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DIREITO INTERNACIONAL

Fontes: Mecanismos de Criação de Normas Jurídicas


Internacionais - Tratado
José Pina Delgado
Prof. Graduado de Teoria do Direito & Direito Público
• Plano de Exposição
1. Introdução Geral
2. O Conceito de Tratado
3. Princípios do DI dos Tratados
4. Instituições de DT no Quadro do Processo
Convencional
Introdução geral
• Uma das duas fontes mais antigas e importante do tratado,
contando com uma dupla-regulação convencional e costumeira no
Direito Internacional
• A convencional baseia-se essencialmente nas Convenções de Viena
de 1969 (116 partes, em vigor) e 1986 (ainda não entrou em vigor)
• CV não é parte da Convenção de Viena 69 ou 86, mas, pelo menos
em relação à primeira, há dois aspectos relevantes a ter em conta:
a) boa parte das normas da CVDT-69 são normas de Direito
Internacional Costumeiro codificadas, portanto, nesta medida,
vinculam os Estados; b) As autoridades cabo-verdianas, mesmo não
sendo parte, actuam nestas matérias utilizando-a como guia. A
Convenção em si aplica-se, em princípio, prospectivamente
• Possibilidade de ser classificado de diversas formas, das quais a
mais relevante para o entendimento do Direito Internacional é
entre tratados bilaterais (2 partes) e multilaterais (+ de 2p.).
Conceito de Tratado
• Pode ser discutido a partir do art. 38 (1) (a) e particularmente a partir do artigo 2º
das duas Convenções de Viena sobre Direito dos Tratados
• O primeiro deles não acrescenta muito, limitando a fazer menção a alguns tipos de
tratado (gerais=multilaterais abertos) e especiais (o classicamente chamado
tratado-contrato, em tese bilateral) e o modo de vinculação expressa exigida pelo
tratado (por oposição ao costume).
• Mais útil é o segundo dispositivo mencionado, o qual contém os principais
elementos que caracterizam o costume enquanto fonte do Direito Internacional.
Está redigido da seguinte forma: “Tratado» designa um acordo internacional
concluído por escrito entre Estados e regido pelo direito internacional, quer
esteja consignado num instrumento único, quer em dois ou mais instrumentos
conexos, e qualquer que seja a sua denominação particular (art. 2.1 (a), CVDT-
1969)
• Contempla, pois, os seguintes elementos:
-a) convergência de vontades, exigindo-se pelo menos duas;
-b) internacionalidade, entre sujeitos de DI ou com a sua cobertura;
-c) juridicidade, que significa que devem ser obrigatoriamente regidos pelo
DI;
d) irrelevância da forma, sendo que esta é livre, como se de um contrato se
tratasse. Assim, ela depende em última instância da vontade dos Estados
e) irrelevância da nomenclatura, decorrente da última. Os Estados podem
intitular os Tratados do que acharem mais conveniente. Vai ser o conteúdo
a definir o tratado – particulamente a sua regência pelo DI. O que pode
ocorrer é uma maior tendência a chamar certos tratados a partir de
determinadas expressões, mas disso não se pode derivar obrigações. São
os casos dos tratados constitutivos de OIs que, regra geral, assumem
nomes mais pomposos, como Carta; Acto Constitutivo; ou os Tratados
celebrados com o Vaticano, regra geral chamados de Concordatas
• A limitação do sujeito habilitado (subjectiva) não extrapola os efeitos da
própria Convenção de 1969. Aliás, a própria Convenção de 1986 foi criada
para abarcar os tratados em que pelo menos uma das partes fosse outro
sujeito de DI, as OIs e da 1969 reconhece que pode haver outros sujeitos
de DI inominados habilitados a celebrar tratados.
• O mesmo ocorre com outros dos elementos inseridos no conceito de
tratado da CVDTE. A materialidade (“escrito”) do Tratado não é uma
exigência de DI Geral. Pode haver perfeitamente tratados não escritos,
ainda que não sejam muito comuns em razão da sua reduzida capacidade
de definição das obrigações e da incerteza que podem suscitar. O art. 3ª
também não exclui a possibilidade de haver tratados não-escritos,
somente estabelece que estes não estão regidos pela CVDTE.
• Estes elementos permitem distinguir facilmente os tratados de outras figuras afins
que podem também resultar de um acordo de vontades entre os Estados.
a) Com os Memorandos de Entendimento (MDE), regra geral conhecidos pela sigla
inglesa MOU (Memorandum of Understanding) a distinção radica no elemento da
juridicidade, já que estes são celebrados por dois ou mais Estados como o
tratado, mas não estão subordinados pela vontade dos Estados ao DI; no fundo
são acordos políticos que somente criam pontes entre os Estados, mas não
obrigações no sentido jurídico.
- A distinção entre um T e um MOU só é possível se se analisar a linguagem
utilizada; a mera denominação pode ser enganosa.
b) Com os contratos, que também podem ser comuns entre os Estados,
particularmente por motivos de arrendamento, empréstimo, de fornecimento de
bens e serviços (por ex. por empresas públicas) a grande diferença radica na
internacionalidade. O contrato é, pela sua própria natureza regido pelo Di e o T
pelo Internacional.
c) Distinta de convenções de estabelecimento, que são celebradas com pessoas
colectivas estrangeiras
Princípios do DI dos Tratados
A – LIBERDADE CONVENCIONAL, que se desdobra nos seguintes aspectos:
1. Os Estados são livres para se vincularem ou não a tratados, mecanismo
de criação do Direito que exige que a vontade seja apresentada de forma
expressa, não podendo ser presumida;
2. A matéria objecto do tratado tb decorre da vontade autónoma das
partes, no sentido de que podem pactuar sobre tudo o que bem
entenderem e da forma como entenderem, com a ressalva de não
poderem violar normas imperativas sob pena de nulidade;
3. Como já se tinha visto o modo de o fazer também é livre, operando as
regras da CVDTE de modo subsidiário, ou seja, desde que não haja
estipulação diversa das partes.
Manifesta-se, designadamente, no facto de o tratado, para além de poder
ser oral, poder estar, como é comum, concentrado num único instrumento
ou por dois ou mais, desde que conexos.
Ter em atenção que a liberdade pode se auto-limitar sem que haja
qualquer causa de sua violação.
Princípios do Direito dos Tratados
B – PACTA SUNT-SERVANDA (Obrigatoriedade de cumprimento) – art 26 CVDT: “TODO
O TRATADO VINCULA AS PARTES E DEVE SER POR ELAS CUMPRIDO …”
Encontra-se limitado pelo princípio da pacta tertiis nec nocent nec prosunt, de
acordo com o qual um tratado não pode produzir efeitos em relação a terceiros
(34-38), portanto Estados que não manifestaram o seu consentimento, o princípio
da manifestação livre do consentimento (vale dizer que são excluídos da
obrigatoriedade de cumprimento os tratados em que à vontade (s) viciadas-42-
45) e, limitadamente, por cláusulas como a rebus sic standibus (62) ou a da
exceptio non adimplendi contractus (60).
C – BOA-FÉ (BONA FIDES), prevista na parte final do mesmo dispositivo, com o
seguinte recorte “TODO O TRATADO (…) DEVE SER (…) CUMPRIDO DE BOA FÉ”, a
qual ao contrário do que se pode acontecer no direito privado interno só começa
a operar depois da entrada em vigor do tratado, cabendo, antes disso, a cada uma
cuidar dos seus próprios interesses desde que não induza a outra a celebrar
tratado de forma fraudulenta. Adopta-se arguivelmente uma espécie limitada e
due dilligence do Direito Privado Anglo-Saxónico em que cada parte deve
acautelar-se quando contrata, não se colocando um dever pré-contratual de
esclarecimento a respeito das suas implicações.
Processo Convencional
• 1ª Fase: Celebração de Tratado – Negociação- aprovação/adopção-
autenticação-manifestação do consentimento/ reservas - vacatio legis-
entrada em vigor- representação/plenos poderes
A – NEGOCIAÇÃO - Por maioria de razão desregulada, estando todos os seus
momentos (local; procedimentos, etc.) livremente estabelecidos pelos
parceiros. Isso não significa, no entanto, que certas regras não tenham já
uma aplicação incidental desde este momento, nomeadamente as regras
sobre a boa-fé e as tratam dos vícios de consentimento.
qui pro quo – momento tipicamente político, em que cada parte, desde
que não induza a outra em erro (dolo)ou tolha a sua vontade pode tentar
tirar o maior partido possível do seu poder e do seu conhecimento sobre
uma determinada matéria
Culmina com um texto que é submetido a aprovação
Processo Convencional
B – APROVAÇÃO /ADOPÇÃO DO TEXTO (art. 8º) – Regra geral (para. 1): “A
adopção do texto de um tratado efectua-se por todos os Estados
participantes da sua elaboração”; Regra especial (para. 2): cobre
conferências internacionais, com as seguintes regras; a) qualquer maioria
que os Estados participantes por maioria de dois terços escolham; b)na
ausência de qualquer convenção em contrário, por maioria de 2/3.
Significa que podem baixar o quórum (por exemplo, metade) ou agravá-lo
(4/5).
Razão: Com o desenvolvimento do DI e com a expansão do sistema, o
mecanismo do consenso seria pouco operacional, particularmente para os
chamados tratados abertos, os quais poderiam sempre ser bloqueados
por uma minoria, mas também em certos tratados não protegeria as
minorias, as quais ficariam pressionadas pela adopção do tratado
C- Autenticação/certificação
• acto para garantir a correcção da versão final face ao que foi negociado a
fim de preparar os próximos actos.
• A CVDTE, como é habitual, permite que ela seja feita da forma como os
Estados escolherem (“O texto de um tratado é considerado como
autêntico e definitivo: a) segundo o procedimento nele previsto ou
acordado pelos Estados participantes na sua elaboração””).
• Limita-se, no entanto, a conter uma regra de aplicação supletiva, de
acordo com a qual (“Na falta de tal procedimento, pela a) assinatura; b)
assinatura ad referendum; c) rubrica.
• Algo que pode ser feito ou no próprio tratado ou numa acta caso se se
tratar de uma conferência internacional (Notar que neste caso essas
conferência normalmente agregam quase todos os Estados que fazem
parte da Comunidade Internacional e outras entidades)
D- Participação/Formas de manifestação de
consentimento

• - Nem sempre a participação de um Estado num tratado é possível. No


fundo, isso também depende dos próprios Estados promotores, havendo
aqui uma classificação útil e aplicável entre tratados abertos (permitem a
participação de qualquer Estado); fechado (não permite a participação de
mais Estados, podendo tanto ser bilateral – este naturalmente ou
multilateral); e semi-aberto (permite, mas condicionalmente,
nomeadamente por motivos de geográficos; culturais e outros).
• - Mesma lógica da autonomia/subsidiariedade, embora com uma
formulação invertida.
• O redator introduz primeiro as formas mais comuns de manifestação de
consentimento que historicamente se tem utilizado. São os casos da;
• a) assinatura (definitiva); b)troca de instrumentos constitutivos; c)
ratificação; d) aceitação; e)aprovação; f) adesão
• 2 Critérios fundamentais: previsão no tratado; previsão em outros documentos;
decorra da intenção dos contratantes expressa ou tácita.
a) Assinatura (12): simples; um acto
• por extenso; inicialização
b) Assinatura ad referendum: 2 actos (assinatura negociação; confirmação pelo
Estado de qualquer normas); não se justifica necessariamente por questões de
separação de poderes, mas por uma necessidade injustificada de confirmação pela
própria entidade a que pertence a autoridade que assina.
c) Troca de instrumentos: tratado disperso por mais de um instrumento; a troca
mútua dos instrumento aplica-se como critério na ausência de determinação
diversa.
d) Ratificação; aceitação; aprovação - Formas próximas, no sentido de que exigem
um duplo-acto de vinculação (assinatura +…), e a sua confirmação através de um
acto solene (Chefe de Estado) ou menos solene (outras autoridades do Estado); o
primeiro, mais comum, corresponde à ratificação; o segundo, como apresentado
pelo Glossário de tratados da ONU, a aceitação e a aprovação.
• 2. Acceptance and Approval
The instruments of "acceptance" or "approval" of a treaty have the same legal
effect as ratification and consequently express the consent of a state to be
bound by a treaty. In the practice of certain states acceptance and
approval have been used instead of ratification when, at a national level,
constitutional law does not require the treaty to be ratified by the head of
state. Glossary of terms relating to Treaty actions. UN
e) Adesão- Actualmente muito comum, corresponde aos casos em que o
Estado que não participou nas negociações e, logo, não se submeteu aos
procedimentos iniciais de vinculação – em regra a assinatura – pretende,
nos termos do tratado; passar a fazer parte do mesmo através de um acto
simples. Tem sido cada vez mais comum a utilização da figura nos casos
em que o tratado fixa um termo certo para ratificação. Os Estados que não
o fizerem como que apagam as vantagens de um eventual acto inicial e
passam a poder somente “aderir”
Reservas
• Conceito – art. 2º (“Designa uma declaração unilateral, qualquer que seja o seu
conteúdo ou a sua denominação, feita por um Estado quando assina, ratifica,
aceita ou aprova um tratado ou a ele adere, pelo qual visa excluir ou modificar o
efeito jurídico de certas disposições do tratado na sua aplicação a esse Estado”).
• Filosofia: regra da liberdade apor reservas (“Um Estado pode (…) formular uma
reserva, a menos que (…)”), com uma preponderância maior da protecção da
autonomia do que da integridade dos regimes jurídicos internacionais. No
entanto, esta norma geral está subordinada também à vontade das partes que
podem estipular solução diversa (por exemplo, proibição total de reservas)
• Admissibilidade – art. 19 – Regra da admissibilidade, com a excepção dos casos
em que haja:
• a) Proibição do Tratado. Geral (ETPI) ou particular ;
• b) Autorização do tratado não abranja os artigos em causa;
• c) A reserva seja incompatível com o objectivo e o fim do tratado
Reservas (Cont.)
• Efeitos
• Os efeitos da reserva são sempre de exclusão ou de modificação de uma
obrigação convencional de um Estado em relação a outro (s).
• - Quando for expressamente autorizada pelo tratado, a menos que previsto pelo
mesmo, não é necessário haver aceitação (20.1). A reserva opera erga omnes, não
se podendo a ela objectar.
• A questão da aceitação coloca-se quando o tratado não explicita a posição que
adopta em relação às reservas, permanecendo em silêncio em relação a elas. A
haver aceitação nestes casos, ela poderá ser expressa ou implícita, considerando-
se que a não formulação de objecções no prazo de doze meses a ela equivale
(20.5), com a excepção do caso do tratado constitutivo de OI (20.2), fazendo com
que ela opere em relação a esses Estados no sentido de que haverá modificação
recíproca de normas nas suas relações (21.2 e 3), salvaguardando-se, no entanto, a
aplicação das normas em relação a terceiros (21-3).
• Não sendo, há um quadro diferente, que o CVDTE tenta resolver, são os casos em
que não são expressamente autorizadas e um Estado objecta à sua formulação:
- Ocorre muitas vezes nos tratados que são silenciosos em relação às reservas em
que os demais contratantes tentam salvaguardar ou o fim e o objecto do tratado
ou as obrigações recíprocas que têm com o outro. Assim sendo, permite-se que
ele possa deduzir oposição à reserva chamada de Objecção
- Objecção- efeitos dependem da vontade do Estado objector, já que pode aceitar a
entrada em vigor, aplicando-se assim os efeitos normais da reserva apesar da sua
objecção; poderá impedir a entrada em vigor do tratado entre ambos, não se
aplicando a norma reservada, nem tão-pouco as outras.
Principal requisito da reserva, aceitação e objecção: forma escrita e comunicação aos
Estados contratantes e aqueles que pretendem ser partes (23. 1)
Vacatio legis -Entrada em vigor (art. 24)

• Tanto a vacatio legis quanto a entrada em vigor são determinados pelos


próprios contratantes, o que significa que pode ou não haver vacatio e o
mecanismos de entrada em vigor são livres. Apesar disso, da análise
comparada verifica-se que há uma tendência a cada vez mais tentar
garantir a estabilidade do tratado estipulando um número quantitativo ou
qualitativo de partes para entrar em vigor.
• Mais uma vez, a CVDTE limita-se a incluir uma regra supletiva para o caso
de os próprios Estados não estabelecerem regras próprias: Todos Estados
para o tratado em geral (para. 2) e, se o tratado já estiver em vigor, na
data da manifestação do consentimento para o Estado que se tornar parte
(para 3).
Representação/Plenos Poderes
Poderes gerais de representação do Estado:
• Chefe de Estado; Chefe de Governo; Ministros das Relações Exteriores -
Cobrem qualquer Estado; matéria ou acto
• Chefes de Missão Diplomáticas – Limitados subjectivamente (somente
para tratados entre o Estado acreditante e o Estado receptor), e em
relação aos actos (adopção do texto) mas não em relação à matéria e os
actos
• Representantes do Estado acreditados numa conferência
internacional/junto de uma organização internacional ou um dos seus
órgãos para a adopção do texto, que pressupõe negociação preliminar.
Plenos Poderes
Plenos poderes
São os casos da aplicação das regras sobre a representação do Estado, que
nos remetem à questão da representação e dos plenos poderes (plein
pouvouirs). A primeira questão emerge negativamente quando se
analisam os plenos poderes e a segunda positivamente.
Assim sendo, quando se diz no número 2 do artigo 7º da CVTDE que certas
entidades não precisam de plenos poderes, estão a dizer que podem
representar o Estado naturalmente (CE; CG; MRE; Ministros no geral –
prática internacional – e as restantes em situações limitadas).
• Para os outros, em princípio exige-se a apresentação dos plenos poderes:,
conceituados como:
• Um “documento emanado da autoridade competente de um Estado que
indica uma ou mais pessoas para representar o Estado na negociação, na
adopção ou na autenticação do texto de um tratado, para manifestar o
consentimento do Estado em ficar vinculado por um tratado ou para
praticar qualquer outro acto respeitante ao tratado” (art. 2. 1. d)).
• No entanto, em certas situações estes podem ser dispensados se “resulta
da prática dos Estados interessados, ou de outras circunstâncias, que
estes tinham a intenção de considerar essa pessoa como representante
do Estado para esses efeitos e de prescindir da apresentação de plenos
poderes.” (art. 7.1. (b))
Obrigações preliminares à entrada em vigor de
um tratado
Artigo 18 : “Um Estado deve abster-se de actos que privem um tratado do seu objecto ou do seu fim: a)
Quando assinou o tratado ou trocou os instrumentos constitutivos do tratado sob reserva de ratificação,
aceitação ou aprovação, enquanto não manifestar a sua intenção de não se tornar Parte no tratado; ou b)
Quando manifestou o seu consentimento em ficar vinculado pelo tratado, no período que precede a entrada
em vigor do tratado e com a condição de esta não ser indevidamente adiada.”
-Pretende, em certa medida, salvaguardar a boa-fé do Estado quando se
compromete com uma conduta internacional ainda que um tratado não lhe
vincule efectivamente, por um lado, e a confiança dos outros. Assim sendo,
ainda que um tratado não lhe seja aplicável ou porque não entrou em vigor
ou porque o Estado ainda não cumpriu todos os procedimentos internos
necessários à sua vinculação internacional ou ainda está a ponderar uma
vinculação efectiva.
-O Estado, no entanto, pode afastar esta obrigação: a) no primeiro caso,
pendência de ratificação, adesão ou aprovação enquanto não manifestar a
sua intenção de não se tornar Parte no tratado, b) no segundo, se na
pendência de entrar em vigor, tendo manifestado consentimento, ela for
indevidamente adiada
• Aplicação Provisória (25) – “Um tratado ou uma parte de um tratado aplica-se a título
provisório, antes da sua entrada em vigor: a) Se o próprio tratado assim o dispuser; ou b)
Se os Estados que tenham participado na negociação assim acordaram, de outro modo. 2 -
Salvo disposição do tratado ou acordo dos Estados que tenham participado na negociação
em contrário, a aplicação a título provisório de um tratado, ou de uma parte de um tratado
relativamente a um Estado cessa se este notificar os outros Estados, entre os quais o
tratado é aplicado provisoriamente, da sua intenção de não se tornar Parte no mesmo”.
• Lógica da liberdade convencional “(a) Se o próprio tratado assim o dispuser; ou b) Se os
Estados que tenham participado na negociação assim acordaram, de outro modo”
• Permite que Estados possam acelerar a produção de efeitos normativos do tratado ainda na
pendência da sua entrada em vigor, adiantando-se, por exemplo, a outros Estados ou até a
procedimentos internos. Nem sempre possível em todos os sistemas constitucionais, em
outros em que o procedimento interno é menos gravoso torna-se possível, transformando-os
em actos de confirmação.
• Facilita-se, como se vê da parte final, a cessação de efeitos do tratado nestes casos, no
entanto com causa especial de o Estado não ter intenção de se tornar parte do mesmo, o
que, em última instância, protege a boa-fé, a confiança dos outros Estados e a segurança
jurídica internacional
2. Fase da Aplicação
• - Aplicação Geral
• Aplicação no Tempo
• Aplicação no Espaço
Processo Convencional II (cont.)
Aplicação a Terceiros Estados:
- Decorrente do princípio da pacta tertiis (art. 34, Regra geral):
consentimento- preservação da vontade do Estado
- Obrigações (art. 35) – Intenção das partes do tratado; consentimento
expresso e por escrito do terceiro Estado
- Direito (art. 36) – Intenção das partes do tratado; Consentimento tácito –
respeito das condições para o exercício de direitos
- Revogação da obrigação (exige consentimento de todos os Estados) e de
direitos (art. 37 (2): a qualquer tempo pelo beneficiário (art. 36 (1); pelas
Partes do tratado a qualquer momento, a menos que se conclua que a sua
intenção era que fossem irrevogáveis (art. 37) (2).
• Orientações de Interpretação de Tratados (arts. 31-32).
Relativas, mas que privilegiam a interpretação objectivista (o que realmente está no
tratado) sobre qualquer interpretação subjectivista (intenção das partes). O símbolo
maior desta abordagem é a fórmula do artigo 31 (“de acordo com o seu sentido
comum”).
- Dito isto, no entanto, a regra básica de interpretação da CVDT admite que o
sentido normativo do tratado tenha que levar em conta o seu contexto (embora
este não deixe de remeter a factores positivados fora do tratado como acordos
paralelo ou posterior, outros acordos e mesmo a prática dos Estados relativamente
ao tratado.
- , bem como o seu objecto, o que, no fundo, afasta a ideia de uma interpretação
literal e isolada dos artigos, mas admite, antes, a interpretação sistemática e a
teleológica
• Meios complementares de interpretação (art. 32) (interpretação
histórica: trabalhos preparatórios e circunstâncias em que foi celebrado o
tratado, podem ser utilizados se a utilização dos meios principais de
interpretação levarem a um sentido ambíguo ou obscuro ou conduza a
resultado manifestamente absurdo ou incoerente. Apesar de ter sido
compreensível esta opção da Convenção de Viena, na verdade o valor que
a prática estadual atribui por exemplo aos trabalhos preparatórios é
claramente maior do que o que lhe foi reservado pela CVDTE
• Interpretação de tratados em duas ou mais línguas: (art. 33)
- Liberdade convencional
- Regras supletivas: fé de todas as versões; não-presunção de autenticidade
de tratado em língua não autenticada; presunção de sentido uniforme;
regra da conciliação de sentidos no caso de não superação de diferenças
Processo Convencional III – Alteração de
Obrigações Convencionais Internacionais
A - Alteração de Normas Convencionais
1. Revisão – Parte do texto (emendas) e caracterizada por envolver todos
os Estados que fazem parte de um tratado, pelo que faz decorrer um
dever de notificação de qualquer proposta e um direito de participação
(tanto nas negociações, quanto do próprio tratado) (art. 40 (2); isso se o
tratado não dispuser em contrário (por exemplo, um tratado pode
conter regra a não permitir a sua revisão ou a prever regras diferentes
das do artigo 40.
Efeitos da revisão: na lógica que preside ao DT somente aos Estados que se
tornam partes da versão revista do Tratado; para as outras, a versão da qual
fazem parte é que lhes vincula (art. 40 (3).
Estado que entra depois da entrada em vigor de versão revista do tratado
(art. 40 (5))
2. Modificação (art. 41): envolve somente algumas das partes do
tratado: permissibilidade mais limitada, destinada a preservar,
na medida do possível a integridade e o núcleo essencial do
tratado, ao mesmo tempo em que preserva a liberdade do
Estado criar regimes particulares com os seus congéneres.
- Condições: a) previsão no tratado ou; b) não proibição, desde
que não prejudique o gozo por terceiros dos seus direitos ou
lhe dificulte o cumprimento das suas obrigações e não diga
respeito a uma disposição cuja derrogação seja incompatível
com a realização do objecto e do fim do tratado no seu todo.
- Dever de informação (41 (2)
3. Substituição (Alteração integral) (art. 59): tratado posterior
sobre a mesma matéria com as mesmas partes; intenção das
mesmas em que o tratado deixe de produzir efeitos ou que esse
efeito resulte da incompatibilidade de aplicação dos dois
tratados (59-1)
- Na realidade, formalmente o tratado anterior deixa de existir
(perde validade), mas materialmente projecta-se com as
alterações necessárias no outro tratado que lhe sucede.
B – Cessação Geral ou Especial da
Vigência de Tratados
• A geral diz respeito à perda de validade do Tratado e a especial aos casos
em que o Tratado deixa de vincular um Estado, mas contínua a vigorar
Geral: 1. Caducidade (54= (termo certo: temporal; cumprimento do seu fim
ou do seu objecto); Consentimento geral.
2. Especial/mistas: A. Invocação de vícios de consentimento
a) Erro (48): Facto ou situação que o Estado supunha existir no momento em que o
tratado foi concluído + base essencial do consentimento do Estado. Possibilidade
de utilização muito excepcional em razão da mencionada due dilligence que o
Estado deve ter com os seus próprios interesses e que é representado pelo
número 1 quando salienta que não se aplica quando o referido Estado contribuiu
para o erro ou se as circunstâncias forem tais que ele devia ter-se apercebido do
erro
b) Dolo ou Fraude (49) – Depende de um acto externo de indução, que retroage ao
momento da negociação do tratado
c) Corrupção Representante do Estado (50): pode ser directa ou indirecta e poderá
recair sobre qualquer contra-partida que seja dada como condição para a
execução de um acto de vinculação. Em CV constitui tb crime.
• Casos de Anulação
• d) Coacção sobre o representante do Estado/Estado (50/51): Efectiva ou
por ameaça
• e) Incompatibilidade com norma de jus cogens (53, 1ª parte): em razão
da força hierárquica superior deste tipo de norma
• B - Consentimento geral (art. 54)
• C - Denúncia ou retirada (56): possibilidade limitada que só pode ocorrer
nos casos em que ou esteja previsto no próprio tratado ou tal conclusão
possa decorrer da sua natureza., terminologia que sempre pode suscitar
polémica no caso concreto. No entanto, sabe-se que, por exemplo,
normalmente um tratado de cooperação pela sua natureza permitiria
denúncia, diferentemente de um tratado de delimitação fronteiriça ou,
menos consensualmente, de um tratado de direitos humanos; isso como
forma de garantir a segurança jurídica e os efeitos sobre ‘terceiros’., os
indivíduos (v. igualmente 60 (5))
D) Situações Especiais
a) Violação do tratado por um das partes (60) exceptio non adimplendi):
Possível em tratados bilaterais desde que haja uma violação substancial ; mais difícil
em tratados multilaterais porque requer uma articulação com as outras partes.
b) Impossibilidade superveniente de cumprimento (61), decorre das situações em
que o desaparecimento ou destruição de objecto indispensável ao cumprimento
do tratado pode permitir à parte fazer cessar a vigência ou pelo menos dele se
retirar. Perda de objecto: secamento de um rio/submersão de uma
Ilha/destruição de uma barragem
c) Alteração fundamental de circunstâncias (62): versão da CVDTE da antiga cláusula
rebus sic standibus, mas numa perspectiva claramente limitada, já que o próprio
dispositivo trata a sua invocabilidade como uma excepção a uma regra geral
negativa que só pode ser utilizada se: a) essas circunstância se tiverem
constituído em base essencial para o consentimento das partes em fazer parte
do tratado; e, b) a alteração em causa tiver por efeito a modificação radical da
natureza das obrigações assumidas
d) Superveniência de Normas Imperativas de Direito Internacional (63):

C- Suspensão de Aplicação: Previsão do tratado – liberdade convencional


a) Consentimento das partes (57);
b) Consentimento entre certas partes do tratado , desde que ou esteja
previsto no tratado ou não seja proibido e não prejudique o gozo de direitos
e a capacidade de cumprir as obrigações das outras partes e não seja
incompatível com o objecto e o fim do tratado (58)
c) Conclusão de tratado com as mesmas matérias e com as mesmas partes
desde que estabelecido no tratado (59 (2).
• Casos de violação substancial em tratado bilateral ou multilateral (60)
• Impossibilidade superveniente temporária de cumprimento (61)
• Alteração fundamental das circunstâncias (62)
PROCEDIMENTOS
-Dever de notificação (65 (1)
- Prazo de no mínimo três meses, salvo excepcional urgência (65 (2);
- 3 meses para os Estados objectarem ; se não o fizerem o Estado pode
tomar as medidas que propõem; caso haja objecção deve-se submeter a
questão a solução pacífica de controvérsias ou pelas demais vias previstas
(submissão ao TIJ casos a envolver normas de jus cogens ou conciliação
com a intermediação do SG)
- Depositário: Entidade opcional (liberdade convencional) para gerir os
aspectos administrativos do tratado. Pode ser um Estado (membro ou
não) ou uma OI.
Conflitos de normas de tratados
• Critério Hierárquico
• Casos de hierarquização geral – artigo 103 da ONU; art. 30 CVDTE
“No caso de conflito entre as obrigações dos membros das Nações Unidas em
virtude da presente Carta e as obrigações resultantes de qualquer outro
acordo internacional, prevalecerão as obrigações assumidas em virtude da
presente Carta” – “Sem prejuízo do art. 103 da Carta ….”
• Casos de hierarquização particular – decorrentes do princípio da liberdade
convencional- Direito Comunitário; Tratado-mãe – protocolo
- Critério Temporal – Artigo. 30 (Lex posterior derrogat lex anterior):
- “2 - Quando um tratado estabelece que está subordinado a um tratado anterior ou posterior ou que não deve ser
considerado incompatível com esse outro tratado, prevalecem as disposições deste último.
3 - Quando todas as Partes no tratado anterior são também Partes no tratado posterior, sem que o tratado anterior tenha
cessado de vigorar ou sem que a sua aplicação tenha sido suspensa nos termos do artigo 59.º, o tratado anterior só se aplica
na medida em que as suas disposições sejam compatíveis com as do tratado posterior.”

• Obrigações concorrentes paralelas: ambas são vinculativas


Relações entre Tratado/Costume
• Relações entre tratado e costume
• 1 - relações de coordenação
• Baseada na ideia de que sendo mecanismos diferentes de produção de
normas e cada um tendo as suas virtudes e defeitos, nomeadamente o
tratado, a dificuldade de universalização decorrente do modo de
vinculação dos Estados, porém maior claridade e completude do sistema,
e o costume, o carácter não escrito que lhe dificulta a criação de regime
normativos completos, com procedimentos, prazos, normas secundárias,
etc, mas facilidade de vinculação universal
• Assim sendo, conjugando-se conscientemente as duas fontes é possível
fortalecer o processo normativo internacional, criando quadros jurídicos a
um tempo completos e, na medida do possível, claros e completos.
Modalidades
de Coordenação
• Beneficia do efeito de projecção que o costume ao vincular um Estado
indirectamente a um tratado pode dar ao tratado e do efeito de
clarificação , completude e sistematização que o tratado pode conferir a
uma norma jurídica costumeira.
• – art38 “O disposto nos artigos 34 a 37 não obsta a que uma norma
enunciada num tratado se torne vinculativa para um terceiro Estado como
norma consuetudinária de DI, reconhecida como tal” e, conforme, o
artigo 43 “A nulidade, a cessação da vigência ou a denúncia de um
tratado, a retirada de uma das partes ou a sua suspensão da aplicação de
um tratado, quando decorram da presente Convenção ou das disposições
do Tratado, em nada afectam o dever de um Estado de cumprir todas as
obrigações enunciadas no tratado às quais estejam sujeitos por força do
Direito Internacional, independentemente desse tratado”.
• A – Tratado declaratório puro (categoria ideal) ou misto– torna mais claro
o regime jurídico costumeiro
• B- Tratado constitutivo sobre costume in statu naciendi – acelera a
criação da norma costumeira e permite que o tratado na prática passe a
abranger um número maior de Estados.
• C- Tratado constitutivo em situação de inexistência de prévia regulação
ou processo costumeiro- poderá atrair uma prática conforme, a qual, por
sua vez, poderá criar um regime jurídico costumeiro subsequente
• D- Tratado constitutivo em situação de prática divergente – tratado
poderá ser utilizado para ultrapassar as divergências, criando as condições
para a solidificação de um regime normativo unificado.
2- Relações de tensão

Tratado-Costume
- A - Tratado para bloquear ascensão de prática costumeira, atraindo prática
contrária
B – Tratado utilizado para alterar (revogar ou modificar) norma/regime jurídico
costumeiro fragilizando a adesão que suscita e levando ao seu desuso.
Costume – Tratado
A – Efeito de nulificação sobre norma de tratado , caso seja uma norma
costumeira de valor reforçado (art. 53) (“É nulo todo o tratado que, no momento
da sua conclusão, seja incompatível com uma norma imperativa de DI Geral”).
B – Efeito de revogação, no mesmo caso em situações de superveniência (art.
64):
“Se sobrevier uma nova norma imperativa de direito internacional, geral, qualquer
tratado existente que seja incompatível com essa norma torna-se nulo e cessa a
sua vigência”.
• C – Efeito de revogação de norma convencional pela emergência de
norma costumeira de valor ordinário desde que seja adoptada nos termos
do processo de elaboração de normas costumeiras.
• D - Efeito de modificação de norma convencional por norma costumeira
posterior é também, de certo modo reconhecido na teoria geral do direito
internacional costumeiro, como pelo facto de a interpretação das normas
convencionais também poder estar sujeito a uma prática posterior em que
os Estados acordem com a interpretação a dar a um tratado (art.31 (3) a)
Exemplos Carta das Nações Unidas art. 44 (não materialização da obrigação
de fornecimento de contingentes militares à ONU, art. 27 (voto afirmativo
passa a ser voto negativo)
• Próxima Aula:
- CNU – Cap. V e VII
- Princípios da CDI sobre Actos Unilaterais do
Estado
- - Artigo 38 (1) (c) e (d) e 2)

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