Science Ltd 1998 pg 30-38
11. Goodman R; Scott S. Autistic Disorders IN: Child Psychiatry 2a ed. Reino Unido
Blackwell Science Ltd 1998 pg 41-49
Recebido em 11/11/2004
Aceito em 10/02/2005
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