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NOTA CIENTÍFICA

Sobrevivência de Sementes de
Talauma ovata St. Hill. (Magnoliaceae) quando
Submetida à Condição de Submersão em Água
Gabriela Sotelo Castan1; Cristiane Carvalho Guimarães2;
Débora Marcouizos Guimarães3 e José Marcos Barbosa4

Introdução resultados com relação à viabilidade das sementes nesta


situação.
Devido ao aumento significativo do uso dos recursos
naturais, têm-se observado inúmeras agressões ao
Material e métodos
ambiente. O desmatamento vem reduzindo extensas áreas
Os frutos de Talauma ovata foram colhidos em um
florestais a fragmentos isolados, e os principais impactos
maciço florestal na região de Ibaté – SP, com auxílio de
deste processo são a perda da biodiversidade e das
tesoura de poda alta. A colheita dos frutos foi realizada
funções a ela atribuídas [1].
no mesmo estádio de maturação e do maior número
Assim, a recuperação de áreas degradadas pode ser
possível de indivíduos (mínimo de 12 indivíduos) para
proposta visando-se diferentes objetivos, que vão desde a
garantia da variabilidade genética.
conservação de recursos genéticos, até à tecnologia de
Após a colheita, as pinhas foram transportadas ao
produção de sementes de espécies nativas. Seja qual for
laboratório da Seção de Sementes e Melhoramento
o objetivo almejado, é inquestionável a importância das
Vegetal do Instituto de Botânica de São Paulo, onde
florestas naturais na integração e preservação da
foram deixadas por um período de 24 horas em condição
biodiversidade, ou na manutenção dos ecossistemas e das
ambiente para abertura dos frutos e posterior retirada das
funções relacionadas à hidrologia e geologia, entre
sementes. Conforme constatado em outros trabalhos, as
outros aspectos [2].
sementes desta espécie exigem retirada do arilo para
Barbosa [3] argumenta que muitos projetos de
germinar, o que é realizado naturalmente pelos
reflorestamentos heterogêneos com espécies nativas
dispersores da mesma. Neste caso, o processo de retirada
fracassaram devido ao pouco conhecimento de técnicas,
do arilo foi realizado manualmente sob água corrente e
principalmente sobre a biologia e a ecofisiologia das
auxílio de peneira.
espécies utilizadas. Acrescenta-se, ainda, a esse fracasso
Após o tratamento pré-germinativo e determinação do
nos reflorestamentos mistos, outros fatores, como a falta
teor de água, a condição de alagamento foi simulada
de critérios técnicos fundamentados em pesquisa e o
acondicionando-se as sementes em caixa plástica de cor
pouco conhecimento da dinâmica das florestas e estudos
branca, medindo 50 x 40 cm e dez cm de profundidade,
sobre tecnologia de produção de sementes e mudas.
sendo a água trocada no intervalo de cinco dias para
A espécie Talauma ovata St. Hill é conhecida
aeração e mantida a temperatura ambiente.
popularmente como pinha do brejo por distribuir-se por
A cada cinco dias foram retiradas 40 sementes,
regiões de solo permanentemente encharcados, como
totalizando nove tratamentos, sendo eles: controle
Matas Ciliares e Matas de Brejo. Em trabalho com
(testemunha), cinco, dez, quinze, vinte, vinte e cinco,
plantas desta espécie, Lobo e Joly [4] estudaram o
trinta, trinta e cinco e quarenta dias de submersão.
mecanismo de tolerâncias à inundação destas e
Quando retiradas, as sementes foram colocadas para
constataram que, de uma forma geral, o crescimento da
germinar em caixas de gerbox, contendo papel de filtro
espécie não é afetado pela condição de alagamento,
como substrato e conduzidas em germinador da marca
sendo, portanto, recomendada para recuperação florestal
FANEM modelo 347G, com fotoperíodo de 12 horas a
em áreas de matas ribeirinhas e reservatórios [5,6].
temperatura constante de 25ºC. Utilizou-se dez sementes
Embora haja conhecimento a respeito da ecofisiologia
por repetição, totalizando quatro repetições para cada
de plântulas desta espécie, observa-se uma falta de dados
tratamento.
precisos com relação ao comportamento das sementes em
O efeito dos tratamentos foi avaliado através dos
condição de anaerobiose. Assim, o presente trabalho
seguintes parâmetros: porcentagem de sementes
objetivou investigar a capacidade de sobrevivência das
germinadas, dormentes e mortas, conforme preconizado
sementes desta espécie (fig. 2), quando submersa em
em Regras para Análise de Sementes [7]. Os resultados
água, por diferentes períodos, a fim de obterem-se
foram submetidos à análise de variância (Teste de
________________
1. Estagiária da Seção de Sementes e Melhoramento Vegetal, Instituto de Botânica de São Paulo. Av. Miguel Estéfano, 3687, São Paulo, SP, CEP
04301-012. E-mail: gabeach@globo.com.br
2. Bióloga e estagiária da Seção de Sementes e Melhoramento Vegetal, Instituto de Botânica de São Paulo. Av. Miguel Estéfano, 3687, São Paulo,
SP, CEP 04301-012.
3. Estagiária da Seção de Sementes e Melhoramento Vegetal, Instituto de Botânica de São Paulo. Av. Miguel Estéfano, 3687, São Paulo, SP, CEP
04301-012.
4. Pesquisador VI e chefe da Seção de Sementes e Melhoramento Vegetal, Instituto de Botânica de São Paulo. Av. Miguel Estéfano, 3687, São
Paulo, SP, CEP 04301-012.
Apoio financeiro: FAPESP E GEF.

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Fischer) e comparação das médias (Teste de Tukey) possibilitando à existência de micro-habitats favoráveis à
sendo utilizado para análise o software Sisvar. germinação [9].
Assim, conforme citado anteriormente, embora as
Resultados e Discussão plântulas de T. ovata sejam tolerantes a saturação hídrica
do solo, as sementes desta espécie apresentam
Conforme indicado na Figura 1, o resultado mostrou
comportamento antagônico não sendo, portanto,
uma progressiva queda na taxa de germinação à medida
recomendada à semeadura direta na recuperação de
que o tempo de submersão foi aumentado. Pode-se
ecossistemas inundáveis.
constatar diferença estatística quando se observa os
tratamentos a zero, cinco e dez dias em ralação aos
demais, com valores máximos de porcentagem de Referências
germinação ao redor de 57,5% (Tabela 1). Observa-se [1] PRUDENTE, C.M. 2005. Produção e germinação de sementes,
morfologia de plântulas e regeneração natural de Tibouchina
ainda que ocorreu uma progressiva queda na taxa de
clavata (Pers.) Wurdack. (Melastomataceae) em área de restinga
germinação, e um aumento da porcentagem de sementes degrada pela mineração. Dissertação de mestrado, Curso de Pós-
dormentes entre dez e quinze dias de submersão. Após Graduação em Agronomia, UNESP, Jaboticabal.
vinte dias em anaerobiose observa-se uma redução [2] RODRIGUES, M.A. 2006. Avaliação da chuva e banco de
drástica na integridade das sementes, sendo que a sementes em áreas de restinga, morfoecologia e potencial biótico
de espécies ocorrentes nestes locais. Dissertação de mestrado,
porcentagem de sementes mortas manteve-se superior a UNESP, Rio Claro.
75% neste período, diferindo estatisticamente dos [3] BARBOSA, J.M. 2002. Aspectos da Tecnologia de Produção de
tratamentos anteriores. Quanto ao índice de velocidade Sementes de Espécies Nativas Florestais. In: Curso sobre
de germinação (IVG), não foi constatada diferença Recuperação de Áreas Degradadas e Tecnologia de Sementes de
Espécies Florestais Nativas, 2002, São Paulo..
significativa podendo-se afirmar que nenhuma das [4] LOBO, P.C & JOLY, C.A. 1995. Mecanismos de tolerância a
situações testadas exerceu influência nesta variável. inundação de plantas de Talauma ovata St. Hill. (Magnoliaceae),
Embora estes resultados contrastem com aqueles uma espécie tipica de matas brejo. Revista Brasileira de Botânica,
encontrados para outras espécies típicas de áreas São Paulo, v. 18, n.2, p.177-183.
[5] LORENZI, H. 1992. Àrvores Brasileiras: Manual de
inundáveis, dados semelhantes foram obtidos por Lobo Identificação e Cultivo de Plantas Arbóreas Nativas do Brasil.
& Joly [8], quando os mesmos trabalharam com T. ovata. Nova Odessa. SP: Editora Plantarum. Vol. 1. P. 231
Estes afirmam que, com o aumento do tempo de [6] BARBOSA, L.M. & MARTINS, S.E. 2003. Diversificando o
estocagem em água, há uma queda no potencial reflorestamento no Estado de São Paulo (espécies disponíveis por
região e ecossistema). São Paulo: Instituto de Botânica, 64 p.
germinativo das sementes desta espécie devido ao fato da [7] BRASIL. 1992. Ministério da Agricultura. Regras para análise
energia gerada anaerobicamente ser insuficiente para de sementes. Brasília: Departamento de Produção Vegetal,
proporcionar a germinação quando restauradas as divisão de Sementes e Mudas. 365p.
condições aeróbias. [8] LOBO, P.C & JOLY, C.A. 1996. Ecofisiologia da germinaçao de
sementes de Talauma ovata St. Hill (Magnoliaceae). Revista
Conclui-se então, que as sementes da espécie não são Brasileira de Botânica, São Paulo, v. 19, n.1, p.35-40.
tolerantes à condição de alagamento por períodos [9] LOBO, P.C. 1993. Tolerância à inundação de plantas de
superiores a cinco dias. Este comportamento, Talauma ovata St. Hil. (Magnoliaceae) e aspectos do seu
aparentemente contraditório, pode encontrar comportamento em uma mata ciliar da bacia do rio Jacaré-
Pepira, Brotas, SP. Dissertaçao de Mestrado, UNICAMP,
embasamento científico no fato dos frutos maduros Campinas..
estarem disponíveis no final da estação chuvosa e início
da estação mais seca (inverno). Neste período, mesmo na
mata de brejo, o lençol freático não é tão superficial,

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100

% de germinadas, mortas e dormentes


90
80
70
60 Germ inadas
50
40 Mortas
30
20 Dorm entes
10
0
0 5 10 15 20 25 30 35 40
Dias de Subm ersão

Figura 1. Porcentagem de sementes de Talauma ovata germinadas, mortas e dormentes, quando submetidas a diferentes
tratamentos (dias de submersão).

Tabela 1. Valores médios percentuais de germinação, sementes íntegras, não íntegras e índice de velocidade de germinação
(IVG), de Talauma ovata, obtidos após diferentes períodos de submersão

Tratamentos Período de % Germinação % Íntegras % Não Íntegras IVG


Submersão

1 0 dias 57,5 c 17,5 a 25 abc 1,257 a


2 5 dias 57,5 c 2,5 a 40 c 1,117 a
3 10 dias 47,5 bc 20 a 32,5 bc 1,349 a
4 15 dias 22,5 ab 5a 72,5 d 0,718 a
5 20 dias 17,5 ab 7,5 a 75 d 0,367 a
6 25 dias 17,5 ab 77,5 b 5 ab 0,443 a
7 30 dias 25 ab 75 b 0a 0,737 a
8 35 dias 17,5 ab 82,5 b 0a 0,690 a
9 40 dias 12,5 a 87,5 b 0a 0,167 a

Obs:Médias seguidas da mesma letra não diferem entre si em nível de 5% de significância pelo teste de Tukey.

Figura 2. Talauma ovata: Fig. 2A, Fruto de Talauma ovata; Fig. 2B, Sementes de Talauma
ovata; Fig.2C, Sementes de Talauma ovata com arilo e sem arilo.

Revista Brasileira de Biociências, Porto Alegre, v. 5, supl. 2, p. 822-824, jul. 2007

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