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INTRODUÇÃO
O trabalho a seguir tem como questionamento principal saber quem são os
moradores do Arroio Dilúvio. O grupo tinha como objetivo ‘’quebrar’’ o pré conceito criado
em torno de pessoas em situações de rua e conhecer, por meio da visão delas, algumas
histórias de vida e a relação com o ambiente onde vivem.
Para isso, realizamos pesquisas qualitativas com pessoas que circundam as
regiões do arroio, além da conversa informal e descontraída de alguns integrantes do
grupo com membros do Jornal Boca de Rua (mídia impressa que dá voz para alguns
segmentos de população socialmente excluídos), onde obtemos os relatos pessoais de
cada um. Reportagens de jornais tiveram papel importante nos passos iniciais bem como
artigos científicos advindos das Ciências Sociais, Biologia e Psicologia Social.
Para auxiliar nossa pesquisa lemos alguns textos. Embora o trabalho seja sobre os
moradores do Arroio Dilúvio, nenhum dos textos trata esse assunto como tema central, no
entanto, nos ajudaram a ter uma visão geral da situação dos moradores de rua, na qual
se incluem os moradores do Arroio Dilúvio.
No artigo denominado 1''Dilúvio: visões sobre um arroio'' é relatada a história e a
razão pela qual o Arroio se encontra na situação atual, qual seja: ignorado tanto por parte
da prefeitura municipal quanto pelas pessoas que passam por ele diariamente; e
recebendo 50m² de detritos, erosão natural, entulho e lixo.
O artigo 2“Quem vocês pensam que (elas) são?” analisa o ponto de encontro entre
o conceito de identidade como metamorfose humana (mudança considerável que ocorre
no caráter) e de representações sociais. No que se refere às pessoas em situação de rua,
o texto surge sob a feição de catalogá-las como vagabundas, sujas, loucas, perigosas e
coitadas. É comum negligenciarmos involuntariamente o contato com elas. Habituados
com suas presenças, parece que estamos dessensibilizados em relação à sua condição
(sub) humana. Tal conhecimento socialmente compartilhado acaba por legitimar a
violência física contra estas pessoas, bem como servir de referência para a constituição
de suas identidades pessoais.
2.MATTOS, Ricardo e FERREIRA, Ricardo. “Quem vocês pensam que (elas) são?” Universidade São Marcos, 2004.
3. GRAZIOLA, Roque. “As pessoas em situação de rua em Porto Alegre e seus dramas, tramas e manhas: a cooperação e a
solidariedade como forma de humanização”, Dissertação de Mestrado, UFRGS, 2011
No jornal Boca de Rua, também é relatada a situação dos moradores de rua de
Porto Alegre, porém tal relato é feito pelos próprios. No referido jornal trabalha Rosina
Duarte, principal fonte de informação para nossa pesquisa. Através dela tivemos acesso a
história do jornal, bem como vários relatos acerca dos moradores de rua.
Ela relatou um pouco sobre sua carreira jornalística, trabalhou durante 17 anos
como repórter e sempre gostou de fazer matérias sobre pessoas em seu cotidiano. Com o
passar do tempo e a chegada dos novos meios tecnológicos ela afirma que o trabalho
havia se tornado acético e que os jornalistas ficavam trancados nas salas de redações,
perdendo o contato com o “mundo real”. Com isso decidiu mostrar o que nunca foi
mostrado, histórias não-contadas e ter um acesso direto a elas.
A ideia de abordar moradores de rua foi instantânea, porém não sabia como fazer
a abordagem nas pessoas em situação de rua. De acordo com ela, os primeiros contatos
com os moradores foram difíceis, mas com o passar do tempo uma relação entre os
moradores e ela começou a se formar, ela acredita que a comunicação é a chave de tudo
e afirma que esse foi o principal meio de conhecer e conversar com os moradores. Sua
principal ideia e proposta era estabelecer uma ponte entre a sociedade e os moradores de
rua, ela nos contou que os moradores então deram a ideia de fazer um jornal e assim
começava o Boca de Rua, no ano de 2000.
Durante todo o processo de criação do jornal os
moradores estavam envolvidos, até mesmo a escolha do
nome foi dos moradores, BOCA DE RUA: lugar onde
tudo passa e tudo acontece. O logotipo também foi
criado por um dos moradores. O logo tem dois símbolos
de igualdade que demonstram o que eles buscam ter
com a sociedade, os dois tridentes mostram como a
sociedade os vê, a boca representa os moradores
gritando.
O logotipo também foi criado por um dos moradores. O logo tem dois símbolos de
igualdade que demonstram o que eles buscam ter com a sociedade, os dois tridentes
mostram como a sociedade os vê, a boca representa os moradores gritando.
A primeira edição do jornal: Vozes de uma gente invisível, foi então lançada, nela
contendo histórias que os próprios moradores de rua escolheram, até hoje eles trabalham
na produção do jornal e na sua venda. Rosina nos contou que no começo os moradores
não sabiam de que forma vender os jornais, mas com o passar do tempo construíram
uma relação entre vendedor e comprador com as pessoas e desenvolveram táticas com o
objetivo de venda.
Começamos a falar sobre violência e o quanto isso afeta no cotidiano dos
moradores, ela afirma: “Existem moradores que exercem violência, porém o número de
moradores violentos é muito menor do que o número dos não-violentos.. Os moradores
têm um extinto de sobrevivência muito maior do que o nosso, pois eles estão expostos a
um ambiente de risco.”
Existem relatos de meninas que foram estupradas antes dos seus 14 anos e que
são abusadas até hoje tanto por policiais quanto por outros moradores. A violência sofrida
por eles é constante, ela nos falou que com a polícia armada o medo dos moradores
aumentou muito.
A questionamos sobre o uso de Drogas por parte dos moradores e ela disse:
“Grande parte dos moradores usam drogas. A droga é uma compulsão, doença, um vício.
A droga é um modo de esquecer da sua realidade”. Ela nos contou também que o Boca
de Rua tenta combater o uso das drogas mas não “limpa” as pessoas, tenta fazer uma
espécie de redução de danos.
Os albergues foram outro tema que abordamos durante a entrevista, na visão dela
e de muitos moradores de rua eles não são uma boa opção, as pessoas não têm os seus
principais pertences, além de que as vagas em albergues são muito poucas, muitas vezes
os moradores acham um lugar confortável na rua e o consideram como lar. De acordo
com ela hoje não existe um bom auxílio tanto físico quanto psicológico para moradores de
rua, o que deixa as pessoas sem esperança e impotentes.
O Boca de Rua é um importante agente de combate aos preconceitos contra os
moradores de rua, ele abre os olhos das pessoas para outras realidades. As pessoas não
notam a existência dos moradores e não enxergam o quão difícil é para eles conseguir
emprego, tratar de doenças graves e conviver com o temor que a sociedade tem contra
eles.
•1°relato: A moradora de rua nos contou que a um tempo atrás ela e seu marido
estavam curtindo de noite, tomando uma bebida, quando foram pedir um cigarro a
um homem perto a eles e então o homem se enfureceu e partiu para cima dos dois,
ela de prontidão pegou uma faca que estava guardada e partiu pra cima do cara,
porém já era tarde demais os outros sete amigos do rapaz que estavam pela
redondeza chegaram e espancaram os dois moradores de rua até quebrarem suas
costelas.
•4o relato: Outro relato aconteceu quando eles estavam na volta do arroio e
perceberam que havia algo dentro dele boiando e quando conseguiram enxergar,
notaram que era um cadáver em pleno arroio. Então ao se depararem foram relatar
à polícia porém ao contarem ao delegado, os moradores levaram a culpa pelo
corpo, mas acabou que o delegado percebeu as suas inocências.
•5o relato: Dois moradores de rua, Cristian e Márcia estavam em seu “barraco”,
quando chegou um policial ameaçando matar o filho deles caso não delatassem
um traficante da região.
Quando os perguntamos sobre a diferença que o Jornal Boca de Rua fez na vida
delas, todos deram respostas categóricas positivas, como exemplo a obtenção de seus
direitos de sociedade (não completo), esperança para continuar sobrevivendo, lhes deu
voz, aumentou suas autoestimas. Porém, o que mais nos surpreendeu foi o relato de
Márcia, moradora de rua que compõe o Jornal Boca de Rua. Antes de ser integrante do
jornal ela tinha uma autoestima muito baixa, não tinha perspectiva de futuro e havia sido
separada de seus filhos, sua família. Contudo, hoje em dia conjunto ao jornal ela ajuda a
mulheres que possuem a autoestima baixa, por conta dos inúmeros abusos que já
sofreram na rua, a se reerguer por meio de tratamentos de beleza com essas mulheres,
maquiando-as, fazendo seus cabelos. Além disso, a Márcia conseguiu recuperar o contato
com seus filhos que estavam sob a guarda da mãe de seu marido (também morador de
rua).
Durante nossa pesquisa decidimos entrevistar diversas pessoas que orbitam o
Arroio Dilúvio, com o objetivo de descobrir o que elas notam quando passam por ele.
Foram 42 entrevistados no total.
Resultados:
4 pessoas - PUCRS (parada)
12 pessoas - Ipiranga
CONCLUSÃO:
Após entrevistarmos cerca de 40 pessoas, Rosina Duarte e os moradores de rua,
foi possível observar que a invisibilidade dos moradores de rua é evidente, a violência
sofrida por eles é constante tanto por parte da sociedade quanto pelas autoridades.
A entrevista das pessoas que passam pelo Arroio Dilúvio confirmou o pensamento
estereotipado e pouco aprofundado que grande parte da população brasileira possui
sobre moradores de rua, além disso percebemos o quanto os moradores são excluídos e
menosprezados, sua presença pelo arroio não é sequer notada pela maioria das pessoas.
Nossa conversa com Rosina fora a base de nosso projeto. Aprendemos o valor da
persistência, ela foi uma das primeiras pessoas a se preocupar com pessoas em situação
de rua e dar uma voz a elas. Além disso, ela nos deu um caminho de acesso aos
moradores mais fácil.
A conversa com os moradores de rua nos possibilitou a descoberta de uma nova
realidade, totalmente diferente da nossa, o que vai além da pobreza, que é estar sujeito a
violência tanto pela sociedade quanto pelas autoridades, sejam elas violências físicas ou
verbais. Também descobrimos que os albergues não são uma solução permanente para a
situação de rua, tendo em vista que a busca por um emprego estável é inviável, pois para
conseguir uma carteira de trabalho é necessária uma moradia fixa.
06 de Novembro de 2018