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Um novo modelo
de gestor:
o nosso
Habilidades diferenciadas, como flexibilidade, criatividade e talento para
empreender em cenários desfavoráveis, são algumas das qualidades dos
gestores brasileiros que começam a ser valorizadas no mercado global
E
m um dos capítulos finais de As novas realidades, de Administração de Empresas de São Paulo, da Fundação Getulio
Peter Drucker resume em sete itens os princípios es- Vargas (FGV-EAESP), destaca aquela que considera principal: gerir
senciais da administração. Entre eles o autor desta- em condições não totalmente favoráveis. “O brasileiro não pensa
ca que a administração tem como meta a integração apenas no projeto, mas também em como financiá-lo. Para ele é na-
de pessoas num empreendimento comum e que, por tural buscar alternativas para possíveis situações adversas, o que o
isso, está “incrustada de cultura”. Assim, a forma com torna um ótimo viabilizador de ações inovadoras”, avalia.
que cada povo gerencia suas empresas é algo que merece atenção. O professor, no entanto, relativiza a ideia de que haja um úni-
O livro, escrito há mais de 20 anos, continua co estilo de gestão brasileiro. “Não há um perfil
relevante e diz muito sobre a realidade atual Treinados na definido, não existe generalização. Mas con-
do Brasil. Diversos analistas e executivos com cordo que estamos começando a desenhar um
experiência internacional têm enxergado no adversidade, estilo de liderança brasileiro.” Segundo Cabrera,
mercado externo uma tendência em reconhe-
cer e valorizar o modo brasileiro de gerir. E
os executivos o estilo de liderar brasileiro está mais evidente
dentro do País, pois a presença de nossos exe-
quais são as características dessa gestão ver-
de-amarela? Sem ufanismo, o que há de dife-
brasileiros cutivos no exterior ainda é tímida, e é justamen-
te o que fazemos por aqui que acaba despertan-
rente, e especial, no executivo brasileiro? aprenderam a do o interesse pelas soluções brasileiras. “O que
Aparentemente o diferencial mais relevan- evidencia o talento do profissional é o resultado
te é a própria realidade do Brasil. A história inovar que sua empresa alcança. Como as empresas
do País está marcada por inúmeros pacotes brasileiras estão conquistando bons resultados,
econômicos, inflação altíssima, trocas de moeda, escassez de re- eles estão se destacando”, diz.
cursos (capital, humano e tecnológico), grande carga tributária
sobre a produção e a crônica falta de infraestrutura energética FLEXIBILIDADE NAS RELAÇÕES
e de transportes. Um estilo verde-amarelo é reconhecido, especialmente, pela maior
Ao vivenciar essa realidade adversa, ou conhecê-la por meio do ênfase dada às relações do que às transações. “Primeiro pergunta-
relato de pais e professores, os executivos brasileiros desenvolve- mos ao interlocutor como ele vai, comentamos alguma amenidade e
ram habilidades específicas. Luiz Carlos de Queirós Cabrera, sócio- só depois perguntamos se o relatório está pronto. Um norte-ameri-
-fundador da Amrop Panelli Motta Cabrera e professor da Escola cano ou indiano formula a questão de primeira, desliga o telefone e
pronto”, compara Cabrera. Além do autocontexto, o brasileiro tam-
bém é reconhecido pela flexibilidade nas relações e pelo respeito às
A reportagem é de Elizabeth Cardoso, colaboradora de HSM Management.
individualidades, fatores que o diferenciam dos gestores de outros
80 HSM Management • Brasil: Presença na Gestão que Dá Certo • Edição Especial Março 2011
Fotos: Divulgação
Para Wong,
o executivo brasileiro
Talento tipo
se destaca nas relações
interpessoais exportação
Os pontos fortes dos executivos brasileiros:
• inovação
• capacidade de atuar em condições adversas
• facilidade nas relações interpessoais
• flexibilidade
• respeito às individualidades
• convive bem com diferentes culturas
• facilidade de integração e aprendizado
E os fracos:
• formação deficiente
• idiomas
• resistência para sair do País
• baixa valorização do trabalho
• informalidade excessiva
HSM Management • Brasil: Presença na Gestão que Dá Certo • Edição Especial Março 2011 81
pessoas
O líder
da escola de
liderança
Foto: Divulgação
Vice-presidente de Gente e Gestão
da Ambev, Márcio Fróes representa PERFIL
o novo perfil –estratégico– do Quem é: Márcio Fróes
gestor de recursos humanos O que estudou: engenharia química
O que faz: vice-presidente de gente e gestão da Ambev
“Se eu estiver falando rápido demais, você me avisa, tá?” Márcio Trajetória: há 19 anos na empresa, já passou por
Fróes fala muito. E bem. A eloquência é a mesma do entusiasmado praticamente todas as áreas, com exceção de finanças e
trainee que entrou na Ambev há 19 anos, como engenheiro químico marketing
recém-formado. Saber o que ele já fez dentro da empresa consome Frase: “Desde o início de minha carreira, tive o privilégio
tempo demais. É mais fácil perguntar por quais áreas ainda não pas- de perceber que precisava entender as pessoas. A chave
sou. “Tirando finanças e marketing, já estive em todos os lugares”, de tudo tem de ser a capacidade de liderar os colegas”
conta. Em 2010, assumiu a vice-presidência de gente e gestão, cargo
que já havia ocupado pela companhia no Canadá e que atualmente
acumula com o comando do setor industrial para a América Latina. Até se tornar gestor de pessoas, esse engenheiro químico pre-
Em um conglomerado conhecido no mundo empresarial como uma cisou passar no teste da versatilidade. A prova de fogo veio em
fábrica de líderes, a vice-presidência é naturalmente estratégica. 1994, quando ele foi encarregado de implantar um novo gerencia-
Certa vez, atraído pelo fato de a Ambev já ter formado 87 exe- mento de rotina na cervejaria, padronizando todas as áreas. “Discu-
cutivos que hoje atuam no exterior, Fróes decidiu investigar as cau- tíamos todo o fluxograma. Aprendi demais sobre todos os setores”,
sas que levavam seus profissionais a serem tão requisitados pelo lembra. Nove anos depois, foi transferido definitivamente para o
mercado. “Toda vez que recebia telefonemas que na Ambev é chamado de “área de gente”.
de headhunters dizia não estar interessado. Em outras palavras, administração do pessoal.
Um dia, porém, resolvi almoçar com um deles. “Quem trabalha “Desde o início de minha carreira, tive o pri-
Pedi desculpas por estar lhe tomando o tempo,
mas disse que estava lá porque queria saber o
mais e entrega vilégio de perceber que precisava entender as
pessoas. Sempre fui um questionador nesse as-
que a empresa precisava fazer para que nos-
sos funcionários nem quisessem ouvir as pro-
resultados sunto. A chave de tudo tem de ser a capacidade
de liderar os colegas”, ensina.
postas de concorrentes”, lembra, divertindo-se. merece mais Além de valorizar os esforços coletivos,
A resposta foi sucinta: impedi-los de escutar Fróes desenvolveu seu senso prático ao longo
ofertas era impossível, mas o caminho era traba- oportunidades” de todos esses anos na companhia. Ele jamais
lhar com os funcionários a cultura da companhia, aceita observações baseadas em intuição; va-
fazer com que eles se sentissem parte do que está acontecendo. lem apenas os fatos apoiados em números. “A gente não acre-
Não é por acaso que ele usa a expressão “nossa empresa”. “É a dita em coisas fáceis ou atalhos. O fundamental nessa cultura
história de tratá-la como sua. É acreditar que quem trabalha mais e é trabalhar com fatos e dados. O chamado feeling não funciona
entrega resultados merece mais oportunidades. Você não pode ser com qualquer gestor. A mensagem precisa vir acompanhada de
promovido pelo simples tempo de casa”, resume. dados”, pondera. (Alex Sabino)
82 HSM Management • Brasil: Presença na Gestão que Dá Certo • Edição Especial Março 2011
Um novo modelo de gestor: o nosso
Vocação
para
trabalhar
com o outro
HSM Management • Brasil: Presença na Gestão que Dá Certo • Edição Especial Março 2011 83
pessoas
Substantivo
feminino
84 HSM Management • Brasil: Presença na Gestão que Dá Certo • Edição Especial Março 2011
Um novo modelo de gestor: o nosso
PERFIL profissional deva estar nas competências e não no sexo. Não tenho
dúvida de que esse equilíbrio ficará cada vez mais evidente nas or-
Quem é: Nadir Moreno ganizações”, declara. Ela também concorda que os estilos são dife-
O que estudou: letras e direito rentes e aponta que a empresa que sabe trabalhar com a diversidade
O que faz: presidente da UPS do Brasil de gêneros sai ganhando.
Trajetória: há 18 anos na empresa, passou por diversas “Homens e mulheres, de modo geral, têm estilos complementa-
áreas, como atendimento ao cliente, despacho aduaneiro, res. Uma empresa que consegue misturar esses estilos só tem razões
contas a pagar, financeiro, recursos humanos e jurídico para ganhar, porque a liderança pode ser aprimorada, com os esti-
Frase: “Acredito que seja indiferente [ser homem ou los sendo incorporados tanto pelos homens como pelas mulheres.
mulher]. Todos têm de enfrentar desafios. O que faz a De maneira geral, entendo que as habilidades femininas que mais
diferença é como as pessoas os encaram” encontramos são: gestão de parceria, sensibilidade, gestão compar-
tilhada e capacidade de trabalhar com multitarefas”, analisa Deni-
capacidade de ter uma visão mais ampla de possibilidades futuras se, que é professora da pós-graduação e do programa de MBA na
é mais acentuada”, define. Fundação Getulio Vargas, nas disciplinas de liderança, negociação e
planejamento estratégico.
Preconceito corporativo Se há um estilo de gestão com a cara do País? Denise crê que
Denise Soares dos Santos, presidente do Hospital e Maternidade sim. “Percebo que o executivo brasileiro aprendeu, ao longo de dé-
São Luiz desde 2009, lamenta a persistência de preconceito no am- cadas, a gerir negócios diante de crises, o que lhe deu não apenas
biente corporativo, mas pondera: “Não posso dizer que o fato de flexibilidade, mas também criatividade na gestão. E, não menos im-
ser mulher limitou meu crescimento, tive oportunidades interes- portante, o brasileiro é reconhecido por seu estilo alegre e amigo,
santes e soube aproveitá-las”. que certamente contagia positivamente um ambiente de trabalho.
Assim como Nadir, Denise não vê vantagens ou desvantagens Trabalhar em equipe e desenvolver relações duradouras é caracte-
no fato de ser mulher. “Acredito que a relevância de escolha de um rística nossa”, conclui. (Elizabeth Cardoso)
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