Você está na página 1de 23

1

DEPARTAMENTO DE FÍSICA DA UNIVERSIDADE DE COIMBRA

Propagadores
Maria da Conceição Ruivo

Conteúdo
1 O operador evolução temporal 2
1.1 O operador evolução temporal - definição e propriedades . . . . . . . 2
1.2 Determinação do operador evolução temporal . . . . . . . . . . . . . 2
1.2.1 Operadores nas representações de Schrödinger e de Heisenberg 2
1.2.2 O operador evolução temporal com H independente do tempo 3
1.2.3 O operador evolução temporal com H dependente do tempo . 4

2 Propagadores 7
2.1 Funções de Green . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 7
2.2 O propagador não relativista . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 8
2.3 O propagador não relativista da partı́cula livre . . . . . . . . . . . . . 9
2.4 O propagador da equação de Klein-Gordon . . . . . . . . . . . . . . . 10
2.5 O propagador da equação de Dirac . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 12
2.6 O propagador do fotão . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 12
2.7 Nova definição do propagador de Feynman . . . . . . . . . . . . . . . 14

3 A matriz S 17
3.1 O operador evolução temporal e a matriz S . . . . . . . . . . . . . . . 17
3.2 O Teorema de Wick . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 17
3.3 Exemplo de aplicação das regras de Feynman em QED . . . . . . . . 19
3.3.1 Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 19
3.3.2 O scattering: e− + µ− → e− + µ− . . . . . . . . . . . . . . . . 20
2

1 O operador evolução temporal


1.1 O operador evolução temporal - definição e propriedades
Um problema central em Mecânica Quântica é o da evolução temporal de um sis-
tema: conhecido o estado de um sistema num instante remoto, e o hamiltoniano que
governa a sua dinâmica, precisamos de saber em que estado se encontra o sistema
num instante futuro. Um instrumento útil para tratar esta questão é o operador
evolução temporal, que passamos a definir.
Adimitindo que no instante t0 o sistema está num estado |α, t0 > e que no
instante t > t0 está num estado |α, t >, vamos definir o operador que faz a translação
no tempo, isto é, o operador evolução temporal, U(t, t0 ), tal que:

|α, t >= U(t, t0 ) |α, t0 >, (1)

uma vez que o tempo é um parâmetro contı́nuo, tem que verificar-se:

limt→t0 |α, t >= |α, t0 > ⇒ U(t0 , t0 ) = 1. (2)

O operador U(t, t0 ) deve obedecer às seguintes propriedades:

(i) Unitaridade: esta propriedade resulta do requisito de conservação da norma:

< α, t|α, t >=< α, t0 |U + (t, t0 ) U(t, t0 )|α, t0 >


=< α, t0 |α, t0 > ⇒ U + (t, t0 )U(t, t0 ) = 1. (3)

(ii) Composição: esta propriedade provém do requisito de a translação temporal


de um sistema, de um instante t0 para um instante t2 , poder resultar da
translação: t0 → t1 → t2 , com t2 > t1 > t0 , isto é:

U(t2 , t0 ) = U(t2 , t1 ) U(t1 , t0 ). (4)

1.2 Determinação do operador evolução temporal


1.2.1 Operadores nas representações de Schrödinger e de Heisenberg

Na representação de Schrödinger a dependência temporal está nos kets de estado e


os operadores são fixos num instante t = t0 e não variam com o tempo; ao contrário,
na representação de Heisenberg a evolução temporal está nos operadores, enquanto
3

os kets de estado não variam com o tempo. Naturalmente, o valor expectável de um


operador é independente da representação, isto é:

< α, t|Q(t0 )|α, t >S =< α, t0 |Q(t)|α, t0 >H , (5)

de onde resulta:
Q(t) = U −1 (t, t0 )Q(t0 )U(t, t0 ), (6)

sendo que Q(t) obedece à equação de movimento de Heisenberg:

∂Q(t)
= i[H, Q(t)], (7)
∂t
onde H é o operador hamiltoniano.

1.2.2 O operador evolução temporal com H independente do tempo

Utilizando as duas equações anteriores (6,7) podemos escrever:

∂ −1
(U (t, t0 )Q(t0 )U(t, t0 )) = i(HU −1 (t, t0 )Q(t0 )U(t, t0 ) − U −1 (t, t0 )Q(t0 )U(t, t0 )H).
∂t
(8)
−1
Multiplicando a equação, à esquerda por U e à direita por U , (para simplificar a
notação vamos deixar de explicitar a dependência temporal), obtemos:

∂U −1 ∂U
U Q(t0 ) + Q(t0 ) U −1
∂t ∂t
= i(UHU Q(t0 ) − Q(t0 )UHU −1 ).
−1
(9)

Se H não depende explicitamente do tempo:

UHU −1 = H. (10)

Por outro lado:


∂ −1 ∂U −1 ∂U
(U U) = U + U −1 =0
∂t ∂t ∂t
∂U −1 ∂U
⇒ U = −U −1 . (11)
∂t ∂t
Usando as equações(10, 11) em (9), obtemos:

∂U −1
[Q(t0 ), U ] = i[H, Q(t0 )], (12)
∂t
4

de onde resulta:
∂U −1
[Q(t0 ), (
U + iH)] = 0. (13)
∂t
Para que esta igualdade seja satisfeita, o segundo operador (entre parentesı́s) no
comutador anterior tem que ser constante, de acordo com o lema de Schür, isto é:
∂U −1
i U = H − E0 , (14)
∂t
sendo E0 uma constante arbitrária. Fazendo E0 = 0, temos uma equação de
Schrödinger para o operador evolução temporal:
∂U
i = HU. (15)
∂t
Integrando esta equação e impondo a condição de que a constante de integração
garanta que U(t0 , t0 ) = 1, obtemos de imediato a expressão do operador evolução
temporal:
U(t, t0 ) = e−iH(t−t0 ) . (16)

1.2.3 O operador evolução temporal com H dependente do tempo

Um dos problemas mais comuns que temos que resolver em Mecâncica Quântica
é o cálculo da probabilidade de transição de um sistema, inicialmente num estado
próprio, |i >, de um hamiltoniano que não depende do tempo, para outro estado
próprio, |f >, desse hamiltoniano, após a actuação de um potencial externo depen-
dente do tempo. Para calcular o operador evolução temporal nestas circunstâncias,
vamos recorrer à hipótese usual de Teoria de Perturbações dependentes do tempo,
isto é, admitir que o hamiltoniano H(t) se pode decompor em duas partes:

H(t) = H0 + HI (t) (17)


com H(t) = H0 para t < t0

Vamos agora definir o operador evolução temporal como o produto de dois oper-
adores:
Ut (t, t0 ) = U0 (t, t0 ) UI (t, t0 ), (18)

sendo U0 (t, t0 ) = e−iH0 (t−t0 ) . Pode verificar-se que todos os operadores na expressão
anterior são unitários, mas apenas Ut e U0 têm a propriedade de composição.
5

Os resultados da actuação dos operadores Ut (t, t0 ) e U0 (t, t0 ) no operador Q(t0 )


serão os seguintes:

Q(t) = Ut−1 (t, t0 )Q(t0 ) Ut (t, t0 ) (19)


Q0 (t) = U0−1 (t, t0 )Q(t0 ) U0 (t, t0 ), (20)

com Q(t) 6= Q0 (t). Isto é, Q0 (t) contém a dependência temporal associada à evolução
dos factores de fase, devida a H0 , enquanto Q(t) contém, para além desta de-
pendência temporal, a que é devida à actuação do potencial externo, com é manifesto
na seguinte expressão:

Q(t) = UI−1 (t, t0 ) U0−1 (t, t0 ) Q(t0 ) U0 (t, t0 ) UI (t, t0 ), (21)


| {z }
Q0 (t)

Obtemos, assim, as seguintes relações:

Q(t) = UI−1 (t, t0 ) Q0 (t) UI (t, t0 ) (22)


Q0 (t) = UI (t, t0 ) Q(t) UI−1 (t, t0 ). (23)

Os operadores Q(t), Q0 (t) obedecem também às seguintes equações de Heisenberg:

∂Q(t)
= i[H, Q(t)] (24)
∂t
∂Q0 (t)
= i[H0 , Q0 (t)]. (25)
∂t
Com vista a obter a forma do operador evolução temporal, vamos trabalhar o
primeiro membro da última equação:

∂Q0 (t) ∂(UI Q(t)UI−1 ) ∂UI −1 ∂Q(t) −1 ∂UI−1


= = Q(t)UI + UI UI + UI Q(t) . (26)
∂t ∂t ∂t ∂t ∂t
Fazendo uso da identidade UI−1 UI = 1 e de ∂
∂t
(UI −1 UI ) = 0, teremos:

∂Q0 (t) ∂UI −1 ∂Q(t) −1 ∂U −1


= UI UI Q(t)UI−1 + UI UI + UI Q(t)UI−1 UI I
∂t ∂t ∂t ∂t
∂UI −1 ∂UI −1 ∂Q(t) −1
= U Q0 (t) − Q0 (t) U + UI UI
∂t I ∂t I ∂t
∂UI −1
= [ U , Q0 (t)] + i UI [H, Q(t)] UI−1 .
∂t I
∂Q0 (t)
Substituindo ∂t
na equação (25) e fazendo um pouco de álgebra, teremos:
6

∂UI −1
[H0 , Q0 (t)] = −i[ UI , Q0 (t)] + UI [H, Q(t)] UI−1
∂t
∂UI −1
⇒ [(H0 + i U ), Q0 (t)] = [H0 , Q0 (t)] + [(UI HI (t)UI−1 ), Q0 (t)] . (27)
∂t I
Vejamos agora o que representa UI HI (t)UI−1 . Uma vez que estamos a usar a rep-
resentação de Heisenberg, HI (t) depende do tempo através dos operadores que o
constituem, que designaremos por φ(t), pelo que HI (t) = HI [φ(t)]. Fazendo uma
expansão de HI [φ(t)] em φ(t), teremos:

UI HI (t)UI−1 = HI [UI φ(t)UI−1 ] = HI [φ0 (t)]. (28)

O hamiltoniano da interação fica então expresso em função dos operadores sujeitos


à evolução temporal dada pelo hamiltoniano H0 . Finalmente:
∂UI −1
[(i U − HI ), Q0 (t)] = 0, (29)
∂t I
vindo finalmente:
∂UI
i
= (HI − E0 )UI , (30)
∂t
sendo E0 um número complexo que pode depender do tempo.
Obtivémos, pois, novamente uma equação de Schrödinger para o evolução tem-
poral, sendo que desta vez o hamiltoniano depende do tempo. Integrando a equação
anterior (por uma questão de simplicidade vamos fazer E0 = 0) obtemos a seguinte
equação geral: Z t
UI (t, t0 ) = 1 − i dt′ HI (t′ )UI (t′ , t0 ) (31)
t0
Esta equação pode ser resolvida iteractivamente:

Z t Z t Z t1
2
UI (t, t0 ) = 1 + (−i) dt1 HI (t1 ) + (−i) dt1 dt2 HI (t1 ) HI (t2 ) + .... (32)
t0 t0 t0

Esta é a chamada expansão em série de Dyson. Se os hamiltonianos, em instantes


sussessivos, comutarem entre si, esta expressão reduz-se a:
Rt
−i dt′ HI (t′ )
UI (t, t0 ) = e t0
. (33)

Para o caso geral, podemos ainda escrever o operador evolução temporal numa
forma compacta recorrendo à definição de produto ordenado no tempo. O produto
ordenado no tempo de dois operadores define-se como:

T (Q(t1 )Q(t2 )) = Q(t1 )Q(t2 )θ(t1 − t2 ) + Q(t2 )Q(t1 )θ(t2 − t1 ). (34)


7

Podemos então reescrever a equação (32) como:


Z Z Z
t 1 t t
UI (t, t0 ) = 1 + (−i) dt1 HI (t1 ) + (−i)2 dt1 dt2 T (HI (t1 ) HI (t2 )) + .... (35)
t0 2 t0 t0

ou, equivalentemente: Rt
−i dt′ HI (t′ )
UI (t, t0 ) = T (e t0
). (36)

2 Propagadores
2.1 Funções de Green
O estudo da evolução temporal de um sistema e o cálculo dos observáveis relevantes
pode ser feito recorrendo à teoria dos propagadores. Como veremos, o propagador
em Mecânica Quântica define-se como um elemento de matriz do operador evolução
temporal entre dois estados do sistema, mas a teoria é conceptualmente baseada no
método das funções de Green para resolver equações diferenciais não homogéneas.
A fim de ilustrar os conceitos básicos, vamos recordar o exemplo da resolução da
equação de Poisson.
∇2 φ(~x) = −ρ(~x), (37)

onde φ(~x) é o potencial devido a uma distribuição de cargas ρ(~x) sujeita a condições
de fronteira. Podemos resolver o problema para uma fonte unitária:

∇2x G(~x, ~x′ ) = −δ 3 (~x − ~x′ ), (38)

sendo G(~x, ~x′ ) o potencial em ~x produzido por uma fonte unitária em ~x′ . Multipli-
cando ambos os membros da equação por ρ(x′ ) e integrando em x′ a todo o volume
V em que se encontra distribuı́da a carga, obtemos:
Z Z
∇2x G(~x, ~x′ ) ρ(x′ )d3 x′ =− δ 3 (~x − ~x′ )ρ(x′ )d3 x′
V V
Z Z
−→ ∇2x ′ ′ 3 ′
G(~x, ~x ) ρ(x )d x = − δ 3 (~x − ~x′ )ρ(x′ )d3 x′ = − ρ(x) (39)
V V

O potencial em ~x devido à distribuição de carga ρ(~x) num volume V será:


Z
φ(~x) = G(~x, ~x′ )ρ(~x′ )d3 x′ . (40)
V
8

2.2 O propagador não relativista


Em Mecânica Quântica define-se o propagador como:

K(~x, t; ~x′ , t′ ) =< ~x|U(t, t′ )|~x > (41)

onde U(t, t′ ) é o operador evolução temporal. A função de onda num instante


genérico t pode ser conhecida a partir da função de onda num instante t′ , desde
que se conheça o propagador, isto é, ψ(~x, t) pode exprimir-se como:
Z
ψ(~x, t) = d3 x′ K(~x, t; ~x′ , t′ ) ψ(~x′ , t′ ). (42)

O propagador obedece às seguintes propriedades:


Z
K(~x, t; ~x′ , t′ ) = d3 x′′ K(~x, t; ~x′′ , t′′ ) K(~x′′ , t′′ ; ~x′ , t′ ) (43)
K(~x, t; ~x′ , t′ ) = 0 para t < t′ (44)
limt′ →t K(~x, t; ~x′ , t′ ) = δ 3 (~x − ~x′ ) (45)

Podemos verificar que o propagador obedece à equação de Schrödinger. De facto,


substituindo ψ(~x, t) pela expressão (42) na equação de Schrödinger, temos:

Z Z

Hx d3 x′ K(~x, t; ~x′ , t′ ) ψ(~x′ , t′ ) − i d3 x′ K(~x, t; ~x′ , t′ ) ψ(~x′ , t′ ) = 0
∂t !
Z

= d3 x′ Hx − i K(~x, t; ~x′ , t′ ) ψ(~x′ , t′ ) = 0
∂t
!

=⇒ Hx − i K(~x, t; ~x′ , t′ ) = 0 (46)
∂t
Atendendo à propriedade (44), a equação anterior pode ser escrita na forma:
!

Hx − i K(~x, t; ~x′ , t′ )θ(t − t′ ) = 0 (47)
∂t
Atendendo a que ∂θ(t − t′ )/∂t = δ(t − t′ ) e à propriedade (45), obtemos finalmente
uma equação que mostra que o propagador é a função de Green da equação
de Schrödinger:
!

Hx − i K(~x, t; ~x′ , t′ ) = −iδ 3 (~x − ~x′ ) δ(t − t′ ) para t > t′ . (48)
∂t
Em geral, define-se a função de Green como:

G(x, x′ ) = iK(x, x′ ) (49)

onde usamos a notação dos tetravectores.


9

2.3 O propagador não relativista da partı́cula livre


Vamos calcular o propagador para o caso simples de um sistema unidimensional. O
propagador neste caso é:
i
K(x, t; x′ , t0 ) =< x|e− h̄ H(t−to ) )|x′ > . (50)

Usando agora a relação de plenitude:


Z Z Z
′ ′ ′ ′ − h̄i H(t−t0 )
K(x, t; x , t0 ) = < x| dp |p >< p | e dp|p >< p|x′ >
Z Z 2
i p
= dp ′
dp < x|p′ >< p′ |e− h̄ 2m (t−t0 ) |p >< p|x′ >
Z 2
i p
= dp < x|p >< p|x′ > e− h̄ 2m (t−t0 ) . (51)

i i
√ 1 e h̄ px , √ 1 e− h̄ px ,

Atendendo a que < x|p >= 2πh̄
< p|x′ >= 2πh̄
e fazendo t − t0 = ∆t,
teremos:

Z
1 i ′ ip2
K(x, t; x′ , t0 ) = dpe h̄ p(x−x ) e− 2mh̄ ∆t
2πh̄ Z
m2 (x−x′ )2 m2 (x−x′ )2
1 i∆t
− 2mh̄ m
(p2 +2p(x−x′ ) ∆t + − )
= dpe (∆t) 2 (∆t)2
2πh̄ Z
1 i m(x−x′ )2 ∆t x−x′ 2
= e 2∆th̄ dpe−i 2mh̄ (p+ m∆t )
2πh̄ |
√ {z2πmh̄
}
i∆t
r
m m(x−x′ )2
= ei 2h̄∆t . (52)
2πih̄∆t
O propagador no espaço dos momentos, é, por definição:
i
K(p, t; p′ , t0 ) =< p|e− h̄ H(t−to ) )|p′ >, (53)

que se calcula facilmente, quer a partir da definição, quer fazendo a transformada


de Fourier de K(x, t; x′ , t0 ), vindo:
2
i p
K(p, t; p′ , t0 ) = e− h̄ 2m ∆t δ(p − p′ ). (54)
10

2.4 O propagador da equação de Klein-Gordon


Vamos calcular apenas o propagador da partı́cula livre. Em Mecânica Quântica
Relativista, sabemos que temos soluções de energia negativa e de energia positiva,
sendo, pois, de esperar que o propagador nos permita interpretar estas soluções em
termos de partı́culas e anti-partı́culas.
Tendo em conta o resultado a que chegámos em 2.2 (48) é natural começar
por definir o propagador como a função de Green respeitante a uma dada equação
diferencial. Assim, por definição, o propagador de partı́cula livre da EKG, △F (x−x′ )
(propagador de Feynman), obedece à equação:
!
∂ ∂
µ
+ m2 △F (x − x′ ) = −iδ 4 (x − x′ ) (55)
∂x ∂xµ

O sinal − é uma questão de convenção e estamos a usar o sistema natural de unidades


(h̄ = c = 1). Com vista a encontrar a forma de △F (x − x′ ), vamos escrever a sua
transformada de Fourier e obter a forma do propagador no espaço dos momentos,
△˜F (p):

Z
d4 p −ip(x−x′ ) ˜
△F (x − x ) = e △F (p) (56)
(2π)4
Substituindo na equação (13), teremos:
!
d4 p
Z
∂ ∂
+ m2 e−ip(x−x ) △˜F (p) = −iδ 4 (x − x′ )

(2π) 4 µ
∂x ∂xµ
4
d4 p −ip(x−x′ )
Z Z
dp  2 2

−ip(x−x′ ) ˜
=⇒ p − m e △ F (p) = i e
(2π)4 (2π)4
i
=⇒ △˜F (p) = 2 . (57)
p − m2
Por conseguinte, o propagador no espaço das configurações é da forma:

d4 p e−ip(x−x )
Z

△F (x − x ) = i . (58)
(2π)4 p20 − E 2

O propagador representa um partı́cula virtual, isto é, fora da camada de massa,


por conseguinte p0 e E são tratados como variáveis independentes. O propagador
tem uma singularidade quando p2 − m2 = 0 ⇐⇒ p20 − E 2 = 0, isto é para p0 =

± p~2 + m2 . Há um pólo para p0 = E, correspondente a soluções com energia posi-
tiva, e outro para p0 = −E, respeitante a soluções com energia negativa. Podemos
calcular △F (x − x′ ), fazendo a integração de Cauchy no plano complexo:
11


d3 p i~p(~x−~x′ ) dp0 i e−ip0 (t−t )
Z Z
′ i
△F (x − x ) = e −
2E (2π)3 2π p0 − E + iǫ

d3 p i~p(~x−~x′ ) dp0 i e−ip0 (t−t )
Z Z
i
− e (59)
2E (2π)3 2π p0 + E − iǫ

I [p 0 ]

- E + i ε-

E-iε

Figura 1: Contornos de integração do integral do propagador de KG

Usando o teorema dos resı́duos, e atendendo a que os dois contornos indicados


na figura têm sentidos contrários, facilmente concluı́mos que:


dp0 e−ip0 (t−t )
Z
i ′ ′
i = (−2πi) e−iE(t−t ) θ(t − t′ ) = e−iE(t−t ) θ(t − t′ )
2π p0 − E + iǫ 2π
Z −ip0 (t−t′ )
dp0 e i ′ ′
−i = −(2πi) eiE(t−t ) θ(t′ − t) = eiE(t−t ) θ(t′ − t) (60)
2π p0 + E − iǫ 2π
Note-se que a solução com energia positiva propaga-se para a frente no tempo,
só é diferente de zero para t > t′ ; o inverso é verdadeiro para a solução com energia
negativa. As funções θ na expressão anterior exprimem este conceito. Podemos
escrever a expressão para o propagador no espaço das configurações como:

d3 p
Z
′ ′
△F (x − x ) =′
3
ei~p(~x−~x ) e−iE(t−t ) θ(t − t′ ) +
(2π) 2E
Z
d3 p ′ ′
+ 3
e−i~p(~x−~x ) eiE(t−t ) θ(t′ − t), (61)
(2π) 2E
12

onde a primeira parcela representa o propagador de partı́culas e a segunda o propa-


gador de anti-partı́culas.

2.5 O propagador da equação de Dirac


O cálculo do propagador da partı́cula livre da equação de Dirac faz-se de modo
semelhante ao da equação de Klein-Gordon. Por definição, este propagador, que
designamos por SF (x − x′ ), obedece à equação:

(6 p − m)SF (x − x′ ) = i δ 4 (x − x′ ). (62)

O propagador no espaço das configurações pode exprimir-se em função do propa-


gador no espaço dos momentos, usando a transformada de Fourier:

d4 p −ip(x−x′ ) ˜
Z
SF (x − x′ ) = e SF (p), (63)
(2π)4

de onde resulta:
i i 6p+m
S˜F (p) = = 2 para p2 6= m2 . (64)
6p−m p − m2
Tal como no caso do propagador da equação de Klein-Gordon, este propagador tem
dois pólos, para p0 = ±E. Fazendo a integração no plano complexo, tal como no
caso anterior, e fazendo uso dos projectores de energia positiva e negativa, λ± (p),
obtemos a seguinte expressão:

d3 p m
Z
′ ′

SF (x − x ) = 3
λ+ (p) ei~p(~x−~x ) e−iE(t−t ) θ(t − t′ ) +
(2π) E
d3 p m
Z
′ ′
+ 3
λ− (p) ei~p(~x −~x) e−iE(t −t) θ(t′ − t), (65)
(2π) E

onde:
±6p+m
λ± (p) = . (66)
2m

2.6 O propagador do fotão


As equações de Maxwell na forma covariante escrevem-se:

F µν = ∂ µ Aν − ∂ ν Aµ (67)
∂µ F µν = j ν (68)
13

A última equação pode escrever-se na forma:

∂ µ ∂µ Aν − ∂ ν (∂µ Aµ ) = j ν (69)

Na ausência de fontes, e se usarmos a condição de Lorentz, (∂µ Aµ = 0), a equação


anterior reduz-se a:
∂ µ ∂µ Aν = 0. (70)

Esta equação apresenta semelhanças óbvias com a equação de Klein-Gordon para a


partı́cula livre, com a diferença de que em vez de uma partı́cula escalar de massa m,
temos uma ”partı́cula”vectorial de massa nula. Procedendo por analogia, podemos
escrever a seguinte equação para o propagador do fotão livre:

∂ α ∂α DFµν (x − x′ ) = ig µν δ 4 (x − x′ ), (71)

de onde resultam as seguintes expressões para o propagador, respectivamente no


espaço dos momentos e no espaço das configurações:
g µν
DFµν (p) = −i (72)
p2

d4 p e−ip(x−x )
Z
DFµν (x ′
− x ) = −ig µν
(73)
(2π)4 p20 − E 2

Tal como no caso da EKG, este propagador tem uma singularidade para P0 =
E = |~p|, vamos pois proceder à integração no plano complexo, vindo:
′ !
d3 p i~p(~x−~x′ ) dp0 i e−ip0 (t−t )
Z Z
1
DFµν (x ′
− x ) = −ig µν
e −
2E (2π)3 2π p0 − E + iǫ
′ !
d3 p i~p(~x−~x′ ) dp0 i e−ip0 (t−t )
Z Z
µν 1
+ig e (74)
2E (2π)3 2π p0 + E − iǫ

Finalmente, após a integração no plano complexo, obtem-se a seguinte expressão


para o propagador no espaço das configurações:
Z
d3 p  −ip(x−x′ ) 
DFµν (x − x′ ) = −g µν e θ(t − t′
) + e−ip(x′ −x)
θ(t′
− t) (75)
(2π)3 2E

Note-se que, uma vez que na teoria do campo electromagnético existe a liberdade
na escolha da ”‘gauge”, a expressão do propagador depende da gauge escolhida.
A gauge que estivémos a usar pertence à classe da ”gauge”’ de Lorentz e por isso
mantém a covariância da teoria, mas não é a mais geral. A escolha da chamada
14

”gauge”’ arbitrária ou de métrica indefinida, implica que a equação 68 se escreva na


forma:
1
∂ µ ∂µ Aν − (1 − )∂ ν (∂µ Aµ ) = j ν , (76)
ξ
onde ξ é um parâmetro. O propagador no espaço dos momentos vem, então, da
forma: !
µν 1 µν pµ pν
DF (p) = −i 2 g − (1 − ξ) 2 . (77)
p p
Para ξ = 1, temos a ”gauge”de Feynman (que temos vindo a usar); para ξ = 0,
temos a ”gauge”de Landau.

2.7 Nova definição do propagador de Feynman


No âmbito da Teoria Quântica de Campos, o propagador é usualmente definido
como o valor expectável no vácuo de um produto de campos ordenado no tempo.
Podemos verificar que esta definição conduz aos mesmos resultados que os obtidos
partindo da definição usada nas secções anteriores.

– Propagador de bosões: Consideremos o caso simples de um campo escalar


neutro:

△F (x − x′ ) = < 0|T (φ(x) φ(x′))|0 >=


=< 0|(φ(x) φ(x′))|0 > θ(t − t′ )+ < 0|(φ(x′ ) φ(x))|0 > θ(t′ − t) (78)

Expandindo os campos em função dos operadores de criação e destruição, podemos


verificar que apenas contribuem para o valor expectável no vácuo os termos em
ap a†p ′ , pelo que, usando o limite do contı́nuo:
Z
X 1 1
√ −→ d3 p q ,
p
~ 2EL3 2E(2π)3

obtemos a seguinte expressão, idêntica à expressão (61):


d3 p
Z
′ ′

△F (x − x ) = 3
ei~p(~x−~x ) e−iE(t−t ) θ(t − t′ ) +
(2π) 2E
d3 p
Z
′ ′
+ 3
e−i~p(~x−~x ) eiE(t−t ) θ(t′ − t) (79)
(2π) 2E
Esta expressão pode escrever-se de forma mais compacta:


Z
d3 p h −ip(x−x′) ′ −ip(x′ −x) ′
i
△F (x − x ) = e θ(t − t ) + e θ(t − t) (80)
(2π)3 2E
15

Tendo em conta as expressões (60), podemos escrever:

d4 p
Z
i ′
< 0|T (φ(x) φ(x′))|0 >= 4 2 2
e−ip(x−x ) (81)
(2π) p − m
O propagador de um campo escalar com carga define-se como:

△F (x − x′ ) = < 0|T (φ(x) φ†(x′ ))|0 >, (82)

e calcula-se de modo semelhante ao anterior.

– Propagador de fermiões: Para o caso de um campo de Dirac, o propagador


define-se como:

SF (x − x′ ) = < 0|T (ψ(x) ψ̄(x′ ))|0 >=


=< 0|(ψ(x) ψ̄(x′ ))|0 > θ(t − t′ )− < 0|(ψ̄(x′ ) ψ(x))|0 > θ(t′ − t). (83)

Note-se que, uma vez que se trata de campos de fermiões, ao trocar a ordem dos op-
eradores de campo temos que trocar o sinal. Conclui-se facilmente que o propagador
é da forma:
d3 p X
Z


SF (x − x ) = 3
u(~p, s)ū(~p, s)e−ip(x−x ) θ(t − t′ ) +
(2π) 2E s
Z
d3 p X ′
− 3
v(~p, s)v̄(~p, s)e−ip(x −x) θ(t′ − t) (84)
(2π) 2E s

Usando as identidades:
X
u(~p, s)ū(~p, s) = 2mΛ+ (p)
s
X
− v(~p, s)v̄(~p, s) = 2mΛ− (p), (85)
s

p+m
onde Λ± = ±62m é o projector de energia positiva (negativa), a expressão do propa-
gador pode escrever-se:

d3 p m
Z


SF (x − x ) = 3
Λ+ (p)e−ip(x−x ) θ(t − t′ ) +
(2π) E
d3 p m
Z

+ 3
Λ− (p)eip(x−x ) θ(t′ − t). (86)
(2π) E
Para reproduzir a expressão do propagador no espaço dos momentos, vamos fazer a
troca: p~ → −~p no segundo integral, o que dá:
16


d3 p ei~p(~x−~x ) 
Z


SF (x − x ) = 3
(γ0 E − ~γ .~p + m)e−iE(t−t ) θ(t − t′ ) +
(2π) 2E

(−γ0 E − ~γ .~p + m)eiE(t−t ) θ(t′ − t).
(87)

Atendendo a que:
Z
−iE(t−t′ ) i ′ γ0 E − ~γ .~p + m −ip0 (t−t′ )
(γ0 E − ~γ .~p + m)e θ(t − t ) = dp0 e
2π p0 − E + iǫ
Z
iE(t−t′ ) ′ i γ0 E − ~γ .~p + m −ip0 (t−t′ )
(−γ0 E − ~γ .~p + m)e θ(t − t) = − dp0 e , (88)
2π p0 + E − iǫ
obtemos a seguinte expressão para o propagador:
d4 p −ip(x−x′ ) 1
Z
SF (x − x′ ) = i e (89)
(2π)4 6p−m

– Propagador do fotão: O propagador do fotão pode também definir-se, tal como


nos casos anteriores, como o valor expectável no vácuo dos produtos ordenados no
tempo de dois operadores de campo, isto é:

DFµν (x − x′ ) =< 0|T (Aµ (x) Aν (x′ )|0 > . (90)


Usando uma ”gauge”de Lorentz, consideramos a seguinte expansão para o campo
Aµ (x):
d3 p
Z
1 X † ∗µ ipx

Aµ (x) = √ ap ǫµ −ipx
~α α e + ap ǫ
~α p~α e , (91)
(2π)3 2ωp α
o propagador vem da forma:
d3 p 1 X  µ ∗ν  −ip(x−x′ )
Z
DFµν (x − x′ ) = 3
ǫp~α ǫp~α e θ(t − t′ ) +
(2π) 2ωp α
d3 p 1 X  µ ∗ν  ip(x−x′ ) ′
Z
ǫ ǫ e θ(t − t). (92)
(2π)3 2ωp α p~α p~α
Seguindo um processo semelhante ao usado nos casos anteriores e tendo em conta
que:
X µ 
µν pµ pν
ǫp~α ǫ∗ν
p
~α = −(g − (1 − ξ) ), (93)
α p2
obtemos a expressão:

d4 p µν pµ pν e−ip(x−x )
Z
DFµν (x ′
− x ) = −i (g − (1 − ξ) ) (94)
(2π)4 p2 p2
17

3 A matriz S
3.1 O operador evolução temporal e a matriz S
Em geral estamos interessados em saber qual a evolução temporal de um sistema,
inicialmente num estado próprio de um hamiltoniano H0 , quando é ”ligada”uma
interação no instante t = t0 . Num instante genérico t a dinâmica do sistema é
governada pelo seguinte hamiltoniano:

H(t) = H0 + HI (t) com H(t) = H0 para t < t0 . (95)

Este problema pode ser resolvido conhecido o operador evolução temporal, definido
como:
Ut (t , t0 ) = U0 (t , t0 ) UI (t , t0 ), (96)
U0 (t , t0 ) descreve a evolução trivial dos factores de fase, devido ao hamiltoniano H0 ,
e UI (t , t0 ), como vimos na secção 1, é da forma:

(−i)2
Z t Z t Z t
UI (t , t0 ) = 1 − i dt1 HI (t1 ) + dt1 dt2 T (HI (t1 )HI (t2 )) + ... (97)
t0 2 t0 t0

Para calcular a propabilidade de um sistema, que num instante remoto estava num
estado próprio de H0 , |i >, vir a ser encontrado, no futuro, num estado próprio |f >,
precisamos de calcular a matriz S, definida como:
< f | UI (∞ , −∞) |i >
Sf i = . (98)
< 0|UI (∞ , −∞)|0 >

3.2 O Teorema de Wick


O cálculo da matriz S pode ser muito complicado, visto que os processos fı́sicos que
interessa calcular podem exigir termos de ordem elevada na expansão do operador
UI (t , t0 ). O operador HI (t) é função dos campos interactuantes, pelo que podemos
ter que calcular elementos de matriz de operadores do tipo:

T (φ1 φ2 φ3 φ4 .....φn ) , (99)

onde φ1 = φ(x1 ) , φ2 = φ(x2 ) , φ3 = φ(x3 ) ....


Sabemos que só alguns termos da matriz S têm contribuições não nulas. Esses
termos têm que ter os operadores de criação e destruição de partı́culas fı́sicas e po-
dem também ter operadores criação e destruição de partı́culas virtuais. Os cálculos
18

podem ser muito simplificados visto que um produto geral de operadores de campo
ordenado no tempo pode escrever-se como uma soma de produtos de operadores
na ordem normal e de propagadores de Feynman. O resultado é conhecido como o
teorema de Wick:

T (φ1 φ2 φ3 φ4 ....φn ) =
=: φ1 φ2 φ3 φ4 ...φn :
+D12 : φ3 φ4 ...φn : +D13 : φ2 φ4 ...φn :
+D12 D34 : φ5 φ6 ...φn : +..
+D12 D34 ....D12 Dn−1 n (100)

sendo Dij o propagador de Feynman:

Dij =< 0|T (φ(xi ) φ(xi )) |0 > (101)

Note-se que ao escrever os operadores na ordem normal, os operadores de criação


ficam à esquerda, os destruição à direita, o que facilita muitı́ssimo o cálculo, visto
que é possı́vel visualizar rapidamente quais são os termos que não contribuem para
o elemento de matriz.
19

3.3 Exemplo de aplicação das regras de Feynman em QED


3.3.1 Introdução

Podemos derivar o lagrangiano que descreve a interacção de fotões com fermiões


aplicando o conceito de substituição mı́nima, que consiste em fazer a seguinte sub-
stituição no lagrangiano de Dirac:

Pµ −→ Pµ − eAµ (x) (102)

de onde resulta:

L(x)D = ψ̄(x)(i 6 D − m)ψ(x) com Dµ = ∂µ + ieAµ . (103)


O lagrangiano que descreve fotões, fermiões e a sua interacção é da forma:
1 1
L(x) = − Fµν (x)F µν (x) − ( ∂µ Aµ (x) )2 + ψ̄(x)(i 6 D − m)ψ(x), (104)
4 2ξ
sendo o lagrangiano de interacção:

L(x)int = −eψ̄(x)γ µ Aµ (x)ψ(x). (105)


Para estudar um processo de decaimento precisamos de calcular a taxa de
decaimento diferencial:
n
1 Y d 3 ki
dWn = (2π)4 δ 4 (pf − pi ) |M|2, (106)
2E i=1 (2π)3 2Eki
sendo E a energia do estado inicial e Eki a energia de cada um dos estados finais,
com i = 1, ...n.
Para estudar um processo de scattering de duas partı́culas precisamos de calcular
a secção eficaz diferencial:
n
1 Y d 3 ki
dσ = (2π)4 δ 4 (pf − pi ) |M|2, (107)
4EE ′ v i=1 (2π)3 2Eki
sendo E e E ′ as energias dos estados iniciais e Eki a energia de cada um dos estados
finais, com i = 1, ...n e v é o fluxo incidente, que se define como:.
p p′
+ ′.
v=
E E
O factor a seguir indicado costuma designar-se por LIPS (Lorentz Invariant Phase
Space):
n
Y d 3 ki
LIP S = (2π)4 δ 4 (pf − pi ) 3
, (108)
i=1 (2π) 2Eki
20

pelo que as expressões anteriores também costumam aparecer na forma:


1 1
dWn = |M|2 × LIP S dσ = |M|2 × LIP S. (109)
2E 4EE ′
A matriz invariante de scattering, M, é definida a partir de:
n
4 4
Y d 3 ki
S = −i(2π) δ (pf − pi ) q M, (110)
i=1 (2π)32Eki

sendo agora n o número de partı́culas que entram e saiem da interacção. Por con-
seguinte, para o cálculo de um processo de decaimento ou de scattering é essen-
cial saber calcular a matriz M. Para começar, desenham-se todos os diagramas
topológicamente distintos, em seguida constroi-se a matriz M, usando as regras de
Feynman.

3.3.2 O scattering: e− + µ− → e− + µ−

Em geral, os cálculos costumam ser feitos no sistema do centro de massa, onde se


usam as chamadas as variáveis de Mandelstam.

PP

Figura 2: Scattering 2 → 2

As variáveis de Mandelstam, tendo em conta a figura anterior, definem-se como:

s = (pa + pb )2 = (pc + pd )2
t = (pa − pc )2 = (pb − pd )2
u = (pa − pd )2 = (pb − pc )2 , (111)
21

verificando-se:
s + t + u = m2a + m2b + m2c + m2d (112)
O diagrama correspondente ao processo e− + µ− → e− + µ− é da forma:

e-
e-
PP

q − igµν / q2

µ− µ−

Figura 3: Scattering e− + µ− → e− + µ−

Vamos agora, com base nas regras de Feynman, construir a matriz M:


(−ie)2  µ
 
ν

iMf i = ū α (p c , s c ) γ αβ u β (p a , s a ) (−ig µν ) ū γ (p d , s d ) γ γδ u δ (p b , s b )
q2
e2  µ

iMf i = i 2 ūα (pc , sc ) γαβ uβ (pa , sa ) (ūγ (pd , sd ) (γµ )γδ uδ (pb , sb )) (113)
q
Para o cálculo da secção eficaz diferencial interessa-nos |Mf i |2 , e devemos somar
sobre todos os spins dos estados finais e tomar a média dos estados iniciais. Por
P
conseguinte, o que nos interessa calcular é: 1/4 spins |Mf i |2 ( os spins são, respec-
tivamente sa , sb , sc , sd ):
1 X e4 X  µ

|Mf i |2 = 4 ūα (pc , sc ) γαβ uβ (pa , sa ) (ūγ (pd , sd ) (γµ)γδ uδ (pb , sb ))
4 spins 4q spins
(ūσ (pb , sb ) (γν )σρ uρ (pd , sd )) (ūθ (pa , sa ) (γ ν )θǫ uǫ (pc , sc ))(114)
22

Os termos deste produto podem rearranjar-se da seguinte forma:

1 X e4 X  µ

|Mf i |2 = 4 ūα (pc , sc ) γαβ uβ (pa , sa ) (ūθ (pa , sa ) (γ ν )θǫ uǫ (pc , sc ))
4 spins 4q sa sc
X
(ūγ (pd , sd ) (γµ)γδ uδ (pb , sb )) (ūσ (pb , sb ) (γν )σρ uρ (pd , sd )) (115)
sb sd

que, por sua vez, pode ainda escrever-se como:


! !
1 X e4 X µ
X
|Mf i |2 = 4 {(γ ν )θǫ uǫ (pc , sc )ūα (pc , sc ) γαβ uβ (pa , sa ) ūθ (pa , sa )
4 spins 4q sc sa
! !
X X
(γν )γδ uδ (pb , sb ) ūσ (pb , sb ) (γµ )σρ ūρ (pd , sd )ūγ (pb , sb ) (}116)
sb sd

Atendendo a que:
X
(uα (p, s)ūβ (p, s)) = (6 p + m)αβ , (117)
s

temos finalmente:
e4 nh ν µ
i
= (γ ) θǫ (6 p c + me ) ǫα γ αβ (6 p a + me ) βθ
4q 4
[(γν )σρ (6 pd + mµ )ργ (γµ )γδ (6 pb + mµ )δσ ]} (118)

1 X e4
|Mf i |2 = 4 {tr [γ ν (6 pc + me ) γ µ (6 pa + me )] tr [γµ (6 pd + mµ ) γν (6 pb + mµ )]}
(119)
4 spins 4q

Cálculo dos traços


Precisamos saber calcular os seguintes traços:

trγ µ 6 aγ ν 6 b = 4(aµ bν + aν bµ − a.b g µν )


trγ µ γ ν = 4g µν (120)

Uma vez que só são diferentes de zero os traços de produtos pares de matrizes de
Dirac, teremos:

tr [γ ν (6 pc + me ) γ µ (6 pa + me )]
= trγ ν 6 pc γ µ 6 pa + trγ ν γ µ m2e
h i
= 4 pµc pνa + pνc pµa − (pc .pa − m2e )g µν (121)
23

O outro traço obtém-se de modo análogo. O produto dos dois traços na eq. (119),
que vamos designar por T , dá:
h ih i
T = 16 pµc pνa + pνc pµa − (pc .pa − m2e )g µν (pb )µ (pd )ν + (pb )ν (pd )µ − (pb .pd − m2µ )gµν
h i
= 16 2(pa .pb )(pc .pd ) + 2(pa .pd )(pc .pb ) − 2m2µ (pa .pc ) − 2m2e (pd .pb ) + 4m2µ m2e(122)

Tendo em conta as definições das variáveis de Mandelstam (eq. 111), podemos fazer
as seguintes substituições:
1
pa .pb = pc .pd = [s − (m2e + m2µ )]
2
1
pa .pd = pc .pb = − [u − (m2e + m2µ )]
2
1
pa .pc = − [t − 2m2e ]
2
1
pb .pd = − [u − 2m2µ ]
2
s + t + u = 2(m2e + m2µ ). (123)

Substituindo estas expressões em T e finalmente na eq. (119), com um pouco de


álgebra, chegamos à expressão final:

1 X 2e4 h i
|Mf i |2 = 2 (s2 + u2 ) − 4(m2e + m2µ )(s + u) + 6(m2e + m2µ )2 . (124)
4 spins t

Você também pode gostar