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Juizados Especiais
Juizados Especiais
Marco Antônio G. L. Lorencini
Juizados Especiais
Marco Antônio G. L. Lorencini
Aspectos procedimentais
nos Juizados Especiais Cíveis................................................ 41
Juizado Especial e audiência.................................................................................................. 41
A prova nos Juizados Especiais Cíveis................................................................................. 43
Os meios de prova específicos:
depoimento pessoal e oitiva das partes............................................................................ 44
Prova pericial e inquirição de técnico................................................................................. 44
A prova testemunhal e a documental................................................................................ 45
A inspeção judicial..................................................................................................................... 48
Atividade saneadora................................................................................................................. 48
A sentença e sua imunização................................................................................................. 49
Estrutura recursal....................................................................................................................... 52
Juizado Especial e recurso contra a sentença.................................................................. 52
Juizado Especial e agravo........................................................................................................ 54
Juizado Especial e recurso adesivo...................................................................................... 54
Juizado Especial e embargos de declaração.................................................................... 55
Juizado Especial e órgãos de superposição...................................................................... 56
Efetividade – a execução do Juizado Especial Cível...................................................... 58
Juizados Especiais
Cíveis Federais: Lei 10.259/2001.......................................... 61
Juizados Especiais Federais e aplicação
do modelo dos juizados em outros ramos....................................................................... 61
Juizados Especiais Cíveis
Federais e hipóteses de cabimento..................................................................................... 62
Juizados Especiais Federais e a regra de interpretação................................................ 63
Peculiaridades do Juizado Especial Federal...................................................................... 63
Sentença e estrutura recursal no Juizado Especial Cível Federal.............................. 70
Execução no Juizado Especial Cível Federal..................................................................... 74
Referências................................................................................... 77
Os Juizados Especiais Cíveis
e o acesso à justiça
A influência do tema
acesso à justiça no cenário brasileiro
A grande virada doutrinária, portanto, foi a obra de Cappelletti e Garth
(1988), que logo ganhou eco no Brasil, ao passo que, do ponto de vista legis-
lativo, a Lei dos Juizados de Pequenas Causas (Lei 7.244/84) tornou direito
positivo parte do anseio de prestigiar a prestação jurisdicional sob a pers-
1
Se não pioneira, a obra foi propulsora entre nós da expressão e dos temas tratados pelos autores a esse propósito.
Os Juizados Especiais Cíveis e o acesso à justiça
O tema acesso à justiça pôs em relevo, de maneira clara e singela, uma preocu-
pação que os juristas recentes jamais abandonaram: fazer a prestação jurisdicio-
nal chegar a todos, apreciando toda sorte de conflitos.
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Os Juizados Especiais Cíveis e o acesso à justiça
Essa última perspectiva criou duas realidades distintas, a esta altura inexorá-
veis, que convivem lado a lado, interdependentes e com interpenetrações: de um
lado, a do Processo Civil tradicional, aqui entendido como aquele existente desde
o nascimento da ciência processual no século XIX, com seus institutos, sujeitos e
princípios fundamentais; e, de outro, aquela proposta pelos Juizados de Pequenas
Causas, hoje, com o advento da Lei 9.099/95, chamados Juizados Especiais.
De certa forma, essa revisita concretizou-se com as pequenas causas, hoje trata-
das pelos Juizados Especiais. Por outro lado, é interessante investigar quanto dos
aspectos do processo tradicional foi abalado por essa revisita e o quanto os pilares
fundamentais encontram-se incólumes apesar desta nova realidade.
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Os Juizados Especiais Cíveis e o acesso à justiça
vou-se e ganhou neste tema mais uma forma de apresentar-se aos jurisdiciona-
dos, embora o tema acesso à justiça possa resvalar na não atuação da função
estatal, como ocorre com os meios extrajudiciais de resolução de controvérsias.
Em uma primeira ordem de ideias, é inegável que a tônica aos meios alterna-
tivos de resolução de controvérsias, como a conciliação e a mediação, resulta da
constatação de que o Estado, em um dado momento histórico, foi incapaz de lidar
com conflitos de determinada natureza.
2
É o que adverte Ada Pellegrini Grinover (1988, p. 74) ao concluir os critérios orientadores para a eficácia da conciliação: “b.2) a
firme possibilidade de acesso à justiça, em caso de insucesso da conciliação; b.3) sua facultatividade, a fim de não obstaculizar
o livre acesso aos tribunais.”
3
Além de, obviamente, a conciliação endoprocessual, jurisdicional no processo tradicional e não jurisdicional nos Juizados
Especiais, a conciliação extrajudicial, de qualquer valor ou natureza, pode ser homologada pelo juízo dos Juizados Especiais
(Lei 9.099/95, art. 57), o que demonstra, pela sua abrangência, o relevo emprestado à conciliação, a operar não só nos Juizados,
como em todo o sistema.
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Os Juizados Especiais Cíveis e o acesso à justiça
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O modo de operar tem a ver com a deformalização das controvérsias no sentido de deformalização do processo, tal como
preconizado por Ada Pellegrini Grinover (1998a).
5
Ada Pellegrini Grinover (1988, p. 280) esclarece que “o termo (deformalização das controvérsias) há de ser utilizado em duas
distintas acepções: de um lado, a deformalização do próprio processo, utilizando a técnica processual em busca de um processo
mais simples, rápido, econômico, de acesso fácil e direto, apto a solucionar com eficiência tipos particulares de conflitos de
interesses. De outro lado, a deformalização das controvérsias, buscando para elas, de acordo com sua natureza a equivalentes
jurisdicionais”.
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Os Juizados Especiais Cíveis e o acesso à justiça
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Acerca da intervenção indireta, Ada Pellegrini Grinover (1998b, p. 12) exemplifica: “A indireta configura o controle da função
jurisdicional pelos destinatários, ora mediante as relações justiça-informação (com a problemática inerente à publicidade dos
atos processuais, passando pelo controle dos meios de comunicação até o sigilo, como publicidade restrita às partes e a seus
procuradores); ora pela técnicas de responsabilização do juiz; ora pelos controles sobre a atuação e inércia dos órgãos da acu-
sação no processo penal.”
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Os Juizados Especiais Cíveis e o acesso à justiça
Os entraves sociais
Entre os entraves sociais, o resultante da combinação entre falta de informação
e descrença no Judiciário é o que mais chama a atenção. A despeito do conteúdo
técnico de que são portadores o processo e as coisas da justiça, os operadores
do direito reforçam a aura de indecifráveis de ambos. O elemento mais evidente
desse fenômeno é a linguagem.7 Para quebrar essa distância, bem como fazer fluir
a informação e tirar o Judiciário do descrédito, é que o modelo dos juizados se
instaurou.8 Os seus critérios orientadores – notadamente a simplicidade, informa-
lidade e oralidade – revelam a proposta de aproximação do cidadão da Justiça.9
No capítulo relativo à educação e informação, é lícito dizer que o modelo dos jui-
zados é o único com a preocupação explícita de esclarecer e instruir. Ele assumiu
a tarefa, ao que parece de bom grado, de cartão de visita do Judiciário, seja para
os litigantes habituais seja para os eventuais.
7
É inegável, como lembra Dinamarco (2000, p. 136), que “Mede-se o grau de desenvolvimento de uma ciência pelo refinamento
maior ou menor de seu vocabulário específico. Onde os conceitos estão mal definidos, os fenômenos ainda confusos e insatisfa-
toriamente isolados sem inclusão em uma estrutura adequada, onde o método não chegou ainda a tornar-se claro ao estudioso
de determinada ciência, é natural que ali também seja pobre a linguagem e as palavras se usem sem grande precisão técnica.”
Na verdade, o obstáculo natural da linguagem, comum a todas as ciências, tem no bacharelismo, em seu sentido pejorativo, o
seu lado perverso. Este merece ataque.
8
Nesse aspecto, a instituição dos Juizados de Pequenas Causas, hoje Especiais, demonstra que a proposta não caberia na mera
reformulação do procedimento sumário, do artigo 275, do CPC. Há uma dimensão bem maior a ser considerada que só o tempo
demonstrou ter sido correta a opção por um modelo exclusivo. Conferir Athos Gusmão Carneiro (1988, p. 333-345 e p. 338-
-341).
9
A respeito da informação que todo cidadão deve receber acerca de seus direitos, da educação que o Estado deve prover e da
descrença da população na justiça, Kazuo Watanabe (1988, p. 131) ressalta ser a participação, mais uma vez, a chave para tais
problemas: “A par das vantagens mais evidentes, que são a maior celeridade e maior aderência da Justiça à realidade social, a
participação da comunidade traz, ainda, o sentido pedagógico da administração da justiça, propiciando o espírito de colabora-
ção. Os que têm a oportunidade de participar conhecerão melhor a Justiça e cuidarão de divulgá-la ao segmento social a que
pertencem. Demais disso, a organização de uma Justiça com essas características, organizada para pessoas mais humildes, tem
a virtude de gerar, pela própria peculiaridade do serviço que presta e pela exigência das pessoas que a procuram, ordinaria-
mente pouco instruídas, um serviço paralelo, que é o de informação e orientação. ‘Paralelo’ é um modo de dizer, pois na verdade
é um serviço que se completa com o de solução de conflitos, formando um todo único. Juizados Informais de Conciliação e
Juizados Especiais de Pequenas Causas que não tenham o serviço de informação e orientação, além do serviço de assistência
judiciária, não estão completos e não cumprirão o relevante papel que lhes é destinado.”
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Os Juizados Especiais Cíveis e o acesso à justiça
O entrave social mais evidente ao acesso à justiça é o que diz respeito à men-
talidade dos envolvidos na prestação jurisdicional. A despeito de a ideia de acesso
à justiça envolver todos os operadores de direito, costuma-se centrar na figura
do julgador as principais recomendações acerca da nova postura que o acesso
à justiça significa. Não são poucas as críticas reservadas aos que exercem a juris-
dição em nome do Estado. É comum acusar a magistratura de conservadora e
resistente a mudanças (GRINOVER, 1998b, p. 25). Por outro lado, a conduta acon-
selhada pelo acesso à justiça atinge o sistema processual como um todo. Não se
pode vislumbrar aí elementos dissonantes que afastam o processo tradicional do
modelo dos juizados. O juiz a atuar em um sistema e no outro deve ser, em essên-
cia, o mesmo. O processo aqui adjetivado de tradicional não impede que o seu
operador o maneje com os olhos do acesso à justiça, pois a ideia de acesso, a ideia
de justiça e de ordem jurídica justa passa por várias perspectivas.
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Os Juizados Especiais Cíveis e o acesso à justiça
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Luis Fux, (1997, p. 210): “na medida em que o juiz deixa de ser um mero espectador e passa a influenciar diretamente na solu-
ção do conflito, cresce também o seu compromisso e a sua responsabilidade pelo bom funcionamento da Justiça”.
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Os Juizados Especiais Cíveis e o acesso à justiça
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Sujeitos e princípios processuais
nos Juizados Especiais Cíveis
Princípios processuais
e critérios orientadores
Há diferentes modos de apresentar os princípios processuais e diferente é
a importância que os estudiosos atribuem a eles no cenário do sistema pro-
cessual. Em geral, a diferença entre uma análise e outra está na perspectiva, o
que implica dizer que uma não desmerece nem anula a outra. Assim, entre os
métodos de análise, dois merecem destaque: o que apresenta os princípios
informativos ou deontológicos. Arruda Alvim (1991, p. 7) anota, conforme,
ainda, Alcides Mendonça Lima (1994, p. 11), bem como Ada Pellegrini Grino-
ver (1975):
Os princípios de ordem técnica se denominam, tradicionalmente – a partir de uma classifi-
cação que vem da segunda metade do século passado, idealizada na Itália – de princípios
informativos. Diz-se que tais princípios informativos são: o lógico, o jurídico, o político e
o econômico. Há quem pretende serem eles destituídos de permeação ideológica maior,
pois que a carga ideológica diria respeito, apenas, aos princípios fundamentais, o que é
inexato. Se se deve ter presente que os chamados princípios fundamentais (pois que deno-
tam caráter eminentemente político) têm, por isso mesmo, decisiva permeação ideológica,
saliente-se, todavia, que, nem pela circunstância de os princípios técnicos (informativos)
aparentarem (e, realmente, nestes a “carga” ideológica é menor) menos este componente,
errôneo será considerá-los exclusivamente técnicos, no sentido de estarem desligados do
ambiente político-cultural em que foram editados, onde existem e funcionam. Consig-
ne-se que, os princípios informativos, em última análise, colimam, teleologicamente, criar
condições “técnicas” para a consecução de finalidades assumidas pelo Estado.
As pequenas causas, no que foram seguidas pelo Juizado Especial, desde seu
surgimento, evitaram o termo “princípios” para delinear seus paradigmas. Pre-
feriram critérios orientadores. Seriam eles os que norteariam o modo de solução
de controvérsias trazidas aos Juizados Especiais. Assim, se no Direito Processual,
salvo uma ou outra diferença1, encontra-se consolidado quais são os tais prin-
cípios gerais, bem como os mais amplos que têm status constitucional, tarefa
instigante é lê-los a partir dos critérios orientadores propostos pelo modelo dos
Juizados Especiais Cíveis.
Em linhas gerais, é possível adiantar – nem poderia ser diferente – que os prin-
cípios processuais têm plena aplicação no modelo dos Juizados Especiais. O que
ocorre é que a sua interação com os critérios orientadores e a própria mentalidade
e filosofia apresentadas pelos juizados autorizam uma releitura.
1
É normal que, dentro da doutrina, não haja exata coincidência entre os princípios fundamentais do Processo Civil enunciados
por cada autor. A doutrina brasileira não foge à regra. Por outro lado, é possível encontrar determinados princípios presentes
na grande maioria dos autores. A respeito de um panorama comparativo sobre os princípios fundamentais, conforme Wambier,
Correia de Almeida e Talamini, (1999, p. 62-70). Recentemente, Dinamarco (2001a, p. 196), destaca: “Existem inúmeras outras
regras técnicas de grande importância e prestígio, também geralmente indicadas como princípios, mas que não o são. É o caso,
p. ex., do chamado princípio da demanda, pelo qual a jurisdição só se exerce mediante provocação de parte (CPC, art. 2.º, art.
262); do princípio da correlação entre provimento e demanda, pelo qual o juiz não pode conceder ao autor senão o que foi
pedido, sendo também obrigado a pronunciar-se sobre o pedido todo (arts. 128, 560); do princípio do livre convencimento, que
dá ao juiz liberdade para examinar os resultados da prova segundo sua própria capacidade perceptiva e atento a que consta dos
autos motivando sua decisão (art. 131 c/c art. 458, II); do princípio da oralidade, que postula a preponderância do verbal sobre o
escrito no procedimento; do princípio dispositivo, da lealdade, da instrumentalidade das formas etc.”
2
Hans Walter Fasching, citado por Fernando Noal Dorfmann (1989, p. 8), exprime bem como os princípios processuais devem ser
entendidos: “Os princípios processuais não são – talvez com a única exceção do princípio do contraditório – de acordo com a sua
própria natureza, nem dogmas, tampouco axiomas, senão o resultado de uma experiência acumulada ao longo de muitos anos
com os diferentes modelos processuais, com a sua aplicação e com a sua finalidade. Esses princípios não devem se converter
em um fim em si mesmos, devem, ao contrário, manter confirmadas, sempre renovadas a sua aprovação e a legitimidade de sua
própria existência. Justamente o desenvolvimento do processo civil na prática das últimas décadas tem sido caracterizado pela
constatação de que o processo transformou-se num fenômeno de massas. As instituições tradicionais da Justiça e as formas
processuais assimiladas do passado são somente condicionalmente adequadas para superar a nova situação de maneira rápida,
econômica e satisfatória para aqueles que buscam a Justiça.”
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Sujeitos e princípios processuais nos Juizados Especiais Cíveis
Princípios processuais
e Constituição Federal (CF)
Além de consagrar o próprio processo como método de solução de controvér-
sias ante o monopólio da jurisdição por parte do Estado, a CF contempla cláusu-
las, garantias e limites, verdadeiros substratos do Estado Democrático de Direito.
Como ressalta Dinamarco (2001a, p. 193-194):
[...] a percepção de que o Processo Civil é ramo do direito público constitui uma grande
premissa metodológica que conduz a colocá-lo como alvo de uma série de preceitos
e garantias na Constituição, os quais se traduzem um verdadeiro sistema de promes-
sas e limitações: promessas de dar solução aos conflitos e conduzir os sujeitos à ordem
jurídica justa e limitações consistentes em uma série de condicionamentos e restrições a esse
exercício. Tais limitações são ditadas com vista a assegurar às partes uma série de posições e
possibilidades no processo, que o juiz não pode desrespeitar.
3
É sempre Dinamarco (2001a, p. 197) que resume: “A Constituição formula princípios, oferece garantias e impõe exigências
em relação ao sistema processual com um único objetivo final, que se pode qualificar como garantia síntese e é o acesso à
Justiça”.
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Sujeitos e princípios processuais nos Juizados Especiais Cíveis
Critérios orientadores
Justamente por encerrar ideias e conceitos, os princípios processuais e critérios
orientadores não se sujeitam a fórmulas. A amplitude de determinado princípio
ou critério, como visto, é a chave para a sua perenidade.
Por causa disso, explicar o que são os critérios orientadores não soluciona o
dilema de determinar todas as hipóteses e circunstâncias em que eles são aplica-
dos. Tampouco a sua convivência com os princípios processuais, constitucionais
ou não, bem como as regras jurídicas. O que é possível dizer é que, no modelo do
juizado, os critérios da oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual
e celeridade (Lei 9.099/95, art. 2.º) têm função sob dois aspectos:
4
Como lembra José Carlos Barbosa Moreira (1997, p. 57), usamos mal um princípio “quando o pomos em prática sem levar
em conta os outros princípios que lhe servem de contrapeso e com ele precisam conjugar-se para assegurar o equilíbrio do
conjunto”.
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Sujeitos e princípios processuais nos Juizados Especiais Cíveis
Vista a questão com mais cuidado, fica patente que a introdução de novas figu-
ras pelo legislador do Juizado Especial não afeta o princípio da simplicidade que
ele consagrou, assim como a própria introdução do modelo do Juizado Especial
convivendo lado a lado com o sistema tradicional não compromete o princípio
do juiz natural.5
A escolha de pessoa diversa do julgador para esse mister teve tripla intenção.
Antes de tudo, a entrega dessa tarefa significa aumentar a capacidade de traba-
lho do julgador, que poderá, enquanto o conciliador estiver desempenhando
5
Com a confirmação da facultatividade de ajuizar ação perante os Juizados Especiais, algumas vozes se levantaram objetando
que a introdução dos Juizados Especiais feriria o princípio do juiz natural. O óbice é descabido. Ainda sob o pálio da Constituição
anterior, Grinover (1984, p. 39) observa que “[...] o princípio do juiz natural, entre nós, é tutelado por dupla garantia: consiste
a primeira na proibição de juízos extraordinários, constituídos ‘ex post facto’; e, a segunda, na proibição de subtração do juiz
constitucionalmente competente”. Portanto, com a introdução dos Juizados Especiais, não se trata de instituir um órgão depois
da ocorrência do fato (problema que se colocou apenas quando da introdução da lei) nem de subtrair a atribuição do juiz
competente. A existência de pluralidade de vias de acesso – Juizados Especiais, com renúncia ao crédito excedente, e Justiça
Comum – não macula o juiz natural, uma vez que ambos são previstos constitucionalmente. De todo modo, aconselhável seria
a exclusividade dos juizados no rol de hipóteses de sua competência. (Lei 9.009/95, art. 3.º).
6
O CPC brasileiro vigente, no início de sua vigência, trazia tão somente a incumbência do juiz de tentar a conciliação sobre
direitos disponíveis na abertura da audiência de instrução de julgamento (CPC, art. 477). A fim de enfatizar essa exigência, a
minirreforma não só introduziu a audiência preliminar, mas também a tentativa de conciliação em uma de suas etapas, como
ainda consagrou a tentativa de conciliação entre os deveres do juiz (art. 125, IV).
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Sujeitos e princípios processuais nos Juizados Especiais Cíveis
sua função, julgar outros casos cuja tentativa de conciliação tenha sido infrutí-
fera. Além disso, de um lado, o conciliador, não sendo o juiz da causa, não corre
o risco do prejulgamento, isto é, de antecipar seu entendimento quanto à ques-
tão objeto de controvérsia, o que lhe possibilita desempenhar sua função sem
nenhuma amarra; a tarefa de conciliar e julgar concentrada em uma só pessoa é
uma verdadeira camisa de força, que resulta, a mais das vezes, em cautela no enca-
minhamento da solução conciliadora. É o que ocorre no Processo Civil tradicional.
De outro lado, a entrega da conciliação a uma pessoa diversa do julgador é uma
aposta na eficiência da especialidade: embora o juiz togado, hoje em dia, deva ter
uma técnica de conciliação apurada, pois do contrário não pode ser tido como
bom juiz, já que ele também exerce a tentativa de conciliação – é de se presumir
que uma pessoa com este fim único – conciliar – torne-se expert, desenvolva essa
habilidade, tratada ora como arte ora como ciência. Por óbvio, contudo, que a arte
de conciliar não se resume a conjugar habilidades no encaminhamento de ques-
tões de cunho econômico. Requer, mais do que nunca, sensibilidade no campo da
sociologia e da psicologia. Embora as questões levadas tenham um fundo patri-
monial, o caminho da conciliação não passa apenas por esse aspecto.
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Sujeitos e princípios processuais nos Juizados Especiais Cíveis
O juiz leigo
Dentro do espírito de divisão de trabalho que preside o juizado, há previsão
legal quanto à condução do processo por juiz leigo. Juiz leigo é a denominação
atribuída àquele que exerce as funções primaciais de conduzir o processo – princi-
palmente na atividade de sanear, instruir e decidir – sem estar investido na função
jurisdicional.7 Como dito, o exercício da função jurisdicional é prerrogativa do juiz
togado, investido para fazer atuar esse poder do Estado e cercado de garantias de
independência e de imparcialidade.8
7
É recrutado entre os advogados com mais de cinco anos de exercício profissional, na dicção do artigo 7.º da Lei 9.099/95.
8
Embora sejam auxiliares da justiça, a exemplo dos conciliadores, os juízes leigos, para que possam exercer sua função com isen-
ção, não podem advogar nos Juizados Especiais em que exercem o munus de juiz leigo (Lei 9.099/95, art. 7.º, parágrafo único).
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Sujeitos e princípios processuais nos Juizados Especiais Cíveis
agem em nome do Estado. O primeiro, entretanto, por não ter investidura, sub-
mete sua decisão ao juiz togado para homologação, pois só este último é veículo
de manifestação do poder estatal pautado na definitividade e inevitabilidade,
atributos da jurisdição.
Sob o aspecto dos poderes no processo, portanto, o juiz leigo só tem subtraído
o poder de dar imperatividade à sua decisão; no mais, sempre sob a óptica dos
atos no processo, é juiz.
9
Lei 9.099/95, artigo 24, parágrafo 2.º.
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Sujeitos e princípios processuais nos Juizados Especiais Cíveis
Por outro lado, proibidos de figurar, seja no polo ativo ou no polo passivo da
relação jurídica processual são, nos termos do artigo 8.º da Lei 9.099/95, o preso,
as pessoas de direito público, as empresas públicas da União10, a massa falida e o
insolvente civil.
Por último, cumpre observar que o Ministério Público pode intervir no pro-
cesso quando se tratar de interesses de réu incapaz.
10
No polo passivo, o cenário sofreu mudança com a Lei 10.259/2001, que dispõe sobre a instituição dos Juizados Especiais
Cíveis e Criminais no âmbito da Justiça Federal.
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Institutos processuais
nos Juizados Especiais Cíveis
Jurisdição e competência
O primeiro ponto envolvendo a competência nos Juizados Especiais Cíveis
tem a ver com a facultatividade. O exercício de direito de ação é facultativo
para o autor no âmbito dessa forma de justiça. O autor cidadão1 pode optar
entre ajuizar uma demanda perante a justiça tradicional ou perante os Juiza-
dos Especiais. Mas a determinação da competência envolve uma conjugação
de critérios e fatores.
1
Como, em regra, a pessoa jurídica não pode ser autora no âmbito dos juizados, podem ser autores a microempresa e o
condomínio residencial. Mesmo este último para a cobrança de verbas relacionadas à razão de ele existir.
Institutos processuais nos Juizados Especiais Cíveis
2
Além disso, dispõe o artigo 8.º da Lei 9.099/95:
Art. 8.º Não poderão ser partes, no processo instituído por esta Lei, o incapaz, o preso, as pessoas jurídicas de direito público, as
empresas públicas da União, a massa falida e o insolvente civil.
§1.º Somente serão admitidas a propor ação perante o Juizado Especial:
I - as pessoas físicas capazes, excluídos os cessionários de direito de pessoas jurídicas;
II - as microempresas, assim definidas pela Lei no 9.841, de 5 de outubro de 1999;
III - as pessoas jurídicas qualificadas como Organização da Sociedade Civil de Interesse Público, nos termos da Lei no 9.790, de
23 de março de 1999;
IV - as sociedades de crédito ao microempreendedor, nos termos do art. 1º da Lei nº 10.194, de 14 de fevereiro de 2001.
§2.º O maior de dezoito anos poderá ser autor, independentemente de assistência, inclusive para afins de conciliação.
3
Lei 9.099/95, artigo 3.º, parágrafo 2.º:
Art. 3.º [...]
§2.º Ficam excluídas da competência do Juizado Especial as causas de natureza alimentar, falimentar, fiscal e de interesse da
Fazenda Pública, e também as relativas a acidentes de trabalho, a resíduos e ao estado e capacidade das pessoas, ainda que de
cunho patrimonial.
4
É sempre bom lembrar que, mesmo neste âmbito, existe a Lei 10.259/2001, instituidora dos Juizados Especiais Cíveis Federais,
que traz algumas exceções a esta regra geral.
32
Institutos processuais nos Juizados Especiais Cíveis
procedimento, já que algo que só pode ser buscado por procedimento especial,
em regra, não tem como tramitar no Juizado Especial.
Competência de foro
No processo tradicional, competente é o foro do domicílio do réu. Essa é a
regra geral também com aplicação no âmbito dos Juizados Especiais Cíveis (Lei
9.099/95, art. 4.º). Porém, ao lado dessa regra ampla, o autor, a seu critério, pode
também ajuizar sua demanda no local em que o réu exerça atividades profissio-
nais ou econômicas, ou mantenha estabelecimento, filial, agência, sucursal ou
escritório. Essa regra facilitadora para o demandante demonstra a real intenção
da lei de evitar que exista uma barreira para que as causas cheguem aos juiza-
dos, pondo em equivalência tanto o domicílio do réu como também um local em
que ele exerça suas atividades, ainda que não principais.
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Institutos processuais nos Juizados Especiais Cíveis
Por outro lado, o imperativo de celeridade fez com que o juizado impusesse a
extinção do processo sem julgamento de mérito no caso de incompetência absoluta
ou relativa. De fato, reconhecida a incompetência territorial ou a incompetência
absoluta, não há a remessa dos autos ao juízo competente.
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Institutos processuais nos Juizados Especiais Cíveis
simplicidade;
hipóteses nas quais o polo ativo movimenta a jurisdição por meio daquele
que tem capacidade postulatória, o advogado, um técnico, portanto, que
deverá observar os requisitos mínimos do modelo que opera.
A postura do ente estatal frente a essas duas situações distintas deve ser igual-
mente diversa. Não se pode ignorar esse aspecto fundamental, que diz respeito ao
Princípio da igualdade, notadamente à paridade de armas, o qual pode comprome-
ter aquilo que se aguarda da prestação jurisdicional e frustrar o jurisdicionado.
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Institutos processuais nos Juizados Especiais Cíveis
Quanto ao pedido em si, ele pode ser oral ou escrito. Desde que não seja pos-
sível determinar, desde logo, a extensão da obrigação, é possível formular pedido
genérico (Lei 9.099/95, art. 14, §2.º), mas a sentença que o apreciar deve ser,
necessariamente, líquida (art. 38, parágrafo único). Nada impede que haja pedido
alternativo ou cumulação de pedidos, desde que os assuntos sejam conexos (art.
15), já que o limite apenas diz respeito ao valor dos quarenta salários mínimos
(art. 39) naquelas hipóteses em que a lei prevê.
O pedido contraposto pode ser apresentado até mesmo por pessoa jurídica ré
e deverá estar fundado nos mesmos fatos que constituem o objeto da controvér-
sia (Lei 9.099/95, art. 31).
Pressupostos de admissibilidade
do provimento jurisdicional
As condições da ação, os pressupostos processuais e os pressupostos de regu-
laridade de procedimento são modernamente agrupados sob a denominação de
pressupostos de admissibilidade do provimento jurisdicional, já que todos consti-
tuem preliminares à análise do mérito.
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Institutos processuais nos Juizados Especiais Cíveis
Aquele que requer a tutela, portanto, seja perante o processo clássico, seja
perante o processo do juizado, tem plena convicção na apreciação do meritum
causae, pois ninguém apresenta demanda por puro exercício teorético. Assim, a
verificação da ausência de um pressuposto de admissibilidade do provimento juris-
dicional é motivo de frustração, já que o impasse da vida, com a decretação de
extinção do processo sem julgamento de mérito, permanece.
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Institutos processuais nos Juizados Especiais Cíveis
Processo e procedimento
O procedimento é o desenho determinado pela lei para a prática dos atos
processuais. Ele deve ser respeitado pelo julgador, pois assim é transmitida às
partes a segurança necessária do que cada uma deve esperar do desenrolar do
processo.
Nos Juizados Especiais Cíveis, a concentração dos atos não admite que as
questões decididas em audiência fiquem cobertas pela preclusão, pois em tais
hipóteses, ainda que a audiência seja cindida no tempo, deve ser lembrado que
ela é um ato complexo, de modo que a questão decidida poderá ser atacada no
bojo do recurso que for interposto contra a sentença que fatalmente virá.
39
Aspectos procedimentais
nos Juizados Especiais Cíveis
1
Nesse sentido, Dinamarco (2001b, p. 143). Ao tempo da lei das Pequenas Causas, Lauria Tucci (1985, p.189) era da opinião
que a concentração deveria ser a regra, com a realização, se o caso, de uma sessão de conciliação, instrução e julgamento.
Aspectos procedimentais nos Juizados Especiais Cíveis
Por outro lado, não raras vezes, a causa não reclama prova além da documen-
tal. Assim, frustrada a tentativa de conciliação, o processo reúne elementos para
o pronto julgamento, depois de ouvido o réu e ele ter apresentado sua resposta.
É fundamental, contudo, que o juizado tenha uma linha de comportamento, pois
se a concentração sugerida pelo texto legal for eventualmente seguida, ela deve
ser, na prática, cercada de cuidados, com as advertências às partes de quais serão
os atos possíveis de ocorrer se infrutífera a conciliação, seja para que tragam suas
testemunhas, seja para o réu providenciar sua resposta, enfim, para que ambos os
polos se preparem para a instrução e julgamento.
Antes da instrução, a causa passa por uma discussão, momento em que a res-
posta será apresentada. É verdade que a resposta pode comportar, além da defesa,
a apresentação de pedido contraposto, o que pode exigir a redesignação de nova
audiência para respondê-lo. Por outro lado, todos são responsáveis pelo pronto
desfecho da demanda, já que em tais situações a parte e o seu advogado devem
aquilatar se têm condições de responder ao pedido contraposto na mesma audi-
ência ou necessitam de uma nova. E essa sinceridade de propósito e verdadeira
concitação à pronta solução do impasse é que estão compreendidas na exigida
mudança de mentalidade das partes, para que não haja adiamentos desnecessá-
rios, o que igualmente exige a atenção do julgador para que, sem violar o contra-
ditório, coíba ele abusos.
42
Aspectos procedimentais nos Juizados Especiais Cíveis
43
Aspectos procedimentais nos Juizados Especiais Cíveis
2
Esse diálogo preconizado fez com que Jorge Alberto Quadros de Carvalho Silva (1999, p. 86), afirmasse, por força de expressão:
“É quase uma cross examination (instituto de direito anglo-saxão) feita pelo juiz de direito, que, afinal, é o destinatário da prova.”
3
“O que cada uma delas houver dito, inclusive confessando durante a fase conciliatória ou em qualquer outro momento, ficará
registrado em fita magnética (art. 1.º, §3.º) e, na medida em que influenciarem na formação do convencimento do juiz, essas
declarações serão referidas na sentença que for proferida.” É o que anota Dinamarco (2001b, p. 153).
44
Aspectos procedimentais nos Juizados Especiais Cíveis
Um aspecto que afeta esse meio de prova envolve o parecer técnico das partes.
Esse parecer técnico induz a pensar que ele virá sob a forma escrita, ao contrário
da inquirição do técnico de confiança do juízo em audiência. Entretanto, seria
inconcebível não admitir o parecer técnico oral. Assim, o técnico não pode ser
incluído no rol de testemunhas propriamente ditas da parte. A consequência
disso é que o limite de até três testemunhas a serem ouvidas no juizado por cada
parte, circunstância que restringe sobremaneira a prova testemunhal, se com-
parado com o processo tradicional, não deve levar em conta o depoimento do
técnico da parte para o cômputo deste limite.
45
Aspectos procedimentais nos Juizados Especiais Cíveis
46
Aspectos procedimentais nos Juizados Especiais Cíveis
4
Pela admissibilidade e a favor de sua solução perante o próprio Juizado Especial, Jorge Alberto Quadros de Carvalho Silva
(1999, p. 89-90). No mesmo sentido, Felippe Borring Rocha (2000, p. 133-134). O mesmo autor entende que o modo de arguição
não reclama peça separada.
47
Aspectos procedimentais nos Juizados Especiais Cíveis
A inspeção judicial
Tradicionalmente, a inspeção judicial é tratada como um meio de prova,
embora alguns não a vejam assim. No Processo Civil tradicional, ela pode ser pra-
ticada em qualquer fase do procedimento e pressupõe a verificação pessoal e
direta, icto oculi, de pessoas e coisas. A despeito de todas as vantagens que esse
contato sem intermediários propicia, não pode ficar sem nota o risco do envol-
vimento emocional e o quanto a percepção direta está sujeita a tromper les yeux.
Porém, no balanço, as vantagens preponderam, já que racionalmente utilizada, a
inspeção é economia de trabalho e tempo dentro do processo. Quebra ela com a
chamada oralidade protocolar.
Atividade saneadora
Até a audiência de instrução e julgamento, não há espaço nem oportunidade
para que o julgador tome alguma decisão interlocutória. Embora o julgador
possa vir a ser o conciliador e, no momento em que tenta aproximar as partes, ele
venha a indeferir o pedido inicial ou exigir alguma complementação, a verdade
é que o Juizado Especial Cível não está calcado nessa lógica. O pedido inicial
escrito, subscrito por advogado ou pelo próprio autor, assim como o oral, é apre-
sentado diretamente perante a Secretaria do Juizado e é ela a encarregada de
designar a sessão de conciliação (Lei 9.099/95, art. 14, caput e §3.º; e art. 16). Ou
seja, a primeira oportunidade do processo tradicional em que o julgador exerce a
atividade saneadora não existe no Juizado Especial Cível. Como tampouco existe
o saneamento nos moldes conhecidos pelo processo tradicional. Se no processo
tradicional, o saneamento, atividade do julgador de direção do processo em que
48
Aspectos procedimentais nos Juizados Especiais Cíveis
Desta forma, no Juizado Especial Cível não há o juízo positivo que declara o pro-
cesso livre de impurezas e apto a prosseguir com a colheita de prova e posterior
sentença. Esse contraste radical com o processo tradicional é compensado com
a extrema concentração concebida, de modo que o que não foi decidido recebe
a promessa de que logo será. Daí que, comumente, as questões envolvendo os
pressupostos de admissibilidade do provimento jurisdicional sejam analisadas no
momento decisório, depois da regular instrução. Essa afirmação precisa ser bem
compreendida: no processo tradicional, o órgão julgador tem o poder-dever de,
ao verificar a possibilidade de extinção do processo, decretá-la por sentença, sem
julgamento de mérito, por ausência de um pressuposto de admissibilidade do
provimento jurisdicional que foi o bastante para acarretar essa extinção.
Em relação à conciliação, não pode ficar sem nota que o ato autocompositivo e
bilateral da transação, maneira pela qual normalmente a conciliação se consubs-
tancia, recebeu um tratamento diferente no ordenamento processual brasileiro
ao longo dos anos. Para o Código de Processo Civil (CPC) de 1939, a transação era
motivo de cessação da instância (art. 206), ou seja, extinção do processo sem jul-
gamento de mérito. O que norteava tal raciocínio era o fato, ainda verdadeiro, de
que ao submeter uma transação para homologação, o julgador, a rigor, não está a
se pronunciar acerca do mérito da causa. Ou seja, não julga nem aprecia o pedido
inicial, isto é, não emite nenhum juízo no sentido de dizer a quem cabe razão.
ser tido como recurso meramente optativo no seio do juizado. Algum registro é
preciso haver e a gravação é o mais fiel e prático modo de fazê-lo.
Em essência, a coisa julgada material nos Juizados Especiais não destoa do que
ocorre no processo tradicional. É bem verdade que a ação rescisória é vedada no
primeiro, mas isso influi apenas no fato de a sentença soberanamente julgada
ocorrer de forma mais expedita.
51
Aspectos procedimentais nos Juizados Especiais Cíveis
Estrutura recursal
Quem se dispuser a analisar a estrutura recursal do processo tradicional terá
um guia seguro para isso. O artigo 496 do CPC elenca os principais recursos cabí-
veis no âmbito do Processo Civil, o que significa que os recursos ordinários e
extraordinários encontram-se arrolados no referido artigo de lei.
É preciso lembrar, contudo, que o rol do mencionado artigo não encerra nume-
rus clausus dos recursos cabíveis porque há recursos previstos em leis extravagan-
tes e diferentes regimentos internos.
No âmbito do Juizado Especial Cível não há um guia seguro como aquele ofer-
tado pelo artigo 496 do CPC. O modelo do juizado reclama um esforço interpre-
tativo e integrativo de maior envergadura, de modo que é equivocado operar
o Juizado Especial apenas com o recurso nele previsto. Mais uma vez, o desafio
é verificar quais os recursos que o processo tradicional oferece, que podem ter
aplicação no Juizado Especial Cível à luz dos princípios e critérios orientadores.
Na seara recursal, a posição apriorística, segundo a qual recurso não previsto pelo
Juizado Especial Cível não é cabível, deve ser abandonada. Isso não quer dizer, por
outro lado, que, na dúvida, um recurso do processo tradicional deva ser admitido
no juizado, pois isso implicaria em infestar o Juizado Especial Cível com o cancro
que se quer extirpar: a profusão de recursos no ordenamento Processual Civil bra-
sileiro.
Como linha de princípio, portanto, o Juizado Especial foi concebido para admi-
tir apenas um recurso, qual seja, aquele contra a sentença final.
Juizado Especial
e recurso contra a sentença
A fim de dar concretude ao princípio do duplo grau de jurisdição, o modelo do
Juizado Especial contemplou a possibilidade de interposição de recurso contra as
sentenças nele proferidas, a ser apreciado por uma turma recursal (Lei 9.099/95,
art. 41). Esse recurso, assimilável à figura do recurso de apelação do processo tra-
dicional, se diferenciaria deste último por se revestir de um caráter de juízo de
52
Aspectos procedimentais nos Juizados Especiais Cíveis
retratação, embora na prática esse traço possa ser pouco notado. O elemento que
indicaria esse caráter de juízo de retratação seria o fato de a turma recursal res-
ponsável pelo julgamento do recurso não ser propriamente um órgão ad quem,
mas sim do próprio juizado. De qualquer modo, o recurso inominado interposto
em face da sentença proferida pelo juízo do Juizado Especial prestigia sobrema-
neira a sentença proferida.
O preparo, por outro lado, é tema que transigiu com o tempo. Ao contrário do
processo tradicional, a parte recorrente tem o prazo de 48 horas depois de inter-
posto o recurso para apresentar a petição comprovadora do preparo (Lei 9.099/95,
art. 42, §1.º). É paradoxal essa disposição legal justamente por se distanciar do
esforço de concentração e celeridade. O processo tradicional, por exemplo, prevê
o preparo concomitantemente com a interposição do recurso. Paradoxal ainda
mais se se pensar a resistência que o Juizado Especial Cível apresenta em admitir
a complementação do preparo quando o recolhimento for insuficiente, em con-
traste com o que dispõe o artigo 511 e seus parágrafos do CPC.
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Aspectos procedimentais nos Juizados Especiais Cíveis
Juizado Especial
e recurso adesivo
No processo tradicional, ocorrida sucumbência recíproca e existindo recurso
da parte contrária conhecido, é viável a interposição de recurso adesivo. A admis-
são dessa forma, no regime do Juizado Especial, de interpor recurso, apesar do
silêncio do modelo a respeito, tem a ver com a razão de ser dessa forma de inter-
posição. Com efeito, assente que o duplo grau de jurisdição é princípio arraigado
em nosso direito processual; assente, ainda, que a parte pode ter acolhido apenas
parte daquilo que pediu; assente que aquele que não pretende se irresignar ante
uma sentença parcialmente desfavorável pode mudar de ideia em função do
comportamento da parte contrária, que venha a recorrer de parte da sentença
que atinge sua esfera jurídica; fácil concluir que o recurso adesivo, embora res-
salte o princípio da economia processual, milita contra a celeridade processual.
54
Aspectos procedimentais nos Juizados Especiais Cíveis
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Aspectos procedimentais nos Juizados Especiais Cíveis
Juizado Especial
e órgãos de superposição
O controle da matéria infraconstitucional e constitucional realizada por órgãos
de superposição é capítulo importante do sistema recursal brasileiro. Contudo,
aplicada ao Juizado Especial, a possibilidade desse duplo controle, vê-se que, de
fato, apenas a matéria constitucional resiste, já que a unificação da interpretação
da matéria infraconstitucional foi recusada pelo órgão encarregado a respeito, o
Superior Tribunal de Justiça (STJ).
O artigo 105, III, “a” e “c”, da CF, dispõe que é afeto ao STJ o julgamento de
recurso especial nas causas decididas, em única ou última instância, pelos Tri-
bunais Regionais Federais ou pelos tribunais dos Estados, do Distrito Federal e
Territórios, quando a decisão recorrida contrariar tratado ou lei federal, ou negar-
-lhes vigência; ou bem der à lei federal interpretação divergente da que lhe haja
atribuído outro tribunal.
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Aspectos procedimentais nos Juizados Especiais Cíveis
Seria compreensível que essa renúncia acontecesse na seara das causas afetas
ao Juizado Especial, se outro órgão ou mecanismo exercesse essa tarefa unifica-
dora que o STJ houve por bem não praticar. Nesse passo, há uma obra incon-
clusa, já que, no âmbito da Lei 9.099/95, não é exercido nenhum controle sobre
o entendimento a ser dado à matéria infraconstitucional. Ou seja, nem o STJ nem
nenhum outro órgão exerce esse controle. Tal situação deve-se, em parte, pelo
veto ao artigo 47 da Lei 9.099/95, o qual rezava que:
Art. 47. A lei local poderá instituir recurso de divergência desse julgamento ao Tribunal
de Alçada, onde houver, ou ao Tribunal de Justiça, sem efeito suspensivo, cabível quando
houver divergência com a jurisprudência do próprio Tribunal ou de outra turma de Juízes,
ou quando o valor do pedido julgado improcedente ou da condenação for superior a vinte
salários mínimos.
O risco de fazer viver esse dispositivo seria que, nessa hipótese, a demanda
seria julgada em última instância por um tribunal, viabilizando o recurso especial
porventura interposto a partir dessa decisão.
57
Aspectos procedimentais nos Juizados Especiais Cíveis
CF, o artigo 102 não menciona o termo tribunal para exigir o conhecimento de
recurso extraordinário interposto em face de decisão proferida por turma, câmara
ou colégio recursal de Juizado Especial. Com isso, irrelevante esses órgãos de
segundo grau do Juizado Especial constituírem tribunais ou não, já que basta
para o mandamento constitucional que a decisão recorrida tenha sido proferida
por última ou única instância.
Efetividade – a execução
do Juizado Especial Cível
Todo o esforço voltado à tutela plena pode esbarrar em obstáculo da reali-
dade ou em fatores internos do processo que emperram a atuação da função
jurisdicional. A respeito da última, as regras processuais podem avançar sobre-
maneira, pois se se chegou ao ponto de o exequente procurar o concurso da
força estatal para satisfazer o seu crédito, o Estado deve entregar a prestação
jurisdicional da forma coincidente, ou pelo menos mais próxima daquela que
o exequente receberia caso a obrigação fosse espontaneamente cumprida.
Modernamente, além de a execução ser o instrumento mais evidente a demons-
trar a capacidade de o processo alterar em concreto a vida das pessoas, de
forma a que sintam uma diferença entre o momento anterior ao ajuizamento
da demanda e o posterior, ressai também como fundamental o aspecto tempo,
já que se aguarda que a manifestação e atuação do Estado ocorram dentro de
um prazo razoável. É verdade que para isso as regras processuais lançarão mão
de procedimentos adequados às obrigações assumidas para que esta maior
coincidência, entre o modo de satisfazer a obrigação naturalmente e a forma
estatal para isso, ocorra. Essa orientação, por óbvio, é concebida nos moldes da
garantia constitucional do processo, já que nada autoriza que elas ocorram só
no processo de conhecimento. Elas incidem no processo executivo.
O que é importante ressaltar é que nem mesmo nessa fase processual o obje-
tivo de conciliar as partes foi abandonado. De modo que, opostos os embargos à
execução, a conciliação é tentada.
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Aspectos procedimentais nos Juizados Especiais Cíveis
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Juizados Especiais Cíveis Federais:
Lei 10.259/2001
1
A propósito, ver artigo 24, X, e artigo 98, I, da CF, bem como a liminar concedida na ADIn 127-DF, referente à Lei 8.906/94 (Esta-
tuto da OAB), que igualmente admite a distinção entre Juizados de Pequenas Causas e Juizados Especiais.
2
Como observa Geísa de Assis Rodrigues (1997, p. 21): “Se a regra é que uma causa de pequeno valor quase sempre é de redu-
zida complexidade, o inverso nem sempre é verdadeiro. Podendo-se concluir, então parcialmente, que as causas cíveis de menor
complexidade têm uma maior abrangência quando cotejadas com as pequenas causas.”
3
A única indicação sobre o tema diz respeito a pronunciamento de juristas, entre eles o próprio Presidente do Superior Tribunal
de Justiça (STJ), segundo o qual “95% do total das causas previdenciárias (relacionadas às aposentadorias e benefícios do setor
privado) alcançam até 60 salários mínimos e serão processadas pelos juizados” in: Notícias do Superior Tribunal de Justiça, de 17
de setembro de 2001. Disponível em: <www.stj.jus.br>.
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Juizados Especiais Cíveis Federais: Lei 10.259/2001
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Juizados Especiais Cíveis Federais: Lei 10.259/2001
4
Em seu caput, o artigo 3.º da Lei 10.259/2001 faz menção a causas, porém alguns de seus incisos mencionam “ações”, aprovei-
tando nomenclatura questionável do ponto de vista processual, mas de larga utilização pelo legislador, seja o do CPC seja da
legislação extravagante. Dispõe, assim, o parágrafo 1.º do artigo 3.º da Lei:
Art. 3.º [...]
§1.º Não se incluem na competência do Juizado Especial Cível as causas:
I - referidas no art. 109, incisos II, III e XI, da Constituição Federal, as ações de mandado de segurança, de desapropriação, de
divisão e demarcação, populares, execuções fiscais e por improbidade administrativa e as demandas sobre direitos ou interesses
difusos, coletivos ou individuais homogêneos;
II - sobre bens imóveis da União, autarquias e fundações públicas federais;
III - para a anulação ou cancelamento de ato administrativo federal, salvo o de natureza previdenciária e o de lançamento fiscal;
IV - que tenham como objeto a impugnação da pena de demissão imposta a servidores públicos civis ou de sanções disciplinares
aplicadas a militares.
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Juizados Especiais Cíveis Federais: Lei 10.259/2001
prova leva no modelo do juizado, poderá ser apresentado até cinco dias antes da
audiência. Enigmática é a menção a que o referido exame poderá ser designado,
seja para conciliação ou ao necessário julgamento da causa, fazendo presumir
que o momento de sua determinação, na primeira hipótese, é o do despacho ini-
cial, e na segunda hipótese, tão logo frustrada a conciliação.
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Juizados Especiais Cíveis Federais: Lei 10.259/2001
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Juizados Especiais Cíveis Federais: Lei 10.259/2001
Resta ainda dizer a respeito do segundo aspecto, qual seja a finalidade. Sim,
pois o dispositivo que prevê o exame técnico é o mesmo que prevê que ele será
necessário à conciliação ou julgamento da causa. Ora, se é certo que a concilia-
ção é o ato primeiro uma vez completada a angularização processual, mais um
motivo para que o exame técnico ocorra desde o início. E aqui a questão volta à
baila: ocorra por iniciativa do polo ativo ou do julgador. A não ser que o disposi-
tivo tenha feito referência à conciliação que o julgador pode encaminhar na pró-
pria audiência de instrução. É evidente que a conciliação deve ser buscada e ten-
tada a qualquer tempo, razão pela qual não há nenhum inconveniente se assim
for. Contudo, tal incerteza decorre da dubiedade do dispositivo que, repita-se,
enxertou a prova pericial no modelo do juizado quando ela, reconhecidamente
uma das responsáveis pela morosidade dos feitos, havia sido extirpada.
A Lei 9.099/95 admite que as intimações ocorram por qualquer meio idôneo,
o que inclui o meio eletrônico. Idôneo deve ser entendido como seguro e hábil a
atingir a finalidade a que se presta: dar ciência do conteúdo da ordem judicial.
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5
Vide, por todos, Barbosa Moreira, (1977) Sérgio Ferraz (1980, p. 38-43) e Nelson Nery Junior (1997, p. 45).
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Juizados Especiais Cíveis Federais: Lei 10.259/2001
Essa remessa obrigatória, que em sua raiz histórica justificava-se como freio
ao juiz inquisitorial do direito intermédio, penetrou no direito lusitano por uma
Lei de 1355 e foi adotada pelas Ordenações Afonsinas e repetida a orientação nas
posteriores, vindo a integrar o direito brasileiro por uma Lei de 1831. Adotado
pelo CPC de 1939 e tratado como se recurso fosse, foi mantido no CPC de 1973.
A conciliação e a transação
A concepção do Juizado Especial Cível Federal esmerou-se a autorizar, para
não inviabilizar o instituto da conciliação, os figurantes em ambos os polos da
demanda a conciliar, transigir e desistir (Lei 10.259/2001, art. 1.º).
6
Lucon (apud TUCCI, 1999, p. 119), com base em entendimento de Dinamarco, Privilégios do Estado em juízo, publicação do Con-
selho Superior de Orientação Jurídica e Legislativa da Fiesp, Fiesp/Ciesp, 1997, afirma que “O dia a dia forense tem demonstrado
que o maior fomentador dos litígios é o próprio Estado, que tem no mais das vezes se comportado como inimigo na voracidade
fiscal, no comportamento processual, muitas vezes eivado de má-fé, nos privilégios que a lei lhe confere em total violação ao
princípio da igualdade.”
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A forma, por se tratar de situação que envolve urgência, deve ser necessa-
riamente por instrumento, já que o modelo do Juizado Especial Cível adotou a
irrecorribilidade das interlocutórias e relegou toda discussão incidental para
a sentença. De modo que o recurso de agravo no modelo do Juizado Especial
Cível, como também a modalidade prevista para a esfera federal, tem como obje-
tivo evitar um dano, e não simplesmente afastar a preclusão. É preciso ver que a
preclusão não pode ter lugar no modelo do juizado, ainda que o procedimento
concentrado concebido seja desvirtuado. O agravo, nesse diapasão, visa remover
um prejuízo iminente ou presente que não pode aguardar o desfecho do pro-
cesso. Embora silente, o mesmo modelo federal deve admitir a tutela antecipada
por consistir em tutela de urgência. E, via de consequência, admitindo-a, admitir
ainda o recurso de agravo contra decisões que a apreciem. De fato, toda deci-
são cuja manutenção implicar dano irreparável ou de difícil reparação desafia o
recurso de agravo. O Juizado Especial não pode se afastar de sua vocação natural:
ser a justiça do cidadão que aguarda uma solução para aquilo que o fez procurar
o ente estatal. Se a solução conciliada fracassou e tudo aponta para a necessidade
de a jurisdição atuar pelo modo mais evidente e conhecido, indispensável que
o modelo conte com a tutela cautelar e tutela antecipada, tendo em vista o evi-
dente caráter instrumental de ambas.
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7
Sobre as peculiaridades de uma e outra posição, se tratará mais a frente.
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No segundo caso, bem como nos casos em que a interpretação de uma Turma
destoar de súmula ou entendimento predominante do Superior Tribunal de
Justiça (STJ), atribui a uma Turma de Uniformização a ser criada, integrada por
juízes das Turmas Recursais, sob a presidência do Coordenador da Justiça Federal
(Lei 10.259/2001, art. 14). Eventual discrepância entre o entendimento da Turma
de Uniformização e a posição adotada pelo STJ recebe também tratamento, de
modo que faculta que este último possa se pronunciar, dirimindo definitivamente
a divergência (Lei 10.259/2001, art. 14, §4.º).
Paralelamente a isso tudo, outro mecanismo sui generis foi introduzido: pedi-
dos de uniformização de conteúdo idêntico ao primeiro que forem levados a
apreciação ficarão suspensos até que o julgamento deste primeiro ocorra. As
partes desses respectivos pedidos subsequentes poderão se pronunciar no pri-
meiro, ainda que neste não sejam partes e, uma vez ele julgado, a decisão terá
repercussão nos demais pedidos de uniformização: se o entendimento preva-
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Juizados Especiais Cíveis Federais: Lei 10.259/2001
Em que pese o nomen iuris, a obrigação de pagar quantia certa deve ser tratada
como verdadeira ordem, já que o intento do modelo foi se desvencilhar de todos
os óbices que o requisitório traz ao Processo Civil tradicional. Neste, o precatório é
expedido pelo julgador da execução e por ele remetido ao Presidente do Tribunal
de Justiça do Estado ou do Tribunal Regional Federal (TRF), conforme o caso, para
que este solicite ao órgão do Executivo que proceda ao pagamento estampado
no documento. Assim, o não atendimento à solicitação do presidente do tribu-
nal competente que expede o requerimento encontra nas figuras do sequestro e
no pedido de intervenção os instrumentos mais utilizados para obter, seja direta-
mente (sequestro), seja por via oblíqua (intervenção), a satisfação do exequente.
8
Milton Flaks, (1980, p. 84 e seguintes).
9
Ricardo Perlingeiro Mendes da Silva (1999, p. 124) lembra, sob o regime do precatório: “Não é demais frisar que o sequestro
constitucional depende, exclusivamente, de preterição na ordem do pagamento. Nenhuma outra causa pode justificá-lo. Dessa
maneira, mantida a ordem de pagamento, a falta de recursos orçamentários ou insuficiência do depósito, por si sós, não ensejam
o sequestro.”
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Juizados Especiais Cíveis Federais: Lei 10.259/2001
ridade pública de não incluir verba específica do não pagamento em si. Escudado
em Vicente Greco Filho (1986, p. 91), as consequências para o primeiro caso são
penais, disciplinares e políticas. Assim, a medida satisfativa ou cautelar de seques-
tro10 encontrou no novel modelo do Juizado Especial Federal a possibilidade de
ele se efetivar em caso de desatendimento da requisição judicial. Essa orientação,
entretanto, só pode ganhar efetividade se acompanhada de uma leitura consen-
tânea com o intuito do modelo federal. Para isso, é preciso ter a requisição judicial
como verdadeiro comando, isto é, ordem judicial. Além da natureza jurisdicional
da determinação judicial, é preciso enxergá-la como provimento mandamental,
de modo que o eventual sequestro não iniba as outras consequências que o não
pagamento implica. Explica-se: se no regime do precatório, o momento da pre-
visão para pagamento distancia-se do efetivo cumprimento da obrigação; no
modelo instituído para as causas federais de pequena complexidade, previsão e
pagamento estão separados por sessenta dias, no máximo, o que dispensa ordem
cronológica. A requisição, isto é, a ordem, deve ser cumprida, e acaso desaten-
dida, o sequestro se impõe.
10
É ainda Ricardo Perlingeiro Mendes da Silva (1999, p.125-126) que arrola Barbosa Moreira e Araken de Assis como filiados ao
entendimento da natureza satisfativa do sequestro, no que é contrariado por Amílcar de Castro, Humberto Theodoro Júnior,
Willard de Castro Villar e Amaral Santos.
75
Referências
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2001b.
FUX, Luis. A ideologia dos Juizados Especiais. Revista de Processo, São Paulo,
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cessual (6.ª série). São Paulo: Saraiva, 1997.
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SILVA, Jorge Alberto Quadros de Carvalho. Lei dos Juizados Especiais Cíveis
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SILVA, Ricardo Perlingeiro Mendes da. Execução contra a Fazenda Pública. São
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78
Referências
79
Juizados Especiais
Juizados Especiais
Juizados Especiais
Marco Antônio G. L. Lorencini