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Florianópolis
Universidade Federal de Santa Catarina
2005
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Florianópolis
Universidade Federal de Santa Catarina
2005
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DEDICATÓRIA
Dedico não só este trabalho, mas também minha formação e todas as demais vitórias
que já tive e terei a quem dedicou toda sua vida em favor de seus três filhos, minha mãe,
Eunice Knoner Campos. Esta mulher foi mãe e pai ao mesmo tempo, dedicou seu tempo,
dinheiro, carinho, seus cuidados e amor para que seus filhos se tornassem homens de bem,
tementes a Deus, respeitáveis e respeitadores. Para ela não tinha tempo ruim, por mais que
esta família tivesse dificuldade, nunca se deixou abalar. Esta rocha tinha o incrível poder de
transformar situações ruins em coisas banais, derrubava facilmente muralhas que a vida
impunha. Sabia que só teria uma chance de fazer com que seus filhos se tornassem alguém,
somente um caminho: a educação, e foi onde apostou tudo. O resultado desta aposta: um filho
médico e dois advogados, filhos que hoje se orgulha e não se arrepende nem um dia de todo
seu esforço e dedicação. Sempre repetia para seus filhos a frase só descansarei quando ver
vocês formados, não importe se isso custar minha vida, neste dia então eu poderei descansar .
III
4
AGRADECIMENTOS
IV
5
SUMÁRIO
XI
RESUMO....................................................................................................................................8
XII
SUMMARY................................................................................................................................9
1. INTRODUÇÃO ..................................................................................................................8
2. REVISÃO DE LITERATURA.........................................................................................10
3. OBJETIVOS .....................................................................................................................33
4. METODOLOGIA .............................................................................................................34
5. RESULTADOS ................................................................................................................36
6. DISCUSSÃO ....................................................................................................................46
7. CONCLUSÃO ..................................................................................................................57
APÊNDICE...............................................................................................................................63
RESUMO
A neuralgia do trigêmeo é uma dor neuropática facial que acomete os ramos do nervo
trigêmeo, uma das dores mais severa conhecida, que por vezes torna a vida do paciente
incapacitante. O objetivo deste trabalho foi caracterizar uma amostra de pacientes com NT e
os resultados do tratamento com compressão percutânea com balão. Método: estudo
retrospectivo de 39 pacientes que fizeram este procedimento entre 1999 a 2004, devido ao não
controle clínico da dor. Resultados: leve prevalência do sexo feminino, idade média de 62,3
anos. Fizeram tratamento cirúrgico prévio ou não convencional cerca de 20 %. Metade dos
pacientes procuraram dentista, e destes, metade fez procedimento odontológico. A dor na
maioria dos casos foi: desencadeada por contato cutâneo, com tics, acometendo lado direito e
ramos V2V3, dor tipo choque elétrico. Todos consideraram como a pior dor, afetando
muito/terrivelmente a qualidade de vida em 97,5 %. A relação alimentação/perda ponderal
teve p = 0,65. Houve sucesso inicial de 98 %, o efeito colateral mais comum foi a parestesia,
tolerado pela maioria que se mostraram satisfeitos com a cirurgia, a mortalidade foi zero. A
taxa de recorrência foi de 20 % em 50 meses, e a parestesia teve nível significante.
Conclusão: a NT atinge pacientes idosos com repercussão terrível em suas vidas, fazendo-os
se submeterem a procedimentos odontológicos desnecessários. Não houve relação estatística
significante entre alimentação/perda ponderal. Pacientes com parestesia têm menos chances
de recorrência. O procedimento percutâneo com balão mostrou-se seguro mesmo em idades
mais avançadas, sem mortalidade e morbidade tolerável.
VI
9
SUMMARY
The trigeminal neuralgia is a facial neuropatic pain that affects the roots of trigeminal
nerve; one of the strongest known pains that in times disables the patient s life. The objective
this paper was to describe a sample of patients with TN and the results of treatment with the
percutaneous balloon compression technique. Methods: retrospective study of in 39 patients
that was carried out this procedure between 1999 and 2004, because of not medical control of
TN. Results: there was a discreet feminine prevalence; the average age was 62,3. Twenty
percent of patients had undergone previous surgical treatment or alternative treatment. Half of
the patients went to the dentist, and half of them went through odontological procedure. The
pain in the majority was: cutaneous contact disenchanted, with tics, on the right side and
V2V3 division, electric shock-like pain. All patients considered the pain to be the worst, and
in 97,5 % of the patients had a terrible effect in the quality of life. The nutrition/weight loss
relationship had p=0,65. The initial success was 98 %, the most common side effect was
paresthesia tolerated by the majority that were satisfied with the procedure. There was any
death. The recurrence rate was 20 % in 50 months. The paresthesia had significant level.
Conclusion: the TN affected the elderly with a terrible repercussion in their lives, and subjects
them to unnecessary odontological procedures. There wasn t statistic association between
nutrition/weight loss. Patients with paresthesia have less probability of recurrence. The PBC
showed to be a safe procedure even in the elderly, with no mortality and tolerated morbidity.
VII
8
1. INTRODUÇÃO
Uma das dores mais severas de que se tem conhecimento, a neuralgia (ou neuralgia)
essencial do trigêmeo é o protótipo da dor neuropática, uma síndrome de dor facial rara
caracterizada por dor tipo choque-elétrico , lancinante, paroxística, e é sentida dentro da
distribuição de uma ou mais divisões do nervo trigêmeo, responsável pela sensibilidade da
face. A dor ainda é descrita como se fosse a sensação de um fio elétrico desencapado
encostando-se à face 1.
Cada ataque de dor dura apenas alguns segundos, mas a dor pode ser tão repetitiva
num curto intervalo de tempo de tal forma que cada ataque novo pode se confundir com o
antecedente, dando às vezes a sensação de dor contínua no paciente. Freqüentemente esta dor
também é acompanhada de leves espasmos faciais, ou tic, e por este motivo também é
conhecida como tic douloureux, que em francês significa tic doloroso 1.
A dor é freqüentemente disparada por estímulos originados na pele, mucosa ou dentes
inervados pelo nervo trigêmeo ipsilateral, nas chamadas zonas-gatilho (Triggers points).
Assim, atividades cotidianas como dormir, fazer a barba, escovar os dentes, comer e até
mesmo falar podem ser extremamente difíceis, dando um prejuízo de tão grande proporção na
qualidade de vida do pacientes que pode levá-lo ao emagrecimento, desidratação, depressão e
até mesmo ao suicídio 1.
A neuralgia do trigêmeo se divide academicamente em essencial e secundária. A causa
da neuralgia secundária normalmente é evidente, pois além da neuralgia facial o paciente
apresenta algum déficit neurológico. Geralmente é causada por tumores no ângulo cerebelo-
pontino 3, 4.
A etiologia da neuralgia essencial do trigêmeo é confusa, no entanto acredita-se que
seja multicausal, sendo consenso que a principal, mas não única, seja o contato neurovascular.
O contato crônico de uma artéria sobre o nervo trigêmeo causa uma lesão no local do contato,
provocando desmielinização local, e conseqüentemente hiperexcitabilidade das fibras
nociceptivas levando à dor 4.
O diagnóstico é essencialmente clínico, no entanto, se houver déficit neurológicos
associados à neuralgia do trigêmeo (NT) estudos de imagem devem ser solicitados 1, 4, 8, 24, 25.
9
2. REVISÃO DE LITERATURA
2.1 HISTÓRICO
Uma revisão da história da neuralgia do trigêmeo (NT) pode muito bem ilustrar o
impacto avassalador desta doença tanto no indivíduo quanto na evolução do conhecimento
médico-cirúrgico a despeito das causas e tratamentos desta dor facial. Apesar da neuralgia do
trigêmeo não ter sido bem documentada na literatura médica antiga, credita-se a Aretaeus de
Cappadocia*, a primeira descrição da neuralgia do trigêmeo, que a descreve como sendo uma
1-3
dor de cabeça acompanhada de espasmos e distorções do semblante .
O próximo registro histórico que se tem, trata-se de uma precoce e parcial descrição
dos sintomas da neuralgia do trigêmeo que foram descritas pelo médico e filósofo persa
Avicenna no século XI em seu livro Quanum, onde escreveu sobre uma condição severa de
dor facial sem perda de força ou sensação. Segundo ele, o tratamento recomendado era vinho
e repouso em quarto escuro 1,4.
A primeira narrativa clara da neuralgia do Trigêmeo foi feita em 1671, pelo médico
alemão Johannes Laurentius Bausch, que inclusive sofria de dor em fisgada na maxila direita.
Ele ficou inábil para falar e comer por causa desta dor, e sucumbiu por escorbuto e
desnutrição após quatro anos de sofrimento. Depois deste caso, a literatura médica européia
começou a fazer mais freqüentemente relatos da doença. Em 1732, um médico francês,
Nicolas Anché, descreveu vários casos de neuralgia do Trigêmeo e batizou esta desordem
como tic douloureux. Então, assim como hoje, o diagnóstico começou a ser baseado
largamente na cuidadosa história coletada pelos médicos 1,4.
A história do tratamento clínica da neuralgia do trigêmeo (NT) demonstra a
preponderante severidade da dor, bem como as condutas médicas aplicadas. O médico inglês
*
Médico grego de Cappadocia que trabalhou em Roma e Alexandria, liderou um reavivamento dos
ensinamentos de Hipócrates, e ele é tido como segundo pai da medicina.
11
John Fothergill foi o primeiro a dar uma definição mais completa e detalhada sobre esta dor
em seu trabalho intitulado "On a Painful Affliction of the Face", apresentado para a Sociedade
Médica de Londres em 1773. Também escreveu uma receita para o tratamento da neuralgia do
trigêmeo a base de extrato de cicuta. Incontáveis outras terapias, por vezes pouco racionais,
foram aplicadas na esperança de aliviar a dor. Relatos da eficácia desses tratamentos foram
provavelmente resultado da coincidência da remissão espontânea da doença tanto quanto
qualquer efeito terapêutico de poções administradas 1,3, 4.
Um ensaio mais moderno de tratamento clínico da doença pode ser realizado por
Hutchinson e subseqüentemente por Davidoff, que recomendaram o uso de carbonato de
ferro. No início do século XX, tricloroetileno, um agente anestésico volátil e solvente
industrial, foi relatado ter efeito benéfico no alívio da neuralgia do trigêmeo. Os pacientes
tratados então, desenvolveram dormência e parestesias sem fraqueza muscular. Subseqüentes
tentativas após estas e em linhas similares de tratamento feitas por outros autores foram
relativamente sem sucesso e acabaram em abandono do procedimento 1, 6.
Em 1900, um célebre artigo de Cushing relatou um método de ablação total do gânglio
gasseriano para o tratamento da neuralgia do trigêmeo 3.
Em 1912, Osler fez as seguintes observações sobre a neuralgia do trigêmeo: Em
pacientes com NT avançada, os paroxismos seguiam um ao outro sem qualquer causa
evidente, e nos intervalos os pacientes jamais poderiam estar livres da dor; as crises iniciavam
por quase todos estímulos externos, como por exemplo, por uma corrente de ar, movimento
dos músculos faciais e ou a lingual durante a fala, tocar na pele, particularmente sobre aqueles
pontos cuja dor parecia originar; e a ação de engolir, especialmente quando a dor envolvia
área mucosa da distribuição do nervo; não era uma doença autolimitada. Em alguns exemplos
a neuralgia alcançava uma intensidade tão terrível que tornava a vida do paciente
incapacitante. Em tempos remotos, o suicídio não era uma conseqüência rara 3.
12
2.2 ANATOMIA
Figura 1. Visão medial do gânglio de Gâsser, destacado em vermelho, e suas ramificações saindo da fossa
média: V1 (fissura orbitária superior), V2 (forame redondo) e V3 (forame oval). FONTE: Netter 7.
13
Figura 2. Visão superior da fossa média, mostrando o gânglio de Gâsser e sua relação com as demais estruturas
da fossa média. O gânglio de Gâsser do lado direito foi rebatido para cima para visualização das estruturas sob
este gânglio. FONTE: Netter 7.
ocular; da parte ectodérmica da mucosa da cavidade bucal, nariz seios paranasais; dos dentes;
dos 2/3 anteriores da língua; da maior parte da dura-máter craniana 5, 6.
Figura 3. Desenho esquemático mostrando a inervação sensitiva da face conforme dermátomos do nervo
trigêmeo e seus respectivos ramos. FONTE: modificado de Netter 7.
Figura 4: desenho esquemático ilustrando o conflito neuro-vascular. Visão micorscópica via acesso de fossa
posterior. Fonte: referência 19, desenho modificado.
Estudos anatômicos por Hardy, Peace, e Rhoton demonstraram que a artéria cerebelar
superior foi o ponto vascular mais comum de contato com a zona de entrada da raiz do
trigêmeo, foi constatado contato entre o nervo trigêmeo e a artéria cerebelar superior em 26
dos 50 nervos extracranianos, e envolvimento da artéria cerebelar póstero-inferior em apenas
quatro casos. Este padrão foi confirmado por séries cirúrgicas, que identificou mais
freqüentemente a artéria cerebelar superior como o ponto de compressão vascular. Além
disso, compressão venosa da zona de entrada da raiz do V par craniano tem sido associado
com a neuralgia do trigêmeo em aproximadamente 10% dos casos operados 18.
O achado anatômico comum de pulsação vascular da raiz do nervo trigêmeo (zona de
entrada ou parte proximal da raiz do trigêmeo) em indivíduos presumivelmente
assintomáticos aumenta algumas questões como qual o papel da compressão vascular na
fisiopatologia da neuralgia do trigêmeo. O porquê certos indivíduos tornam-se sintomáticos e
outros com o mesmo encontrado anatômico ficam assintomático não está claro 3, 4, 8, 17, 18.
Casos de neuralgia trigeminal familiar tem sido descrito na literatura, creditando um
possível caráter hereditário a essa doença com uma aparente transmissão autossômica
dominante, responsável pelas alterações vasculares já ditas. Encontrou-se em pacientes com
17
dor poderá acionar sinal de alerta para o médico procurar por uma possível lesão estrutural
responsável pelos achados alterados. A presença de qualquer queixa sistêmica, como febre,
malignidade, ou perda de peso inexplicável deve ser totalmente explorada, haja vista o alto
valor preditivo destes sinais quando associados a alterações neurológicas. O paciente pode ser
indagado sobre recentes cirurgias/procedimentos odontológicos compatível com sua condição
clínica. Não é raro o paciente procurar avaliação neurocirúrgica depois de procedimentos
cirúrgicos odontológicos terem falhado no alívio de sua dor 1, 24.
*
A síndrome de Horner é condição rara, decorrente de lesão da via simpática que pode ocorrer em qualquer
nível, desde o hipotálamo, até o olho. É caracterizada pela tétrade de sinais: ptose, miose, enoftalmo e anidrose
facial.
21
Figura 5: RM: A, cisto epidermóide (seta) no ângulo cerebelo-pontino esquerdo. B, schwannoma (seta) no
ângulo cerebelo-pontino esquerdo. C, malformação artério-venosa (seta) no cerebelo e vermis. D, meningioma
(seta) no ângulo cerebelo-pontino esquerdo. FONTE: figuras 1, 2, 4, 5 de Goh BT, Poon CY and Peck RHL 25.
trigêmeo e em detectar lesões que promovem NT, tais como placas de esclerose múltipla,
gliomas do tronco encefálico, acidente vascular encefálico, vasos anômalos comprimindo a
zona de entrada da raiz trigeminal e tumores cisternais (Figura 5) 1, 24, 25.
O valor diagnóstico da angiografia por ressonância magnética com reconstrução 3D na
elucidação diagnóstica da neuralgia do trigêmeo, foi tema de um trabalho cujo objetivo era
demonstrar também contato neurovascular e/ou deslocamento do nervo trigêmeo em pacientes
com neuralgia deste nervo. Foi realizado em 172 pacientes acometidos pela neuralgia do
trigêmeo. Os resultados deste método de imagem foram comparados aos dados clínicos dos
pacientes. O contato neurovascular na zona de entrada da raiz trigeminal foi detectado sobre o
lado sintomático em 94 pacientes (figura 6), e sobre o lado assintomático em 12 pacientes 21.
A importância no diagnóstico pré-operatório de contato neurovascular está na escolha
da técnica neurocirúrgica a ser adotada, sendo esta questão abordada mais adiante em
tratamento cirúrgico 26.
Figura 6: À esquerda, compressão neurovascular tipo sandwich . O nervo trigeminal direito está enlaçado entre
uma alça arterial (seta vermelha) e uma veia (seta amarela), mostrados nos planos A axial, e B coronal. Na
reconstrução sagital C, a zona de entrada do nervo (seta de baixo) está em contato cerrado com a artéria (seta
aberta). À direita, tem-se a reconstrução axial D, coronal E, e sagital F do deslocamento do nervo trigeminal
esquerdo (seta superior). FONTE: figuras 1 e 2 modificadas de Vörös et al 26.
23
2.7 DIAGNÓSTICO
INDICAÇÕES 1, 3, 4, 27
CONTRA-INDICAÇÕES 1, 3, 4, 27
TÉCNICA CIRÚRGICA
Figura 7: A: posicionamento do paciente no aparelho Arco em C. B: Rx perfil. A seta indica o forame oval 30.
Figura 8. A: ponto nº 1 fica a 3 cm anterior ao tragos, ponto nº 2 abaixo da pupila, ponto nº 3 a 2,5 cm da
comissura labial. B: inserção percutânea da agulha no ponto nº 3 até o gânglio Gâsser via forame oval. Fonte: 19.
Usando uma cânula graduada nº 14, penetra-se então na pele no terceiro ponto de
referência (figura 8B) que fica a 2,5 cm lateral à comissura labial. Uma cânula de Guedel
pode ser usada no paciente para evitar mordidas involuntárias no dedo indicador do cirurgião,
que está posicionado inferiormente à asa lateral do pterigóide. O posicionamento do dedo
indicador do cirurgião é importante para evitar que a cânula penetre na mucosa da cavidade
oral, além de guiar a cânula para dentro da porção medial do forame oval dirigindo-o em
direção à intersecção de um plano coronal que passa pelo ponto a 3 cm do tragos e um plano
sagital passando pelo aspecto medial da pupila. Pelo controle radiológico do intensificador na
pose perfil, o cirurgião direciona a cânula 5 a 10 mm abaixo do assoalho da sela turca ao
longo do clivo (figura 9) 27.
A entrada da cânula dentro do forame oval é sentida pelo neurocirurgião e é sinalizado
por uma leve contração do músculo masseter, que indica contato com o gânglio de Gâsser. Se
a atropina não foi usada ainda, uma breve bradicardia pode ocorrer quando a cânula engrenar
no forame oval devido ao reflexo trigêmino-cardíaco, também usado pelo cirurgião como
sinal de que a cânula engrenou no forame oval. Neste momento o anestesista pode optar pela
administração da atropina, previamente preparada na mesa anestésica 27.
29
Figura 9. A: ilustração da relação da raiz trigeminal com o clivos e a agulha. Os números 1,2 e 3 indicam os
ramos do nervo trigêmeo. B: a agulha é inserida 5 a 10 mm abaixo da intersecção da linha do assoalho (floor) da
sela turca com a linha clival, ou da intersecção da porção petrosa com o clivo. C: pose lateral da fluoroscopia
mostrando a inserção da agulha conforme os desenhos A e B, os pontos 1 e 2 indicam clinóide anterior e
posterior respectivamente. Fonte: A e B Youmans 27, C fluoroscopia de um dos casos estudados.
Uma vez que o forame oval é engrenado pela cânula, então um cateter de Fogarty nº 4
avança para a entrada do cavum de Meckel, normalmente 17 a 22 mm além do forame. Se
uma pose anteroposterior é obtida com o fluoroscópio, centrando a rugosidade da porção
petrosa do temporal dentro da órbita, um declive é visto medialmente representando a entrada
do nervo trigêmeo por sobre a porção petrosa. Esta imagem é descrita como estando a 9 mm
medial do limite lateral ao canal auditivo interno. Se um estilete é usado, então uma via pode
ser criada através do qual o cateter de Fogarty facilmente transpassará. O cateter
freqüentemente divaga deste ponto se a agulha nº 14 não é apropriadamente posicionada no
trajeto em que foi direcionada. O cateter de Fogarty é leve e rombo e pode limitar os riscos de
hemorragia se usada sozinha, mas se o cateter não achar o poro trigeminal, então as fibras
retrogasserianas não serão comprimidas pelo balão, e é neste poro que se obtém as mais altas
pressões com o balão. O balão levanta a dura-mater inelástica livre do gânglio, limitando a
pressão a que ela é comprimida. No poro trigeminal, o balão comprime as fibras
retrogasserianas contra a borda firme da dura-máter e a rugosidade petrosa, permitindo que o
nervo passe para dentro do cavum de Meckel, esta abertura tem 9 mm X 2 mm 28.
Figura 10. A: representação esquemática da disposição do gânglio de Gâsser no cavum de Meckel relacionada
às camadas das meninges. B: Desenho esquemático demonstrando a penetração da agulha nas fibras retro-
gasserianas através do forame oval. Fonte: referência 19, desenho modificado.
31
Quando o balão é inflado dentro do poro trigeminal, ele adquire a forma característica
de pêra vista no fluoroscópio (figura 11A). No entanto, se ele adquirir um formato diferente
(figura 11B), isto é um sinal de que o balão está incorretamente posicionado, e provavelmente
o resultado do procedimento será comprometido. É importante que o balão na ponta do cateter
esteja posicionado na entrada do cavum de Meckel. Se a insuflação for insuficiente, então o
grau de parestesia será limitado, e provavelmente limitado a V3. Se a ponta do cateter no
espaço subaracnóideo estender-se além da parte petrosa do temporal o tronco cerebral pode
ser comprimido, mas certamente a maioria dos nervos não será lesada suficientemente.
Nenhuma lesão ocorre se o balão escorregar de encontro à fossa posterior, entretanto a
operação não será bem sucedida se isto acontecer 28.
O balão é inflado 0,75 a 1,00 cc (seringa de tuberculina) por 1 minuto ou até 1,5
minuto. Se for usado uma simples seringa de tuberculina, o neurocirurgião terá a vantagem de
poder sentir em seu dedo uma contrapressão (feedback) da pressão aplicada. O insuflador
mecânico tem a desvantagem de não ter este feedback, entretanto é um modo simples de
começar 28.
Figura 11. Fluoroscopia em perfil demonstrando em A, forma característica de pêra que o balão adquire quando
corretamente posicionado, e em B, balão com forma diferente (feijão) demonstrando posicionamento incorreto.
Fonte: dois pacientes que fizeram procedimento no serviço de neurocirurgia da Clínica Neûron.
32
3. OBJETIVOS
4. METODOLOGIA
DELINEAMENTO
Trata-se de um estudo transversal, descritivo, não controlado, retrospectivo.
CASUÍSTICA
No período de 1999 a 2004, o serviço de Neurocirurgia Funcional da clínica Neûron
(Clínica Imagem) em Florianópolis - SC, realizou 41 procedimentos em 39 pacientes com
neuralgia do trigêmeo essencial, que fizeram a compressão percutânea por balão do gânglio
de Gâsser, e foram selecionados de acordo com o critério abaixo:
Critérios de inclusão: pacientes em acordo com os critérios diagnósticos de
neuralgia trigeminal idiopática (essencial) pela International Headache Society.
COLETA DE DADOS
Os dados foram coletados de duas formas, revisão de prontuários e entrevista
telefônica. Os dados clínico-demográfico (dados pré-operatórios) foram colhidos dos
prontuários médicos da clínica Neûron, e algumas pendências destes dados juntamente com os
dados pós-operatórios foram colhidas por entrevista telefônica. Os dados dos prontuários
foram colhidos entre os meses de março a dezembro de 2004, e a entrevista telefônica entre
agosto e dezembro de 2004.
Para a coleta dos dados foi utilizado um protocolo de pesquisa (Apêndice I), dividido
em dados de identificação do paciente, dados clínico-demográficos e dados pós-operatórios,
com as seguintes informações:
Dados de identificação do paciente: nome, endereço, telefone, idade, sexo.
Dados pré-operatórios: tempo com neuralgia, tipos de tratamentos prévios, droga
utilizada para controle da dor, motivo do insucesso clínico, métodos não
convencionais utilizados como tratamento, qualidade da dor, intensidade da dor e sua
interferência na qualidade de vida, queixa de dificuldade para se alimentar, perda
ponderal, modo de desencadeamento da dor, lado e ramo do trigêmeo acometido,
procura por dentista com ou sem procedimento odontológico (extração dentária ou
tratamento de canal), e outro familiar de 1º com neuralgia do trigêmeo.
35
ANÁLISE ESTATÍSTICA
Os dados obtidos foram analisados com o auxílio do software SPSS 12 for Windows.
A probabilidade cumulativa de permanecer curado ao longo do seguimento está
apresentada pela curva de Kaplan-Meyer (Gráfico 7). A existência de associação entre a
incapacidade de comer durante a crise e a perda ponderal de mais de 5 kg foi analisada através
do teste exato de Fisher com um nível de significância p < 0,05.
Foi realizada uma análise univariada (Tabela 9) comparando as diferenças na
distribuição das variáveis clínico-cirúrgicas e demográficas entre pacientes com resultado
cirúrgico favorável (curados) e os que recorreram, e para isso algumas variáveis foram
categorizadas. Foi utilizado o modelo de risco proporcional de Cox (Cox proportional
hazzards model) para estabelecer o nível de significância entre as variáveis estudadas
(independentes) e o resultado cirúrgico (variável dependente). A magnitude de associação
entre determinada variável e o resultado cirúrgico observada na análise univariada (Tabela 9)
foi medida através do Hazzard-ratio bruto e o respectivo intervalo de confiança de 95% (IC
95%). Variáveis clínico-demográficas que mostraram uma associação com o resultado
cirúrgico com um nível de significância de p inferior a 0.20 foram incluídas no modelo final
de regressão múltipla de Cox (Tabela 10) para estabelecer o grau de associação entre cada
uma destas variáveis e o resultado cirúrgico de forma independente, e este modelo final
refinou estas variáveis adotando nível de confiança de p < 0,05.
36
5. RESULTADOS
DADOS PRÉ-OPERATÓRIOS
Masculino
Feminino
46%
54%
A idade média foi de 62,3 anos, variando entre 26 anos e 87 anos, distribuídos nas
faixas etárias conforme o gráfico 2.
37
15
3 8 ,5 %
M e a n = 6 2 ,0 3
Std . D e v . = 1 2 ,5 5 6
N = 39
12
23 %
9
18 %
6
13 %
3
5 %
2 ,5 %
0 %
0
20 30 40 50 60 70 80 90
Id a d e
Tempo com NT N %
< 10 anos 27 69,2
10 anos 12 30,8
TOTAL 39 100 %
Fonte: prontuários da clínica de neurocirurgia NEURON.
38
Carbamazepina %
N
Não 1 2,6
Sim 38 97,4
TOTAL 39 100 %
Fonte: prontuários da clínica de neurocirurgia NEURON.
Cerca de 18 % dos pacientes utilizaram outra droga além da CBZ, e estas foram: Baclofen,
fenitoína, gabapentina, nortriptilina e AINEs
Sem controle
Efeito colateral
8% Ambos
23%
69%
Nota: os dados constam na tabela 12 do apêndice II.
Efeitos colaterais referidos foram hepáticos, intoxicação, sonolência, tontura, cansaço, visão turva, vertigem.
Cerca de 20 % fizeram algum tipo de tratamento cirúrgico prévio para o tratamento da NT, e
estes foram: Alcoolização, rizotomia por radiofreqüência, descompressão microvascular,
rizotomia por balão, cirurgia aberta intra-oral, 2 infiltrações anestésicas. Aproximadamente 54
% dos pacientes procuraram dentista em virtude da dor, e destes, cerca de 28,2 % fizeram
algum tipo de procedimento odontológico como extração dentária ou tratamento de canal.
39
Tratamento não N %
convencional
Não 31 79,5
Acupuntura* 4 10,3
Homeopatia 3 7,7
Outros** 1 2,6
TOTAL 39 100
Fonte: entrevista com pacientes entre setembro a dezembro de 2004.
* Um caso teve piora da dor, no restante não houve alívio. ** Benzedura.
87%
Nada
Pouco
% de pacientes
Médio
Muito
Terrivelmente
10,5%
0,0% 0% 2,5%
Cerca de 84,6 % dos pacientes relataram dificuldade de se alimentar por causa da NT,
e destes, 36 % relataram perda ponderal em virtude desta dificuldade. Dentre os 14 pacientes
(36%) que referiram perda ponderal, a quantidade média de peso perdido relatada foi de 6 Kg
/pessoa. A associação incapacidade de alimentar-se e perda ponderal foi analisada
estatisticamente pelo teste exato de Fisher com resultado de p = 0,65.
Desencadeamento da dor N %
Falar 2 5,1
Mastigar 7 17,9
Contato cutâneo/mucoso* 25 64,1
Brisa/vento 5 12,8
TOTAL 39 100
Fonte: prontuários da clínica de neurocirurgia NEURON. * Coçar, fazer a barba, escovar os dentes.
41
DADOS PÓS-OPERATÓRIO
Imediato
1 a 7 dias
8 a 15 dias
5,0% 2,5% > 15 dias
13% Não obteve alívio
79,5%
NOTA: os dados constam na tabela 12 do apêndice II.
Interferência N %
Nada 12 36,5
Pouco 17 51,5
Médio 2 6
Muito 1 3
Terrivelmente 1 3
TOTAL 33 100
Fonte: entrevista com pacientes entre setembro a dezembro de 2004.
6 4 ,1 %
7 0
6 0
5 0
40
2 5 ,6 %
%
3 0
1 0 ,3 %
2 0
1 0
R u im B o m Ó t im o
TABELA 9: Associação entre as variáveis clínica-cirúrgicas e demográficas e os resultados da rizotomia percutânea por balão.
Análise univariada pelo modelo de risco proporcional de Cox (Cox proportional hazzards model).
Todos os Resposta ao tratamento HR bruto IC 95% p
Variável Pacientes Curado Recorrência De recorrência
n = 39 (100 %) n = 33 (84,6 %) n = 6 (15.4 %)
Sexo
Masculino 18 (46) 15 (83,3) 3 (16,7) 1.0
Feminino 21 (54) 18 (85,7) 3 (14,3) 1,53 (0,29 7,95) 0,61
Idade
Média (DP) 62,3 (12,5) 61,7 (12,7) 63,5 (12,5)
Até 60 anos 17 (44) 14 (82,4) 3 (17,6) 1,0
Acima de 60 anos 22 (56) 19 (86,4) 3 (13,6) 3,0 (0,44 20,47) 0,26
Tempo c/ NT
Média (DP) 7,5 (6,1) 8,2 (6,3) 3,8 (2,4)
Mais ou = 10 anos 12 (31) 12 (100) 0
Menos 10 anos 27 (69) 21 (77,8) 6 (22,2) NA NA 0,33
Tto cirurg prévio
Sim 8 (20,5) 5 (62,5) 3 (37,5) 1,0
Não 31 (79,5) 28 (90,3) 3 (9,7) 5,19 (0,86 31,04) 0,07
Tic facial
Não 16 (41) 14 (87,5) 2 (12,5) 1,0
Sim 23 (59) 19 (82,6) 4 (17,4) 3,48 (0,38 31,7) 0,27
Lado
D 33 (84,5) 28 (84,8) 5 (15,2) 1,0
E 06 (15,5) 5 (83,3) 1 (16,7) 2,0 (0,21 19,28) 0,55
Ramos acometidos
Único 20 (51) 16 (80) 4 (20) 1,0
Mais de um 19 (49) 17 (89,5) 2 (10,5) 0,44 (0,79 2,47) 0,34
Procedimento odonto
Não 33 (84,6) 28 (84,8) 5 (15,2) 1,0
Sim 6 (15,4) 5 (83,3) 1 (16,7) 2,16 (0,22 20,1) 0,50
FONTE: análise estatística dos dados através do software SPSS 12 for Windows.
NOTA: HR = Hazzard Rate, IC = intervalo de confiança.
45
TABELA 10: Modelo final de regressão múltipla de Cox para determinar o efeito independente de variáveis clínico-cirúrgicas e a resposta ao
tratamento cirúrgico da neuralgia do trigêmeo pela rizotomia percutânea por balão.
Todos os Resposta ao tratamento HR IC 95 % p
Variável Pacientes Curado Recorrência De recorrência Value
n = 39 (100 %) n = 33 (84,6 %) n = 6 (15.4 %)
Alívio dor pos-op
Não imediato 8 (20,5) 4 (50) 4 (50) 1,0
Imediato 31 (79,5) 29 (93,5) 2 (6,5) 1,99 (0,22 17,84) 0,53
Fez Tratamento Cirurg
Sim 8 (20,5) 3 (50) 3 (50) 1,0
Não 31 (79,5) 28 (84.8) 5 (15,2) 3,83 (0.43 -33,92) 0,22
Parestesia no pós-op
Não 6 (15,5) 3 (50) 3 (50) 1,0
Sim 33 (84,5) 30 (90,9) 3 (9,1) 22,0 (1,64 290,9) 0.02
FONTE: análise estatística dos dados através do software SPSS 12 for Windows.
46
6. DISCUSSÃO
DADOS PRÉ-OPERATÓRIOS
Aproximadamente 40.000 pessoas nos Estados Unidos sofrem desta dor, sua
incidência nos EUA fica em torno de 4-5 casos/100.000 pessoas. Apesar de todos os pacientes
do trabalho serem caucasianos, não se observa na literatura nenhuma preferência racial ou
regional. Com relação ao sexo, na literatura há uma leve predominância feminina numa taxa
homem/mulher de 2:3. Esta leve predominância do sexo feminino também pode ser observada
no presente trabalho (gráfico 1), onde 54 % eram do sexo feminino e 46 % masculino 4, 8 .
Idade avançada, hipertensão e esclerose múltipla são os fatores de risco encontrados
em estudo epidemiológicos na literatura, sendo a idade o fator de risco maior 4, 8.
No presente estudo, 97,5 % dos pacientes operados estavam acima dos 40 anos, sendo
que a maioria (61,5 %) ficou entre 50-69 anos (gráfico 2). A idade média dos pacientes foi de
62 anos. Na literatura, a maioria dos casos aparece em pacientes entre 60-70 anos, sendo que
90% dos pacientes encontram-se acima de 40 anos no momento do diagnóstico 4, 8, 27.
Aterosclerose vascular muda a forma do vaso, resultando em alongamento e
tortuosidade dos vasos intracranianos, e este mecanismo têm sido a hipótese explicada para a
apresentação dos sintomas principalmente na classe geriátrica 4, 8, 18.
No presente trabalho, houve um paciente (2,5 %) com idade de 26 anos. Apesar da
apresentação da doença em idade avançada na grande maioria das vezes, há relatos na
literatura de casos na infância. Pacientes que apresentam esta doença entre 20-40 anos são
mais comumente acometidos por lesão desmielinizante como esclerose múltipla. Segundo
literatura, pode-se encontrar uma incidência de 1,9 a 4,4% de neuralgia do trigêmeo em
pacientes com esclerose múltipla 21, 32.
A literatura relata que apesar da maioria destes pacientes apresentares neuralgia 11 a
12 anos depois das primeiras manifestações de esclerose múltipla, 0,3 % dos pacientes abrem
o quadro de esclerose múltipla com neuralgia do trigêmeo. No paciente em questão do
trabalho apresentado não houve evidência de esclerose múltipla durante o seguimento, no
47
entanto, deve-se estar atento para esta questão quando do diagnóstico de neuralgia em uma
idade precoce 4, 8, 21, 32.
Casos de neuralgia trigeminal familiar tem sido descrito na literatura, creditando um
possível caráter hereditário a essa doença com uma aparente transmissão autossômica
dominante, responsável pelas alterações vasculares que resultariam no conflito neurovascular.
No presente estudo, houve apenas um paciente com familiar acometido pela neuralgia
trigeminal 20.
A magnitude e a repercussão da neuralgia do trigêmeo na vida dos pacientes pode ser
quantificada, ainda que de forma subjetiva, por alguns dados do estudo. Numa escala de dor
de 0 a 10, todos os pacientes deram nota 10 para neuralgia do trigêmeo, que corresponde a
pior dor do mundo ou a pior já sentida. Além disso, cerca de 97,5 % dos pacientes
entrevistados disseram que esta dor interferia muito/terrivelmente em sua qualidade de vida
(Gráfico 4).
Outra forma de notar o impacto desta dor na vida do paciente está na forma como ela é
desencadeada, fazendo com que ações banais como escovar os dentes, barbear, comer e falar
sejam um ato penoso. A tabela 5 nos mostra que cerca de 64 % dos pacientes tinha a dor
desencadeada por contato cutâneo/mucoso, como coçar a face, barbear, escovar os dentes.
O tempo de sofrimento com a neuralgia do trigêmeo foi em média 8 anos até o
momento da cirurgia, sendo que mais de 30 % tinham um tempo de sofrimento de mais de 10
anos (Tabela 1). O paciente é afetado por picos de dor durante o ano, que pode ser diário por
algum período e seguir com remissão espontânea por dias a meses. Durante o período crítico
de dor, o paciente pode ter de um a centenas ataques por dia, que podem ser ataques separados
ou ainda sobrepostos, dando a sensação de uma dor contínua 1, 4, 8, 24.
Durante as crises, cerca de 84,5 % dos pacientes apresentavam tics faciais. A neuralgia
do trigêmeo geralmente é acompanhada de leves espasmos faciais, ou tic, devido à
hiperexcitação também das fibras motoras do trigêmeo, além das sensitivas. E por este motivo
também é conhecida como tic douloureux, que em francês significa tic doloroso, nome dado
pelo médico francês Nicolas Anché em 1732 1, 4, 8.
O padrão mais comum de envolvimento foi dor na segunda e terceira divisão do nervo
trigêmeo (tabela 6). Em seguida, mais freqüentemente envolvimento da segunda divisão
sozinha, seguida pela terceira divisão isolada por pouca diferença, e primeiro e segundos
ramos juntos. Esta freqüência vem ao encontro com os observados na literatura: V2V3 (32
48
%), V2 (17 %), V3 (15 %) e V1V2 (14 %). Curiosamente não houve nenhum caso no presente
estudo de acometimento dos três ramos, apesar da literatura mostrar uma freqüência de 17 %.
Dor na divisão oftálmica (V1) de forma isolada é incomum (4 % na literatura) e no presente
estudo esta freqüência foi de 5 % 1.
O lado direito foi acometido na grande maioria (85 %) dos pacientes (Tabela 6).
Segundo a literatura, o lado direito acomete mais freqüentemente que o lado esquerdo (60 %
versus 35 % respectivamente). Não é sabido o porquê desta discrepância entre os lados 1.
Trousseau em 1853 chamou esta condição de névralgie épileptiforme , e foi de suas
observações clínicas que emergiu a possibilidade de utilizar medicações antiepilépticas como
agente antineurálgico. Em geral utiliza-se drogas antiepilépticas para o controle da dor, sendo
a carbamazepina medicamento mais eficaz e de primeira escolha no tratamento desta dor
facial. A carbamazepina foi o medicamento usado previamente como tratamento clínico em
97,4 % dos pacientes entrevistados no presente trabalho (Tabela 2). Segundo a literatura, os
resultados iniciais são excelentes em 40 a 100% dos doentes. A melhora inicial mantém-se em
81% dos casos durante seis meses e em mais de 7 a 10% dos casos quando associada à
difenil-hidantoína. A dor recorre 24hs após a suspensão do tratamento 24, 33.
Nem todos que utilizam a carbamazepina se beneficiam de sua ação ou toleram seus
efeitos colaterais. O presente trabalho mostrou que 31 % dos pacientes não puderam
continuam com o tratamento farmacológico devido aos efeitos colaterais da carbamazepina,
que comumente são dose-dependente, e estes foram sonolência, tontura, cansaço, visão turva,
vertigem e alguns relataram efeitos colaterais hepáticos. De forma isolada, os efeitos
colaterais contribuíram em 23 % dos casos de insucesso clínico. Segunda a literatura, na dose
de 600mg/dia, 43% dos casos apresentam vertigens, 50% sonolência e limitação das
atividades diárias. Na dose de 400mg/dia, 18% apresentam vertigens e, 32% sonolência. Em
18% dos casos, há interferência com atividades diárias. A erupção cutânea ocorre em 2 a 5%
dos casos e é sinal premonitório de depressão da medula óssea. A dose necessária para
controlar a dor causa vertigem em 10% dos doentes, sonolência transitória em 7,5% e
exantema em 2,5% 24, 33.
A carbamazepina além de importante para o tratamento, também se mostrou importante no
diagnóstico final de NT em alguns trabalhos, na forma de teste terapêutico. Tal estudo
mostrou que dos pacientes com NT, 90 % vão responder inicialmente, enquanto que no grupo
49
de pacientes sem NT haverá uma resposta em apenas 45 %. A relação entre a eficácia da CBZ
e o diagnóstico final de NT foi estatisticamente significante (p < 0,05) .
Dentre pacientes com trigger points identificáveis 97 % tinham NT segundo a
literatura, enquanto que nos pacientes sem trigger points identificável somente 67 % tinham
NT. A porcentagem nos casos com trigger points foi significativamente mais alta (p > 0,05)
nos casos com NT do que nos casos sem NT 35.
O presente estudo mostrou também que 18 % dos pacientes entrevistados fizeram uso
prévio de outra droga além da carbamazepina. Outros agentes anticonvulsivantes
recentemente passaram a ser empregados no tratamento da neuralgia do trigêmeo, incluindo o
topiramato e a gabapentina. A gabapentina é uma droga antiepiléptica recente, introduzida em
1994 para controle de convulsões parciais com ou sem generalização secundária. Ela tem
mostrado ser efetiva em combinação com carbamazepina ou lamotrigine na neuralgia
trigeminal idiopática 24, 33.
O baclofeno parece bloquear o efeito de neurotransmissores excitatórios no núcleo do
trato espinal do nervo trigêmeo 24.
Um trabalho sobre o uso do misoprostol, um análogo da prostaglandina E1, concluiu
que este pode ser uma alternativa terapêutica segura e eficaz em pacientes com neuralgia do
trigêmeo associado à esclerose múltipla que são refratários a terapêutica convencional com
carbamazepina. Nenhum pacientes do presente estudo usou este medicamento 35.
A falha do tratamento farmacológico dos pacientes do presente trabalho deveu-se ao
não controle da dor em 69 % dos pacientes como visto no gráfico 3, aos efeitos colaterais em
23 % dos pacientes e ambos em 8 %. Apesar de muito eficientes na fase inicial do tratamento,
observa-se que, a longo prazo, há recorrência da dor após o tratamento farmacológico.
Observou-se que 41,6% dos doentes tratados, a longo prazo, com carbamazepina, difenil-
hidantoína e vitaminas do complexo B, recorreram a dor, segundo literatura 24.
A queixa de que as crises atrapalhavam a alimentação esteve presente em 84,5 % dos
pacientes entrevistados, e 36 % relataram perda ponderal. Esta associação foi analisada pelo
teste exato de Fisher e constatados que não houve relação estatística entre a incapacidade de
se alimentar de perda ponderal (p = 0,65). Não há relato na literatura deste tipo de análise.
Cerca de um quinto dos pacientes tentaram algum tipo de tratamento não
convencional, como acupuntura, homeopatia e outros. Destes, 10,3 % fizeram acupuntura sem
melhora, e um caso relatou piora da dor (Tabela 3). Apesar deste dado do trabalho, alguns
50
Figura 12: Algoritmo de escolha entre os procedimentos cirúrgicos percutâneos e abertos. NVC, conflito
38
neurovascular. MVD, descompressão microvascular . FONTE: figura 1 de Orlandini G .
DADOS PÓS-OPERATÓRIOS
Apenas 1 paciente não obteve alívio da dor com a compressão percutânea com balão
no presente estudo. O balão neste paciente não teve o formato característico de pêra,
fundamental para o sucesso técnico do procedimento. Posteriormente foi submetido à MDV
com sucesso. Todo o restante (98 %) teve alívio da dor, de forma imediata (80 %) ou não
imediata (18 %), sendo que estes demoraram em média 6 dias até o alívio completo (Gráfico
5). O alívio da dor normalmente ocorre logo após o paciente acordar da anestesia (alívio
imediato), mas ocasionalmente pode demorar vários dias, segundo a literatura 40.
Se a dor não é aliviada de forma imediata, então o procedimento pode ser repetido,
mas o paciente deve esperar no mínimo uma semana antes, fazendo logo que possível, porque
a injúria secundária ao nervo pode causar injúria progressiva e o alívio da dor pode ocorrer
nos dias seguintes. Se o paciente ainda continuar com dor após a compressão do gânglio,
53
fibras mielinizadas. Outras alterações por causa do comprometimento de V1 podem ser vistas,
como no presente estudo onde 3 pacientes tiveram esta queixa 40.
Paresia do VI par craniano foi vista no paciente que não obteve alívio da dor no
seguimento pós-operatório do trabalho. Podemos observar na literatura que esta complicação
apesar de rara, pode acontecer. Na série de Brown et al., um paciente da série teve uma
paralisia temporária do VI par craniano que se resolveu de forma espontânea,
presumivelmente devido a uma hiper-insuflação do balão e conseqüente compressão do seio
cavernoso. Podemos encontrar também descrição de outros pares cranianos afetados por conta
do procedimento 28, 30.
Apesar de dois pacientes se queixarem de alterações gustativas após o procedimento
cirúrgico, não há relatos na literatura deste tipo de alteração. Entretanto, estas alterações
podem ser justificadas pelo comprometimento de V3 devido ao procedimento, já que este
ramo faz a inervação sensitiva de 2/3 anteriores da língua 5, 6.
Uma paciente teve hemorragia subaracnóidea no trans-operatório, entretanto não
houve seqüelas. Posteriormente descobriu-se que esta paciente fazia uso por conta própria e
irregular de medicamentos naturais que podem interferir na agregação plaquetária, não
referido pela paciente quando indagada, pois julgava ser composto inofensivo. Esta
complicação é a que tem sido mais chamada atenção na literatura devida sua maior gravidade.
A hemorragia subaracnóidea pode causar um quadro de meningite asséptica: cefaléia, febre e
confusão mental que pode durar por 24 a 48 horas. O paciente reclamará de cefaléia
imediatamente após acordar da anestesia. Alguns trabalhos mostraram que esta complicação
pode ocorrer, na série de Brown et al., cinco por cento dos pacientes tiveram meningite
asséptica pós-operatória ocorrendo dentro de seis horas após o procedimento. Estes sintomas
se resolveram dentro de 48 horas sem nenhum déficit residual. Segundo literatura, não houve
crescimento bacteriano na cultura do líquor e a contagem de hemáceas sugeriu que a causa
deste quadro foi uma pequena hemorragia subaracnóidea. O tratamento é medidas de suporte
e sintomáticos 30, 40.
Normalmente, a neuralgia do trigêmeo causa a pior dor já sentida, e o paciente aceita
prontamente os risco e efeitos colaterais do procedimento tamanho a dor, entretanto, todas o
paciente deve ser informado dos riscos e efeitos colaterais inerentes ao procedimento, mesmo
que estes sejam mínimos e/ou suportáveis na quase totalidade das vezes.
55
exemplo, a dor pode ser tão freqüente que impede o paciente uma nutrição via oral, levando a
estados de desnutrição e emagrecimento em situações extremas. Pode-se encontrar relatos de
problemas quanto à higiene pessoal do paciente, como dificuldade para barbear-se e/ou
escovar os dentes. Depressão secundária é um achado comum em pacientes que possuem uma
síndrome dolorosa crônica. A severidade da dor pode levar pacientes ao suicídio 4, 8.
Uma morte relatada na literatura pesquisada foi associada com sangramento intra-
operatório devido à introdução incorreta da agulha que foi demasiadamente além do forame
oval 42.
TABELA 11: revisão de literatura de grandes séries Compressão Percutânea com Balão
comparada com trabalho atual.
7. CONCLUSÃO
I. Houve leve prevalência do sexo feminino, maior incidência acima dos 50 anos e
terrível repercussão da doença na qualidade de vida dos pacientes com neuralgia, com um
tempo de sofrimento de 8 anos em média. A dor era tipo choque-elétrico na grande maioria,
sendo que em 3 casos a qualidade da dor mudou no decorrer da evolução da neuralgia
trigeminal. A dor era na maioria acompanhada de tics e desencadeada por contato
cutâneo/mucoso. A grande maioria usava CBZ como tratamento clínico prévio, que falhou
devido ao não controle da dor na grande maioria dos casos. Um quinto tinha feito tratamento
cirúrgico prévio ou tratamento não convencional. O lado direito foi o mais acometido
disparadamente, e o ramo mais acometido foram V2V3. Não houve casos de acometimento
dos três ramos.
II. A queixa de que as crises atrapalhavam a alimentação não teve relação estatística
com o relato do paciente de perda ponderal.
III. Metade dos pacientes procuraram o dentista confundindo a neuralgia trigeminal
com uma odontalgia, e destes, metade ainda fez algum procedimento odontológico
desnecessário devido a uma confusão diagnóstica.
IV. A compressão percutânea com balão do gânglio de Gâsser obteve um sucesso
inicial em 98 % dos casos, sendo que a grande maioria obteve alívio imediato. Mostrou-se um
tratamento com baixa morbidade e nenhuma mortalidade, sendo, portanto, um procedimento
seguro até em idades mais avançadas. A parestesia foi o efeito colateral na grande maioria dos
casos, entretanto, teve boa tolerância pela grande maioria dos pacientes, e mesmos nos que se
queixaram deste sintoma, todos preferiram parestesia à dor facial. O grau de satisfação foi
aproximadamente 90 %
V. A curva de Kaplan-Meyer mostrou que num seguimento de 50 meses a taxa de
recorrência foi de 20 %. Dentre todas as variáveis, a única que se mostrou interferir de forma
independente nos resultado foi a parestesia no pós-operatório, ou seja, pacientes com
parestesia no pós-operatório tem baixa probabilidade de recorrência da neuralgia do trigêmeo,
fazendo com que a parestesia no pós-operatório se torne fator protetor em relação a
recorrência.
58
NORMAS ADOTADAS
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63
APÊNDICE
PROTOLOCO
DADOS DE IDENTIFICAÇÃO
a) Nome: __________________________________________________________
b) Endereço_________________________________________________________
c) Telefone: ______________________
d) Idade: _________________________
e) Raça: ( ) branco ( ) negro ( ) amarelo ( ) pardo
f) Sexo: ( ) M ( ) F
g) Data da cirurgia______/______/________
DADOS PRÉ-CIRÚRGICOS
11. Sobre a qualidade da dor, como ela era quando iniciou suas crises?
( ) Tipo choque elétrico ( )Facada ( ) agarramento ( )ardência/queimação ( )parestesia
12. Ainda sobre a qualidade da dor, como ela era na época da cirurgia?
( ) Tipo choque elétrico ( )Facada ( ) agarramento ( )ardência/queimação ( )parestesia
13. Sobre a intensidade da dor, que nota você daria para sua dor em uma escala de 0 a 10
(VAS), sendo que 0 é nenhuma e nota 10 para a pior dor da sua vida? ___________
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16. Teve perda ponderal desde que começou a neuralgia? .................................( ) S ()N
DADOS PÓS-CIRÚRGICOS
23. Alívio da dor? ( ) Imediato ( ) N imediato