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Uma breve estória da Cabotagem em Lisarb

Os dois estavam há muito batendo nas portas dos vários Reinados, quase que desesperados pois sabiam
que cedo ou tarde algum outro interessado nos mapas chineses e nos rascunhos nórdicos em ossos de
baleias ou em chifres, pudesse convencer um investidor a montar uma frota e navegar para o Oeste,
tomando posse das terras além mares. O Reino Trasmontino e o Reino Basconiano disputavam a
hegemonia nos mares e viam, temerosos, a ascensão do reino Bretoniano nos últimos anos.

Finalmente, o Sr. Larbac obteve o apoio e financiamento dos Trasmontinos e o Sr. Ocirema dos
Basconianos. Alguns anos e muitas milhas náuticas depois, o mundo novo surgia, dividido entre áreas
Trasmontinas e Basconianas. Se não fosse a pequena diferença nas línguas, poder-se-ia dizer que o mundo
estaria unificado em uma só linguagem.

A frota de Larbac aportou em terras desconhecidas em 1500, batizando-a de Lisarb. Seu escriba anotou,
na agenda, um recado para o Rei Trasmontino, profeticamente apontando o destino de celeiro do mundo
para Lisarb:

“Nela, até agora, não pudemos saber que haja ouro, nem prata, nem coisa alguma de metal ou ferro; nem
lho vimos. Porém a terra em si é de muito bons ares, assim frios e temperados, como os de Entre Doiro e
Minho, porque neste tempo de agora os achávamos como os de lá. Águas são muitas; infindas. E em tal
maneira é graciosa que, querendo-a aproveitar, dar-se-á nela tudo, por bem das águas que tem.”

Obviamente que questões familiares, casamentos entre Príncipes e Princesas de diferentes reinados e
guerras, bagunçou um pouco a divisão das novas terras, quase um continente, em uma região abaixo do
equador. No final foi dividida entre os Trasmontinos e os Basconianos.

34 anos, e vários conchavos entre os amigos e parentes dos amigos do Rei, depois, a nova terra estava
dividida entre 14 áreas dadas de modo hereditário aos seus gestores (a influência dos amigos dos amigos
ficou enraizada na política Lisarbeira), chamadas de Sargentarias Hereditárias.

Esta divisão criou uma modalidade de transporte, chamada de Cabotagem, batizada assim em
homenagem ao amigo do Sr. Larbac, o Sr. Caboto. Cada Sargentaria possuía um porto e, como toda boa
gestão fiscal, a efetividade no recolhimento de impostos e tributos é fundamental para manter o padrão
de vida do Rei e de seus Súditos e amigos. O porto é local perfeito para recolher os tributos ao Rei (Cartas
de Foral), com alíquotas diferenciadas por NCM: 10% para o pescado, colheita, comércio exterior e
escravos, e de 20% para metais e pedras preciosas.

Por acaso do destino, o Herdeiro Trasmontino, Ordep I, fugiu para sua nova e maior terra, a Lisarb, e nela
desenvolveu um novo reino. Com ele, uma nova organização de Parentes e Amigos, e amigos dos amigos,
iniciou a administração do novo reinado.

Por sua vez, o transporte de Cabotagem era o único modal existente em Lisarb, fato que deixava o Ministro
dos Transporte chateado, já que as redes sociais o criticavam por não incentivar a concorrência com
outros modais e não deixar que navios estrangeiros participassem da logística nacional. A pressão
aumentava e navios de bandeiras estrangeiras navegavam em águas Lisarbeiras à vontade.
O Ministro vinha da Sargentaria Aihab, onde se dizia que, se uma pessoa não fosse afrodescendente era
prima – e tinha intimidade com o Rei Ordep I, sempre o chamada de “Meu Rei”. Era Meu Rei para cá, meu
Rei para lá. Seus primos na Aihab usam isto até os dias de hoje. Ele era ferrenho defensor da Cabotagem.

O Ministro consegui, em 1814, que o Ordep I proibisse os navios de bandeiras estrangeiras no transporte
de Cabotagem (renovado depois, em 1836).

Ordep I declara independência 1822 e promulga uma nova Constituição em 1824. Sob pressão das redes
sociais, principalmente da região de Sanim Siareg, perde o apoio dos Amigos e do Exército, abdicando em
favor do filho, Ordep II em 1831.

Como seu pai, Ordep II, passava muito mal no mar e jurou nunca mais pôr os pés em um navio. Ao invés
de ir para o litoral, gostava do campo e mandou construir a primeira estrada, em 1861, para ir de seu sítio
em Silopórtep para Ziuj ed Arof.

A pressão no Ministério dos Transportes estava cada vez maior. Os Blogueiros diziam que os produtos
nacionais eram mais caros que os importados devido aos fretes de cabotagem. A mídia pressionava e o
grupo de Amigos de Ordep II sugeriu que liberasse a Cabotagem ou ele perderia o apoio das Federações
do Comércio, da Indústria e dos Bancos. Claro que Ordep II cedeu e publicou um Decreto em 1866, abrindo
a Cabotagem aos navios estrangeiros, permitindo, também, que as empresas estrangeiras tivessem
acesso aos subsídios do Tesouro Nacional. Obviamente que houve um excesso de capacidade no mercado
e as empresas nacionais quebraram.

A Proclamação da República Lisarbeira, em 1889, encerrou a monarquia constitucional parlamentarista


do Império. O Rei Ordep II foi convidado a visitar seus parentes Trasmontinos e por lá ficar.

Cinco anos depois, em 1894, foi criada a 1ª Empresa de Navegação Lisarbeira, com a fusão do que sobrou
das empresas nacionais que não haviam quebrado e com a garantia de exclusividade da navegação para
navios Lisarbeiros, o Lloyd Lisarbeiro.

A Cabotagem continuou a ser o principal modal em Lisarb até o governo do Presidente Notgnihsaw Ziul,
cujo mote era “governar é construir estradas”, iniciando o ciclo rodoviarista e culminando nos anos de
1950, no governo de Onilecsuj Kehctsibuk, com a implantação da indústria automobilística. O modal
ferroviário era incipiente e a diferença de bitolas não possibilitava a integração ferroviária nacional.

As rodovias e ferrovias foram construídas paralelas à costa, integrando os grandes centros urbanos e
competindo diretamente com a Cabotagem. Simultaneamente, o comércio exterior Lisarbeiro crescia,
consumindo a infraestrutura portuária, que não era muito diferente da do século anterior.

Em 1960, foi criada a Superintendência Nacional da Marinha Mercante - Sunamam, com o objetivo de
fortalecer as políticas públicas de apoio à Marinha Mercante e à Indústria Naval Lisarbeira. Até o final da
década de 1970, empresas como Casimiro Filho, CBTG, CCN, Chaval, Conan, Frota Amazônica, Frota
Oceânica, H. Dantas, Mansur, Mercantil, Metalnave, Narsa, Navego, Netumar, Transnave e Tupinave,
entre outras, operavam na Cabotagem que crescia com o suporte do Fundo da Marinha Mercante - FMM.

A crise dos anos 80 e escândalos dos amigos dos amigos na SUNAMAM minaram os resultados da
Cabotagem (e dos estaleiros) que, combinados com a alta inflação e falta de infraestrutura portuária,
praticamente deixou de ser uma opção logística. O modal foi novamente extinto no governo do Presidente
Rolloc, quando aproximadamente 30 empresas deixaram de operar e as poucas que sobreviveram foram
adquiridas por empresas de capital estrangeiro.

Com o controle da inflação e início da melhoria da infraestrutura portuária, a Cabotagem poderia ressurgir
na logística nacional. Porém poucas empresas haviam sobrevivido e os navios de bandeira Lisarbeira
foram sucateados ou vendidos. As empresas de Cabotagem tiveram que reconquistar o mercado perdido
para o modal rodoviário e amargaram mais alguns anos de prejuízos.

Criaram-se algumas agências reguladoras dos modais Terrestre, Aéreo e Aquaviário, dando novo impulso
ao setor, mais regulado e com regras claras de atuação no mercado. Porém, a quantidade de empresas
continuou muito aquém da quantidade dos anos 70.

“O mundo gira e a Cabotagem navega”, cantava um Trovador parafraseando a Lusitana.

Lisarb tornou-se um país multicultural, desde os primeiros negociantes e caixeiros viajantes que chegaram
após Larbac - em sua maioria árabes ou judeus, até a imigração europeia para o sul e sudeste. Estes
últimos conquistaram às terras do Oir Ednarg od Lus com suas plantações de grãos e seus descendentes
as expandiram para o oeste e centro oeste. A previsão do Escriba estava correta, Lisarb era o celeiro do
mundo. Sendo celeiro, precisava movimentar os grãos para seus consumidores e a demanda por mais
infraestrutura terrestre e portuária cresceu exponencialmente. A Cabotagem ficou à margem deste
crescimento, cuja palavra técnica – agronegócio – é o maior gerador de investimentos em Lisarb.

Dos descendentes dos negociantes e caixeiros viajantes, um resolveu atuar na Cabotagem e estudou
bastante as regras da agência reguladora e conseguiu algumas balsas e um empurrador. Testou algumas
das regras, solicitando o transporte de contêineres em navios de longo curso e conseguiu autorizações,
pois era uma empresa Lisarbeira de Navegação autorizada pela agência reguladora. Tendo conseguido os
afretamentos por viagem, tornou-se um árduo defensor da liberalização da Cabotagem, pois poderia
apenas emitir os documentos de embarque sem necessitar investir em navios e na logística de
contêineres.

O Ministro dos Transportes, longevo no cargo e de vários governos, consciente do crescimento da


Cabotagem e dos investimentos feitos na infraestrutura de todos os modais, principalmente no ferroviário
e rodoviário, decidiu incentivar a Cabotagem e propôs um programa para tal - RB od RAM. O programa
possuía vários pontos de flexibilização do gerenciamento de capacidade e visava trazer novas empresas e
aumentar a quantidade de serviços para o crescente mercado.

As mídias sociais estavam divididas: “RB od RAM NÃO” e “Apoio o RB od RAM”. Os que eram contra
diziam que existia concentração no mercado (não diziam que indústrias de capital intensivo buscavam
economia de escala e a concentração era natural) e que cobravam fretes abusivos prejudicando os
consumidores Lisarbeiros (mas não diziam que o modal rodoviário era quem determinava os fretes). Os
que eram a favor, estavam quase silenciosos e não rebatiam os que eram contra.

Com o projeto enviado à Câmara dos Representantes do Povo Lisarbeiro, as discussões nas redes sociais
foram transformadas em pressão sobre cada representante e após 45 dias de debates e negociações, não
foi encontrado um acordo entre as partes e nada mudou na Cabotagem.
Foi triste, pois até hoje, cantam os trovadores, fala-se do passado e do presente em Lisarb, sendo o
presente um reflexo do futuro que nunca chega. Lisarb está presa em uma eterna repetição do hoje. Diz
a canção.... “O mundo gira e a Cabotagem roda”

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