Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
De Evana Ribeiro
CAPÍTULO 14
Copyright
CENA 1 - RUA DE LONDRES - EXT - NOITE
Continuação do capítulo anterior. Herman olha para
Valentina, admirado e com lágrimas nos olhos.
HERMAN
Alice!
VALENTINA
Are you confusing me, sir? My name
isn’t...
HERMAN
Você esqueceu de mim, Alice?
VALENTINA
Fala português! Escute, senhor, meu
nome não é Alice. É Valentina.
HERMAN
Tininha! (avança para ela e a
abraça, emocionado) Como você está
bonita, minha filha! Eu a vi
pequenininha!
Valentina se deixa abraçar, sem entender nada.
FADE PARA
VALENTINA
Lembro sim! Lucille me mostra as
fotos e eu lembro de tudinho sim,
senhor! (sorri)
MARCELO
Então tá. Quem você vê nas fotos?
VALENTINA
Eu, você, Alice...
MARCELO
Você quer dizer "mamãe".
VALENTINA
(finge que não ouviu)
Leon, Lucille e tio Herman.
FADE PARA
LUCILLE
Olá, doutor Marcelo.
MARCELO
Lucille, quero que conheça o doutor
Herman Villestone, pediatra.
(indica Herman) Ele salvou a vida
do nosso Leon.
LUCILLE
(levanta-se e estende a mão
para cumprimentá-lo)
Prazer em conhecê-lo. Sou Lucille
Petrovic.
HERMAN
Igualmente, senhorita.
FADE PARA
HERMAN
Sim, sim... Valentina, você está
tão parecida com sua mãe!
VALENTINA
(fazendo cara de
desapontamento)
É?
LUCILLE
Ela não gosta muito de comparações,
doutor.
HERMAN
Entendi...
VALENTINA
Lembra de Lucille, doutor?
HERMAN
Primeiro, vamos deixar de lado
esses formalismos. Afinal eu a
conheço desde o berço, sinto-me
como se fosse seu parente! E é
claro que lembro de sua babá! Como
poderia esquecer aquela adolescente
com carinha de boneca de louça?
LUCILLE
(ruborizando)
Agradeço pela parte que me toca,
doutor Herman.
HERMAN
É muito bom ver que vocês continuam
unidas até hoje. Geralmente as
crianças crescem e perdem o vínculo
com suas babysitters.
VALENTINA
Mas Lucille não foi minha babá. Ela
foi muito mais do que isso. Se
fosse enumerar tudo o que Lucille
representa pra mim, não sairíamos
daqui tão cedo.
HERMAN
E seu irmão, Valentina? O que houve
com ele?
Valentina olha para cima, pensativa.
5.
VALENTINA
(off)
Boa pergunta. Nesse tempo todo mal
lembrei que tinha irmão. O que ele
deve estar fazendo agora?
CORTA PARA
LEON
Que bom! Onde vocês vão trabalhar?
MILENA
(baixinho, para Ana Paula)
O que a gente diz agora?
ANA PAULA
(baixinho, para Milena)
Deixa comigo. (para Leon) Na
verdade, a gente não vai começar a
trabalhar hoje mesmo, sabe? Esses
amigos do meu tio tem uns amigos
que trabalham num hotel, ou algo
assim, eles não explicaram direito.
Aí souberam que a gente tava aqui e
vieram oferecer o trampo! Mas não é
definitivo não, sabe? A gente não
vai ficar muito tempo nessa.
(sorri)
MILENA
E você, Leon? Tem novidade?
LEON
Decidi fazer concurso público, já
que procurar nos classificados não
tem dado muito certo pra mim...
MILENA
Que legal!
LEON
Vou sair agora pra me inscrever.
Pra que lado vocês vão?
MILENA
A gente vai pro... Pra... Como é o
nome do lugar mesmo, Aninha?
ANA PAULA
Eita, esqueci! Acho melhor ligar
pros caras e anotar o endereço
dessa vez.
LEON
Eu vou nessa. Boa sorte no emprego!
MILENA
Boa sorte pra você também! (sorri)
Leon sai. As meninas ficam sozinhas.
7.
MILENA
Por que você pisou no meu pé?
ANA PAULA
Sei lá. Quando você disse que
ia (imita Milena)"trabalhar!",
fiquei assustada.
MILENA
Você acha que eu sou doida? É claro
que eu não ia dizer pro Leon que a
gente caiu na vida de um dia pro
outro. Ele é o nosso único amigo na
cidade, e eu não ia correr o risco
de perdê-lo por um deslize meu.
ANA PAULA
É verdade, amizade é sagrada. Ainda
mais se é um amigo lindo como o
Leon! (ri)
CORTA PARA
ANA PAULA
Obrigada! Vamos, Mi?
MILENA
Vamos.
Ana Paula e Milena saem e vão para um ponto de ônibus.
ANA PAULA
O que tinha naquele papel?
MILENA
Uma despedida. Não vamos mais ver
aqueles homens.
ANA PAULA
Sério?
MILENA
É. Agora vamos conhecer a cidade,
né? Vamos aproveitar que temos
algum dinheirinho sobrando e
passear um bocado! (acena para o
primeiro ônibus que aparece, que
pára. Elas sobem)
CORTA PARA
HERMAN
O que acha de nos reencontrarmos
amanhã? Nós quatro, na minha casa?
VALENTINA
Tudo bem! Até amanhã, então.
HERMAN
Até amanhã. (beija a testa de
Valentina)
Valentina, Lucille e Angela saem do carro, que se afasta
rapidamente.
CORTA PARA
LAYLA
Diga a ela que a levo com prazer.
(tempo) Ela perdeu outro bebê?
AMANDA
É. Infelizmente...
LAYLA
Sabe quando ela pode ir?
AMANDA
Depois de amanhã. Tá bom pra você?
Eu vou junto. Agora tenho que
subir. Tô podre de cansada! (sobe
as escadas)
CORTA PARA
JULIAN
Não adianta ficar pensando no que
poderia ter sido feito, Karen. Já
se passaram vinte anos, já foi! Não
chore mais.
KAREN
Eu vou desistir dos tratamentos.
JULIAN
Vai fazer o quê agora?
KAREN
(olha para Julian, séria)
Vamos adotar uma criança.
CORTA PARA
MILENA
E agora, o que a gente vai fazer?
Não temos mais nenhum centavo para
voltar pra casa.
DEPOENTE
(as observando de cima a
baixo)
Onde as patricinhas moram?
ANA PAULA
Boa Viagem, por quê?
DEPOENTE
Se quiser, desenrolo um troco pra
volta. Dez contos pras duas irem
pra minha casa, que tal?
POLICIAL
Ei! Trata de respeitar as moças
aqui, ou vai pra cela!
DEPOENTE
Ora, seu polícia! Essas meninas tem
toda uma cara de...
ANA PAULA
(levanta)
Pode parando, tá legal? Quem você
pensa que é pra ir acusando a
gente?
MILENA
Pára, Aninha! Não arruma mais
confusão! Vamos embora, vamos.
(pega os BOs e sai)
CORTA PARA
ANA PAULA
Perguntou pra pessoa errada,
queridinha.
Uma garota pequena, mas com feições muito femininas e
extremamente mal vestida, aproxima-se das duas.
KATIA
Problemas?
MILENA
(virando-se assustada)
Oi?
KATIA
Perguntei se vocês estão com
problemas.
ANA PAULA
Todos! Tem um trocado pra dar a
duas criaturas sem sorte que querem
voltar pra casa?
KATIA
Não tenho nem pra mim! O negócio tá
ruim aqui na praça hoje.
MILENA
Trabalha aqui?
KATIA
É. Por quê?
MILENA
Assim, só por curiosidade... O que
você faz aqui mesmo?
ANA PAULA
(arrasta Milena num canto)
Você não percebeu? Ela é
prostituta, que nem a gente! E
muito sem sorte, por sinal.
KATIA
(desconfiada)
O que vocês tão cochichando aí?
ANA PAULA
(voltando para perto de Katia)
Nada não! Assim... você também é...
prostituta?
14.
KATIA
É, por quê? Vocês também são?
MILENA
Assim... A gente é, mas começamos
ontem e já encerramos a carreira...
KATIA
Eu também dizia isso quando
comecei. Já tou nessa vida há dois
anos.
ANA PAULA
E quantos anos você tem?
KÁTIA
Dezenove.
ANA PAULA
(desconcertada)
É... Vê só... Tem alguém aqui que
possa arranjar um troco pra gente
voltar pra casa? Não somos daqui, a
gente tava só conhecendo a cidade e
fomos assaltadas.
KATIA
Vocês vão ter que se virar,
filhinhas.
Milena e Ana Paula se entreolham.
CORTA PARA
VALENTINA
Não, não... Vou ficar por aqui
mesmo. Entra, fica à vontade! Não
demoro. (sai correndo)
Michael senta no sofá e olha as fotografias espalhadas pela
sala, sorrindo. Dois minutos depois, Valentina aparece,
usando um vestido claro, os cabelos molhados e despenteados.
VALENTINA
(rindo)
Viu só como eu não demoro?
MICHAEL
Você é uma mulher de palavra!
(tempo) Você deve estar se
perguntando porque eu vim aqui sem
avisar, mas... É que eu soube do
que aconteceu no hospital ontem e
achei que devia te dar uma força.
Afinal, você foi tão bacana comigo
naquele dia do almoço e...
VALENTINA
Eu só tava retribuindo o que você
fez pela minha filha. (tempo) Mas
eu agradeço muito pela sua
preocupação comigo, de verdade! A
gente se conhece há tão pouco
tempo, e você tem sido um grande
amigo, como poucos foram comigo.
MICHAEL
Mas você deve ter muitos amigos,
não? Sempre pensamos em você como
uma pessoa tão extrovertida,
sociável...
VALENTINA
É verdade, eu sempre gostei de sair
na frente, sempre fui cercada de
gente na escola, na faculdade.
Companhias de balada tinha aos
montes, mas amigos de verdade eu
conto nos dedos. Sua mãe é uma
dessas pessoas. E agora tem você!
(coloca a mão sobre a dele)
Os dois ficam de mãos dadas, se olhando fixamente. Lucille e
Angela aparecem. Lucille tenta passar sem ser notada, mas
Angela larga sua mão e corre para os braços da mãe,
interrompendo o clima. Michael fica sem graça, mas Valentina
começa a rir.
16.
CORTA PARA
LAYLA (...cont.)
libertasse da lembrança da Kate!
Estou até mais animada para
trabalhar.
Layla volta a trabalhar na escultura. Darren pega algumas
sobras de argila e começa a modelá-la. Sobe The Greatest -
Cat Power.
CORTA PARA
MATEUS
Então... Traz uma coca cola.
GIULIA
Assim tá melhor! (sai)
Depois que Giulia se afasta, Mateus começa a olhar as mesas
próximas, procurando alguma garrafa de rum. Giulia volta com
uma lata de coca cola e a coloca sobre a mesa.
GIULIA
Bebe logo e cai fora, que a gente
não quer confusão com a sua mãe.
MATEUS
Não esquenta, lindinha! (joga um
beijo para Giulia)
Giulia olha séria para Mateus e sai. Ao se ver sozinho, ele
vai furtivamente até uma das mesas que tem uma garrafa de
rum e coloca um pouco em seu copo sem ser notado. Depois
volta para sua mesa, coloca coca cola no copo e bebe de um
trago só. Repete este ritual mais três vezes.
Clarice entra no bar sem ser notada. Olha para os lados,
tentando encontrar seu filho. Vê de longe um garoto bebendo
sozinho em uma mesa e reconhece Mateus imediatamente. Começa
a correr, esbarrando nas pessoas até chegar à mesa. Mateus
continua bebendo sem dar pela presença da mãe. Ela fica por
alguns instantes apenas o observando.
CLARICE
(grita)
Mateus!
MATEUS
(vira-se assustado)
Mãe? O que... O que você tá fazendo
aqui?
CLARICE
(puxando Mateus pela orelha)
Eu que pergunto o que você está
fazendo aqui! O que eu disse a você
essa manhã, hein mocinho? O que eu
disse?
MATEUS
(tentando se soltar)
Ah, mãe! Eu não lembro nem o que
comi na hora do almoço!
19.
CLARICE
Ah, é? Não lembra? (aperta a orelha
dele com mais força) Olha só, está
completamente bêbado! (o arrasta na
frente de todos) Pois amanhã mesmo
o senhor vai se confessar com o
padre. Nem que eu tenha que levá-lo
à igreja arrastado pelos cabelos!
(sai)
LUIGI
(olhando de longe, incrédulo)
Mas esse menino não aprende mesmo!
GIULIA
Eu avisei que a gente não queria
confusão, mas ele disse que não ia
beber...
LUIGI
Esqueça, bambina, esqueça. Vai
atender a mesa 18.
GIULIA
Já vai. (sai)
CORTA PARA
ANA PAULA
Tava sonhando acordada?
MILENA
Não... Eu tava pensando no Leon.
ANA PAULA
Sim, tava sonhando acordada. E que
sonho, hein?
MILENA
(finge que não ouviu)
É que a gente tá aqui, sem
problemas financeiros, e ele,
coitado, tá todo enrolado! (tempo)
A gente devia ajudar ele.
ANA PAULA
Emprestando dinheiro?
Milena pega algumas notas de cinqüenta reais e sai sem dizer
nada.
CORTA PARA
MILENA
Tá achando ruim? Então vá pra
cozinha e faça milagre.
ANA PAULA
Não, não é isso! É que comer a
mesma coisa durante a semana enche
um pouco...
MILENA
Que exagerada...
ANA PAULA
Quando a gente não come com os
clientes, o que é que a gente come?
Miojo!
MILENA
Tá, tá, você tá certa! Mas dá pra
comer enquanto ainda tá quente?
ANA PAULA
(comendo)
O que o Leon disse do dinheiro?
MILENA
Nada.
ANA PAULA
Como assim, não disse nada? Você
deu o dinheiro e ele recebeu assim,
sem nem perguntar de onde veio?
MILENA
Eu não dei o dinheiro nas mãos
dele. Passei por baixo da porta e,
a essa hora, ele já deve ter
encontrado.
ANA PAULA
Que bonitinho... Uma mulher
apaixonada tentando ajudar o ser
amado sem ofendê-lo!
MILENA
Apaixonada, eu? (ri) Nada a ver,
Aninha.
ANA PAULA
Sim, nada a ver... Tu já
experimentou se olhar no espelho
quando fala do Leon? Já percebeu
que de vez em sempre você fica
(MAIS...)
23.
VALENTINA
Eu? (ri)
ANGELA
Foi ela, vovó! (aponta para
Valentina)
VALENTINA
Angie, coisa feia! Eu escolhi uma
roupa tão bonita pra você, mas você
quis trocar três vezes.
LUCILLE
Vamos logo, já estamos atrasadas.
VALENTINA
Ai, como o carro vai me fazer
falta! Espero que não demore muito
para ficar pronto.
As três saem e pegam o elevador.
CORTA PARA