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PARECER JURÍDICO

Parecer n.º 00020221313

Requerente: Janaina Moreira


Ementa: Direito de Família. União Estável. Reconhecimento de União Estável.
Dissolução de União Estável. Casamento. Partilha de bens. Comunhão Parcial de
Bens. Alimentos.
RELATÓRIO
Trata-se de uma consulta requerida pela Sra. Janaína Moreira acerca da natureza
jurídica de seu relacionamento e os direitos que ela e sua filha, fruto deste
relacionamento, porventura tenham em face do Sr. Marivaldo Santana. Neste
ínterim, a requerente narra que manteve um relacionamento sem nenhum registro
público com o requerido, de 2004 a 2018, com bens imóveis adquiridos na
constância desse relacionamento, quais sejam: uma casa e um apartamento, bem
como cita que o mesmo recebeu uma herança quando da morte de um tio, no valor
de R$ 100.000,00 (cem mil reais). Relata também que residiam juntos e as famílias
tinham ciência da união, porém, em meados de 2010, quando o Sr. Marivaldo
informou que precisaria mudar para outra cidade para que tivesse boas
oportunidades de emprego e sugeriu que ela permanecesse na cidade de Camaçari
com o intuito de prestar cuidados à sua mãe já idosa e acometida por grave quadro
de demência, não mais foram vistos em público, nem mesmo para eventos mais
íntimos em família. Através do Sr. Marivaldo, teve conhecimento de que, em 2016,
ele constituíra negócio em outras cidades da região, motivo que justificaria suas
ausências e visitas cada vez mais espaçadas. Neste momento, Janaína descobriu
que ele havia constituído casamento com a Sra. Alessandra Nogueira e, diante
disso, realiza consulta com esta banca de advogados especialistas em Direito Civil
com o intuito de entender a sua situação jurídica diante do quanto relatado, bem
como explicita o seu desejo de rompimento da relação com o Sr. Marivaldo e o
receio por ser dependente financeiramente dele.
É o Relatório. Passa-se ao opinativo.
FUNDAMENTAÇÃO
Reconhecimento e Dissolução de União Estável
De acordo com o artigo 1.723 do Código Civil (CC): “É reconhecida como entidade
familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência
pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de
família.”
Pelo referido artigo, alguns elementos são essenciais para o reconhecimento desse
tipo de relação: publicidade, continuidade, estabilidade e objetivo de constituição de
família.
Conforme relato mencionado pela parte, é possível observar a presença de todos
esses requisitos na sua relação com o Sr. Marivaldo. Outros elementos acidentais,
como a presença de prole comum, grande tempo de convivência e coabitação
também estavam presentes.
Outrossim, mesmo sem a formalização através de título público, é possível, com
base nos elementos citados, caracterizar a relação apresentada como uma união
estável, com todas as implicações, inclusive patrimoniais, dela decorrentes.
O reconhecimento, no caso em tela, considerando a existência de menor e o melhor
interesse da criança, é possível apenas via ação judicial visando o reconhecimento
e dissolução da união estável em uma mesma ação, inclusive, para que sejam
atendidos os princípios da eficiência, celeridade e economia processual. Nesse
mesmo processo também poderão ser discutidos alimentos, bens, guarda e
convivência.
Prestação de Alimentos
Acerca de relações familiares, o Código Civil traz em seu bojo artigos que
sustentam as possibilidades de prestação de alimentos.
O artigo 1.724 declara que "as relações pessoais entre os companheiros
obedecerão aos deveres de lealdade, respeito e assistência, e de guarda, sustento
e educação dos filhos”. Neste sentido, entende-se a obrigação de prestar alimentos
como de responsabilidade mútua, cabendo a ambos os genitores e observado o
binômio possibilidade x necessidade - adequando a prestação à realidade fática.
No caso em tela, é possível que a genitora da menor, enquanto sua representante,
pleiteie alimentos em seu favor, comprovando os seus gastos efetivos. É importante
frisar que a prestação alimentar compreende gastos diversos, inclusive os
concernentes à dignidade da pessoa humana, como manutenção do estilo de vida.
Também diante da situação de dependência financeira relatada pela parte
requerente, há a possibilidade de enquadrá-la no artigo 1.694 do CC, que rege:
"
Podem os parentes, os cônjuges ou companheiros pedir uns aos outros os
alimentos de que necessitem para viver de modo compatível com a sua condição
social, inclusive para atender às necessidades de sua educação". Por decorrência
da dissolução da união estável entre a Sra. Janaína Moreira e o Sr. Marivaldo
Santana, a convivente terá direito à partilha dos bens comuns e também a alimentos
para o suprimento das suas necessidades, considerando que a mesma não tem
fonte de renda própria - cabendo ao requerido continuar suprindo-a, em atendimento
ao dever de mútua assistência previsto no artigo 1.566, III, do Código Civil e aos
princípios da dignidade da pessoa humana e da solidariedade social e familiar,
previstos nos artigos 1°, III, e 3° da Constituição Federal.
Em suma, partindo do pressuposto de que havia uma união estável entre a Sra.
Janaína e o Sr. Marivaldo, há o dever de assistência por parte do requerido, com o
objetivo de atender as necessidades e as mantenças da requerente.
Dissolução e Partilha de Bens
Com o desejo de dissolução da relação e das implicações legais de cunho
patrimonial que dela decorrem, faz-se necessário observar o regime de partilha de
bens que será adotado.
O Código Civil estabelece em seu artigo 1.725 que, se não houver disposição em
contrário, considera-se o regime de comunhão parcial de bens como padrão. Tendo
em vista que não houve a formalização da união estável através de título público e,
consequentemente, não houve a escolha do regime de bens pelas partes,
adotar-se-á a comunhão parcial para fins de partilha dos bens resultantes da
dissolução dessa união.
De acordo com esse regime de partilha, comunicam-se os bens que foram
constituídos pelos companheiros na constância do casamento por título oneroso,
mesmo que em nome de apenas uma das partes.
Conforme relatado pela requerente, foram constituídos como patrimônio do casal
durante esse período, uma casa e um apartamento. Esses bens foram adquiridos
anteriormente ao casamento de Marivaldo com Alessandra. Dessa forma, no
processo de meação, a Sra. Janaína teria direito à metade do valor correspondente
a esses imóveis.
Sobre a herança recebida pessoalmente por Marivaldo de seu tio, no valor de R$
1
00.000,00 (cem mil reais), não deve-se levar em consideração no processo de
partilha, em consonância com o artigo 1.659 inciso I do CC/02:
"
Artigo 1.659. Excluem-se da comunhão:
I - os bens que cada cônjuge possuir ao casar, e os que lhe sobrevierem, na
constância do casamento, por doação ou sucessão, e os sub-rogados em seu
lugar."
Demais bens adquiridos por Marivaldo após 2018, data do fim do relacionamento,
devem também ser excluídos do processo de partilha.
CONCLUSÃO
Diante do exposto, considera-se que a ação de reconhecimento e dissolução da
união estável entre os conviventes em questão será procedente, tendo em vista as
evidências da existência desse vínculo, assim como recomendamos a inclusão, na
mesma ação, dos pedidos de partilha dos bens adquiridos durante a união e da
fixação de alimentos em favor da filha e da convivente.
É o parecer.
Salvador/BA, 10 de maio de 2022.
Banca de Advogados: André Siqueira Vieira, Érika Laísia da Silva Maia, Joana
Fidelis da Paixão, Louise Miranda de Sena Veiga, Monique Fonseca da Silva, Rose
Leide Oliveira Dantas.

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