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recomendações

Atualização de Condutas em Pediatria


nº 71 Departamentos Científicos SPSP - gestão 2013-2016
Dezembro 2014

Departamento de
Otorrinolaringologia
Corpos
estranhos em
vias aéreas
Departamento de Infectologia
Coqueluche:
recomendações
atuais

Sociedade de Pediatria de São Paulo


Alameda Santos, 211, 5º andar
01419-000 São Paulo, SP
(11) 3284-9809
recomendações
Departamento de Infectologia

Coqueluche:
recomendações atuais

A coqueluche vem se
constituindo em
um grande proble-
ma de saúde pública em
todo o mundo, ganhando
Um fato conhecido é
que nem a infecção nem a
imunização levam a uma
imunidade permanente.
A ausência de reforços
destaque a partir de um imunitários leva a um au-
surto ocorrido na Califór- mento de casos na idade
nia, em 2010, com cerca de da adolescência e adultos
9.000 casos diagnosticados. jovens. Esse grupo apre-
Essa epidemia levou ao senta doença com poucos
óbito 10 lactentes, sendo a sintomas e passa a ser res-
maior notificação de casos, ponsável pela disseminação
repetindo-se em diversos da doença para a população
países do mundo, inclusive mais suscetível, que são os
no Brasil. lactentes jovens.
Autor:
Eitan N. Berezin Outro fator importante
DEPARTAMENTO DE
Porque aconteceu para a maior prevalência da
INFECTOLOGIA esse aumento doença em lactentes jovens
Gestão 2013-2016
em uma doença é a menor transmissão de
Presidente: imunoprevenível anticorpos por via transpla-
Silvia Regina Marques
Vice-presidente: As coberturas vacinais centária, em decorrência da
Helena Keico Sato contendo o componente queda dos níveis de anticor-
Secretário:
Irene Walter de Freitas pertussis aumentaram subs- pos na população de adultos
Membros:
Aída de Fátima T. B. Gouvêa,
tancialmente nas duas úl- jovens.
Calil Kairalla Farhat, Eduardo timas décadas, superando O ser humano é o único
Palandri, Eitan N. Berezin, Flavia
Jacqueline Almeida, Heloisa
80% em 2009; entretanto, hospedeiro da Bordetella per-
Helena de Souza Marques, Lily a coqueluche persiste como tussis. A bactéria é um pató-
Yin Weckx, Luiza Helena Falleiros
R. Carvalho, Marco Aurélio importante problema de geno específico de humanos
Palazzi Safadi, Maria Célia Cervi, saúde pública, ocorrendo e não sobrevive bem fora
Otávio Augusto Leite Cintra,
Regina Célia de M. Succi, Renato na forma endêmica e epidê- do hospedeiro. O contágio
de Ávila Kfouri, Rosely Miller mica, mesmo em países em ocorre através do contato
Bossolan, Sandra de O. Campos,
Saulo Duarte Passos, Seila Israel que as coberturas vacinais com gotículas respiratórias
do Prado, Sonia Regina Testa
da S.Ramos, Valter Pinho dos
no primeiro ano de vida são geradas por tosse ou espir-
Santos. superiores a 95%. ro de pessoas doentes, es-
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pecialmente na fase catarral 5.443 e, em 2013, o total de


e início da fase paroxística, casos notificados chegou a
nas primeiras três semanas 6.368.
do quadro, quando difi- Um fator preocupante
cilmente se faz a suspeita é o numero total de óbitos
diagnóstica. Até 80% dos que, no Brasil, chegou a 86
contactantes domiciliares em 2012 e 108 em 2013,
imunes adquirem a doença sendo a totalidade em lac-
decorrente da imunidade tentes com idade inferior a
evanescente. seis meses. O coeficiente de
Os irmãos mais velhos incidência em menores de
(incluindo os adolescentes) um ano no Estado de São
e os adultos apresentam Paulo em 2013 atingiu 195
formas mais leves e atípi- por 100.000 e o coeficien-
cas da doença e são pouco te de letalidade no Estado
diagnosticados. A doença de São Paulo em menores
nos adultos jovens, fre- de um ano atingiu 4,09 por
quentemente assintomática, 100.000, com um total de
é a mais importante fonte 39 mortes.
da infecção para os lacten-
tes jovens. Quadro clínico
O principal motivo de
Dados de hospitalização de bebês
frequência no com menos de seis meses de
Brasil idade é a pneumonia, mui-
Segundo os dados re- tas vezes acompanhada por
gistrados no Sistema Na- crises de apneia e hipóxia,
cional de Agravos de No- levando à necessidade de in-
tificação (SINAN), foram ternação em unidade de cui-
notificados e confirmados dados intensivos. Embora
no ano de 2010, no Brasil, as complicações sejam mais
um total de 605 casos de frequentes em lactentes in-
coqueluche. completamente vacinados,
Em 2011 observou- elas podem ocorrer em pes-
-se um importante aumen- soas de qualquer idade. Um
to, com um total de 2.248 achado de importância é a
episódios confirmados de leucocitose com linfocito-
coqueluche. Em 2012 esse se, podendo atingir número
número aumentou para bastante elevado, superior a
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30.000 células/mm3. Lem- neurológicas apresentam


brar que uma crise de apneia alto risco para doença grave.
em lactente jovem pode ser
um sinal de coqueluche. Principais sinais
de alarme para
Manuseio clínico quadros graves
Lactentes jovens com Os lactentes, cujos pa-
quadro de apneia ou tosse roxismos repetidamente le-
paroxística apresentam indi- vam a risco de morte, ape-
cação de hospitalização. sar da oferta de oxigênio ou
O quadro clínico da co- cuja fadiga resulta em hiper-
queluche no lactente é bas- capnia, requerem intubação
tante grave, necessitando e ventilação mecânica.
frequentemente de cuidados
de terapia intensiva. Lem- Exsanguíneo-
brar que recém-nascidos transfusão
prematuros, crianças com Alguns autores recente-
doenças de base cardíacas, mente têm sugerido transfu-
pulmonares, musculares ou são de substituição através

Tabela 1 - Fatores preditivos para o diagnóstico


de pertussis

Sintomas Outros Fatores que


Fatores predominantes fatores para o afastam
positivos em lactentes diagnóstico diagnóstico

Tosse como Apneia Imunização Febre


sintoma incompleta
predominante Choque Exantema e
Contato íntimo enantema
Assintomático Bradicardia com paciente
entre paroxismos com tosse Taquipneia, sibilos,
Crises de cianose estertores
Tosse paroxística Mais de 10
com guincho anos desde a Linfoadenopatia;
imunização neutrofilia;
Linfocitose neutropenia;
(células sem linfócitos com
atipias) atipias

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de exsanguíneo-transfusão Esquemas
em casos de extrema gravi- antimicrobianos
dade. Essa indicação deve terapêuticos e
ser reservada para os lac- quimioprofiláticos
tentes que apresentam um Todos os pacientes
número elevado de leucóci- diagnosticados e todos os
tos (valores maiores de 106/ contactantes domiciliares
mm3), em decorrência da devem receber antibiótico
síndrome de hiperviscosida- terapêutico ou profilático
de com possibilidade de de- até 21 dias após o início do
senvolvimento de trombos quadro.
leucocitoclásticos na vascu- A recomendação atual
latura pulmonar. do Ministério da Saúde é

Quadro 1 - Avaliação durante a


hospitalização

1 Acompanhar progressão da doença e


probabilidade de eventos que envolvam risco de
vida.

2 Prevenção e tratamento de complicações. As


frequências cardíaca e respiratória e a oximetria de
pulso devem ser continuamente monitoradas.

3 Os paroxismos típicos que não conferem risco de


vida têm as seguintes características: duração
inferior a 45 segundos; rubor, mas não cianose;
taquicardia, bradicardia (não inferior a 60
batimentos/min em lactentes), ou dessaturação
de oxigênio, que resolve espontaneamente ao
final do paroxismo; guincho ou esforço para
autorrecuperação ao final do paroxismo; rolha de
muco espontaneamente expectorada; e a exaustão
pós-tosse, mas ausência de perda de consciência.

4 Os registros detalhados da tosse e documentação


de alimentação, vômitos e alterações no peso
fornecem informações para avaliação da
gravidade.

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utilizar como droga prefe- anteriores, a eritromicina


rencial a azitromicina por pode ser utilizada na dose
maior facilidade de uso. de 40-50mg/kg dia, dividi-
O tratamento e a quimio- da em 4 doses, por 14 dias.
profilaxia tem os mesmos Lembrar que a eritromicina
esquemas terapêuticos. A não é recomendada em me-
terapêutica antimicrobiana nores de um mês pelo risco
tem como finalidade evitar de associação com estenose
a transmissão para os con- hipertrófica de piloro.
tactantes domiciliares e hos- Em caso de intolerância
pitalares. a macrolídeo utilizar Sulfa-
Em caso de indisponi- metazaxol-Trimetropin (SMZ-
bilidade dos medicamentos -TMP).

Tabela 2 - Monitoração das crises de tosse

Sinal Quadro moderado Quadro grave

Cor Rosado Cianótico

Taquicardia Resolução <30 Persiste


segundos após o fim
do paroxismo

Bradicardia (<60 em Resolução após o fim Persiste, necessita


lactentes <3 meses) do paroxismo sem estimulação
estimulação

Dessaturação Resolução <30 Persiste


(Sat O2< 90%) segundos após o fim
do paroxismo

Tampão mucoso Expectora sem auxílio Obstrutivo, requer


aspiração

Recuperação da Imediata Apneia


respiração

Guincho Forte Nenhum

Estado pós- paroxismo Exausta Sem resposta

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Imunização: Essa vacina está disponí-


vacina materna e vel no serviço público des-
profilaxia casulo de o final de 2014. Cabe ao
Novas abordagens têm pediatra reforçar a aplicação
sido introduzidas para a dessa vacina nas gestantes.
proteção particularmente As vacinas de células in-
do lactente jovem. Nesse teiras (DTPw) não são reco-
sentido, o Ministério da mendadas para indivíduos
Saúde recomenda a admi- maiores de sete anos, devi-
nistração da vacina trípli- do à sua alta reatogenicida-
ce acelular tipo adulto, de. As vacinas dTap (com-
preferencialmente após a binação de difteria adulto,
vigésima semana de ges- tétano e pertussis acelular)
tação, podendo ser admi- são seguras e efetivas e são
nistrada simultaneamente recomendadas para dose de
a outras vacinas indicadas reforço em crianças maio-
na gestação, tais como va- res, adolescentes e adultos.
cinas contra hepatite B e Essa vacina deverá ser utili-
influenza. zada nas gestantes.

Tabela 3 - Sinais de alarme que


indicam necessidade de unidade
de terapia intensiva

u Taquipneia - frequência respiratória acima de 60


respirações por minuto

u Frequência cardíaca acima de 120 batimentos/


minuto

u Contagem de leucócitos acima de 50.000


células/mm3

u Rápido aumento do número de leucócitos

u Hipóxia pós-paroxismos persistente

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Novas abordagens têm servir de fonte de infecção


sido introduzidas para a para o lactente jovem.
proteção particularmente A principal abordagem
do lactente jovem. no momento atual é a in-
A profilaxia casulo se clusão da vacina tríplice
constitui na imunização, acelular adulto na gestante.
além da mãe no puerpério, Essa abordagem tem como
de toda a família no mo- objetivo a passagem trans-
mento do nascimento de placentária de anticorpos
uma nova criança, com o maternos assegurando uma
objetivo de limitar o surgi- proteção ao RN ou lacten-
mento de um novo caso no te jovem. Tal conduta está
ambiente familiar que possa prestes a se iniciar no Brasil.

Tabela 4 - Doses de
Referências bibliográficas antimicrobianos
American Academy of Pediatrics.
Pertussis. Pickering LK, Baker CJ,
Kimberlain DW, Long SS editors.
In: 2012 Red Book: Report of the Idade Azitromicina Claritromicina
Committee on Infectious Diseases, Elk
Grove Village, IL, American Academy (1ª opção) (2ª opção) -
of Pediatrics.
não recomendado
Bamberger ES, Srugo I. What is
new in pertussis? Eur J Pediatr abaixo de 1 mês
2008;167(2):133-9.
Bisgard KM, Pascual FB, Ehresmann
CA et al. Infant pertussis who was < 6 meses 10mg/kg; 1 vez ao 7,5mg/kg; 2 vezes
the source. Pediatr Infect Dis J
2004;23(11):985-9. dia, durante 5 dias ao dia, durante 7
Berezin EN, Moraes JC, Leite D et al – preferido para dias
Sources of pertussis infection in young
babies from São Paulo state, Brazil Ped essa faixa etária
Infect Dis 2014 in press.
Cherry J. Epidemic Pertussis in
2012 - The Resurgence of a Vaccine- ≥ 6 meses 10mg/kg (máximo 7,5mg/kg; 2 vezes
Preventable Disease. N Engl J Med
2012;367(9):785-9. de 500mg); 1 ao dia, durante 7
Donoso A, Arriagada D, Cruces P, Díaz tomada no 1º dia dias
F. Coqueluche grave: Estado Del arte
Rev Chilena Infectol 2012;29(3):290- e, do 2º ao 5º dia,
306.
Edwards KM. Is pertussis a frequent
5mg/kg (máximo
cause of cough in adolescents and de 250mg), 1 vez
adults? Should routine pertussis
immunization be recommended? Clin ao dia
Infect Dis 2001;32:1698-9.
Brasil. Ministério da Saúde/SVS -
Sistema de Informação de Agravos de Adultos 500mg em 1 500mg; 2 vezes ao
Notificação - Sinan TabNet Linux 2_4
COQUELUCHE - Casos confirmados tomada no 1º dia dia, durante 7 dias
Notificados no Sistema de Informação
de Agravos de Notificação - Sinan.htm e, do 2º ao 5º dias,
[Acessado em 20-09-14]. 250mg, 1 vez ao
Carvalho LH, Berezin EM. Coqueluche.
Veronesi R, Focaccia R, editors. In: dia
Tratado de Infectologia. 4ª Edição. São
Paulo (SP): Editora Atheneu.
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