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Capítulo 2.

Mercado de Trabalho e Desemprego1

2.1. Conceitos e Factos


2.2. Equilíbrio no Mercado de Trabalho
2.3. Desemprego Estrutural
2.4. Desemprego Friccional
2.5. Conclusão

2.1 Conceitos e Factos

Uma pessoa desempregada tem menor poder de compra, menor amor próprio, e, tende, em
geral, a perder qualificações. Estes efeitos são particularmente acentuados no caso do
desemprego de longa duração, ao qual está frequentemente associado um grande
sofrimento, da pessoa desempregada e da sua família.

A existência de desemprego significa que os recursos produtivos da economia não são


plenamente aproveitados. Produzem-se menos bens e serviços do que aqueles que seria
possível produzir, dados os recursos e a tecnologia existentes. Isto reflecte-se no bem-estar
das gerações presentes e futuras.

As pessoas empregadas também suportam os custos do desemprego, directa e


indirectamente. Os sistemas de segurança social transferem recursos para as pessoas
desempregadas (subsídio de desemprego). Além disso, uma maior taxa de desemprego
implica uma maior taxa de criminalidade, uma maior taxa de subsídio, e um maior nível
de tensão social.

1
Este texto de apoio (1E207 Macroeconomia II, FEP-UP, 2009-10) não dispensa a frequência das aulas e a
consulta da bibliografia recomendada. Fotografia: “Migrant Mother” de Dorothea Lange (EUA, 1936).
Comentários e sugestões: João Correia da Silva (joao@fep.up.pt).

1
Uma pessoa diz-se desempregada se, num período de referência, verificar
simultaneamente as seguintes condições:

i) não possuir emprego;

ii) procurar activamente emprego;

iii) estiver apta/disponível para trabalhar imediatamente.

A população activa (NS) é o conjunto das pessoas que, num período de referência,
manifestam disponibilidade para trabalhar, podendo estar empregados ou desempregados.

A população inactiva (Pop-NS) é o conjunto das pessoas que, num período de referência,
não estão empregadas nem desempregadas. Inclui crianças, estudantes, reformados, e
todos aqueles que não procuram emprego ou não estão aptos para trabalhar.

A taxa de actividade (NS/Pop) é o rácio entre a população activa e a população total.


Aumentou muito significativamente na segunda metade do século XX, com a entrada das
mulheres no mercado de trabalho.

A taxa de desemprego (u) é o rácio entre a população desempregada (U) e a população


activa (NS).

1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008
População Activa 5.096 5.136 5.226 5.325 5.408 5.460 5.488 5.545 5.587 5.618 5.625
Empregados 4.844 4.910 5.021 5.112 5.137 5.118 5.123 5.123 5.160 5.170 5.198
Desempregados 252 226 206 214 271 342 365 422 428 449 427
População Inactiva 5.033 5.031 4.997 4.969 4.958 4.985 5.021 5.018 4.999 4.986 4.998
População Total 10.129
0 10.167
0 10.223
0 10.294
0 10.366
0 10.445
0 10.509
0 10.563
0 10.586
0 10.604
0 10.623
0
Taxa de Actividade 50,3% 50,5% 51,1% 51,7% 52,2% 52,3% 52,2% 52,5% 52,8% 53,0% 53,0%
Taxa de Desemprego 4,9% 4,4% 3,9% 4,0% 5,0% 6,3% 6,7% 7,6% 7,7% 8,0% 7,6%
Fonte: Instituto Nacional de Estatística.

Tabela 2.1: Emprego, desemprego e inactividade em Portugal (1998-2008).

2
Nos últimos 10 anos, a população activa (tal como a população total) teve um aumento de
522 mil pessoas. Hoje temos mais 326 mil pessoas empregadas, e mais 197 mil
desempregados.

Emprego em Portugal (1998) Emprego em Portugal (2008)

47,8% 47,0% 48,9%


49,7%

Empregados
Desempregados
Inactivos
2,5% 4,0%

Figura 2.2: Emprego, desemprego e inactividade em Portugal (1998-2008). Fonte: INE.

Nos últimos 30 anos, a taxa de actividade aumentou dos 40% para os 53%. Parte deste
aumento resultou da entrada progressiva das mulheres no mercado de trabalho.

Actividade e Desemprego em Portugal (1955-2008)

60% 12%

50% 10%
taxa de desemprego
taxa de actividade

40% 8%

30% 6%

20% 4%

10% Taxa de Actividade 2%


Taxa de Desemprego
0% 0%
1955 1960 1965 1970 1975 1980 1985 1990 1995 2000 2005

Figura 2.3: Taxa de actividade e taxa de desemprego em Portugal (1955-2008).


Fonte: Banco de Portugal e Instituto Nacional de Estatística.

3
Grande parte da inactividade é devida ao facto de as pessoas em questão não estarem em
idade de trabalhar. Podemos ter interesse em ignorar esta inactividade puramente
demográfica, de forma a medir a inactividade que é originada por outros motivos,
associados à organização económica e ao funcionamento do mercado de trabalho.

Nesse sentido, pode considerar-se um universo mais restrito, a população em idade


activa, que é o conjunto de pessoas residentes, com idades compreendidas entre os 15 e os
64 anos.2

A taxa de emprego é a percentagem da população em idade activa que está empregada.

1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008
Pop. Residente 10.129 10.167 10.223 10.294 10.366 10.445 10.509 10.563 10.586 10.604 10.623
Homens 4.884 4.905 4.934 4.971 5.009 5.052 5.087 5.115 5.125 5.133 5.141
Mulheres 5.244 5.263 5.289 5.323 5.357 5.393 5.421 5.448 5.461 5.471 5.481
Pop. Residente (15 e +) 8.445 8.505 8.577 8.654 8.724 8.800 8.863 8.912 8.942 8.975 8.993
Homens 4.021 4.053 4.091 4.132 4.168 4.209 4.243 4.268 4.285 4.291 4.310
Mulheres 4.424 4.452 4.486 4.522 4.556 4.591 4.620 4.644 4.665 4.677 4.689
População Activa 5.096 5.136 5.226 5.325 5.408 5.460 5.488 5.545 5.587 5.618 5.625
Homens 2.805 2.818 2.855 2.901 2.938 2.948 2.957 2.964 2.985 2.986 2.991
Mulheres 2.291 2.318 2.372 2.424 2.470 2.512 2.531 2.581 2.603 2.632 2.633
Empregados 4.844 4.910 5.021 5.112 5.137 5.118 5.123 5.123 5.160 5.170 5.198
Homens 2.694 2.709 2.765 2.810 2.816 2.787 2.784 2.765 2.790 2.789 2.797
Mulheres 2.149 2.201 2.256 2.302 2.321 2.331 2.339 2.357 2.370 2.380 2.401
Desempregados 251,9 225,8 205,5 213,5 270,5 342,3 365,0 422,3 427,8 448,6 427,1
Homens 110,6 108,9 89,3 91,6 121,4 160,9 172,9 198,1 194,8 196,8 194,3
Mulheres 141,3 116,9 116,2 122,0 149,1 181,4 192,2 224,1 233,1 251,8 232,7
Taxa de Actividade 50,3% 50,5% 51,1% 51,7% 52,2% 52,3% 52,2% 52,5% 52,8% 53,0% 53,0%
Homens 57,4% 57,5% 57,9% 58,4% 58,7% 58,4% 58,1% 57,9% 58,2% 58,2% 58,2%
Mulheres 43,7% 44,0% 44,8% 45,5% 46,1% 46,6% 46,7% 47,4% 47,7% 48,1% 48,0%
Taxa de Emprego 57,4% 57,7% 58,5% 59,1% 58,9% 58,2% 57,8% 57,5% 57,7% 57,6% 57,8%
Homens 67,0% 66,8% 67,6% 68,0% 67,6% 66,2% 65,6% 64,8% 65,1% 65,0% 64,9%
Mulheres 48,6% 49,4% 50,3% 50,9% 50,9% 50,8% 50,6% 50,8% 50,8% 50,9% 51,2%
Taxa de Desemprego 4,9% 4,4% 3,9% 4,0% 5,0% 6,3% 6,7% 7,6% 7,7% 8,0% 7,6%
Homens 3,9% 3,9% 3,1% 3,1% 4,1% 5,5% 5,8% 6,7% 6,5% 6,6% 6,5%
Mulheres 6,2% 5,0% 4,9% 5,0% 6,0% 7,2% 7,6% 8,7% 9,0% 9,6% 8,8%
Fonte: Instituto Nacional de Estatística .

Tabela 2.4: Emprego, desemprego e inactividade em Portugal, por sexo (1998-2008).

2
Alternativamente, consideram-se todas as pessoas com idade igual ou superior a 15 anos.

4
A taxa de emprego feminina é significativamente inferior à masculina. É superior nos
países nórdicos, e inferior nos países mediterrânicos.

Emprego - Mulheres (OCDE 2005)


20% Poland
Slovakia
taxa de desemprego

Greece
15%
Spain
France Germany
Italy Belgium
10%
Hungary Czech Rep Portugal Finland
Slovenia Canada Sw eden
Luxemb A ustraliaUSA Sw itz
5% Japan A ustria Denmark
Netherlands
Korea Ireland UK New Zeal Norw ay
0%
40% 45% 50% 55% 60% 65% 70% 75%
taxa de emprego (15 a 64 anos)

Figura 2.5a: Taxa de emprego e taxa de desemprego nos países da OCDE (2005) - mulheres.

A taxa de desemprego na população masculina é, em geral, inferior à que se verifica na


população feminina. A diferença é particularmente acentuada na Grécia, Espanha e Itália.

Emprego - Homens (OCDE 2005)


20%

Poland
Slovakia
15%
taxa de desemprego

10% France Germany


Finland Spain
Hungary
PortugalSw eden Canada
Belgium Italy
Czech USA A ustraliaJapan
5% Slovenia AGreece
ustria
UK
Denmark
Luxemb Ireland Norw ay
Korea Netherlands New Zeal Sw itz

0%
55% 60% 65% 70% 75% 80% 85%
taxa de emprego (15 a 64 anos)

Figura 2.5b: Taxa de emprego e taxa de desemprego nos países da OCDE (2005) - homens.
Fonte: OECD Factbook 2007: Economic, Environmental and Social Statistics.

5
Em 1962, Arthur Okun observou que o desemprego tem flutuações cíclicas, inversamente
relacionadas com as flutuações cíclicas do produto. Este facto estilizado ficou conhecido
como a Lei de Okun.

Figura 2.6: Lei de Okun.


Fonte: Gordon (2005), “Macroeconomics”, 10th ed., Addison-Wesley.

Dado este comportamento, faz sentido decompor o desemprego em desemprego natural


(UN) e desemprego cíclico (U-UN), que correspondem à tendência de longo prazo e ao
desvio relativamente a essa tendência, respectivamente.

6
A taxa de desemprego natural (uN) está associada ao produto natural (YN). Quando o
desemprego é inferior (superior) ao natural, o produto é superior (inferior) ao natural, e a
inflação tende a aumentar (diminuir).3

A evolução da taxa de desemprego em Portugal, nos últimos 30 anos, parece apresentar


um comportamento cíclico inversamente relacionado com o comportamento cíclico do
produto (tal como previsto pela Lei de Okun).

Produto e Desemprego em Portugal (1978-2008)

10% 150 000

PIB (milhões de euros)


8% 125 000
taxa de desemprego

6% 100 000

4% 75 000
Taxa de Desemprego
Produto Real (base 2000)
2% 50 000
1978 1983 1988 1993 1998 2003 2008

Figura 2.7: Produto real e taxa de desemprego em Portugal (1978-2008).


Fonte: Banco de Portugal e Instituto Nacional de Estatística.

A estimação empírica da Lei de Okun aponta para que um aumento de 1% da taxa de


desemprego esteja associado a uma diminuição de 2% a 3% do produto da economia.

3
A designação anglo-saxónica da taxa natural de desemprego é NAIRU: Non-Accelerating Inflation Rate of
Unemployment.

7
2.2 Equilíbrio no Mercado de Trabalho

2.2.1 Oferta de Trabalho

Para adquirir e consumir os bens necessários à vida e ao conforto, as pessoas precisam de


ter rendimentos. A maior parte das pessoas obtém rendimento através da oferta de trabalho
a empresas em troca de um salário. Por outro lado, as pessoas valorizam também o seu
tempo livre. Como o tempo não estica, cada hora adicional de trabalho implica que a
pessoa tenha menos uma hora disponível para o lazer.

Para explicar o comportamento da oferta agregada de trabalho da economia, NS, vamos


começar por explicar a oferta individual de trabalho, recorrendo a um modelo
microeconómico simples no qual o chamado agente representativo4 divide o seu tempo
disponível entre trabalho, L, e lazer, l.

A satisfação ou utilidade do agente, U(C,l), depende do seu nível de consumo e do seu


tempo de lazer, verificando-se a lei das utilidades marginais decrescentes. Esta
propriedade implica que as curvas de indiferença sejam convexas relativamente à origem.

O trabalho proporciona um salário nominal, W, que o agente utiliza para adquirir bens de
consumo ao preço unitário P. O salário real é, portanto, w = W/P. Supondo que o agente
não poupa qualquer fracção do seu rendimento, e que não tem qualquer rendimento
adicional, obtemos:

P ⋅C =W ⋅ L ⇔ C = w⋅ L .

4
O agente representativo é uma espécie de agente médio da economia. Assume-se implicitamente a
semelhança entre o comportamento da economia cujos agentes têm características diversas, e uma economia
hipotética na qual todos os agentes são réplicas deste agente dito representativo.

8
Se considerarmos o dia como período de referência e a hora como unidade de medida do
tempo, então, obrigatoriamente, L+l = 24. Esta restrição temporal implica directamente a
seguinte restrição orçamental:

C = w ⋅ (24 − l ) .

O “preço” de uma hora de lazer, ou seja, o custo de oportunidade de uma hora adicional
de tempo de lazer, medido em unidades de bens de consumo, é w. O declive da recta
orçamental (-w) mede este trade-off entre consumo e lazer. Cada hora adicional de lazer
implica a diminuição do nível de consumo em w unidades.

A taxa marginal de substituição entre consumo e lazer mede a quantidade de consumo


de que o agente está disposto a abdicar para poder dispor de uma unidade adicional de
lazer. Graficamente, é traduzida pelo declive da curva de indiferença. Analiticamente,
pode calcular-se como a razão entre as utilidades marginais do lazer e do consumo.

C ∂U ∂U
dC dU (C , l ) = 0 ⇔ ⋅ dC + ⋅ dl = 0 ⇔
TMS C ,l =− ∂C ∂l
dl ISOU ⇔ UMg C ⋅ dC + UMg l ⋅ dl = 0 ⇔
dC UMg l
⇔− = ⇔
dl ISOU UMg C
te
U =C UMg l
⇔ TMS C ,l =
UMg C
l
Figura 2.8: Igualdade entre a TMS e o declive da curva de indiferença (em valor absoluto).

Como as utilidades marginais são decrescentes, quanto maior for o tempo de lazer e
quanto menor for o nível de consumo, menor é a quantidade de consumo de que o agente

9
está disposto a abdicar para obter uma unidade adicional de lazer. Isto é, a taxa marginal
de substituição decresce com o aumento do lazer e com a diminuição do consumo.

O problema do agente é o de maximizar a sua utilidade, U(C,l), estando sujeito à restrição


orçamental, C = w·(24-l). A escolha é óptima se o agente se posicionar na curva de
indiferença mais afastada da origem, dentro da sua restrição orçamental.

É razoável assumir que as curvas de indiferença são diferenciáveis, e que o indivíduo


precisa tanto de consumir bens como de dispor de tempo de lazer para sobreviver. Nesse
caso, a solução óptima corresponde ao ponto de tangência entre a recta orçamental e o
mapa de indiferença, isto é, ao ponto no qual são iguais a taxa marginal de substituição
entre consumo e lazer (TMSC,l = UMgl/UMgC) e o salário real, ou preço (relativo) do lazer,
w.

C lazer insuficiente

óptimo
w ⋅ 24
inatingível
w⋅ L* U =U2
U = U1
U =U0

24 − L* 24 l
Figura 2.9: Escolha óptima entre lazer e consumo.

Resolvendo este problema para uma gama alargada de valores de w, obtemos a função
oferta individual de trabalho, LS. Esta função dá-nos a quantidade de trabalho que o
agente representativo pretende oferecer, para cada valor do salário real. O impacto de uma

10
variação do salário real sobre a quantidade de trabalho que o agente oferece depende da
magnitude de dois efeitos opostos: o efeito rendimento e o efeito substituição.

Um aumento do salário real torna o lazer relativamente mais caro (em termos de custo de
oportunidade). Não trabalhar passa a implicar abdicar de uma maior quantidade de bens de
consumo. Esta alteração dos preços relativos do consumo e do lazer leva os agentes a
consumir mais e a dedicar menos tempo ao lazer (substituição de lazer por consumo). O
efeito substituição age no sentido de levar os agentes a trabalhar mais (menos) e a
consumir mais (menos) quando o salário real aumenta (diminui).

Por outro lado, um aumento salarial permite aos agentes consumir uma maior quantidade
de bens, mantendo o seu tempo de lazer. Como a utilidade marginal do consumo é
decrescente, as unidades adicionais de consumo estão associadas a um menor aumento da
utilidade. Isto faz com que os agentes trabalhem menos, e dediquem mais tempo ao lazer
(mais lazer e mais consumo). O efeito rendimento age no sentido de levar os agentes a
agentes a trabalhar menos (mais) e a consumir mais (menos) quando o salário real
aumenta (diminui).5

C
w2 ⋅ 24

w1 ⋅ 24
C
w0 ⋅ 24 B

24 l
5
Estamos a assumir, implicitamente, que o consumo e o lazer são bens normais. Quando o rendimento
aumenta, o agente representativo passa a consumir mais e a dedicar mais tempo ao lazer.

11
Figura 2.10: Efeito de uma variação do salário real.

A combinação óptima de consumo e lazer altera-se. Em resultado de um aumento salarial,


os agentes passam a consumir sempre mais, mas podem passar a trabalhar mais ou menos
conforme predomine o efeito substituição ou o efeito rendimento.

Graficamente, o aumento do salário real traduz-se numa rotação da recta orçamental:


aumenta a ordenada na origem e aumenta a inclinação. No caso representado na figura: o
efeito substituição predomina quando o salário real sobe de w0 para w1 (o agente passa a
trabalhar mais); mas quando o salário aumenta de w1 para w2, é o efeito rendimento que
predomina (o agente passa a trabalhar menos).

O efeito de substituir o caro pelo barato (substituição) tende a predominar para níveis
salariais baixos, enquanto que o efeito rendimento tende a predominar a partir de um certo
nível salarial. A curva oferta individual de trabalho tende, portanto, a ser positivamente
inclinada na zona de salários baixos, e negativamente inclinada a partir de um certo ponto.

w
Predomina o
efeito rendimento

predomina o
efeito substituição

LS
Figura 2.11: Oferta individual de trabalho.

12
Frequentemente, o trabalhador não tem a possibilidade de escolher a quantidade de
trabalho que vai realizar. É-lhe proposto um contrato que estipula um determinado horário
laboral (por exemplo, 40 horas semanais) e uma remuneração, que o trabalhador pode
aceitar ou não. Ao valor mínimo do salário que o trabalhador aceita para trabalhar
chamamos salário de reserva.

Observa-se que a reacção dos indivíduos às variações do salário é maior no longo prazo do
que no curto prazo. Isto é, a oferta individual de trabalho é rígida no curto prazo, mas
relativamente elástica no longo prazo.

A oferta agregada de trabalho, NS, é simplesmente a soma das quantidades de trabalho


que são oferecidas por todas as pessoas numa economia. É bastante mais elástica do que a
oferta individual de trabalho, e é positivamente inclinada (na zona economicamente
relevante). Mesmo que diminua a quantidade de trabalho que algumas pessoas oferecem,
essa diminuição é mais do que compensada pelo aumento das quantidades oferecidas pelas
outras pessoas, algumas das quais nem sequer procuravam trabalho ao nível salarial
anterior.

NS
Figura 2.12: Oferta agregada de trabalho.

A oferta de trabalho depende não só das características individuais, mas também de


factores demográficos (população e estrutura etária), de factores culturais que

13
influenciam a taxa de actividade (participação das mulheres no mercado de trabalho, idade
de reforma), e da legislação reguladora (horários de trabalho e subsídio de desemprego).
Aumentos da população activa ou do horário de trabalho fazem naturalmente aumentar a
oferta de trabalho.

2.2.2 Procura de Trabalho

Para desenvolverem a sua actividade produtiva, as empresas procuram contratar


trabalhadores, que lhes oferecem trabalho, em troca de um salário. Contratar mais um
trabalhador permite aumentar o volume de produção, mas, por outro lado, implica um
custo adicional.

Para cada nível salarial, uma empresa escolhe a quantidade de trabalho que maximiza o
seu lucro. A relação entre o nível salarial vigente no mercado e a quantidade de trabalho
que as empresas procuram designa-se por função procura de trabalho.

A relação entre os factores de produção utilizados e o volume de produção designa-se por


função de produção. Se considerarmos apenas a possibilidade de escolher a quantidade
de factor trabalho, estando os restantes (capital, terra) fixos, a função produção escreve-se,
simplesmente, como Q=F(L).

A produtividade marginal do trabalho é o aumento do volume de produção


proporcionado pela utilização de uma unidade adicional de trabalho, e calcula-se como a
derivada da função produção: PMgL = F’(L). É razoável assumir que a produtividade
marginal é decrescente.

14
O lucro de uma empresa que utiliza L unidades de factor trabalho, remunerado ao salário
nominal W, para produzir F(L) unidades de produto, que vende a um preço unitário igual a
P, é dado por:

LT ( L) = P ⋅ F ( L) − W ⋅ L .

A quantidade de factor trabalho que maximiza o lucro da empresa é tal que a


produtividade marginal do trabalho (benefício marginal) é igual ao salário real (custo
marginal):

W
CPO : LT ' ( L) = 0 ⇔ P ⋅ F ' ( L) − W = 0 ⇔ PMg L = = w.
P

Se a quantidade de trabalho for inferior à óptima, a produtividade marginal é superior ao


salário real, de modo que compensa aumentar a utilização de trabalho (o que faz diminuir
a produtividade marginal).

Q
PMgL
declive = PMgL w
(decrescente)

RMgL>CMgL RMgL<CMgL

L L
Figura 2.13: Determinação da procura de trabalho.

A curva da procura individual de trabalho, LD, coincide com a curva da produtividade


marginal do trabalho.

15
w

LD = PMgL

L
Figura 2.14: Procura de trabalho por parte de uma empresa.

A procura agregada de trabalho, ND, é a soma de todas as procuras individuais de


trabalho das empresas. É normalmente medida em horas-homem.

w
w = PMgN

ND
Figura 2.15: Procura agregada de trabalho.

Dado que a curva da procura de trabalho coincide com a curva da produtividade marginal
do trabalho, os factores determinantes da produtividade do trabalho são também
determinantes da procura de trabalho. Dois determinantes fundamentais são o
progresso técnico (aumento da produtividade dos factores de produção) e a utilização dos
outros factores (essencialmente, de capital). Quanto maior for o nível tecnológico da
economia, e quanto maior for o stock de capital existente, maior é a produtividade do
trabalho, e, portanto, maior é a procura de trabalho.

16
w
PMgN
w ND

N N
Figura 2.16: Efeito de um aumento da produtividade do trabalho.

2.2.3 Equilíbrio no Mercado de Trabalho

O salário real de equilíbrio, w*, do mercado de trabalho é aquele para o qual são iguais a
quantidade oferecida e quantidade procurada de trabalho. A esta quantidade de trabalho
que é oferecida e procurada chamamos emprego de equilíbrio, N*.

w
NS

w*
ND

N* N
Figura 2.17: Equilíbrio no mercado de trabalho.

Um factor que afecte positivamente a oferta de trabalho tem como efeito uma diminuição
do salário real de equilíbrio, e um aumento do emprego de equilíbrio. Exemplos destes

17
factores são o aumento da taxa de participação das mulheres no mercado de trabalho, o
aumento populacional, e a imigração.

w NS

w*
ND

N* N
Figura 2.18: Efeito de um aumento da oferta agregada de trabalho.

Os factores que afectam positivamente a procura de trabalho fazem aumentar o salário real
de equilíbrio e o emprego de equilíbrio. Exemplos destes factores são o progresso
tecnológico e o aumento do stock de capital.

w
NS

w*
ND

N* N
Figura 2.19: Efeito de um aumento da procura agregada de trabalho.

Na situação teórica de equilíbrio, não há desemprego (involuntário). Todas as pessoas que


pretendem trabalhar ao salário real vigente estão empregadas. Só não estão empregadas

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aquelas que não estão aptas ou não estão disponíveis para trabalhar. Muitas não oferecem
trabalho por considerarem insuficiente o salário vigente. Nesse caso, não fazem parte da
população activa, e, portanto, não são consideradas desempregadas. O desemprego
voluntário não é considerado como desemprego de facto.

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2.3 Desemprego Estrutural

O desemprego estrutural, Ue, resulta do facto de o salário real não se ajustar de forma
exacta e imediata ao valor do salário real de equilíbrio. Sendo o salário real superior ao
valor de equilíbrio (w’>w*), verifica-se um excesso de oferta de trabalho relativamente à
procura, de modo que nem todos os agentes que oferecem trabalho obtêm emprego.

w
NS

w' Ue

w*
ND

ND NS N
Figura 2.20: Rigidez real e desemprego estrutural.

Seria de esperar que o salário real diminuísse, dado que os agentes desempregados
estariam dispostos a trabalhar por um salário inferior ao vigente. Mas observa-se que o
salário nominal é bastante rígido à baixa (isto é, não diminui instantaneamente em
resultado de um excesso de oferta). Uma das origens da rigidez nominal dos salários é a
influência dos sindicatos.

Os movimentos sindicais procuram aumentar o poder negocial dos trabalhadores.


Invocam que a relação entre patrão e empregado não é paritária, o que origina uma
partilha do rendimento entre salários e rendimentos do capital que não está de acordo com
a produtividade dos factores.

20
Sendo os salários determinados por negociação bilateral entre o patronato e os sindicatos,
o mercado de trabalho não funciona em condições de concorrência perfeita.

Em geral, se compararmos a oferta de um monopolista com a oferta concorrencial,


verificamos que o monopolista vende uma menor quantidade de produto a um preço mais
elevado. É de esperar que a influência dos sindicatos implique salários superiores, mas
menos emprego. Chamamos oferta colectiva de trabalho, NC, à oferta agregada de
trabalho que resulta das ofertas individuais e da influência dos sindicatos.

De certa forma, os sindicatos defendem os interesses dos indivíduos empregados (salários


mais elevados) à custa dos indivíduos desempregados (menos emprego). Este tipo de
conflito entre um grupo instalado e um grupo excluído designa-se por conflito
insiders/outsiders.

w NC
e
NS
w' U

w*
ND

ND NS N
Figura 2.21: Oferta colectiva de trabalho e desemprego estrutural.

A fixação de um salário mínimo também contribui, evidentemente, para a rigidez


nominal dos salários. O objectivo do Governo ao fixar um salário mínimo é o de limitar a
compressão artificial dos salários por parte de empregadores com elevado poder negocial
e o de evitar a exploração do emprego juvenil. A presença de um salário mínimo
desencoraja as empresas de recrutar trabalhadores com baixa produtividade, como, por
exemplo, os idosos não qualificados.

21
Em maior ou menor medida, a produtividade dos trabalhadores depende do empenho e
dedicação com que encaram o trabalho. Se uma empresa não observar perfeitamente o
esforço dos seus trabalhadores, é natural que estes se esforcem tanto mais quanto mais
motivados estiverem.

Um salário superior pode proporcionar ao trabalhador uma motivação adicional, que se


reflecte na sua produtividade. Pode interessar, portanto, às empresas, pagar aos seus
trabalhadores um salário superior ao salário de reserva. O salário que, nestas condições,
maximiza o lucro da empresa designa-se por salário de eficiência.

O facto de as empresas pagarem salários de eficiência (superiores ao salário de equilíbrio)


origina desemprego no mercado de trabalho. Por sua vez, um maior nível de desemprego é
geralmente um factor adicional de motivação para as pessoas empregadas. Passa a ser
maior o custo de perder o emprego, dado que os desempregados demorarão, em princípio,
mais tempo a encontrar um novo emprego.

Em suma, os salários de eficiência podem permitir:


- obter maior dedicação e esforço por parte dos trabalhadores, que pretendem
evitar o despedimento ou conseguir uma promoção, estão mais motivados, e estão mais
saudáveis;
- contratar trabalhadores mais produtivos, dado que o excesso de oferta de
trabalho permite maior selecção no processo de recrutamento;
- diminuir a rotatividade dos trabalhadores e os consequentes custos associados à
formação e à fuga para a concorrência.

22
2.4 Desemprego Friccional

O desemprego friccional resulta do dinamismo inerente ao normal funcionamento da


economia e do mercado de trabalho em particular. Em cada momento são criados novos
postos de trabalho, desaparecendo outros, e há novos trabalhadores que entram no
mercado, saindo outros. Existe desemprego friccional porque é necessário tempo para que
se encontrem um trabalhador (que procura um emprego) e uma empresa (que pretende
preencher um posto de trabalho) com características compatíveis.

Relativamente ao mercado de trabalho, um indivíduo pode estar numa de três situações:


empregado, desempregado ou inactivo. O desemprego friccional está relacionado com as
velocidades de transição entre estes três estados.

Figura 2.22: Fluxos entre emprego, desemprego e inactividade.

A taxa de separação (s) define-se como a fracção de trabalhadores empregados (E) que
se tornam desempregados, num determinado período de tempo. Pode também ser
interpretada como a probabilidade de um trabalhador deixar de estar empregado. Tem uma
componente cíclica, sendo evidentemente superior nas fases de recessão económica, altura
em que há uma maior destruição de postos de trabalho.

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A taxa de ingresso (f), ou taxa de contratação, é definida como a fracção de
desempregados (U) que encontra emprego, num determinado período de tempo. Pode ter
interesse interpretar este parâmetro como a probabilidade de um desempregado conseguir
emprego. É maior nas fases de expansão económica, altura em que há um aumento dos
volumes de produção, e, portanto, um maior ritmo de criação de postos de trabalho.

Supondo que a população activa, NS, permanece constante, a variação do desemprego é


dada por: ∆U = s·E – f·U. Considerando também como fixos os valores destes parâmetros,
podemos estimar o desemprego friccional, como o nível de desemprego estacionário, isto
é, aquele para o qual ∆U = 0:

s
∆U = 0 ⇒ s ⋅ E − f ⋅ U = 0 ⇒ U = E.
f

Como NS = E + U, podemos determinar a taxa de desemprego friccional. Naturalmente,


esta é tanto menor quanto menor for a taxa de separação e maior for a taxa de contratação:

U s f s
N S = E +U ⇒u = = ⇒u = .
E +U 1+ s f s+ f

O ritmo de progresso técnico tem uma influência decisiva nos valores das taxas de
separação e de contratação. A inovação torna obsoletos postos de trabalho, produtos, e
mesmo indústrias, criando, por outro lado, novos postos de trabalho a serem preenchidos,
novos produtos e novas indústrias.

O desemprego friccional também é determinado pelo ambiente social e institucional e


pelas restrições legais. A taxa de separação é maior em países com menos restrições legais
ao despedimento. A taxa de contratação é maior quanto melhor for a disseminação da
informação relativa às ofertas de emprego, e quanto maior for o esforço dos
desempregados no sentido de encontrar emprego.

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Em Portugal, no 4º trimestre de 2008, a taxa de separação foi igual a 1,3%, enquanto que a
taxa de ingresso foi igual a 18,0%. Destes valores resultaria, no longo prazo, uma taxa de
desemprego friccional igual a 6,7%.

Figura 2.23: Fluxos entre emprego, desemprego e inactividade – Portugal (4ºT 2008).
Fonte: Instituto Nacional de Estatística.

O subsídio de desemprego tem um impacto importante no mercado de trabalho. As


condições em que é concedido variam significativamente de país para país. Um sistema de
apoio aos desempregados tem como principais características: (1) os critérios de
elegibilidade; (2) o nível de substituição do rendimento do trabalho; e (3) o período de
duração.

Em Portugal, um desempregado é elegível se tiver obtido remunerações durante 450 dias


nos 24 meses imediatamente anteriores à data do desemprego. O montante do subsídio é
igual a 65% da remuneração média, tendo como máximo o triplo do salário mínimo e
como mínimo o salário mínimo. O período de concessão depende da carreira contributiva
do beneficiário e da sua idade, variando entre os 270 e os 900 dias.

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Estes apoios fazem aumentar o desemprego friccional, por acomodação da pessoa à
situação de desemprego, especialmente se o período de duração for muito elevado. Na
medida em que a situação de desemprego acarreta perda de capacidades produtivas, as
pessoas podem cair na chamada armadilha do desemprego, tornando-se desempregados
de longa duração.

Por outro lado, algumas pessoas aproveitam a situação de desemprego para adquirir novas
qualificações profissionais e para procurar um posto de trabalho mais adequado às suas
características produtivas. Em casos como estes, a perda económica associada ao
desemprego é temporária e pode ser mais do que compensada por um acréscimo da
produtividade futura.

Todos estes factores devem ser tidos em conta na definição do sistema de apoio aos
desempregados, de modo a que se encontre um bom compromisso entre o grau de
protecção social e a eficiência económica.

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2.5 Conclusão

O desemprego natural é um nível de desemprego de equilíbrio, associado ao produto


natural e, portanto, à ausência de pressões no sentido de aumento ou diminuição da
inflação. Tem uma componente estrutural e uma componente friccional, a primeira de
natureza estática, e a segunda de natureza dinâmica.

A componente estrutural do desemprego resulta da diferença entre o salário real


estacionário e aquele para o qual são iguais a oferta e a procura de trabalho. Esta diferença
deve-se à influência dos sindicatos, à existência de um salário mínimo legal, e à fixação de
salários de eficiência por parte das empresas.

Mesmo se o salário real fosse igual ao salário real de equilíbrio, o dinamismo inerente ao
processo económico implicaria sempre a existência do chamado desemprego friccional,
que é originado pelo processo permanente de criação e destruição de postos de trabalho, e
pelos fluxos constantes de entrada e de saída das pessoas do mercado de trabalho.

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