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Química Orgânica, de Vinícius de Moraes e Poética, Poema de

Manuel Bandeira. Com os comentários/ Análises. Leituras para


a 3ª Etapa do PAS UnB de 2019
QUÍMICA ORGÂNICA (VINÍCIUS DE MORAES)

Há mulheres altas e mulheres baixas; mulheres bonitas e mulheres feias;


mulheres gordas e mulheres magras; mulheres caseiras e mulheres rueiras;
mulheres fecundas e mulheres estéreis; mulheres primíparas e mulheres multíparas;
mulheres extrovertidas e mulheres inconsúteis; mulheres homófagas e mulheres
inapetentes; mulheres suaves e mulheres wagnerianas; mulheres simples e mulheres
fatais; - mulheres de toda sorte e toda sorte de mulheres no nosso mundo de
homens. Mas, do que pouca gente sabe é que há duas categorias antagônicas de
mulheres cujo conhecimento é da maior utilidade, de vez que pode ser determinante
na relação desses dois sexos que eu, num dia feliz, chamei de "inimigos
inseparáveis". São as mulheres "ácidas" e as mulheres "básicas", qualificação esta
tirada à designação coletiva de compostos químicos que, no primeiro caso, são
hidrogenados, de sabor azedo; e no segundo, resultam da união dos óxidos com a
água e devolvem à tintura do tornassol, previamente avermelhada pelos ácidos, sua
primitiva cor azul.

Darei exemplos para evitar que os ínscios e levianos, ao se deixarem levar pela
mania de classificar, que às vezes resulta de uma teoria paracientífica, cometam
injustiças irreparáveis. Pois a verdade é que mulheres que podem parecer em
princípio "ácidas", como as louras (conf. com a expressão corrente: "branca azeda",
etc.), podem apresentar tipos da maior basicidade. Não é possível haver mulher mais
"básica" que Marylin Monroe,* por exemplo; enquanto que Grace Kelly, que muita
gente pode tomar por "básica", é a mulher mais cítrica dos dias que correm. Podia-
se fazer com Grace Kelly a maior limonada de todos os tempos, e nem todo o açúcar
de Cuba seria capaz de adoçá-la.

De um modo geral, a mulher "ácida" é sempre bela, surpreendente mesmo de


beleza. É como se a Natureza, em sua eterna sabedoria, procurasse corrigir essa
hidrogenação excessiva com predicados que a façam perdoar, senão esquecer pelos
homens. Porque uma coisa eu vos digo: é preciso muito conhecimento de química
orgânica para poder distinguir uma "básica" ou uma "ácida" pela cara. A mulher
"ácida" tem uma consciência intuitiva da sua química, e não é incomum vê-la querer
passar por "básica" graças ao uso de maquilagem apropriada e outros disfarces
próprios à categoria inimiga.

Como um homem prevenido vale por dois, dou aqui, por alto, noções
geográficas e fisiológicas dos dois tipos, de modo que não chupe tamarindo aquele
que gosta de manga, e vice-versa. A vol d'oiseau se pode dizer que as regiões
escandinavas, certas regiões balcânicas e a América do Norte são infestadas de
mulheres "ácidas", no caso da América, sobretudo o Sul e Middlewest, onde há
predominância do tipo one hundred per cent American. Ingrid Bergman é uma "ácida
escandinava" típica e é preciso ir procurar uma Greta Garbo para achar a famosa
exceção comum a toda a regra. As Ilhas Britânicas em si não são "ácidas"; mas há
que ter cuidado com certas regiões da Escócia e da Irlanda, onde o limão come solto.
Na França, com exceção de Paris e Île-de-France, e naturalmente da Côte d'Azur,
reina uma certa acidez, sobretudo na Bretanha, Alsácia e Normandia. A Itália é
"básica", tirante, talvez, o Veneto e a Sicília. Os Países Baixos são o que há de mais
"ácido", Flandres ainda mais que a região flamenga. A Alemanha é à base do araque.
Há, aí, que ir mais pelo padrão psicofisiológico que pelo geográfico.

Desconfie-se, em princípio, de mulheres com muita sarda ou tache-de-


rousseur. Há exceções, é claro; mas vejam só Betty Davis, * * que é de dar dor na
dentina. É bom também andar um pouco precavido com mulheres, louras ou
morenas, levemente dentuças. Acidez quase certa.

Felizmente, a grande maioria é constituída de "básicas", para bem de todos e


felicidade geral da nação. Sobretudo no Brasil, felizmente liberto, desde alguns
meses, da sua "ácida número um" - aliás de outras plagas, diga-se, o peito inchado
do mais justo orgulho nacional.

* O autor congratula-se consigo mesmo de haver escrito, há dez anos, urna


verdade que resulta em tão graciosa homenagem póstuma à grande estrela
americana.
**Poderia ser substituída, atualmente, pela atriz Doris Day
Disponível em: http://www.viniciusdemoraes.com.br/pt-br/prosa/quimica-organica

OUTRA ANÁLISE

Felizmente, a grande maioria é constituída de "básicas", para bem de todos e


felicidade geral da nação. Sobretudo no Brasil, felizmente liberto, desde alguns
meses, da sua "ácida número um" - aliás de outras plagas, diga-se, o peito inchado
do mais justo orgulho nacional.

*No texto, o autor faz criticas às mulheres ácidas, comparando-as com as


substâncias encontradas na Química.O autor faz referência à mulher ácida (aquele
tipo de mulher que é mais complicada, mais difícil de engolir) e à mulher básica
(aquela que é mais fácil de ser decifrada). Mas antes de tudo ele faz uma listagem
de vários tipos de mulheres que estão englobadas em diversas categorias.
Marcus Vinícius da Cruz e Mello Moraes nasceu em 1913 no bairro da Gávea,
no Rio de Janeiro. Mudou-se com a família para o bairro de Botafogo em 1916, onde
iniciou os seus estudos na Escola Primária Afrânio Peixoto, onde já demonstrava
interesse em escrever poesias.
Poeta essencialmente lírico, também conhecido como um boêmio inveterado,
fumante e apreciador deuísque. Era também conhecido por ser um grande
conquistador. Casou-se por nove vezes ao longo de sua vida. Sua obra é vasta,
passando pela literatura, teatro, cinema e música. No campo musical teve como
principais parceiros: Tom Jobim, Toquinho, Baden Powell, João Gilberto, Chico
Buarque e Carlos Lyra que tiveram uma grande influência na Bossa Nova.
Por:Gabriel Freir
In: http://m-sociedade.blogspot.com.br/2011/10/vinicius-de-moraes-quimica-
organica.html
Uma 3ª Análise

Vinicius de Moraes - Antologia Poética (2): Análise da obra

Devido a certas semelhanças, Bach pode nos levar a Vinicius.

Foi em Eisenach, pequena cidade da Turíngia, na Alemanha central, que, em 1685,


nasceu Johann Sebastian Bach. Ali passou os primeiros anos de sua infância, iniciou
sua escolarização e recebeu as primeiras noções de música, tomando aulas de violino
com o pai, Johann Ambrosius Bach - músico da corte municipal -, e de cravo e órgão,
com o tio Johann Christoph.

Johann Sebastian era ainda uma criança quando deixou a cidade natal para percorrer
os tortuosos caminhos que o levariam à imortalidade...

Quanto ao nosso poeta, foi em 1913, na cidade do Rio de Janeiro, que nasceu, em
meio a um forte temporal, Marcus Vinícius da Cruz de Mello Moraes, filho de Clodoaldo
Pereira da Silva Moraes, funcionário da Prefeitura, poeta (amigo deOlavo Bilac),
violonista e cantor de modinhas, que iniciaria Vinicius na música. O tio mais moço,
boêmio e seresteiro, também exerceu forte influência sobre ele. Além de sua mãe,
Lydia Cruz, e o avô, que eram hábeis pianistas.

Como é possível notar, nascido no seio de uma família de músicos (e de poetas!),


Vinicius, tal como Bach, terá forte presença dessa arte superior, que é a música, por
toda sua vida.

Além dessas semelhanças, no mínimo curiosas, há algo maior que o liga ao mestre
de Eisenach. Dentre os parceiros de Vinicius (...e eles não são poucos. Só para citar
os mais conhecidos: irmãos Tapajós, Paulinho Soledade, Vadico, Pixinguinha,Adoniran
Barbosa, Carlos Lyra, Baden Powell, Francis Hime, Villa-Lobos, Chico Buarque, Tom
Jobim, Toquinho etc.), Bach foi o mais inusitado de todos porque, obviamente, já
estava morto e jamais tomou conhecimento de tal negócio! Em 1961, a Banda do
Corpo de Bombeiros fluminense gravou "Rancho das Flores", marcha-rancho com
versos do poeta sobre tema de "Jesus, Alegria dos Homens", do compositor clássico
alemão.

Vinicius de Moraes foi diplomata, músico, boêmio, advogado, crítico de cinema e,


sobretudo, poeta, que se auto-intitulava o "branco mais preto do Brasil".

Um crítico certa vez disse que Vinicius era um homem plural, e que essa pluralidade
era percebida nas várias atividades que o poeta desenvolveu, nos vários amores que
teve (seus biógrafos afirmam que teve, oficialmente, 9 mulheres), e no próprio
nome: Marcus Vinícius da Cruz de Mello Moraes.

Como diplomata, ele residiu em várias capitais do mundo. Além de formado em


Direito, foi agraciado com a primeira bolsa do Conselho Britânico para estudar língua
e literatura inglesas na Universidade de Oxford.

O que é uma antologia


Antes de qualquer coisa é preciso definir o que vem a ser "antologia". Antologia
significa, etimologicamente, "coletânea de flores"; o termo remete à ideia de escolha,
coleção. Sendo assim, antologia é uma coleção de trabalhos literários; neste caso,
coleção de trabalhos poéticos.

A importância de se ler uma obra como esta ("Antologia Poética") está no fato de
que estamos tendo contato com uma seleção de poemas feita pelo próprio autor.

A divisão da obra de Vinicius


A obra poética de Vinícius de Moraes é tradicionalmente dividida pela crítica em três
fases distintas.

A primeira inicia-se em 1933 e abrange os livros O caminho para a


distância (1933);Forma e exegese (1935); Ariana, a mulher (1936). Nesse período
encontramos um poeta místico, que escrevia versos longos, de tom bíblico-
romântico, de espiritualidade católica e visionária. O próprio poeta caracterizou esta
fase como "o sentimento do sublime". Na "Advertência" à sua Antologia Poética ele
afirmava que "a primeira [fase], transcendental, frequentemente mística, [era]
resultante de sua fase cristã".

A segunda fase (ou como se costuma dizer: o segundo Vinicius) tem início emCinco
Elegias, de 1943. O novo tom, a nova linguagem, as novas formas e temas, que
vinham desde Novos poemas, de 1933, intensificam-se e diversificam-se nos livros
posteriores - Poemas, sonetos e baladas (1946) e Novos poemas II (1959) -, em que
se mostram tanto as formas clássicas (soneto de tradição camoniana e
shakespeariana) quanto a poesia livre (em "A última elegia", os versos têm forma de
serpente). O poeta sente-se à vontade para inventar palavras, muitas vezes
bilíngues, ou praticar a oralidade maliciosa.

Por haver nessa fase uma renúncia à superstição e ao purismo fortemente presentes
na primeira, bem como um direcionamento para uma atitude mais brincalhona e
amorosa perante a poesia, essa segunda fase ficou conhecida como "O encontro do
cotidiano pelo poeta".

Nessa passagem do metafísico para o físico, do espiritual para o sensual, do sublime


para o cotidiano, o poeta retoma sugestões românticas (como lua, cidade, samba).
Refugia-se no erotismo: há contemplação do amor, poemas "sobre a mulher" e
adoração panteística da natureza. Compôs também poemas de indignação social,
cujos exemplares são: "Balada dos mortos dos campos de concentração", "O operário
em construção" e "A rosa de Hiroxima".

O terceiro Vinicius é o compositor, letrista e cantor. Autor de mais de trezentas


músicas (como atesta seu Livro de letras, lançado postumamente, em 1991, onde
estão mais de 300 letras de músicas de sua autoria), difundidas pelo mundo com o
grande acontecimento cultural e musical que foi a bossa nova. Seus parceiros, como
vimos, vão desde Bach a Toquinho.

Embora a crítica fizesse (faça) tal divisão, colocando de um lado o poeta e de outro
o showman, Vinicius nunca concordou que houvesse diferença entre seus sambas e
seus poemas escritos, pois para ele tudo era igual.

Escrito e postado por: Jorge Viana de Moraes, Especial para a Página 3


Pedagogia & Comunicação 24/03/200916h48
Extraído de: http://educacao.uol.com.br/disciplinas/portugues/vinicius-de-moraes---antologia-
poetica-2-analise-da-obra.htm Em 02/05/2016 – 20:30

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